Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0003940-02.2020.2.00.0000
Requerente: ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL SECÇÃO DO RIO GRANDE DO SUL - OAB/RS
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL - TJRS

 

 

 

VOTO 

 

A concessão de medida liminar pelo Conselho Nacional de Justiça – CNJ está disciplinada no artigo 25, inciso XI, do Regimento Interno, verbis:

Art. 25. São atribuições do Relator:

(...)

XI - deferir medidas urgentes e acauteladoras, motivadamente, quando haja fundado receio de prejuízo, dano irreparável ou risco de perecimento do direito invocado, determinando a inclusão em pauta, na sessão seguinte, para submissão ao referendo do Plenário;

 

Consolidou-se no âmbito do Conselho entendimento no sentido de que o deferimento de medida liminar, resultante do concreto exercício do poder geral de cautela, somente se justifica em face da existência de plausibilidade do direito invocado (fumus boni juris), de um lado, e da possibilidade de lesão irreparável ou de difícil reparação (periculum in mora), de outro.

Compulsados os autos, constata-se que estão presentes ambos os requisitos necessários ao deferimento da medida de urgência. 

Com efeito, o considerável acervo de processos físicos do TJRS dificulta e, em certos casos, paralisa a prestação jurisdicional, especialmente neste excepcional momento em que se vivencia uma crise sanitária sem precedentes, que impôs a suspensão do trabalho presencial nesse e nos demais órgãos que compõem o Poder Judiciário.

Vê-se que a proposta da Instituição requerente, no sentido de serem retomadas as atividades presenciais no âmbito daquela Corte de Justiça, visa possibilitar, minimamente, a continuidade da prestação jurisdicional, ainda que de forma contida e gradual, dada a natureza essencial do serviço público que ali se presta à população.

Impende mencionar que até mesmo o Tribunal requerido considera a proposta formulada como caminho viável à retomada do atendimento aos jurisdicionados e, para tanto, informou que já implementou ações para a transformação de seu acervo físico em eletrônico e que vem realizando estudos para a retomada gradual das atividades presenciais, com “a realização de um expediente presencial interno - sem a imediata abertura irrestrita ao público externo”.

Vale enfatizar que o estudo elaborado pela área de gestão de pessoas do TJRS, intitulado “Plano para o retorno ao trabalho presencial” (ID n. 3996740, p. 54), bem descreve os planos de respostas aos riscos, as providências para aquisição e disponibilização de EPIs, a implantação de protocolos sanitários, dentre outros planejamentos e estratégias. Essas medidas revelam o firme propósito de se modificar o atual sistema de atendimento, bem como demonstram a diligência e o cuidado empregados nas operações de reinício do trabalho presencial.

As ações adotadas e as tratativas que vêm sendo executadas pelo TJRS estão, com efeito, em consonância com as preocupações da Requerente, tanto assim que a OAB/RS afirma que os dados trazidos aos autos “traduzem o brilhante trabalho desenvolvido (...) no que se refere ao retorno gradual do expediente com base nos Decretos Estadual e Municipais, o que vem alinhado com as teses manifestadas pela requerente na petição inicial”.

É salutar registrar que este momento de distanciamento social não foi capaz de inviabilizar a participação de inúmeras entidades representativas de magistrados, servidores, associações de classe, dentre outros e que a mobilização registrada nos autos revela o anseio pela reabertura, diga-se, responsável, externado pela maioria dos segmentos da sociedade rio-grandense, o que denota gestão participativa e democrática, nos moldes traçados na Resolução CNJ n. 221/2016.

Assim, entende-se que está configurada a plausibilidade do direito invocado.

Ademais, cabe o registro de que este Conselho, ciente da natureza essencial da atividade jurisdicional e da necessidade de se assegurar condições mínimas para sua continuidade, compatibilizando-a com a preservação da saúde de magistrados, agentes públicos, advogados e usuários em geral, estabeleceu regime de Plantão Extraordinário para uniformizar o funcionamento dos serviços judiciários e garantir o acesso à justiça neste período emergencial, com o objetivo de prevenir o contágio pelo vírus causador da Covid-19.

Para tanto, atua, com frequência quase que semanal, nas necessárias atualizações e adequações, haja vista que “alguns estados federados e municípios estão relativizando as regras de isolamento social, enquanto outros entes vêm enfrentando maiores dificuldades, chegando a instituir o regime de lockdown, de modo a impedir um regramento único para todos os tribunais do país”.

E, exatamente por força das peculiaridades e circunstâncias verificadas nos estados federados e municípios, o Presidente do Conselho fez publicar no Diário da Justiça Eletrônico n. 164, de 1º de junho de 2020, a Resolução CNJ n. 322/2020, outrora mencionada, para estabelecer um planejamento de retorno gradual às atividades presenciais, onde seja possível e de acordo com critérios estabelecidos por autoridades médicas e sanitárias.

Referida Resolução aponta especiais parâmetros e orientações para a retomada e, na mesma linha da gestão participativa acima identificada, prevê a obrigatoriedade de os tribunais criarem “grupos de trabalho para implementação e acompanhamento das medidas de retorno gradual ao trabalho presencial, a serem compostos por magistrados de primeiro e segundo graus de jurisdição e por servidores, devendo se reunir periodicamente e, preferencialmente, por videoconferência”, a teor do que dispõe seu art. 6º.

A edição desse normativo, neste momento, concretiza o reconhecimento institucional do efetivo risco de perecimento do direito dos jurisdicionados. Portanto, reconhece-se o periculum in mora.

Feitas estas considerações e, diante da situação fática experimentada pela Justiça Estadual Gaúcha, tem-se que o deferimento do pleito dirigido ao CNJ pela OAB/RS é medida que se impõe.

Ante o exposto, defiro o pedido liminar para, nos termos do § 2º do art. 2º da Resolução CNJ n. 322/2020 e, em prestígio ao princípio da autonomia constitucional reservadas aos tribunais, autorizar a adequação do expediente interno e externo no âmbito da Justiça Estadual do Rio Grande do Sul como forma de se assegurar condições mínimas para a continuidade da prestação jurisdicional.

A decisão quanto ao restabelecimento das atividades presenciais deverá:

i) observar os critérios fixados na Resolução CNJ n. 322/2020, notadamente a criação de grupo de trabalho para acompanhamento das medidas de retorno gradual ao trabalho presencial, conforme disposto em sal art. 6º;

ii) ter como fundamento a gestão democrática e plural, por meio da obrigatória participação colaborativa dos atores envolvidos, tais como as associações e sindicatos representativos de magistrados e servidores, Ministério Público, OAB, dentre outros (Resolução CNJ n. 221/2016);

iii) amparar-se em informações técnicas oferecidas por órgãos públicos competentes e setores internos de área médica e recursos humanos.

Em tempo, admite-se o ingresso, na condição de terceiros interessados, às seguintes entidades: i) Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul – AJURIS, ii) Sindicato dos Servidores da Justiça do Estado do Rio Grande Do Sul – SINDJUS/RS (ID n. 3994800), iii) Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – CFOAB; iv) Associação dos Oficiais de Justiça do Rio Grande do Sul – ABOJERIS e, v) Associação dos Servidores da Justiça do Rio Grande do Sul – ASJ,  as quais receberão os autos no estágio em que se encontra.

Anote-se.

Intimem-se as partes e terceiros, com urgência, concedendo ao Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul o prazo de 15 (quinze) dias para a prestação de informações complementares.

É como voto.

Brasília, data registrada no sistema.

 

FLÁVIA PESSOA 

Conselheira