Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0006663-57.2021.2.00.0000
Requerente: ASSOCIAÇÃO DOS MAGISTRADOS BRASILEIROS - AMB
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ - TJPA

 

RECURSO ADMINISTRATIVO. PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR EM DESFAVOR DE MAGISTRADO. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE FLAGRANTE OU TERATOLOGIA. IMPOSSIBILIDADE DE INTERFERÊNCIA DO CNJ.

1. Conforme reiterada jurisprudência, não cabe ao Conselho Nacional de Justiça interferir na condução de Processo Administrativo Disciplinar (PAD) em curso, salvo nos casos de flagrante ilegalidade ou teratologia.

2. O decurso do prazo de 140 (cento e quarenta) dias para o encerramento do PAD não conduz, por si só, à cessação da medida cautelar de afastamento do magistrado, cuja revogação pressupõe a demonstração da insubsistência dos motivos que autorizaram a sua decretação.

3. Uma vez prorrogado o prazo para a conclusão do PAD, com a manutenção da medida cautelar de afastamento, fica superada a alegação de constrangimento ilegal por excesso de prazo.   

4. Recurso conhecido e desprovido.

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto da Relatora. Presidiu o julgamento a Ministra Rosa Weber. Plenário Virtual, 27 de outubro de 2022. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Rosa Weber, Luis Felipe Salomão, Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene (Relatora), Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Marcio Luiz Freitas, Giovanni Olsson, Sidney Madruga, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto, Mário Goulart Maia e Luiz Fernando Bandeira de Mello.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0006663-57.2021.2.00.0000
Requerente: ASSOCIAÇÃO DOS MAGISTRADOS BRASILEIROS - AMB
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ - TJPA


RELATÓRIO

 

Trata-se de recurso administrativo (Id 4531523), em sede de Procedimento de Controle Administrativo (PCA), interposto pela ASSOCIAÇÃO DOS MAGISTRADOS BRASILEIROS (AMB) contra decisão monocrática que julgou improcedente o pedido e determinou o arquivamento do feito (Id 4517903).

Em sua petição inicial, a associação questiona aspectos relacionados a Processo Administrativo Disciplinar (PAD) instaurado em desfavor do Juiz de Direito JULIANO DANTAS JERÔNIMO e de pedido de remoção formulado pelo referido magistrado.

Por bem resumir o objeto deste PCA, transcrevo o relatório da decisão recorrida (Id 4517903):

 

Trata-se de Procedimento de Controle Administrativo – PCA, com pedido de liminar, proposto pela Associação dos Magistrados Brasileiros – AMB, com o objetivo de questionar ato administrativo do Tribunal de Justiça do Estado do Pará – TJPA.

A Requerente informa que foi instaurado junto ao Tribunal Requerido o Processo Administrativo Disciplinar nº 00000141- 23.2021.8.14.0000 em desfavor do Juiz de Direito Juliano Dantas Jerônimo (Portaria nº 1215/2021-GP), ora representado.

Esclarece que, no referido feito disciplinar, foi determinado o afastamento cautelar do magistrado das suas funções judicantes. Sustenta, porém, que os fatos imputados não foram apresentados de forma objetiva, em violação às disposições constantes do art. 14, §5º, da Resolução nº 135 do Conselho Nacional de Justiça.

Argumenta, ainda, que a instrução do processo disciplinar apresenta excesso de prazo em sua conclusão e andamento, não constando renovação do afastamento provisório do indiciado, situação que considera ilegal em face aos ditames normativos vigentes. Informa que a instrução do procedimento disciplinar teve termo final em 21/8/2021, sem qualquer decisão de renovação do prazo para instrução do feito.

A par disso, considera que prorrogação da fase de apuração do procedimento disciplinar e suas consequências, como o afastamento cautelar, “somente pode ocorrer por decisão fundamentada, justificada e por deliberação do Plenário ou Órgão Especial, no qual esteja tramitando”.

Neste sentido, a AMB considera que, vencido o inicial prazo da instrução processual, não havendo nova deliberação do colegiado, tal situação impõe a imediata suspensão ou encerramento da decisão de afastamento cautelar do magistrado. Argumenta que a manutenção do afastamento cautelar por prazo indeterminado configura antecipação de pena, situação amplamente rechaçada pelo Supremo Tribunal Federal.

Em acréscimo, argumenta que o TJPA iniciou procedimento de remoção para a Vara Única da Comarca de São Félix do Xingu/PA, que contou com a inscrição de apenas dois magistrados, dentre eles o juiz Juliano Dantas Jerônimo, ora representado.

Porém, diante do afastamento cautelar determinado no PAD acima noticiado, informa que a Corregedoria de Justiça das Comarcas do Interior, no julgamento do Pedido de Providências nº 0001867-06.2021.2.00.0814, rejeitou o pedido do magistrado e afastou sua participação no procedimento de remoção.

A AMB relata que o magistrado Juliano Dantas apresentou manifestação nos autos do citado procedimento administrativo em 12/6/2021, no qual anunciou sua desistência no pleito de remoção. Contudo, esclarece que, antes da apreciação da solicitada desistência, o magistrado apresentou “pedido de desconsideração” em 14/7/2021.

Aduz, porém, que a Corregedoria Geral de Justiça indeferiu o pedido de desconsideração do pleito de desistência, com fundamento na Resolução nº09/2018-GP do TJPA.

Pelos fatos e fundamentos que apresenta, solicita a concessão de medida liminar que imponha (i) o retorno imediato do magistrado Juliano Dantas Jerônimo às suas funções judicantes, nos termos do §9º do art. 14 da Resolução nº 135/11 do CNJ; (ii) a imediata suspensão do concurso de provimento para a Vara Única da Comarca de São Félix do Xingu/PA; e, ainda, (iii) o reconhecimento cautelar da ilegalidade apresentada nas decisões que rejeitaram o pedido de remoção e não acolheram o pleito de desconsideração da desistência ao pedido de remoção.

No mérito, a AMB pugna pelo reconhecimento da nulidade suscitada no PAD nº 000141-23.2021,8,14,0000, com manutenção do magistrado Juliano Dantas Jerônimo nas funções judicantes; bem ainda, a anulação das decisões que afastaram o magistrado do procedimento de remoção para a Vara Única de São Félix do Xingu/PA.

Instado a se manifestar sobre as alegações do Requerente, assim o fez o Tribunal Requerido (ID 4492195), aduzindo, em suma, não haver ilegalidades na tramitação do aludido Processo Administrativo Disciplinar, pelas razões que aponta. É o relatório.

 

Ao apreciar a demanda, o então Conselheiro Relator André Godinho entendeu que o pedido não merecia ser acolhido, uma vez que (i) a intervenção do CNJ em processos disciplinares em curso nos tribunais somente pode ocorrer nos casos de flagrante ilegalidade, o que não se vislumbrou na espécie; (ii) a jurisprudência do CNJ assenta a possibilidade de prorrogação do prazo de 140 dias para a conclusão do PAD, inclusive com manutenção do afastamento cautelar do magistrado e (iii) o indeferimento do pleito de desconsideração do pedido de desistência da remoção encontra amparo na Resolução n. 9/2018-GP, que considera irretratável o pedido de desistência.

O feito foi redistribuído à minha relatoria em razão da vacância da cadeira ocupada pelo então Relator por mais de noventa dias, nos termos do art. 45-A, § 2º, do Regimento Interno. 

Em suas razões recursais (Id 4531523), a AMB insiste nos pedidos formulados na petição inicial e, em linhas gerais, se limita a reiterar os fundamentos já expostos.

Contrarrazões no Id 4607959.

       

É o relatório.

 

Brasília, 28 de setembro de 2022.

 

 

Conselheira Salise Sanchotene

Relatora


 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0006663-57.2021.2.00.0000
Requerente: ASSOCIAÇÃO DOS MAGISTRADOS BRASILEIROS - AMB
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ - TJPA

 


VOTO

 

O recurso interposto atende aos requisitos do art. 115 do Regimento Interno do CNJ, razão pela qual dele conheço.

A decisão monocrática contra a qual se insurge a recorrente julgou improcedente o pedido, nos seguintes termos (Id 4517903):

 

Inicialmente, pontue-se que, por meio do presente PCA, a Requerente pretende que este Conselho realize o controle quanto à legalidade na tramitação de Processo Administrativo Disciplinar em curso perante o egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Pará – TJPA.

Ocorre que, consoante revelam os precedentes sedimentados do douto plenário do CNJ, tal interferência não se mostra possível, face à autonomia administrativa constitucionalmente assegurada aos tribunais, salvo em caso de flagrante ilegalidade.

Confira-se:

RECURSO ADMINISTRATIVO. PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO CEARÁ. TRANCAMENTO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR INSTAURADO EM DESFAVOR DE MAGISTRADO. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE FLAGRANTE OU TERATOLOGIA. IMPOSSIBILIDADE DE INTERFERÊNCIA DO CNJ. 1. Pedido de trancamento de Processo Administrativo Disciplinar (PAD) instaurado contra magistrada que teria realizado provas de concurso público enquanto gozava de licença médica remunerada. 2. Decisão do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará (TJCE) devidamente fundamentada e que decorreu de razoável e coerente valoração dos elementos indiciários colhidos no procedimento apuratório, a demonstrar a presença de indícios mínimos do ilícito administrativo e de sua autoria. 3. Não cabe ao CNJ interferir na condução dos Processos Administrativos Disciplinares em curso nos Tribunais de Justiça, salvo nos casos de flagrante ilegalidade ou teratologia. Precedentes. 4. Recurso administrativo conhecido e improvido.(CNJ - RA – Recurso Administrativo em PCA - Procedimento de Controle Administrativo - 0008464- 42.2020.2.00.0000 - Rel. RUBENS CANUTO - 82ª Sessão Virtual - julgado em 19/03/2021). (grifamos)

No caso destes autos, penso não estar configurada, à primeira vista, flagrante ilegalidade apta a justificar a atuação excepcional deste Conselho.

Com efeito, consta que o PAD em análise foi regularmente instaurado pelo Pleno do egrégio TJPA, em 24 de março de 2021, a partir de 03 (três) diferentes Reclamações Disciplinares propostas, duas delas, pelo Sindicato dos Oficiais de Justiça do Estado do Pará - SINDOJUS, e outra pelo Sindicato dos Funcionários Públicos do Estado do Pará – SINDJU.

A decisão de instauração do feito disciplinar, registre-se, foi tomada, à unanimidade, no decorrer da 10ª Sessão Ordinária daquele Órgão, ocasião em que foi também deliberado o afastamento do Magistrado das suas funções jurisdicionais.

A questão relacionada ao prazo de conclusão do PAD, qual seja, o seu possível excesso, por já ter o mesmo superado os 140 (cento e quarenta) dias previstos pelo artigo 14, §9º, da Resolução CNJ nº 135/2011, a meu sentir, não procede, considerando a possibilidade de sua prorrogação, consoante amplamente assentado pelo Plenário deste douto Conselho, inclusive com a possibilidade de manutenção do afastamento cautelar.

Confira-se:

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PRORROGAÇÃO DO PRAZO POR 140 DIAS. QUESTÃO DE ORDEM. PEDIDO DE RETORNO ÀS FUNÇÕES JURISDICIONAIS. MANUTENÇÃO DO AFASTAMENTO. QUESTÃO DE ORDEM INDEFERIDA. (PADMAG nº 000046-18.2020.2.00.0000 – Relator Conselheiro André Godinho – Julgamento Plenário – 16/04/2021 – 84ª Sessão Virtual - Unanimidade)

Já no que toca à possível ilegalidade decorrente do indeferimento do pedido de remoção do Magistrado para a comarca de São Felix do Xingú, o TJPA esclareceu em suas informações que o mesmo, após efetuar sua inscrição, apresentou pedido de desistência da remoção (em 12 de junho de 2021) e, posteriormente, pedido de desconsideração da desistência (em 14 de julho de 2021), que não foi acatada pela Corte (Id 4492195).

O tema é regulamentado no âmbito do TJPA pela Resolução nº 09/2018-GP que, quanto à questão específica, assim dispõe:

“Art. 41. Em caso de desistência da inscrição, o requerimento será irretratável.”

Claro e autoexplicativo o texto normativo, a evidenciar o acerto do indeferimento do pleito de desconsideração do pedido de desistência.

Dessa forma, se a Corte, no regular exercício de sua autonomia administrativa, tratou do tema de forma específica, penso que, também quanto a esse ponto, não se vislumbra a ilegalidade suscitada.

Ante o exposto, com fulcro no artigo 25, X e XII, do CNJ, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados no presente Procedimento de Controle Administrativo, restando prejudicada a análise do pedido liminar.

Após as intimações devidas, não havendo recurso, DETERMINO o ARQUIVAMENTO do feito.

À Secretaria Processual para as providências cabíveis.

Brasília, data registrada no sistema.

Conselheiro André Godinho Relator

 

 

Devidamente fundamentada a decisão combatida, não identifico no recurso argumento capaz de modificar a conclusão de que não há ilegalidade a ser reparada por este Conselho.

Especificamente em relação ao PAD n. 00000141-23.2021.8.14.0000, comungo do entendimento externado pelo então Conselheiro Relator André Godinho no sentido de que não há flagrante ilegalidade apta a justificar a atuação excepcional do CNJ pela via do PCA.

Com efeito, a pretensão da requerente não encontra ressonância na jurisprudência do CNJ que, reiteradamente, tem autorizado o afastamento cautelar de magistrados por prazo superior a 140 dias e reconhecido a possibilidade de prorrogação retroativa do prazo destinado à instrução e encerramento do PAD.

Cabe esclarecer que, após a formulação deste PCA, o pleno do TJPA passou a prorrogar os prazos para a conclusão do PAD, sendo que a última prorrogação foi autorizada, por unanimidade, no dia 14 de setembro de 2022, conforme informação constante no autos do PP n. 0002254-38.2021.2.00.0000, Id 4875824.

Assim, é forçoso reconhecer que a arguição de ilegalidade da manutenção do afastamento cautelar do magistrado em razão da não prorrogação do prazo de conclusão do PAD se encontra superada.

Em reforço, consigno que, tal como ocorre nos processos judiciais, em especial no processo penal, não há uma correlação direta e necessária entre o decurso de prazos processuais e a duração máxima de medidas acauteladoras.

A atual compreensão do princípio da razoável duração do processo recomenda que sejam levados em consideração, ao lado dos prazos processuais, critérios tais como a complexidade do caso concreto e o comportamento das partes e das autoridades envolvidas.

Dessa forma, o mero decurso do prazo para a conclusão do PAD não conduz ao automático afastamento da medida cautelar imposta anteriormente, que pressupõe a demonstração da insubsistência dos motivos que autorizaram a sua decretação.

Diante do exposto, nego provimento ao recurso administrativo e mantenho, com os acréscimos feitos neste voto, a decisão monocrática que julgou improcedente o pedido, por seus próprios fundamentos. 

É como voto.

Intimem-se as partes.

Em seguida, arquivem-se os autos, independentemente de nova conclusão.

 

    Brasília, 28 de setembro de 2022.

 

 

 

Conselheira Salise Sanchotene

Relatora