Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0010040-70.2020.2.00.0000
Requerente: WAGNER WILSON FERREIRA e outros
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS - TJMG

 


EMENTA: 

RECURSO EM PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. PROJETO DE LEI DE INICIATIVA DO PODER JUDICIÁRIO. CRIAÇÃO DE CARGO DE DESEMBARGADOR. PERDA SUPERVENIENTE DE OBJETO. POSTERIOR APROVAÇÃO PELO LEGISLATIVO ESTADUAL.

1.             Em razão de o ato questionado neste PCA já se encontrar convertido em lei stricto sensu, resta evidente a perda superveniente do objeto ora questionado, o qual se reportava à fase anterior do processo legislativo, concernente à elaboração de proposta normativa (anteprojeto de lei) de iniciativa do Poder Judiciário.

2. Prejudicado o exame na seara administrativa. Precedentes do Plenário.

3. Recurso administrativo que se conhece e nega provimento.

 

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator. Presidiu o julgamento o Ministro Luiz Fux. Plenário Virtual, 8 de outubro de 2021. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Luiz Fux, Maria Thereza de Assis Moura, Luiz Fernando Tomasi Keppen, Tânia Regina Silva Reckziegel, Mário Guerreiro, Flávia Pessoa, Sidney Madruga, Ivana Farina Navarrete Pena, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, André Godinho, Mário Goulart Maia e Luiz Fernando Bandeira de Mello. Não votaram, em razão das vacâncias dos cargos, os representantes do Tribunal Superior do Trabalho, do Tribunal Regional Federal e da Justiça Federal.

 

RELATÓRIO

 

Trata-se de Procedimento de Controle Administrativo - PCA, com pedido liminar, formulado pelo Desembargador Wagner Wilson Ferreira e outros, em desfavor do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais – TJMG.

Em síntese, os requerentes se insurgem contra a aprovação de anteprojeto de lei complementar pelo Órgão Especial da Corte, ocorrida durante a sessão administrativa realizada em 25 de novembro de 2020 e que tratou da criação de 10 (dez) novos cargos de Desembargador.

Sustentam que a aprovação do projeto de lei complementar vai de encontro ao que dispõe o Regimento Interno do TJMG, que não delegou ao Órgão Especial a competência para este fim. Consideram que a iniciativa do processo legislativo é atribuição do Tribunal Pleno, com participação e deliberação por todos os membros, notadamente quando a matéria envolver a criação ou extinção de cargo de desembargador e de juiz.

Argumentam, ainda, que a questionada proposta normativa “não observou o trâmite procedimental de anteprojeto de lei a ser apreciado pelo órgão competente, nos termos dos artigos 184 e 185, do TITJMG, bem como não houve publicação da pauta da sessão, em ofensa ao princípio da publicidade”.

Pelos fatos e fundamentos que apresentam, solicitam a suspensão liminar dos efeitos do anteprojeto de lei publicado no DJe de 26/11/2020, impedindo seu envio ao Poder Legislativo Estadual. No mérito, pugnam pela declaração de nulidade do ato impugnado, com determinação ao Tribunal que observe o procedimento estabelecido no seu respectivo Regimento Interno, notadamente seus respectivos prazos.

Na inicial análise dos autos (Decisão Monocrática - Id nº 4208664), por não vislumbrar a irregularidade suscitada, os pedidos formulados na inicial foram julgados improcedentes. Foi observado que o aludido Projeto de Lei foi recebido pela Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais no dia 1º de dezembro de 2020, com a devida publicação no Diário do Legislativo em 02 de dezembro de 2020. A respectiva tramitação do PLC teve início 01 (um) dia antes da deflagração deste PCA.

Inconformado com a decisão supra, os requerentes interpuseram tempestivo Recurso Administrativo (Id nº 4213259), no qual reiteram semelhantes argumentos àqueles lançados na inicial. Apresentaram, ainda, nova petição junto ao Id nº 4245797 e seguintes, pela qual suscitam “fatos posteriores à interposição de recurso administrativo”.

Em suas contrarrazões, o TJMG defende o não acolhimento do recurso administrativo, por considerar que não há qualquer fundamento que ampare a pretensão dos requerentes (Id nº4246320). Defende, ainda, a perda superveniente do objeto questionado no presente procedimento de controle administrativo. O Tribunal esclarece que a proposta legislativa encaminhada pelo Poder Judiciário foi autuada como Projeto de Lei Complementar nº 47/2020 e posteriormente aprovado pela Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais, o que resultou na publicação da Lei Complementar Estadual nº 157/2021, promulgada pelo Governador do Estado de Minas Gerais em 07 de janeiro de 2021.

É o relatório.

 

 

 

VOTO

 

Examinando os autos, verifica-se que a parte recorrente não trouxe em sede recursal qualquer elemento novo ou razão jurídica capaz de alterar o entendimento sobre a causa, razão pela qual mantenho a decisão recorrida por seus jurídicos fundamentos, os quais submeto ao crivo deste Colegiado:

 

DECISÃO MONOCRÁTICA FINAL

(...)

É o Relatório, sucinto.

O pleito não reúne condições de prosperar.

Nos termos da Constituição Federal, compete ao Conselho Nacional de Justiça o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário, bem como do cumprimento dos deveres funcionais dos Juízes (Art. 103-B, §4º da CF). Não é dado, portanto, a este Conselho fiscalizar a atuação dos demais Poderes.

Com efeito, o presente procedimento foi proposto em 02 de dezembro de 2020. Em consulta ao sítio eletrônico da Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais, consta que o aludido Projeto de Lei foi recebido por aquela Casa Legislativa no dia anterior, ou seja, em 1º de dezembro de 2020, com a devida publicação no Diário do Legislativo em 02 de dezembro de 2020. A tramitação do PLC teve início, portanto, 01 (um) dia antes da deflagração deste PCA.

É pacífico o entendimento, no âmbito deste Conselho, sobre a sua incompetência para interferir na tramitação de projetos de lei já em curso no Poder Legislativo, a bem do Princípio da Separação dos Poderes.

Confira-se, a respeito, o seguinte precedente:

RECURSO ADMINISTRATIVO EM PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. REMESSA DE PROJETO DE LEI COMPLEMENTAR À ASSEMBLEIA LEGISLATIVA LOCAL. INSTAURAÇÃO DE PROCESSO LEGISLATIVO. ATO DE ÍNDOLE POLÍTICA. COMPETÊNCIA CNJ. IMPOSSIBILIDADE DE ADENTRAR NO CONTROLE DE MATÉRIA LEGIFERANTE. PRECEDENTES DO CNJ E STF. AUSÊNCIA DE AFRONTA À SÚMULA 685/STF. MANUTENÇÃO DE DECISÃO MONOCRÁTICA. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO.

I. O Tribunal, ao tratar da reestruturação de seus cargos, age dentro dos limites de sua autonomia orgânico-administrativa (art. 96 da CF) e em consonância com os ditames constitucionais.

II. A instauração de processo legislativo é ato de índole política, em relação ao qual o CNJ não detém qualquer ingerência, uma vez que sua competência se restringe ao controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário (art. 103-B, §4º). Incabível a intervenção do Conselho Nacional de Justiça na esfera orgânica de outros Poderes. Precedentes.

III. Se a proposta encaminhada à Câmara Legislativa local corre sem prejuízo da nomeação dos novos escreventes técnicos judiciários, aprovados no último concurso, não há que se falar em violação da Súmula 685/STF.

IV. Inexistindo razão jurídica capaz de alterar o entendimento sobre a causa, deve-se manter a decisão recorrida pelos seus próprios fundamentos.

V. Recurso conhecido, uma vez que tempestivo, mas que, no mérito, nega-se provimento.

(CNJ - RA – Recurso Administrativo em PCA - Procedimento de Controle Administrativo - 0002018-33.2014.2.00.0000 - Rel. ANA MARIA DUARTE AMARANTE BRITO - 200ª Sessão Ordinária – julgado em 02/12/2014).

Pelo exposto, não possuindo o CNJ competência para controlar os atos do Poder Legislativo, JULGO MANIFESTAMENTE IMPROCEDENTES os pedidos formulados neste feito, determinando seu o ARQUIVAMENTO por decisão monocrática, nos termos do inciso X c/c XII do art. 25 do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça, restando prejudicada a análise do pedido liminar.

Intimem-se às partes.

Sem recurso, arquive-se.

À Secretaria Processual, para as providências cabíveis.

Brasília, data registrada em sistema.

Conselheiro André Godinho

Relator

 

 

Em acréscimo a decisão recorrida, relevante destacar que o projeto de lei ora questionado, de iniciativa do Poder Judiciário Estadual e que dispôs sobre a criação de 10 (dez) novos cargos de desembargador junto à Corte Estadual mineira, após apresentação e instrução, foi aprovado pelo Legislativo estadual, convertendo-se em dispositivo de lei.

Infere-se do sítio eletrônico da Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais e do próprio Diário Executivo do Estado, que o Projeto de Lei Complementar nº 47/2020, derivado do ato questionamento no presente procedimento, foi acolhido pela Casa Legislativa e convertido na Lei Complementar Estadual nº 157/2021, posteriormente promulgada pelo Governador do Estado de Minas Gerais em 07 de janeiro de 2021.

Vejamos:

 

LEI COMPLEMENTAR 157, DE 06/01/2021 

Altera a Lei Complementar nº 59, de 18 de janeiro de 2001, que contém a organização e a divisão judiciárias do Estado de Minas Gerais.

O GOVERNADOR DO ESTADO DE MINAS GERAIS,

O Povo do Estado de Minas Gerais, por seus representantes, decretou e eu, em seu nome, promulgo a seguinte lei complementar:

Art. 1º – O inciso I e os §§ 4º e 15 do art. 10 da Lei Complementar nº 59, de 18 de janeiro de 2001, passam a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 10 – (...)

I – em Belo Horizonte, duzentos Juízes de Direito em varas da Justiça Comum ou em unidades jurisdicionais do Juizado Especial e cinquenta e oito Juízes de Direito Auxiliares Especiais, com função de substituição e cooperação;

(...)

§ 4º – A instalação das comarcas, das varas e das unidades jurisdicionais do Sistema dos Juizados Especiais criadas por esta lei complementar, bem como a alteração de competência das unidades judiciárias, serão determinadas pelo órgão competente do Tribunal de Justiça, por meio de resolução, de acordo com a necessidade da prestação jurisdicional e após a verificação, pela Corregedoria-Geral de Justiça, das condições de funcionamento e, pela Presidência do Tribunal de Justiça, da disponibilidade de recursos financeiros.

(...)

§ 15 – Para expedir a resolução de que trata o § 4º deste artigo, o órgão competente do Tribunal de Justiça exigirá a estimativa justificada de distribuição média, por mês, de:

I – cem processos, para a instalação de vara ou a alteração de sua competência;

II – cento e sessenta processos para cada Juiz, em se tratando de instalação de unidade jurisdicional do Sistema dos Juizados Especiais ou de cargo de Juiz de Direito em unidade jurisdicional do Sistema dos Juizados Especiais.”.

Art. 2º – Ficam extintos dez cargos de Juiz de Direito Substituto de Segundo Grau da Comarca de Belo Horizonte, criados pelo art. 1º da Lei Complementar nº 139, de 3 de maio de 2016, e ainda não providos.

Art. 3º – Ficam criados dez cargos de Desembargador do Tribunal de Justiça, passando o § 1º do art. 11 da Lei Complementar nº 59, de 2001, a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 11 – (…)

§ 1º – São cento e cinquenta os cargos de Desembargador do Tribunal de Justiça, dos quais um será o de Presidente, três, os de Vice-Presidentes, e um, o de Corregedor-Geral de Justiça.”.

Art. 4º – O § 8º do art. 84-C, o inciso V do caput do art. 114, o § 3º do art. 123, o parágrafo único do art. 126 e os §§ 1º e 7º do art. 313 da Lei Complementar nº 59, de 2001, passam a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 84-C – (...)

§ 8º – Na Comarca de Belo Horizonte, um dos Juízes de Direito do Sistema dos Juizados Especiais será designado pelo Corregedor-Geral de Justiça para exercer a função de Juiz-Coordenador dos Juizados Especiais no Estado.

(...)

Art. 114 – (...)

V – um terço da remuneração, em razão de férias;

(...)

Art. 123 – (...)

§ 3º – Os Juízes e os servidores designados para o plantão previsto neste artigo, bem como para o exercício de outras atividades administrativas ou jurisdicionais extraordinárias, terão direito a compensação ou indenização pelos dias em que servirem.

(...)

Art. 126 – (...)

Parágrafo único – As férias-prêmio poderão ser concedidas por período de, no mínimo, um mês, para gozo parcelado em três períodos de dez dias.

(...)

Art. 313 – (...)

§ 1º – Nos fins de semana, feriados ou em qualquer outro dia ou horário em que não houver expediente forense, haverá, nos tribunais e nos órgãos da Justiça de primeiro grau, magistrado e servidor em plantão, designados para apreciar e processar as medidas de natureza urgente, conforme dispuserem os respectivos regimentos internos, com direito a compensação ou indenização.

(...)

§ 7º – O magistrado que permanecer de plantão, quando designado, nos fins de semana, feriados ou em qualquer outro dia ou horário em que não houver expediente forense, terá direito a compensação ou indenização, a ser paga no prazo de trinta dias após o requerimento de conversão.”.

Art. 5º – Em decorrência das alterações previstas nos arts. 1º e 3º desta lei complementar, a linha 1 do item I.1 e a linha 2 do item I.2.I do Anexo I da Lei Complementar nº 59, de 2001, passam a vigorar na forma do Anexo desta lei complementar.

Art. 6º – Ficam revogados os seguintes dispositivos da Lei Complementar nº 59, de 2001:

I – o inciso VIII do art. 9º;

II – os arts. 46-B e 46-C;

III – o inciso VI do caput do art. 114.

Art. 7º – Esta lei complementar entra em vigor na data de sua publicação.

Belo Horizonte, aos 6 de janeiro de 2021; 233º da Inconfidência Mineira e 200º da Independência do Brasil.

ROMEU ZEMA NETO

https://www.almg.gov.br/consulte/legislacao/completa/completa.html?ano=2021&num=157&tipo=LCP

 

 

Nesse contexto, em razão de o ato questionado já se encontrar convertido em lei stricto sensu, resta evidente a perda superveniente do objeto deste PCA, o qual se reporta à fase anterior do processo legislativo, concernente à elaboração de proposta normativa (anteprojeto de lei) de iniciativa do Poder Judiciário.

Uma vez constatado que o anteprojeto de lei questionado perante este Conselho foi posteriormente convertido em lei específica, em razão da sua efetiva promulgação, considera-se prejudicado o exame na seara administrativa, ante a perda superveniente do objeto.

Precedente do Plenário neste sentido:

 

RECURSO ADMINISTRATIVO. PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. ANTEPROJETO DE LEI. ALTERAÇÃO DO PLANO DE CARGOS E SALÁRIOS. SERVIDORES DO PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO. CONVERSÃO EM LEI. PERDA SUPERVENIENTE DO OBJETO. PREJUDICIALIDADE. PRECEDENTES DESTE CONSELHO. RECURSO CONHECIDO, MAS DESPROVIDO.

I) A conversão em Lei de Anteprojeto, após impugnação perante este Conselho, implica a prejudicialidade do procedimento instaurado, ante a perda superveniente do objeto. Precedentes.

II) Improcedência da alegação de possibilidade de que o CNJ determine ao Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo o encaminhamento de mensagem revogadora ao Parlamento estadual.

III) Recurso administrativo conhecido, mas desprovido.

(CNJ - RA – Recurso Administrativo em PCA - Procedimento de Controle Administrativo - 0003189-15.2020.2.00.0000 - Rel. IVANA FARINA NAVARRETE PENA - 74ª Sessão Virtual - julgado em 02/10/2020).

 

 

Assim, considerando todas as circunstâncias acima apresentadas, tem-se que a decisão monocrática aqui proferida se amolda de forma adequada ao disposto no art. 25, X, do RICNJ.

Por essas razões, conheço do Recurso Administrativo para negar-lhe provimento, nos termos da fundamentação supra.

É como voto.

Brasília, data registrada em sistema. 

 

Conselheiro André Godinho 

 

Relator