Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0004023-81.2021.2.00.0000
Requerente: TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE RONDONIA e outros
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE RONDÔNIA - TJRO

 


 

PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE RONDÔNIA. APOSENTADORIA COMPULSÓRIA DE DESEMBARGADOR. ATO COMPLEXO. TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE RONDÔNIA. APRECIAÇÃO DA LEGALIDADE. ATRIBUIÇÃO CONSTITUCIONAL. TJRO. REVISÃO ADMINISTRATIVA. ANÁLISE DA COMPETÊNCIA. REPERCUSSÃO GERAL. DECISÃO DA CORTE DE CONTAS. DESCUMPRIMENTO. IMPOSSIBILIDADE. AUTOTUTELA DO TRIBUNAL. INAPLICABILIDADE.

1. Recurso contra decisão que não conheceu do pedido de desconstituição de ato do Tribunal que fixou os termos da aposentadoria compulsória de magistrado em desacordo com acórdão do Tribunal de Contas.

2. A questão subjacente ventilada pelo TCE/RO consiste o exame da competência do Tribunal de Justiça para, no exercício de suas atribuições administrativas, revisar decisão proferida pelo Plenário de uma Corte de Contas.  A análise da pretensão independe de um caso específico e o julgamento tem repercussão geral para todo o Poder Judiciário.

3. A Constituição Federal estabeleceu que o exame da legalidade do ato concessório da aposentadoria é uma atribuição da Corte de Contas. Diante disso, no exercício da competência administrativa, os Tribunais não têm competência para revisar decisões dos Tribunais de Contas.

4. O respeito à autoridade das decisões proferidas pelos Tribunais de Contas no exercício de sua competência constitucional constitui a própria razão da existência de um órgão de controle externo. Dessa forma, não se divisa a possibilidade de atos do Tribunal de Contas serem anulados unilateralmente por outro órgão na via administrativa, resguardada a revisão judicial.

5. O TJRO agiu fora de sua competência administrativa quando reconheceu a prescrição do direito de o órgão de controle externo exercer sua atividade fiscalizatória. A decisão acarretou no descumprimento das determinações do Plenário do TCE/RO, proferidas na análise da legalidade do ato de aposentadoria, as quais são de observância obrigatória e eventual inconformismo deve ser apreciado apenas judicialmente.

6. Não há fundamento para o TJRO discutir questões relacionadas ao mérito da decisão do TCE/RO e deixar de aplicá-la com base na prescrição. Descabe invocar o princípio da autotutela para rever uma decisão  proferida pela Corte de Contas.

7. Recurso provido.

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, deu provimento ao recurso para julgar o pedido inicial procedente e anular o Ato 1.130/2020 e, por consequência, restabelecer os efeitos do Ato 729/2020, ambos editados pelo TJRO, para fixar os termos da aposentadoria compulsória do Desembargador, nos termos do voto da Relatora. Presidiu o julgamento o Ministro Luiz Fux. Plenário Virtual, 12 de agosto de 2022. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Luiz Fux, Maria Thereza de Assis Moura, Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto (Relatora), Richard Pae Kim, Marcio Luiz Freitas, Giovanni Olsson, Sidney Madruga, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto, Mário Goulart Maia e Luiz Fernando Bandeira de Mello.

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RELATÓRIO

A SENHORA CONSELHEIRA JANE GRANZOTO (RELATORA): Trata-se recurso administrativo interposto pelo Tribunal de Contas do Estado de Rondônia (TCE/RO) contra decisão que não conheceu do pedido formulado na inicial para anular o ato praticado pelo Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia (TJ/RO) que alterou pela via administrativa acórdão da Corte de Contas e modificou os termos da aposentadoria compulsória do Desembargador Sebastião Teixeira Chaves estabelecidos pelo órgão de controle externo.

Monocraticamente, o pedido não foi conhecido ao argumento de que a pretensão deduzida na inicial traduz interesse meramente individual e sem repercussão geral para o Poder Judiciário (decisão Id4384936).

O TCE/RO interpôs recurso administrativo no Id4402395 no qual afirmou que a manutenção da decisão monocrática ensejará a continuidade da violação de normas constitucionais e que seu acórdão foi rejeitado por ato unilateral do TJRO.

Sustentou a presença de repercussão geral da matéria em face da afronta à Constituição Federal e ao Estado Democrático de Direito e reiterou argumentos apresentados na inicial. Pediu o restabelecimento da autoridade das decisões do órgão de controle externo, conforme previsto no texto constitucional.

Contrarrazões apresentadas pelo Desembargador aposentado Sebastião Teixeira Chaves no Id4430834 e pelo TJRO no Id4442306.

No Id4519146 o Desembargador aposentado Sebastião Teixeira Chaves apresentou manifestação para registrar a existência de parecer emitido pela área técnica do TCE/RO que opinou pelo reconhecimento da prescrição.

É o relatório.

 

Brasília, data registrada no sistema. 

 

Jane Granzoto

Conselheira 

 

 

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VOTO

 

A SENHORA CONSELHEIRA JANE GRANZOTO (RELATORA): Trata-se de recurso administrativo contra a decisão que não conheceu do pedido, nos seguintes termos (Id44384936): 

Trata-se de Procedimento de Controle Administrativo (PCA), com pedido liminar, proposto pelo TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE RONDÔNIA (TCE-RO) e pelo ESTADO DE RONDÔNIA em face do TRIBUNAL DE JUSTIÇA do mesmo ente federativo (TJRO), no qual intentam a desconstituição do Ato nº 1130/2020 que acolheu a pretensão do magistrado aposentado compulsoriamente, SEBASTIÃO TEIXEIRA CHAVES, e afastou, unilateralmente, a retificação do ato de aposentadoria determinado pela Corte de Contas.

Os requerentes explicam que o então desembargador fora apenado em Processo Administrativo Disciplinar (PAD) com pena de aposentadoria compulsória, com proventos proporcionais ao tempo de serviço, por deliberação deste Conselho na 57ª Sessão Ordinária de julgamento, realizada em 27.2.2008.

Em cumprimento à decisão, relatam que o TJRO expediu o Ato nº 255, de 14 de abril de 2008-CM, que retroagiu os efeitos da decisão para 19.3.2008, e o encaminhou para o TCE-RO para fins de registro.

A partir disso, os requerentes passam a expor sobre a sucessão de atos e decisões emanados tanto do TCE-RO, quanto do TJRO, em relação à aposentadoria do magistrado, que nos termos finais culminou com a apresentação de recurso pelo desembargador, no TJRO, provido pelo Pleno Administrativo para acolher a pretensão recursal e afastar, unilateralmente, a retificação do ato da Corte de Contas, resultando na expedição do Ato nº 1130/2020, ora impugnado.

Recebida a comunicação sobre o resultado do julgamento, os requerentes discorrem que a Corte de Contas reforçou ao TJRO a anterior determinação de retificação da aposentadoria do magistrado, mas assinalam que o presidente do Tribunal proferiu despacho alegando ter havido o esgotamento da jurisdição e determinou o arquivamento dos autos.

A partir desse contexto, os postulantes defendem a competência do Tribunal de Contas para apreciar, para fins de registro, a legalidade das concessões de aposentadorias, por se tratar de um ato complexo que só se aperfeiçoa após sua análise, assim como teriam estabelecido a Súmula Vinculante nº 6 e a Súmula nº 199 do Tribunal de Contas da União (TCU). Além disso, alegam a violação à competência constitucional do TCE-RO, conforme estaria retratado por votos divergentes proferidos por alguns dos desembargadores do TJRO e pela jurisprudência erigida no âmbito do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Assim, justificam a necessidade de concessão de medida cautelar, porquanto a decisão teria garantido ao magistrado aposentado o acréscimo em seus proventos do Adicional de Inatividade, da ordem de R$ 3.859,72 (três mil, quinhentos e cinquenta e nove reais e setenta e dois centavos) mensais, o que seria devido somente nas hipóteses de aposentadoria voluntária e com paridade. Defendem que eventual pagamento do montante poderá acarretar prejuízos à Fazenda Pública diante da irrepetibilidade das verbas de caráter alimentar.

Pretendem, por isso, o deferimento de medida cautelar para suspender o Ato nº 1130/2020 do Presidente do TJRO e restaurar os efeitos do Ato nº 729/2020, que havia dado cumprimento ao Acórdão do TCE-RO.

No mérito, os requerentes pugnam pela confirmação da liminar e a determinação para que o TJRO cumpra de imediato as deliberações do TCE-RO, a respeito da concessão de aposentadoria compulsória do desembargador Sebastião Teixeira Chaves.

Instado, o Tribunal também observa que o então desembargador foi sancionado disciplinarmente por esta Casa, com a pena de aposentadoria compulsória, com proventos proporcionais ao tempo de serviço, e para tanto, expediu o Ato nº 255/2008 (publicado no Diário Oficial do Estado de 15.04.2008, nos termos do artigo 42, inciso V, da Lei Orgânica da Magistratura-LOMAN c/c artigo 93, VIII da Constituição Federal, com efeitos retroativos a 19/03/2008) (Id 4381179).

Relata que o TCE apreciou a legalidade do ato e proferiu decisão monocrática (nº 149/2013/TCE/RO, de 19.9.2013) para retificar a fundamentação legal (acrescentar o art. 40, § 1°, III, “a”, §§ 3° e 17 e o inciso VI do art. 93 da Constituição Federal c/c a Lei n. 10.887/2004), e enfatizar que o cálculo dos proventos proporcionais ao tempo de serviço deveria ser efetuado pela média aritmética prevista na lei nº 10.887/2004, limitando-se ao teto remuneratório constitucional vigente, e sem paridade, o que foi cumprido pelo requerido ao publicar a retificação da Portaria nº 255/2008-CM, em 16.4.2014.

Narra que nova retificação do ato foi determinada por decisão do TCE-RO nos autos de nº 01919/08 - Acórdão nº 610/2016, tendo sido cumprida pelo Tribunal em 17.10.2016 ao publicar outra retificação (DOE nº 197 de 20.10.2016).

Da nova revisão, o TJRO menciona que o desembargador aposentado apresentou ao TCE-RO pedido de reexame, tendo sido este recebido com efeito suspensivo, o que restabeleceu os efeitos do anterior (Ato nº 2441, de 16.4.2014), e seu cumprimento se deu com a edição do Ato nº 1267/2018 (DOE nº 149, de 13.8.2018).

A Corte esclarece que o pedido de reexame feito pelo desembargador foi apreciado pelo TCE-RO apenas em 2020, na sessão virtual de julgamento ocorrida entre os dias 4 e 5 de junho, na qual  não foi acolhido e gerou a necessidade de o requerido expedir, em 9.7.2020, o Ato nº 729/2020, para tornar sem efeito a publicação de 16.4.2014, e ratificar parcialmente os termos do Ato nº 255/2008-CM, primeiro ato concessivo da aposentadoria compulsória ao magistrado.

Na sequência, o TJRO enfatiza que o magistrado interpôs recurso para combater o Ato nº 729/2020, sob o argumento da ocorrência da prescrição, pois decorridos pouco mais de 12 (doze) anos entre a data da publicação do ato que o aposentou (19.3.2008) até a revisão operada pelo TCE-RO. O Presidente do TJRO então teria indeferido o recurso, mas com a apresentação de novo apelo pelo desembargador, julgado pelo Pleno Administrativo do TJRO em 26.10.2020, foi dado provimento ao recurso, por maioria, para reconhecer a ocorrência da prescrição e, portanto, pela impossibilidade de alterar o ato concessório de aposentadoria. Para dar cumprimento à deliberação, expediu o Ato nº 1130/2020, tornando sem efeito o de nº 729/2020.

Consigna que em concomitância ao julgamento, o TCE-RO apresentou o Ofício nº 0732/2020 para comunicar que sua 1ª Câmara, em sessão virtual realizada no entre os dias 26 a 30.10.2020, julgou o processo nº 01919/08-TCERO e determinou a exclusão do adicional de inatividade ao magistrado.

Por fim, o TJRO afirma ter cientificado o TCE-RO do teor da deliberação tomada pelo Pleno Administrativo do Tribunal.

Cumprindo determinação desta relatora, o TJRO intimou o magistrado aposentado, Sebastião Teixeira Chaves, que protocolou sua manifestação (Id 4383733).

Preliminarmente, em suas razões, contesta o pedido liminar sob os seguintes argumentos: não teve acréscimos em seus proventos quando em verdade a Corte de Contas tentou diminuí-los, argumento que caracterizaria a má-fé dos requerentes; ilegitimidade ativa do Estado de Rondônia por não possuir qualquer vínculo com o Poder Executivo, mas com o Judiciário; manifesta estranheza quanto à opção do TCE-RO de tentar reverter decisão do TJRO se socorrendo desta Casa e quanto ao fato de o Procurador do Estado assinar a petição inicial na condição de representante do Estado e do TCE-RO; caráter individual da matéria.

Na sequência, o magistrado, discorre sobre sua trajetória profissional e sobre o processo administrativo disciplinar que respondeu, pois entende que as acusações irrogadas contra ele tinham caráter político, além de ter sido injustiçado e perseguido pelo Tribunal de Contas do Estado. Nessa linha, avalia que a pretensão autoral não seria a de modificar o ato do Tribunal de Justiça, “mas sim a decisão do Conselho que não estabeleceu a perda da paridade e sim a aposentadoria proporcional”.

O então desembargador afirma o preenchimento dos requisitos constitucionais para sua aposentadoria, e sobre a existência de prescrição do direito do TCE-RO de modificar o ato, visto que editado há mais de 12 (doze) anos, argumento que estaria amparado na Súmula nº 7 TCE-RO, no art. 205 do Código Civil, e no art. 1º da Lei nº 9-873/1999.

Pela exposição, o magistrado aposentado pugna pelo acolhimento das preliminares. Caso se adentre no mérito, que os pedidos não sejam conhecidos, haja o indeferimento da liminar, e seja admitido no feito na condição de terceiro interessado.

É o relatório.

Fundamento e DECIDO.

Na espécie, os requerentes almejam a desconstituição de decisão do Pleno Administrativo do TJRO que teria acolhido recurso de magistrado aposentado compulsoriamente com proventos proporcionais e modificado, unilateralmente, o ato de aposentação determinado pela Corte de Contas.

No intuito de melhor expor a sucessão dos atos administrativos ocorridos desde a deliberação deste CNJ que apenou o então desembargador Sebastião Teixeira Chaves com a sanção de aposentadoria compulsória em Processo Administrativo Disciplinar (PAD), exponho, de forma sintética, os fatos na ordem dos acontecimentos:

· 15.4.2008: publicação no Diário Oficial do Estado (DJE) da Portaria nº 255/2008-CM que aposentou compulsoriamente o Magistrado Sebastião Teixeira Chaves, com proventos proporcionais ao tempo de serviço, com efeitos retroativos a 19/03/2008 (Id 4369980);

· 19.9.2013: decisão do TCE-RO para retificar a fundamentação legal do ato concessório para acrescentar o art. 40, § 1°, III, “a”, §§ 3° e 17 e o inciso VI do art. 93 da Constituição Federal c/c a Lei n. 10.887/2004; e que o cálculo dos proventos proporcionais ao tempo de serviço deveria ser efetuado pela média aritmética prevista na Lei n. 10887/2004, limitando-se ao teto remuneratório constitucional vigente, sem paridade com os Magistrados da ativa;

· 16.4.2014: publicação no DJE da retificação da Portaria nº 255/2008-CM ato mencionado, conforme decisão da Corte de Contas (Id 4369981);

· 6.4.2016: Acórdão do TCE-RO que novamente determinou a retificação do Ato, tendo em vista que em se tratando de aposentadoria compulsória decorrente de penalidade imposta pelo CNJ, seria incompatível a aposentadoria com proventos integrais com paridade plena (artigos 93, incisos VI e VIII; artigo 103B, §4º, inciso III e artigo 40, §§ 1º, 3º, 8º e 17, todos da Constituição Federal, com redação da EC n. 41/2003 c/c artigo 42, V da LOMAN, c/c artigos 1º e 15 da Lei n. 10.887/04) (Id 4369982);

· 17.10.2016: publicação no DJE da retificação de aposentadoria pelo TJRO;

· 26.4.2017: Pedido de reexame apresentado pelo desembargador ao TCERO, recebido monocraticamente no efeito suspensivo (Id 4369983);

· 13.8.2018: publicado no DOE o Ato nº 1267/2018 para tornar sem efeito a retificação anterior de 17.10.2016 e restabelecer o 1º Ato de Retificação de aposentadoria publicado em 16.04.2014;

· 5.5.2020: julgamento do pedido de reexame pelo TCE-RO para manter a decisão recorrida (Id 4369984);

· 9.7.2020: publicação do Ato nº 729/2020 pelo TJRO para tornar sem efeito o teor da publicação de 16.4.2014, que retificava a Portaria nº 255/2008- CM, para confirmar parcialmente seus termos de quando publicado em 15.4.2008 (Id 4381196, fl. 37);

· recurso do magistrado contra o ato alegando prescrição (Id 4381196, fl. 47);

· 23.7.2020: decisão monocrática do Presidente rejeitando a prescrição (Id 4381196, fl. 50);

· Recurso do magistrado;

· 26.10.2020: Acórdão do Pleno Administrativo do TJRO que conheceu do recurso para dar provimento e declarar a prescrição da decisão do TCE-RO (Id 4381196, fls. 66 e 67).

Menciono essa sequência de fatos para demonstrar o nítido viés individual do pedido, pois embora verse sobre a aposentadoria de magistrado, encontra-se desprovido de interesse e repercussão gerais para todo o Poder Judiciário, pois limitado ao caso específico do inativo Sebastião Teixeira Chaves.

De forma a retratar esse entendimento, utilizo-me da elucidativa ementa do acórdão a seguir que, apreciado pelo Plenário desta Casa, bem definiu os contornos da natureza individual do pedido nessas situações:

RECURSO EM PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAÍBA. 1/3 DO PERÍODO DE FÉRIAS. PEDIDO DE CONVERSÃO EM PECÚNIA. INDEFERIMENTO. AUTOGESTÃO. INTERESSE INDIVIDUAL. RECURSO IMPROVIDO. 1. Procedimento em que se requer o pagamento de 1/3 do período de férias a certo magistrado, em virtude do pedido de sua conversão em pecúnia. 2. Em que pese às vezes seja difícil a identificação de situações meramente individuais, que envolvem interesses particulares, a ausência de repercussão geral fica bem caracterizada quando a decisão fica adstrita às peculiaridades do caso concreto e o resultado do julgamento não se estende a outras hipóteses. 3. Essa é a situação dos autos, pois o objeto deste PCA circunscreve-se ao estrito pagamento de 1/3 das férias ao requerente, cuja Administração a qual está vinculado já manifestou desfavoravelmente ao pedido, por ausência de conveniência e oportunidade administrativas, bem como disponibilidade orçamentária e financeira. 4. Consoante pacífica jurisprudência desta Casa, refoge ao CNJ o exame de pedidos eminentemente individuais, sobretudo quando voltados à cobrança de valores. 5. Recurso a que se nega provimento. (CNJ - RA – Recurso Administrativo em PCA - Procedimento de Controle Administrativo - 0008924- 63.2019.2.00.0000 - Rel. MARIA TEREZA UILLE GOMES - 83ª Sessão Virtual - julgado em 30/03/2021 ).

Com efeito, a singularidade do pedido obsta o seu conhecimento por este Conselho, assim como preceitua Enunciado Administrativo nº 2, aprovado pelo Plenário quando da apreciação do Procedimento de Competência de Comissão nº 0001858-37.2016.2.00.0000, conforme se transcreve:

2) INTERESSE INDIVIDUAL 

Não cabe ao CNJ o exame de pretensões que ostentem natureza eminentemente individual, desprovidas de interesse geral, compreendido este sempre que a questão ultrapassar os interesses subjetivos da parte em face da relevância institucional, dos impactos para o sistema de justiça e da repercussão social da matéria. (CNJ – RA – Recurso Administrativo em Pedido de Providências – 0006372- 04.2014.2.00.0000 – Rel. Bruno Ronchetti – 2ª Sessão Virtual – j. 10/11/2015; PCA - Procedimento de Controle Administrativo nº 2008100000033473 – Rel. Cons. João Oreste Dalazen – 81ª Sessão – j. 31.03.2009).

Embora fosse suficiente o indeferimento monocrático da matéria diante da força vinculante dos Enunciados Administrativos editados por esta Casa (art. 102, § 5º, do RICNJ), há farta jurisprudência construída rejeitando pretensões de cunho subjetivo:

RECURSO ADMINISTRATIVO EM PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. CONTRATO ADMINISTRATIVO. PENALIDADE DE MULTA APLICADA PELO PLENO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO CEARÁ – TJCE, EM VIRTUDE DE DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. REQUERIMENTO DE AFASTAMENTO DA PENALIDADE APLICADA. PRETENSÃO DE CARÁTER INDIVIDUAL DA EMPRESA RECORRENTE. NÃO CONHECIMENTO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. Consoante Enunciado Administrativo aprovado pelo Plenário deste Conselho, a competência do CNJ para controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário fica adstrita às hipóteses em que verificado interesse geral, compreendido este sempre que a questão ultrapassar os interesses subjetivos da parte em face da relevância institucional, dos impactos para o sistema de justiça e da repercussão social da matéria. 2. Recurso Administrativo conhecido e não provido. (CNJ - RA – Recurso Administrativo em PCA - Procedimento de Controle Administrativo - 0001314-49.2016.2.00.0000 - Rel. BRUNO RONCHETTI - 17ª Sessão Virtualª Sessão - j. 09/08/2016).

RECURSO ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO AMAPÁ. SERVIDOR. INDEFERIMENTO DE PEDIDO DE PARTICIPAÇÃO RETROATIVA AO PERÍODO EM QUE ESTEVE À DISPOSIÇÃO DO TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO AMAPÁ NOS CONCURSOS DE PROGRESSÃO FUNCIONAL. REFORMA DA DECISÃO. DIREITO INDIVIDUAL. INTERVENÇÃO DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. IMPOSSIBILIDADE. NÃO CONHECIMENTO. PRECEDENTES. 1. Recurso administrativo contra decisão que não conheceu dos pedidos relativos à participação retroativa nos concursos de progressão funcional (Resolução TJAP nº 055/2005) promovidos durante o período em que o Recorrente esteve à disposição do Tribunal Regional Eleitoral do Amapá (TRE-AP). 2. A revisão do ato que defere ou indefere pedidos de participação de servidores em processos de progressão funcional não possui repercussão geral para este Conselho, configurando questão de natureza individual. Precedentes. 3. Não cabe ao Conselho Nacional de Justiça a tutela de interesses individuais de servidores do Judiciário, em especial os de natureza remuneratória. CNJ. Precedentes. 4. Segundo a jurisprudência consolidada, o Conselho Nacional de Justiça não é instância recursal para revisão de causas subjetivas individuais. CNJ. Precedentes. 5. Recurso a que se nega provimento. (CNJ - RA – Recurso Administrativo em PCA - Procedimento de Controle Administrativo - 0001348- 53.2018.2.00.0000 - Rel. FERNANDO MATTOS - 49ª Sessão Extraordinária - julgado em 14/08/2018). RECURSO EM PEDIDO DE PROVIDÊNCIA. RECONSIDERAÇÃO DA DECISÃO QUE NÃO CONHECEU O PEDIDO. RECONHECIMENTO DO DESVIO DE FUNÇÃO E PERCEPÇÃO DAS DIFERENÇAS SALARIAIS CABÍVEIS. MATÉRIA ESTRITAMENTE INDIVIDUAL. MANUTENÇÃO DA DECISÃO. 1. É pacífico, no âmbito deste Conselho, que matéria estritamente individual não se insere no rol das atribuições constitucionais previstas no artigo 103-B. 2. A requerente deverá buscar perante o órgão judicial competente, através do instrumento processual adequado, o reconhecimento do direito que alega estar sendo violado. 3. Recurso que se nega provimento. (CNJ - RA – Recurso Administrativo em PP - Pedido de Providências - Conselheiro - 0003155-16.2015.2.00.0000 - Rel. ROGÉRIO NASCIMENTO - 23ª Sessão Virtual - julgado em 23/06/2017).

Ante o exposto, com base no art. 25, inc. X, do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça, NÃO CONHEÇO do pedido contido na exordial, prejudicado o pedido de medida liminar.

Inclua-se no feito, na condição de terceiro interessado, o magistrado Sebastião Teixeira Chaves.

Intime-se. Após, arquive-se. (sem grifos originais) 

Pedindo vênia ao entendimento externado pela Conselheira que me antecedeu na vaga e proferiu a decisão acima transcrita, pelos motivos a seguir expostos, diviso fundamentos jurídicos no recurso administrativo interposto TCE/RO para acolhimento da pretensão deduzida na inicial.

1. Questão de direito. Decisões do TCE/RO. Revisão. Competência administrativa do TJRO. Análise. Repercussão geral. Existência.

Inicialmente, deve ser assentada a presença de repercussão geral da matéria suscitada nos autos.

O pedido formulado neste PCA consiste na anulação do Ato 1.130, de 26 de outubro de 2020, expediente editado pelo TJRO que fixou os termos da aposentadoria do magistrado Sebastião Teixeira Chaves em desacordo com a decisão proferida pela TCE/RO na apreciação da legalidade do ato concessório.

Embora o exame inicial dos fatos tenha identificado que o objeto deste PCA se resume à solução de um caso concreto, entendo que a questão de direito não está vinculada a uma situação particular e o deslinde da causa ultrapassa o interesse meramente individual.

O TCE/RO questionou ato administrativo praticado pelo TJRO que reconheceu a prescrição e, como efeito prático, acarretou o descumprimento de decisão colegiada daquela Corte de Contas proferida no exercício de sua competência constitucional.

Embora o pedido imediato seja a anulação do Ato 1.130/2020, é no exame do pedido mediato que se tem a exata dimensão do alcance da matéria de direito discutida neste PCA.

In casu, a questão subjacente ventilada pelo TCE/RO consiste no exame da competência do Tribunal de Justiça para, no exercício de suas atribuições administrativas, revisar decisão proferida pelo Plenário de uma Corte de Contas.  A análise da pretensão independe de um caso específico e o julgamento tem repercussão geral para todo o Poder Judiciário.

Ademais, o presente procedimento tem potencial para se tornar um caso paradigmático, uma vez que o entendimento a ser firmado pelo Conselho Nacional de Justiça direcionará a atuação administrativa dos Tribunais, com exceção do Supremo Tribunal Federal, no cumprimento de decisões dos Tribunais de Contas.

Desta feita, considerando que o controle de legalidade propugnado pelo TJRO firmará orientação jurídica de relevância para todo o Poder Judiciário, há que se concluir pela existência de repercussão geral.

2. Ato 1.130/2020. Aposentadoria compulsória de magistrado. Atuação do TCE/RO. Prescrição. Conduta do TJRO. Controle de legalidade.

Uma vez constatada a presença dos requisitos para incursão no mérito deste PCA, cumpre repisar que o pedido formulado na inicial consiste na desconstituição do Ato 1.130/2020, o qual foi editado pelo TJRO para estabelecer os termos da aposentadoria do Desembargador Sebastião Teixeira Chaves em desacordo com a decisão proferida pelo TCE/RO no Acórdão 230, de 5 de maio de 2020.

Eis a redação do Ato 1.130/2020:

Ato Nº 1130/2020

O PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE RONDÔNIA, no uso das atribuições que lhe são conferidas pelo artigo 136, IX, do RI/TJRO,

Considerando o constante no Processo SEI nº 0007392-63.2020.8.22.8000,

Considerando a decisão do egrégio Tribunal Pleno Administrativo no Recurso Administrativo n. 0002078-80.2020.8.22.0000, na sessão administrativa, realizada em 26/10/2020.

R E S O L V E :

TORNAR SEM EFEITO o Ato nº 729/2020, disponibilizado no D.J.E. nº 127 de 9/7/2020, referente a aposentadoria compulsória do Magistrado SEBASTIÃO TEIXEIRA CHAVES, Desembargador deste Poder, mantendo-se inalterado o teor da publicação disponibilizada no DOE nº 2441 de 16/4/2014 (página 18), que retificou o Ato n. 255/2008-CM, disponibilizado no D.J.E n. 069 de 15/4/2008, nos seguintes termos:

ONDE SE LÊ: ...Nos termos do art. 42, inciso V, da Lei Orgânica da Magistratura – LOMAN c/c artigo 93, VIII da Constituição Federal, com proventos proporcionais ao tempo de serviço, com efeitos retroativos a 19/03/ 2008...

LEIA-SE: ...Nos termos do art. 93, VI e VIII, da Constituição Federal c/c art. 3º da Emenda Constitucional n. 47/2005, art. 42,V, e 74 ambos da lei Orgânica da Magistratura – LOMAN e art. 45 da Lei Complementar n. 432/ 2008, com efeitos retroativos a 19/03/2008...

Para melhor entendimento da questão controvertida, é válido traçar a sequência de fatos até a decisão impugnada pelo TCE/RO:

a) Em 15 de abril de 2008, foi publicada a aposentadoria do então Desembargador Sebastião Teixeira Chaves (Portaria 255/2008 – CM, Id4369980) para cumprir decisão do Conselho Nacional de Justiça no PAD 6/CNJ. Esta portaria foi republicada em 16 de abril de 2014 com alteração do fundamento legal, na forma determinada pelo TCE/RO (Id4369981);

b) Após reanálise da legalidade do ato de aposentadoria, em 6 de abril de 2016, o TCE/RO ordenou nova retificação do fundamento legal do ato (Id4369982);

c) A retificação do ato de aposentadoria do Desembargador Sebastião Teixeira Chaves foi publicada em 16 de outubro de 2016;

d) O magistrado interpôs Pedido de Reexame no âmbito da Corte de Contas rondoniense e este recurso foi recebido com efeito suspensivo. Diante disso, foram restabelecidos os efeitos da Portaria 255/2008 – CM (Ato 1.267, de 13 de agosto de 2018);

f) Em 5 de maio de 2020, o TCE/RO negou provimento ao Pedido de Reexame, nos termos do Acórdão 230/2020 (Id4369984). Diante dessa decisão, o TJRO publicou o Ato 729, de 9 de julho de 2020, para estabelecer o ato de aposentadoria conforme ordenado pela Corte de Contas;

g) O Desembargador aposentado Sebastião Teixeira Chaves interpôs recurso perante o TJRO contra o Ato 729/2020,  alegando a prescrição do direito de o TCE/RO examinar a legalidade do ato de aposentadoria;

f) O recurso interposto pelo Desembargador aposentado Sebastião Teixeira Chaves foi rejeitado monocraticamente (Id4381196, fl. 50), porém houve novo recurso ao Pleno Administrativo do TJRO e a ele foi dado provimento, tendo sido reconhecida a prescrição da atuação do TCE/RO;

Desse modo, a quaestio iuris reside em definir se TJRO agiu dentro de sua competência administrativa na conformação do ato de aposentadoria compulsória do Desembargador Sebastião Teixeira Chaves, medida que foi determinada pelo Conselho Nacional de Justiça no julgamento do PAD, na 57ª Sessão Ordinária de julgamento, realizada em 27.2.2008.

3. Aposentadoria. Ato complexo. Exame da legalidade. Competência do órgão de controle externo. Atividade fiscalizatória. Autonomia. Força cogente das decisões dos Tribunais de Contas. Revisão judicial.

Acerca do ato concessório de aposentadoria, o entendimento majoritário da doutrina e da jurisprudência é no sentido de classificá-lo como ato administrativo complexo, pois sua concretização depende da conjugação da vontade de órgãos diversos. Nesse sentido, destaco o seguinte julgado do Supremo Tribunal Federal:

Recurso extraordinário. Repercussão geral. 2. Aposentadoria. Ato complexo. Necessária a conjugação das vontades do órgão de origem e do Tribunal de Contas. Inaplicabilidade do art. 54 da Lei 9.784/1999 antes da perfectibilização do ato de aposentadoria, reforma ou pensão. Manutenção da jurisprudência quanto a este ponto. 3. Princípios da segurança jurídica e da confiança legítima. Necessidade da estabilização das relações jurídicas. Fixação do prazo de 5 anos para que o TCU proceda ao registro dos atos de concessão inicial de aposentadoria, reforma ou pensão, após o qual se considerarão definitivamente registrados. 4. Termo inicial do prazo. Chegada do processo ao Tribunal de Contas. 5. Discussão acerca do contraditório e da ampla defesa prejudicada. 6. TESE: "Em atenção aos princípios da segurança jurídica e da confiança legítima, os Tribunais de Contas estão sujeitos ao prazo de 5 anos para o julgamento da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma ou pensão, a contar da chegada do processo à respectiva Corte de Contas". 7. Caso concreto. Ato inicial da concessão de aposentadoria ocorrido em 1995. Chegada do processo ao TCU em 1996. Negativa do registro pela Corte de Contas em 2003. Transcurso de mais de 5 anos. 8. Negado provimento ao recurso. (RE 636553, Relator(a): GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 19/02/2020, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-129 DIVULG 25-05-2020 PUBLIC 26-05-2020, grifamos)

O precedente da Corte Suprema nos permite inferir que a aposentadoria pode ser cindida em duas etapas e, em cada uma delas, as competências são bem definidas.

A primeira etapa é a concessão (ou determinação, no caso de cumprimento de penalidade) da aposentadoria, cuja atribuição é do órgão de origem do agente público ou político. Em seguida, para o ato de aposentadoria se aperfeiçoar, é necessária sua submissão ao Tribunal de Contas que, de forma independente, examinará sua legalidade para fins de registro.

A atuação da Corte de Contas está secunda na Constituição Federal, que elencou na seção dedicada à fiscalização contábil, financeira e orçamentária da Administração Pública Direta e Indireta, a atribuição do Tribunal de Contas da União para apreciar, para fins de registro, a legalidade dos atos administrativos que concedem aposentadoria (artigo 71, inciso III[1]).

Anote-se que as normas relativas às atividades fiscalizatórias do Tribunal de Contas da União devem ser replicadas em âmbito estadual em função do princípio da simetria constitucional que, relativamente à atividade dos Tribunais de Contas dos Estados, está insculpido no artigo 75, da Constituição Federal.

Nesse particular, no Estado de Rondônia, a competência do TCE/RO para apreciar a legalidade de atos concessórios de aposentadoria está prevista no artigo 49, inciso III, alínea “a”, da Constituição Estadual, vejamos:

Art. 49. O controle externo, a cargo da Assembleia Legislativa, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas do Estado, ao qual compete:

[...]

III - apreciar, para fins de registro, a legalidade:

b) das concessões de aposentadorias, reformas e pensões, ressalvadas as melhorias que não alterem o fundamento legal do ato concessório; 

Como se vê, o texto constitucional estabeleceu com clareza meridiana que o exame da legalidade do ato concessório da aposentadoria é uma atribuição da Corte de Contas. Diante disso, não cabe aos Tribunais, no exercício da competência administrativa, revisar decisões dos Tribunais de Contas, sob pena de violar a competência constitucional do órgão de controle externo.

Com efeito, a fiscalização contábil, financeira e patrimonial da Administração Direta e Indireta brasileira é secular e, desde a instituição do Tribunal de Contas da União em 7 de novembro de 1890[2], foi norteada pelo princípio da autonomia. Em razão disso, a necessidade de observância das decisões do órgão controlador, ressalvada a apreciação judicial, está na essência da atividade fiscalizatória.

A força cogente dos julgados do Tribunal de Contas foi ratificada pelo Supremo Tribunal Federal há mais de meio século com a aprovação da Súmula 6, em 13 de dezembro de 1963. Confira-se:

A revogação ou anulação, pelo Poder Executivo, de aposentadoria, ou qualquer outro ato aprovado pelo Tribunal de Contas, não produz efeitos antes de aprovada por aquele Tribunal, ressalvada a competência revisora do Judiciário.

Em data mais recente, a necessidade de observância das decisões do Tribunal de Contas (repita-se, ressalvada a revisão judicial) foi reafirmada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário 576.920, conforme se extrai da ementa do acórdão:

ADMINISTRATIVO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL. NATUREZA DO CONTROLE EXTERNO EXERCIDO PELOS TRIBUNAIS DE CONTAS EM RELAÇÃO A ATOS ADMINISTRATIVOS DOS MUNICÍPIOS. APRECIAÇÃO DE ATOS DE REGISTRO. NATUREZA IMPOSITIVA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO JULGADO PROCEDENTE. 1. No complexo feixe de atribuições fixadas ao controle externo, a competência desempenhada pelo Tribunal de Contas não é, necessariamente, a de mero auxiliar do poder legislativo. Precedentes. 2. A Câmara Municipal não detém competência para rever o ato do Tribunal de Contas do Estado que nega o registro de admissão de pessoal. 3. Recurso extraordinário a que se julga procedente. Tese: A competência técnica do Tribunal de Contas do Estado, ao negar registro de admissão de pessoal, não se subordina à revisão pelo Poder Legislativo respectivo. (RE 576920, Relator (a): EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 20/04/2020, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-119 DIVULG 13-05-2020 PUBLIC 14-05-2020 REPUBLICAÇÃO: DJe-267 DIVULG 06-11-2020 PUBLIC 09-11-2020)

A decisão do Supremo Tribunal Federal no RE 576.920 gerou o Tema de Repercussão Geral 47, cuja tese é a seguinte:

A competência técnica do Tribunal de Contas do Estado, ao negar registro de admissão de pessoal, não se subordina à revisão pelo Poder Legislativo respectivo.

Na mesma linha, cabe registrar trecho do voto proferido pelo Ministro Luiz Fux no julgamento do Agravo Regimental no Mandado de Segurança 31.677/DF que destacou a importância das decisões colegiadas dos Tribunais de Contas e a excepcionalidade de sua revisão que, por certo, somente pode ocorrer na via judicial:

[...]

O descumprimento de decisão colegiada da Corte de Contas nacional, órgão controlador máximo da República, é um afronte aos ditames da Constituição Federal e ao próprio Estado Democrático de Direito. Caso o Supremo Tribunal Federal endossasse a tese dos agravantes, estar-se-ia chancelando o descumprimento das relevantes e diligentes atuações do TCU, não em nome de ilegalidade ou teratologia patentes, mas de uma boa fé abstrata e genérica, sem pertinente comprovação nestes autos.

Descabe transformar este Supremo Tribunal Federal em constante revisor, geral e irrestrito, da atuação do TCU. A revisão judicial dos atos praticados pelo Tribunal de Contas da União, órgão técnico-especializado no controle da Administração Pública Federal, com previsão constitucional para tanto, deve ser exercida com parcimônia, em situações de patente ilegalidade e/ou teratologia. Trata-se de respeitar a capacidade institucional da Corte de Contas no exercício de suas funções constitucionais.

[...] 

A melhor exegese dos precedentes judiciais é a de que o respeito à autoridade das decisões proferidas pelos Tribunais de Contas, no exercício de sua competência constitucional, é um princípio que constitui a própria razão da existência de um órgão de controle externo.

O entendimento jurisprudencial acima apresentado não deixa dúvidas quanto à impossibilidade de os atos do Tribunal de Contas serem revogados ou anulados unilateralmente administrativamente, por outro órgão, resguardada a revisão judicial. Admitir que as decisões das Cortes de Contas possam ser revistas no âmbito administrativo pelos órgãos por elas controlados fragilizaria ao extremo a valorosa atividade de controle externo desenvolvida pelos Tribunais de Contas.

4. TJRO. Ato 1.130/2020. Reexame de decisão do TCE/RO. Ausência de competência. Autotutela administrativa. Inaplicabilidade.

No caso vertente, a cadeia de eventos evidenciou que, depois dos resultados desfavoráveis no âmbito do TCE/RO e da utilização de todos os recursos ali disponíveis, o Desembargador aposentado Sebastião Teixeira Chaves levou para o contencioso administrativo do TJRO a discussão da validade da decisão da Corte de Contas, oportunidade em que defendeu tese que não foi acolhida pelo órgão de controle externo.

De fato, ao julgar o recurso administrativo interposto pelo magistrado, o Tribunal rondoniense acolheu argumento que havia sido rejeitado pela Corte de Contas, qual seja, a prescrição, para invalidar a decisão colegiada do TCE/RO consolidada no Acórdão 230/2020.

Contudo, é preciso reconhecer que a publicação do ato de aposentadoria do então Desembargador Sebastião Teixeira Chaves exauriu a atuação do TJRO na formação do ato complexo. Após esta etapa, não caberia ao Tribunal requerido, pela via administrativa, controlar uma decisão colegiada do TCE/RO que foi proferida no exercício de sua atividade fiscalizatória.

O reexame de decisão colegiada do TCE/RO por meio de julgamento administrativo no TJRO contraria o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal acerca da autoridade das decisões das Cortes de Contas, pois somente é admitida a revisão judicial.

Ademais, desafia a lógica do sistema constitucional de controle externo da Administração Direta e Indireta permitir que o TJRO, o órgão controlado, examine (no campo administrativo) a validade da decisão proferida pelo TCE/RO, o órgão controlador, e a desconstitua de forma unilateral.

Nesse contexto, não vislumbro possibilidade de os órgãos do Poder Judiciário examinarem a validade de decisões dos Tribunais de Contas, na via administrativa. O eventual reexame deve ocorrer por meio dos instrumentos jurisdicionais previstos na legislação de regência e com observância do contraditório e da ampla defesa.

Em minha compreensão, é da alçada do Estado-Juiz apreciar a eventual superveniência do prazo prescricional do direito de o TCE/RO exercer sua atividade fiscalizatória. Essa discussão não é própria do Estado-Administrador, uma vez que o contencioso administrativo não é a seara adequada para análise de atos estranhos ao Poder Judiciário.

Em que pese os argumentos do TJRO e do terceiro interessado, apresentados ao longo da instrução, este PCA não comporta discussão relacionada à validade da decisão proferida pelo TCE/RO. Repita-se, as deliberações das Cortes de Contas somente podem ser revistas judicialmente e, seja no âmbito do contencioso administrativo do TJRO ou mesmo do Conselho Nacional de Justiça, não há espaço para rever ato do órgão de controle externo.

Portanto, é inarredável concluir que o Tribunal requerido agiu fora de sua competência administrativa quando reconheceu a prescrição do direito de o órgão de controle externo exercer sua atividade fiscalizatória. A decisão que resultou no ato impugnado na inicial acarretou o descumprimento das determinações do Plenário do TCE/RO, proferidas na análise da legalidade do ato de aposentadoria, as quais são de observância obrigatória e eventual inconformismo deve ser apreciado apenas judicialmente. 

5. Conclusão.

A instrução deste PCA demonstrou que o Ato 1.130/2020 deve ser anulado em face a manifesta ausência de competência para o TJRO, pela via administrativa, revisar decisão do Plenário do TCE/RO que apreciou a legalidade do ato de aposentadoria do Desembargador Sebastião Teixeira Chaves.

Os Tribunais de Contas são entes autônomos por natureza e suas determinações relacionadas à atividade fiscalizatória são de observância obrigatória. Eventuais questionamentos, podem ser feitos diretamente às Cortes de Contas ou judicialmente.  Nesta ordem de ideias, não é aceitável que o TJRO invoque a autotutela administrativa para reconhecer a prescrição e revisar uma decisão que não proferiu.

Ante o exposto, dou provimento ao recurso administrativo interposto pelo TCE/RO para julgar o pedido inicial procedente e anular o Ato 1.130/2020 e, por consequência, restabelecer os efeitos do Ato 729/2020, ambos editados pelo TJRO para fixar os termos da aposentadoria compulsória do Desembargador Sebastião Teixeira Chaves.

É como voto.

 

Brasília, data registrada no sistema. 

 

Jane Granzoto

Conselheira



[1] Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete:

[...]

III - apreciar, para fins de registro, a legalidade dos atos de admissão de pessoal, a qualquer título, na administração direta e indireta, incluídas as fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, excetuadas as nomeações para cargo de provimento em comissão, bem como a das concessões de aposentadorias, reformas e pensões, ressalvadas as melhorias posteriores que não alterem o fundamento legal do ato concessório; (Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ constituicao/constituicao.htm. Acesso em 21 de junho de 2022)

[2] Disponível em https://portal.tcu.gov.br/institucional/conheca-o-tcu/historia/historia-do-tcu.htm. Acesso em 21 de junho de 2022.