Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0008187-26.2020.2.00.0000
Requerente: DANIEL RODRIGUES BRAGA
Requerido: CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DO CEARÁ - CGJCE

 


PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. RATIFICAÇÃO PELO PLENÁRIO. PEDIDO LIMINAR DE SUSPENSAO DE DECISÃO PROFERIDA PELO CORREGEDOR GERAL DE JUSTIÇA DO CEARÁ QUE CONCLUIU PELA IMPOSSIBILIDADE DE O CARTÓRIO DE REGISTRO CIVIL DE PESSOAS NATURAIS DA COMARCA DE MARACANAU LAVRAR ESCRITURAS PÚBLICAS.PRESENÇA DOS REQUISITOS LEGAIS. LIMINAR DEFERIDA.

1. Procedimento de Controle Administrativo em que o Requerente pede, liminarmente, a suspensão do DESPACHO/OFÍCIO Nº 5735/2020/CGJCE proferido pelo Corregedor Geral de Justiça do Ceará, no processo nº 8502330-50.2020.8.06.0026, restabelecendo-se a atribuição de Tabelionato de Notas (de modo integral) da serventia extrajudicial código CNS nº 020636 ou; b) determinar ao Tribunal que forneça cópia integral do processo nº 8502330-50.2020.8.06.0026 da CGJ-CE, para que lhe seja oportunizada manifestação, a fim de garantir o contraditório e o devido processo legal, com a justa apreciação de todos os fundamentos que envolvem a matéria de fato e de direito, notadamente o enfrentamento da aplicabilidade do artigo 513 e 533 da Lei 12.342/1994, combinados com o caput do artigo 128, e anexo I, da Lei nº 16.397/2017.

2.Configuração do fumus boni iuris e do periculum in mora.

 

3. Deferimento do pedido de liminar para suspender os efeitos do DESPACHO/OFÍCIO Nº 573/2020/CGJCE, proferido pelo Corregedor-Geral de Justiça do Estado do Ceará, no âmbito do Processo nº 8502330-50.2020.8.06.0026, restabelecendo-se a atribuição de lavrar escrituras ao Cartório de Registro Civil de Pessoas Naturais da Comarca de Maracanaú, até que sobrevenha decisão de mérito neste PCA.

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, ratificou a liminar deferida, nos termos do voto do Relator. Declarou suspeição o Conselheiro Mário Goulart Maia. Presidiu o julgamento a Ministra Rosa Weber. Plenário Virtual, 20 de abril de 2023. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Rosa Weber, Luis Felipe Salomão, Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Marcio Luiz Freitas, Giovanni Olsson, Sidney Madruga, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto e Luiz Fernando Bandeira de Mello. Não votou o Conselheiro Mário Goulart Maia, em razão de suspeição declarada.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0008187-26.2020.2.00.0000
Requerente: DANIEL RODRIGUES BRAGA
Requerido: CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DO CEARÁ - CGJCE


RELATÓRIO


            T1.     RELATÓRIO

O EXMO. SR. CONSELHEIRO LUIZ PHILIPPE VIEIRA DE MELLO FILHO (RELATOR): Trata-se de Procedimento de Controle Administrativo, com pedido liminar, proposto por DANIEL RODRIGUES BRAGA, em face de decisão do Corregedor-Geral de Justiça do Estado do Ceará, proferida nos autos do Processo Administrativo nº 8502330-50.2020.8.06.0026, que entendeu pela impossibilidade de o Cartório de Registro Civil de Pessoas Naturais da Comarca de Maracanaú lavrar escrituras públicas.

O Requerente relata que a delegação lhe foi outorgada em 20/01/2020, em razão de sua aprovação em concurso público, tendo iniciado suas atividades no dia 18/03/2020, exercendo, a partir de então, por mais de 5 (cinco) meses, todas as atribuições autorizadas, inclusive o tabelionato de notas, com os devidos selos disponibilizados.

Em 06/04/2020, formalizou pedido aos setores competentes da Corregedoria de Justiça do Estado do Ceará requerendo a disponibilização de selos digitais para a serventia extrajudicial implantar as novas funções de Ofício de Registro Civil das Pessoas Jurídicas, Ofício de Registro de Títulos e Documentos, Tabelionato de Notas e Tabelionato de Protesto, na forma do artigo 128, caput, da Lei Estadual 16.397/2017.

Os setores técnicos responsáveis autorizaram a solicitação, com anuência da Corregedoria Geral de Justiça, e o Requerente chegou a lavrar 12 atos de escrituras públicas.

Inobstante, em 24/09/2020 foi surpreendido com a notícia do ato impugnado, mediante o qual o Corregedor-Geral de Justiça do Estado determinou a: “(...) inviabilidade de autorização para lavratura de escrituras públicas declaratórias pelos Cartórios dos Distritos Judiciários’.” (Id. 4134371 – p. 2).

Alega afronta aos princípios do contraditório e da ampla defesa, porquanto a decisão decorreu de uma consulta formulada pelo Sr. Gerardo Rodrigues de Albuquerque Neto (titular do Cartório 1º Notariado e 1º Ofício de Registros da Comarca de Maracanaú) indagando acerca das atribuições da serventia de titularidade do autor, em especial se estaria habilitada à lavratura de escrituras. No entanto, o Requerente sequer foi chamado a manifestar-se em referida consulta.

Destaca ainda que a Corregedoria local usou precedente de 2013 (autos 8502330-50.2020.8.06.0026), em que a situação discutida difere-se largamente do caso concreto, pois a cidade de Maracanaú não configura distrito.

Entende que também houve violação da legalidade e da isonomia, posto que o art. 128 do atual Código de Divisão e Organização Judiciária, do ano de 2017, “autoriza a existência, na sede de cada comarca do interior do Estado, pelo menos, 1 (um) ofício de registro civil e 1 (um) ofício de registro de imóveis, cabendo a ambos, cumulativamente, os serviços de tabelionato de notas, ofício de registro de títulos e documentos e civis das pessoas jurídicas e ofício de protesto de títulos.”.

Em razão da decisão impugnada, a serventia por que responde o Requerente é atualmente a única de comarca sede do interior do Estado impossibilitada de acumular a função de Tabelionato de Notas.

Assim, requereu perante este Conselho Nacional de Justiça a suspensão liminar dos efeitos do DESPACHO/OFÍCIO Nº 573/2020/CGJCE, proferido pelo Corregedor-Geral de Justiça do Estado do Ceará, no âmbito do Processo nº 8502330-50.2020.8.06.0026, restabelecendo-se a atribuição de lavrar escrituras ao Cartório de Registro Civil de Pessoas Naturais da Comarca de Maracanaú. No mérito, pugnou pela confirmação da liminar.

Intimado, o TJCE apresentou manifestação do Corregedor-Geral de Justiça do Estado do Ceará (Id. 4140928) no sentido de que: a) não há violação ao princípio à isonomia, pois cada serventia extrajudicial configura unidade especifica, devendo ser analisada individualmente; b) não há previsão de contraditório em procedimento de consulta; c) pelo teor do parágrafo 3º do art. 128 da Lei Estadual 16.397/2017, a serventia do Requerente não pode lavrar escrituras públicas; d) há precedente do Tribunal, referido no processo autos 8502330-50.2020.8.06.0026, no sentido da impossibilidade de os cartórios dos Distritos Judiciários lavrarem escrituras públicas declaratórias (Id. 4140928, p.8).

Por fim, no que se refere à alegação do Requerente de que lhe foram fornecidos os selos digitais para a serventia extrajudicial implantar as novas funções de Ofício de Registro Civil das Pessoas Jurídicas, Ofício de Registro de Títulos e Documentos, Tabelionato de Notas e Tabelionato de Protesto, na forma do art. 128, caput, da Lei Estadual nº 16.397/2017, destaca que tal fornecimento decorreu do pedido formulado pelo Requerente como sendo “em cumprimento a ordem do Juízo Corregedor Permanente da Comarca de Maracanaú-CE, solicito que providenciem a liberação de cotas de selos números 05; 07; 11 e 15 para Serventia de Código nº 120004”, fato esse que, segundo informa, está sendo apurado no âmbito daquela Corte, uma vez que não consta nenhuma ordem escrita do Juiz Corregedor Permanente competente nos autos para embasar o pedido.

Em 23/10/2020, por não vislumbrar evidência de risco de prejuízo irreversível, a caracterizar o periculum in mora, meu antecessor indeferiu o pedido liminar (Id. 4148237) e, na mesma oportunidade, solicitou informações complementares ao Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, a fim de que fosse esclarecida a alegada inobservância da previsão contida no art. 128, caput, da Lei Estadual nº 16.397/2017.

Atendendo à determinação, o Corregedor-Geral de Justiça do Estado do Ceará apenas reafirmou que “o Despacho/Ofício nº 5735 somente declarou, em resposta à consulta formulada, as competências atribuídas por Lei a serventia extrajudicial de RCPN da Comarca de Maracanaú (CNS 02.063-6), não tendo o condão de modificá-las, sendo esta atribuição do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará.” (Id.4171607 – p. 3).

Em 17/12/2020 (Id. 4206287), o Requerente pediu a inclusão do feito em pauta para a efetiva prolação de decisão final até 11/01/2021, data da audiência de reescolha, o que já não se mostrava viável, diante da proximidade do recesso judiciário.

Em 03/03/2021 (Id.4275154), reiterou o pedido para inclusão na pauta de julgamento, o que ocorreu em 08/04/2021.

Em seguida, o Requerente apresentou memoriais sobre a matéria, destacando que a Corregedoria do TJCE em duas oportunidades “foi omissa em suas informações, e não atendeu a contento as requisições lhe foram direcionadas pelo Conselheiro Relator, circunstância que denota a procedência da demanda apresentada no PCA”. Considerando que a situação que reputava irregular perdurava por 6 meses, reiterou o pedido de concessão da liminar.

Em 06/04/2021, após a inclusão do feito na pauta de julgamentos virtual, o Requerente formulou pedido de sustentação oral e a migração do feito para a pauta de julgamento presencial (ID 4326510), o que foi deferido pelo então Relator.

Em março de 2022, já sob minha relatoria, houve pedido de inclusão do feito em pauta virtual, e o Requerente novamente pediu sua exclusão para realização de sustentação oral (ID 4658528).

Em 19/10/2022, o Requerente peticionou para comunicar que solicitou diligência probatória para “infirmar as alegações apresentadas pela CGJCE, e comprovar a procedência de todas os fundamentos do autor deste PCA”, consistente no pedido de acesso à informação formulado no âmbito do Pedido de Providências nº 8501327- 89.2022.8.06.0026/CPA em tramitação perante a Corregedoria de Justiça do Ceará.

Acrescentou que parecer técnico da Corregedoria Geral do TJCE, além de prestar várias informações, esclareceu que a situação teria potencial de repercutir de forma geral em casos análogos no Estado, e cogitava criar um grupo de trabalho a fim de reanalisar a situação de fundo do presente pedido, ou seja, rever as atribuições do Cartório de Registro Civil de Maracanaú (Cód. 120004), especificamente no atinente à atribuição de lavratura de escritura pública, propondo, em sendo o caso, ao Tribunal de Justiça a alteração de entendimento.

Solicitei novas informações à Corregedoria Geral do TJCE, que limitou-se a reiterar que cogitava a criação do referido grupo de trabalho (ID 4938503).

Em 31/01/2023, nova petição do Requerente esclarecendo que o Juiz Auxiliar da Corregedoria Geral de Justiça do Ceará emitiu parecer jurídico (PARECER Nº 01/2023/GAB5/CGJCE), acolhendo a procedência dos fundamentos de seu pleito. Contudo, o parecer foi ignorado, e no dia 27/01/2023 a CGJCE proferiu a DECISÃO/OFÍCIO Nº 402/2023-CGJUCGJ por meio da qual determinou a suspensão do processo originário (8501327- 89.2022.8.06.0026/CGJCE) e comunicou o ato no PP nº 0004569- 05.2022.2.00.0000, que tramita perante a Corregedoria Nacional de Justiça (ID 5008176), sem fornecer as informações que haviam sido requeridas.

Ao final, o Requerente reitera o pedido para que seja concedida a liminar, nos termos já explicitados.

Proferi novo despacho determinando a intimação da Corregedoria Geral do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará para informações sobre o alegado, no prazo de 5 dias (ID 5017083).

Nesse ínterim, o feito foi incluído em pauta por equívoco, mas em seguida retirado (ID 5022056).

Em 17/02/2023, vieram informações do novo Corregedor Geral da Justiça do TJCE, informando sua posse há menos de 1 mês, comprometendo-se a prestar informações com a maior brevidade possível (ID 5033168).

Em 28/02/2023, novos memoriais do Requerente, reiterando os termos das petições anteriores e trazendo a conhecimento precedentes deste Conselho no mesmo sentido de seu pedido (PCAs nº 200710000008917, 0006510- 73.2011.2.00.0000 e PCA 0001152-54.2016.2.00.0000).

                        É o relatório, em síntese.

 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0008187-26.2020.2.00.0000
Requerente: DANIEL RODRIGUES BRAGA
Requerido: CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DO CEARÁ - CGJCE

 


VOTO


             EXMO. SR. CONSELHEIRO LUIZ PHILIPPE VIEIRA DE MELLO FILHO (RELATOR): Submeto ao referendo do Plenário, nos termos do artigo 25, X, do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça, a seguinte decisão que deferiu o pedido de liminar:

O Requerente reitera o pedido de concessão de decisão liminar para suspender o DESPACHO/OFÍCIO Nº 5735/2020/CGJCE proferido pelo Corregedor Geral de Justiça do Ceará, no processo nº 8502330-50.2020.8.06.0026, restabelecendo-se a atribuição de Tabelionato de Notas (de modo integral) da serventia extrajudicial código CNS nº 020636 ou; b) determinar ao Tribunal que forneça cópia integral do processo nº 8502330-50.2020.8.06.0026 da CGJ-CE, para que lhe seja oportunizada manifestação, a fim de garantir o contraditório e o devido processo legal, com a justa apreciação de todos os fundamentos que envolvem a matéria de fato e de direito, notadamente o enfrentamento da aplicabilidade do artigo 513 e 533 da Lei 12.342/1994, combinados com o caput do artigo 128, e anexo I, da Lei nº 16.397/2017.

A questão central discutida neste PCA é a legalidade da DESPACHO/ OFÍCIO Nº 5735/2020/CGJCE proferido pelo Corregedor Geral de Justiça do Ceará, no processo nº 8502330-50.2020.8.06.0026, que suprimiu o exercício da atribuição de tabelionato de notas da serventia do Requerente.

O parecer elaborado pelo juiz auxiliar da Corregedoria local (ID 5009370), dr. Luís Gustavo Montezuma Herbster, apresenta elementos indispensáveis à melhor compreensão da questão.

Referido parecer esclarece, inicialmente, que o processo original que deu causa ao conflito (Consulta nº 8502330-50.2020.8.06.0026), foi formulada pelo Delegatário Gerardo Rodrigues de Albuquerque Neto, titular do Cartório 1º Notariado e 1º Ofício de Registros da Comarca de Maracanaú, que indagava à Corregedoria local sobre a possibilidade de o delegatário do Cartório do Registro Civil da Comarca Maracanaú exercer atribuições correspondentes à dos Tabelionatos de Notas, e se estaria habilitado à lavratura de escrituras.

Ainda que a consulta suscitasse interesse geral, fora formulada por interesses particulares e constata-se que seu deslinde acabou por repercutir sobre a esfera de interesses do Requerente deste PCA, sem que lhe fosse oportunizada manifestação nos autos.

Sugere o magistrado que referida consulta seria nula de plano, pela violação do contraditório e da ampla defesa. Prosseguindo, motivado pela primazia da decisão de mérito, passou à análise da consulta, oferecendo um histórico da criação do Cartório de Registro Civil de Maracanaú, titularizada pelo Requerente. Transcrevo trecho do referido parecer, pela clareza de seu texto (grifos acrescidos):

De partida, esclareça-se que o Município de Maracanaú até 1983 era Distrito pertencente ao Município de Maranguape, vindo a ser elevado à condição de ente federativo por meio da Lei Estadual 10.811/1983.

Por sua vez, a Comarca de Maranguape somente veio a ser implantada em 1994, por meio do art. 513 da Lei 12.342/94 (Código de Divisão e de Organização Judiciária do Estado do Ceará). Até então a unidade judiciária do Município de Maranguape era Termo Judiciário.

Importante frisar ainda que quando da criação da Comarca de Maracanaú, esta já se dá como comarca de Terceira Intrância (sic), com duas varas. Senão vejamos:

Art. 513 - Serão imediatamente implantadas, como comarcas de 1ª entrância, as Comarcas de Amontada, Aratuba, Caridade, Carnaubal, Catarina, Cruz, Eusébio, Forquilha, Fortim, Graça, Hidrolândia, Horizonte, Icapuí, Ipaporanga, Irauçuba, Itarema, Madalena, Morrinhos, Palmácia, Paraipaba, Poranga, Quixelô, Quixeré e Uruóca, todas de vara única, e, como comarca de 3ª entrância, a Comarca de Maracanaú, com duas varas, a 1ª e a 2ª, devendo a instalação obedecer ao disposto no artigo 12 e seus parágrafos.

Em 2009, a Comarca de Maranguape é elevada ao status de Comarca de Entrância Final, por meio da Lei 14.407/09:

Art. 9º As Comarcas do Estado do Ceará ficam classificadas em 3 (três) entrâncias, denominadas: entrância inicial, entrância intermediária e entrância final, sendo enquadradas, com os respectivos ofícios do foro extrajudicial, em:

I - entrância inicial, formada pelas comarcas atualmente de 1ª e 2ª entrâncias;

II – entrância intermediária, formada pelas atuais comarcas de 3ª entrância;

III - entrância final, formada pela Comarca de Fortaleza.

Parágrafo único. As Comarcas de Caucaia, Maracanaú, Sobral e Juazeiro do Norte, atualmente de 3ª entrância, ficam classificadas como de entrância final. (Redação dada pela Lei n° 14.407, DE 15.07.09, D.O. DE 16.07.09)

a serventia em questão foi criada muito antes, no ano de 1934, sendo a primeira a existir no então Distrito de Maracanaú, consoante documentos comprobatórios acostados nos autos. Assim como a maioria das serventias extrajudiciais do Estado do Ceará, notadamente as mais vetustas, a mencionada serventia não teve seu ato de criação definido em lei específica, pelo que se compreende que deve se subordinar aos regramentos das sucessivas legislações gerais que vigeram ao longo do tempo e regularam as atribuições notariais e registrais no Estado do Ceará, notadamente: a Lei nº 12.342/1994; Lei nº 12.758/1997 e Lei nº 16.397/2017.

Nesse rumo, temos, que quando da implantação da Comarca de Maracanaú, a própria Lei 12.342/94, em seu artigo 533, promoveu a primeira alteração nas atribuições da serventia em debate, transformando-o em Ofício de Notas, Registro de Títulos e Documentos e Registro Civil das Pessoas Naturais, mais precisamente em 1º Ofício.

Art. 533 - Os titulares dos Cartórios de Registro Civil dos Termos Judiciários erigidos em comarca por esta Lei, no gozo de estabilidade, e com escolaridade mínima de segundo grau completo, assumirão na nova comarca as titularidades do 1º Ofício de Notas, Registro de Títulos e Documentos e Registro Civil das Pessoas Naturais.

Ocorre que a mesma Lei 12.342/94, em sua redação original, por meio do seu art. 526, veio a criar mais duas serventias extrajudiciais na Comarca de Maracanaú: chamados de 1º e 2º Ofício de Notas. Vejamos:

Art. 526 - Ficam criados os seguintes cargos, não remunerados pelos cofres públicos, e sem a acumulação da função de escrivão, a serem preenchidos por concurso público de provas e títulos:

I - Cargos de Primeiro Notário: a) vinte e quatro (24) nas comarcas definidas no art. 51;

 b) um (01) na comarca de Maracanaú;

II - Cargos de Segundo Notário: a) vinte e quatro (24) nas comarcas definidas no art. 513;

b) um (01) na comarca de Maracanaú.

III - Cargo de Terceiro Notário: Um (01) na comarca de Juazeiro do Norte.

IV - Cargo de Quarto Notário: Um (01) na comarca de Sobral.

Observa-se no ponto uma aparente contradição nas nomenclaturas trazidas pela lei em análise, porquanto ao mesmo tempo em que esta elevou o Cartório de Registro Civil dos Termo Judiciário de Maranguape à 1º Ofício de Notas, Registro de Títulos e Documentos e Registro Civil das Pessoas Naturais, por meio do art. 533, criou um segundo 1º Ofício de Notas, por meio do seu art. 526.

A citada falta de técnica legislativa da Lei 12.342/94, contudo, não teve, em nosso entender, o condão de retirar, ao menos naquele momento, a atribuição de notas do RCPN de Maracanaú, porquanto os artigos art. 533 e 526 devem receber exegese voltada a harmonizá-los. Assim sendo, considerando que o art. 533 tem maior grau de especialidade em relação ao art. 526 – porquanto prevê expressamente que “ Os titulares dos Cartórios de Registro Civil dos Termos Judiciários erigidos em comarca (...) assumirão na nova comarca as titularidades do 1º Ofício de Notas, Registro de Títulos e Documentos e Registro Civil das Pessoas Naturais”, a interpretação a qual julgamos mais razoável de harmonização desses dois artigos é a que entende que o art. 526, em verdade, criou um segundo e um terceiro ofício de notas, uma vez que o 1º Ofício de Notas da Comarca de Maracanaú foi criado especificamente pelo art. 533.

Nessa ordem de ideias, a primeira conclusão que aqui chegamos é que a serventia hoje titularizada pelo Sr. Daniel Rodrigues Braga, primeira serventia criada na sede do Município de Maracanaú, passou, a partir de 1994, a cumular, entre outras, as atribuições de Registro Civil de Pessoas Naturais e Notas, sem qualquer ressalva quanto a amplitude desta última atribuição.

Por sua vez, entendemos que a alteração trazida pelo artigo 4º, da Lei 12.758/1997, não teve o condão de retirar ou diminuir a atribuição de notas do citado cartório, porquanto limitou-se a, de forma geral, acrescentar - e não excluir - as funções de Tabelionato de Protestos e Registro Civil de Pessoas Jurídicas em favor das serventias de Registro Civil de Sede de Comarca do interior, in verbis:

Art. 4º. Todos os Cartórios de Registro Civil das Pessoas Naturais das sedes das Comarcas do interior do Estado e dos seus Termos Judiciários, a partir da vigência desta Lei, passam a acumular os serviços de Protesto de Títulos e de Registro de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas.

V E T A D O - Parágrafo único. Igualmente, todos os Oficiais do Registro Civil das Pessoas Naturais das sedes, dos Termos e dos Distritos Judiciários das Comarcas do Estado poderão lavrar procurações, reconhecer firmas e autenticar documentos.

Consoante bem apontou a parte interessada, não se pode conceber uma interpretação no sentido de que a autorização geral, trazida pelo citado artigo, para que todos os RCPN’s das sedes das Comarcas do interior do Estado e dos seus Termos Judiciários passassem a acumular os serviços de Protesto de Títulos e de Registro de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas significou a exclusão das competências de Notas para tais serventias. Caso assim fosse, a repercussão lógico-jurídica seria a de que todos os Cartórios de Registro Civil de Sede de Comarca do interior do Estado não poderiam acumular a atribuição de Tabelionato de Notas, o que não ocorre.

Outrossim, de fato, naquela ocasião a atribuição dos serviços parciais de Notas em favor dos Ofícios de Registro Civil das Pessoas Naturais das sedes, dos Termos e dos Distritos Judiciários das Comarcas do Estado veio a ser vetado, somente sendo concedido mais adiante, por ocasião da promulgação da Lei 16.397/2017. Tal fato, contudo, também não induz conclusão de que os Cartórios de RCPN que naquele momento continham competência de notas vieram a perdê-la. Pensar assim, seria admitir que o veto a um dispositivo geral teria o poder de revogar norma específica vigente.

Prosseguindo na evolução legislativa acerca da matéria, sobreveio a vigente Lei de Organização Judiciária do Estado do Ceará (Lei 16.397/2017), que revogou praticamente toda a Lei 12.342/94, ressalvando-se, contudo, as normas de criação de cargos e de serventias extrajudiciais, no que não for incompatível com o disposto nesta Lei, o que fez nos seguintes termos:

Art. 152. Ficam revogadas as Disposições Preliminares; o Livro I; os Títulos I, II e V, do Livro II; e o Livro III, da Lei Estadual nº 12.342, de 28 de julho de 1994, que instituiu o Código de Divisão e Organização Judiciária do Estado do Ceará, à exceção das normas de criação de cargos e de serventias extrajudiciais, no que não for incompatível com o disposto nesta Lei.

Analisando a redação da novel legislação de organização judiciária, assim como as resoluções que a regulamentaram, não se observa qualquer dispositivo que extinga ou altere especificamente as atribuições das serventias extrajudiciais da Comarca de Maracanaú (ANEXOS III e IV), seja da sede ou de distrito.

Lado outro, imperioso apontar algumas mudanças gerais operadas pela Lei 16.397/2017 no atinente aos Registros Civis:

Art. 128. Haverá, na sede de cada comarca do interior do Estado, pelo menos, 1 (um) ofício de registro civil e 1 (um) ofício de registro de imóveis, cabendo a ambos, cumulativamente, os serviços de tabelionato de notas, ofício de registro de títulos e documentos e civis das pessoas jurídicas e ofício de protesto de títulos.

§ 1° Nas comarcas do interior do Estado, o primeiro escrivão e tabelião exercerá as funções de oficial de registro civil e o segundo escrivão e tabelião as funções de oficial do registro de imóveis.

§ 2° Nas comarcas do interior do Estado em que não exista Ofício de Registro de Distribuição ou nas quais ainda não esteja implantado um serviço na forma da Lei Federal nº 9.492, de 10 de setembro de 1997 (art. 7º, parágrafo único), as funções de distribuição extrajudicial serão exercidas pelo titular do Primeiro Ofício.

§ 3º Todos os oficiais de registro civil das pessoas naturais das comarcas sedes ou vinculadas do interior, bem como os dos respectivos distritos judiciários, poderão também lavrar procurações, reconhecer firmas e autenticar documentos.

§ 4º Nas comarcas onde exista instalado, na sede, mais de um ofício de registro civil e/ou mais de um ofício de registro de imóveis, o Tribunal de Justiça, por ato normativo, definirá as zonas nas quais cada serventia exercerá suas atribuições.

Analisando o caput do precitado artigo, base para a interpretação dos seus parágrafos, de imediato, identificamos, que o seu intento primário, com escopo de promover o melhor acesso da população aos serviços notariais e registrais, é garantir que na sede de cada comarca do interior do Estado do Ceará, haja pelo menos 1 (um) ofício de registro civil e 1 (um) ofício de registro de imóveis, e, a par disso, sejam garantidos a tais serventias, cumulativamente, os serviços de tabelionato de notas, ofício de registro de títulos e documentos e civis das pessoas jurídicas e ofício de protesto de títulos.

Tal previsão, segundo nossa visão, traz um arranjo mínimo de atribuições dentro de comarcas do interior, não sendo infenso quanto à arquitetura de atribuições preexistente na sede da comarca de Maracanaú, na medida em que ali está presente pelo menos 1 (um) ofício de registro civil e 1 (um) ofício de registro de imóveis. Ou seja, o citado dispositivo não veda a existência, na mesma sede de Comarca do interior, de duas ou mais serventias de Registro Civil ou de Registro de Imóveis, como de fato ocorre na cidade de Maracanaú e em outras comarcas do interior do Estado.

A partir desse cenário, não conseguimos vislumbrar a revogação tácita das atribuições do Cartório de Registro Civil da Comarca de Maracanaú/CE (CÓD. TJ 120004), prevista no art. 533 da Lei 12.342/94, notadamente diante da exceção prevista na parte final do art. 152 da Lei 16.397/2017.

Já o §1º do mesmo artigo, apenas complementa o caput, ao prever que nesse arranjo mínimo – em que haja na sede de cada comarca do interior do Estado, pelo menos, 1 (um) ofício de registro civil e 1 (um) ofício de registro de imóveis - o primeiro ofício exercerá as funções de registro civil e o segundo de oficial do registro de imóveis.

Por sua vez, o §3º do mesmo dispositivo traz regra a qual garante a todos os oficiais de registro civil das pessoas naturais, das comarcas sedes ou vinculadas do interior, bem como os dos respectivos distritos judiciários, a prática parcial de atos notariais, a saber, lavrar procurações, reconhecer firmas e autenticar documentos.

Cuida-se de regra criada com o fim de garantir um incremento na renda dos RCPN’s de comarcas do interior do Estado, serventias com histórico deficitário no Estado do Ceará e em todo país.

 Tal previsão, no entanto, em nosso entender, tem natureza suplementar, leia-se, somente se aplica aos RCPN’s puros. Ou seja, aquelas serventias que somente possuem atribuição de registro civil de pessoas naturais. Não se prestando, por outro lado, para reduzir a competência de notas de cartórios que antes de sua vigência possuíam, por força de lei, atribuições de RCPN cumuladas, entre outros, com notas integrais, como é o caso do Cartório de Registro Civil da Comarca de Maracanaú/CE (CÓD. TJ 120004).

No ponto, mais uma vez vale reforçar a previsão do art. 152 da Lei 16.397/2017, parte final, que preservou as normas de criação das serventias extrajudiciais, no que não for incompatível com o disposto da mesma lei.

Nessa senda, forçoso concluir que diante das peculiaridades que envolvem a criação e atribuição de competências das serventias da sede da Comarca de Maracanaú, tanto o Cartório 1º Notariado e 1º Ofício de Registros (CNS 01.553-7 – Cartório Albuquerque) como o Cartório de Registro Civil (CNS 01.553-7 – Cartório Braga), ambos da Comarca de Maracanaú/CE, possuem, entre outras, atribuições de Registro Civil de Pessoas Naturais e Notas Integrais.

Portanto, salvo melhor juízo, em face da conclusão acima, parece-nos equivocada o entendimento desta Casa Censora plasmado no DESPACHO/OFÍCIO Nº 5735/2020/CGJCE (Processo nº 8502330-50.2020.8.06.0026).

Par além das razões aqui aduzidas, perscrutando a precitada decisão observamos ainda que esta encontra-se ancorada em precedente desta casa (Processo nº 8500882-86.2013.8.06.0026/TJCE) que não guarda a necessária similitude jurídica com o caso ora em debate.

Com efeito, tanto o parecer que lastreou a decisão, como as razões de decidir e dispositivo da decisão (a: “(...) inviabilidade de autorização para lavratura de escrituras públicas declaratórias pelos Cartórios dos Distritos Judiciários”) revelam que foi dado tratamento jurídico ao Cartório de Registro Civil da Comarca de Maracanaú/CE como se serventia de distrito fosse, o que é absolutamente equivocado, porquanto é incontroverso que se trata de cartório de sede de comarca do interior.

Rememorando a sucessão legislativa aqui escrutinada, vimos que o Município de Maracanaú, deixou de ser Termo Judiciário, elevando-se à Comarca com a vigência da Lei 12.342/94 (Código de Divisão e de Organização Judiciária do Estado do Ceará), sendo certo ainda que o Cartório de Registro Civil da Comarca de Maracanaú/CE sempre esteve localizado na sede do município. Nesse rumo, a juridicidade aplicada no citado precedente não se acopla a do caso sob análise, porquanto já esclarecido que os RCPN’s de Distritos recebiam e recebem tratamento diverso dos RCPN’s de sede.

Por fim, entendemos que eventuais achados em pretéritas inspeções realizadas no Cartório de Registro Civil da Comarca de Maracanaú/CE, no sentido de que a mencionada serventia não realizava protesto, bem ainda que realizava, além de registro civil de pessoas naturais, apenas atos notariais de autenticação e reconhecimento de firma, não tem o condão de retirar atribuições da serventia previstas em lei. Vale dizer, a inércia de anteriores delegatários na prática de atos notariais aos quais possui competência não retira esta do delegatário que decide fazê-lo. Ademais, é função desta Corregedoria justamente cobrar dos delegatários a realização de todos os atos notariais e registrais legalmente atribuídos às suas respectivas serventias.

Assim sendo, por todo o exposto e tudo mais que consta nos presentes autos, opinamos pelo reconhecimento da nulidade do Processo Administrativo nº 8502330-50.2020.8.06.0026, com consequente nulidade do conteúdo decisório contido no do DESPACHO/OFÍCIO Nº 5735/2020/CGJCE, ou, de outro modo, pela integral revogação do DESPACHO/OFÍCIO Nº 5735/2020/CGJCE, proferido no bojo do Processo Administrativo nº 8502330-50.2020.8.06.0026, consolidando-se, em qualquer caso, o entendimento jurídico em sentido contrário aqui plasmado, no sentido de reconhecer que o Cartório de Registro Civil da Comarca de Maracanaú (CÓD. TJ 120004 – Cartório Braga) também tem atribuição para a prática de atos de “Notas Integrais” - Código nº 27, podendo assim também lavar escrituras públicas.

É como se opina.

Submeto a presente manifestação à superior apreciação do Exmo. Corregedor-Geral da Justiça para análise e deliberação.

Da análise do andamento processual na origem, extrai-se que o conflito enseja algumas reflexões centrais: a) o bem elaborado parecer do Juiz Auxiliar da Corregedoria, dr. Luís Gustavo Montezuma Herbster, ofereceu minudente e sistemática interpretação da legislação local, concluindo pela legalidade do pedido do Requerente; b) o deslinde da consulta que tramitou no Tribunal de origem - instaurada por serventuário que possuía interesses econômicos antagônicos aos do Requerente - acabou por subtrair atribuições da serventia, sem que lhe fosse facultado o contraditório e a ampla defesa; c) o parecer do Juiz Auxiliar da Corregedoria não foi acolhido pelo então Corregedor porquanto “referida questão, já se encontra submetida à análise e julgamento do Conselho Nacional de Justiça, nos autos do Procedimento de Controle Administrativo nº 0008187-26.2020.2.00.0000 interposto pelo ora requerente” encontrando-se “em fase avançada de tramitação, com indeferimento do pedido liminar formulado”, tornando-se “necessário aguardar a finalização daquele procedimento a fim de subsidiar as medidas a serem implementadas nesta Corregedoria Geral de Justiça relacionadas às postulações do ora requerente”.

Em face das premissas acima delineadas, entendo que há dúvida substancial sobre a interpretação das normas locais sobre a definição das atribuições do 1º Ofício de Registro Civil de Maracanaú (Cód. 120004), titularizado pelo Requerente, tendo havido, ademais, violação dos princípios da isonomia, ampla defesa e contraditório no curso da tramitação do processo na origem.

Apesar das graves irregularidades, o Requerente vem suportando os sacrifícios da referida decisão, sem oportunidade de manifestar-se nos autos da origem, e muito menos ver seus robustos argumentos serem respondidos pela Administração.

Ante o exposto, defiro o pedido de liminar formulado pelo Requerente, de modo a suspender os efeitos do DESPACHO/OFÍCIO Nº 573/2020/CGJCE, proferido pelo Corregedor-Geral de Justiça do Estado do Ceará, no âmbito do Processo nº 8502330-50.2020.8.06.0026, restabelecendo-se a atribuição de lavrar escrituras ao Cartório de Registro Civil de Pessoas Naturais da Comarca de Maracanaú, até que sobrevenha decisão de mérito neste PCA.

Intimem-se com urgência.

À pauta, para ratificação plenária.

Ministro LUIZ PHILIPPE VIEIRA DE MELLO FILHO

Conselheiro Relator 

É como voto.

Brasília, data registrada no sistema.   

 

Ministro LUIZ PHILIPPE VIEIRA DE MELLO FILHO

Conselheiro Relator