Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: CONSULTA - 0006897-39.2021.2.00.0000
Requerente: LUIZ CRISPIM DE VERAS FILHO
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ

 


 

RECURSO ADMINISTRATIVO – CONSULTA – CASO CONCRETO – INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA – INOBSERVÂNCIA DO ART. 89 DO RICNJ – AUSÊNCIA DE ARGUMENTOS RECURSAIS APTOS A ALTERAR O ENTENDIMENTO ADOTADO NA DECISÃO COMBATIDA. RECURSO NÃO PROVIDO.

 

1.  A “Consulta” não tem por escopo a apreciação de caso concreto, nem tampouco a impugnação de atos praticados por Órgãos do Poder Judiciário, mas sim, nos termos do art. 89, do RICNJ, tem por objetivo aclarar – em tese – os questionamentos relacionados a matérias de interesse e repercussão gerais que envolvam a aplicação dos dispositivos legais e regulamentares inerentes aos temas inseridos na competência administrativa do CNJ.

 

2. Na hipótese, sob o pretexto de que a medida abarcaria, em tese, tema de interesse e repercussão gerais, à luz do decidido pelo Plenário deste Órgão em casos que reputa simétricos ao questionamento veiculado na presente “Consulta”, exsurge nítido que o ora recorrente, na realidade, expõe uma narrativa de índole nitidamente individual e concreta, ou seja, pela via transversa e inadequada, tenciona a prolação de decisão com caráter normativo, no intuito de nortear a própria atuação administrativa do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe frente à situação exposta na peça vestibular e viabilizar o pleno acesso do Consulente às demandas propostas diretamente por ele próprio perante o Juizado Especial (causas inferiores a 20 salários mínimos).  

 

3. A jurisprudência deste Conselho é firme no sentido de não conhecer de Consultas que visem meramente sanar dúvidas jurídicas de feição particular do interessado ou que constituam instrumento de antecipação da solução de casos concretos apresentados sob a forma de situações hipotéticas.  Precedentes.


4. A argumentação renovada no recurso já foi objeto de ampla análise na decisão monocrática combatida e não apresenta quaisquer elementos aptos à modificação do entendimento ali adotado, inviabilizando o provimento do recurso.

 

5. Recurso Administrativo a que se nega provimento.   

 

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto da Relatora. Presidiu o julgamento o Ministro Luiz Fux. Plenário Virtual, 29 de abril de 2022. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Luiz Fux, Maria Thereza de Assis Moura, Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Marcio Luiz Freitas, Sidney Madruga, Mário Goulart Maia e Luiz Fernando Bandeira de Mello. Não votaram, em razão das vacâncias dos cargos, os Conselheiros representante da Justiça do Trabalho, representante do Ministério Público Estadual e os representantes do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: CONSULTA - 0006897-39.2021.2.00.0000
Requerente: LUIZ CRISPIM DE VERAS FILHO
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ


RELATÓRIO


        

 

A EXMA. SRA. CONSELHEIRA JANE GRANZOTO (RELATORA): Trata-se de Recurso Administrativo interposto pelo consulente, Ilmo. Sr. LUIZ CRISPIM DE VERAS FILHO, pelas razões de ID. 4478813, em face da r. decisão de ID. 4476666, proferida pela então Relatora, Exma. Sra. Conselheira Tânia Regina Silva Reckziegel, que não conheceu da Consulta, com fundamento no art. 25, inciso X, do RICNJ e, por corolário, reputou prejudicado o exame da pretensão liminar, deliberando, ao final, pelo arquivamento dos autos.

Nas suas razões de insurreição, o consulente-recorrente remete ao teor das decisões proferidas pelo Plenário do CNJ nos autos dos Pedidos de Providências números 0007318-15.2010.200.0000 e 0004525-98.2013.2.00.0000 e do Procedimento de Controle Administrativo nº 0007414-20.2016.2.00.0000, as quais, na sua compreensão, refletiriam posicionamentos favoráveis ao peticionamento eletrônico pela parte desassistida de advogado nos Juizados Especiais.

Nessa órbita, assevera que, no intuito de tornar vinculante o teor das mencionadas decisões, formulou “Consulta” – revestida, sob a sua ótica, de “cunho de repercussão geral” - quanto à obrigatoriedade dos Tribunais de viabilizarem o  peticionamento eletrônico à parte desassistida de advogados em Juizados Especiais, em causas de até 20 (vinte) salários e que tramitem sob a égide da Lei 11.419/06.

Insiste que, diante dos reiterados e definitivos pronunciamentos do Plenário do CNJ nos autos dos pedidos de providências e do procedimento de controle administrativo já anteriormente citados, solicitou, à luz do artigo 90, do RICNJ, a manifestação monocrática da então Relatora, de modo que a decisão recorrida, ao não conhecer da Consulta, além de se revelar incongruente, frente ao próprio aporte jurisprudencial ali reproduzido, teria afrontado o comando extraído do citado dispositivo normativo.

Bate-se na premissa de que a Consulta apresentada não constitui dúvida particular, nem tampouco teria por escopo solver dúvida quanto à interpretação de normas, mas sim enfoca matéria de “repercussão geral”. Pondera, nesses termos, que a indicação dos processos ajuizados pelo próprio recorrente perante o Juizado Especial do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe resultou necessária, para demonstrar que a situação veiculada na petição inicial constitui “fato recorrente em nossos dias”, não se tratando de relato meramente abstrato.

Defende que a situação apontada pelo recorrente no Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe – restrição ao peticionamento eletrônico a pessoa desassistida de advogado em Juizados Especiais  - constitui apenas um “caso”, entre “vários”, mencionando, em caráter exemplificativo, a realidade supostamente vivenciada junto aos Tribunais de Justiça dos Estados do Espírito Santo e da Bahia, no afã de respaldar a tese de que o tema veiculado por intermédio da presente medida possui “interesse geral”, a desafiar a “universalização” dos procedimentos – com caráter vinculante -.

Repisa que os aportes jurisprudenciais reproduzidos na decisão recorrida não se amoldam ao caso vertente, assinalando que seu objetivo – respaldado no teor de três decisões exaradas pelo Plenário do CNJ – não teve por objetivo o saneamento de dúvida jurídica individual e/ou antecipação da solução do caso concreto.

Requer, à luz do art. 115, § 2º, do Regimento Interno, a reconsideração da decisão recorrida e, sucessivamente, o envio do apelo ao Plenário, com consequente provimento do recurso e acolhimento da “Consulta”, nos moldes estabelecidos pelo artigo 90, do RICNJ.

É o relatório.

 

 

Jane Granzoto 

Conselheira 

 

 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: CONSULTA - 0006897-39.2021.2.00.0000
Requerente: LUIZ CRISPIM DE VERAS FILHO
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ

 


VOTO


                 A EXMA. SRA. CONSELHEIRA JANE GRANZOTO (RELATORA): Em que pesem os argumentos expendidos pelo consulente-recorrente, a r. decisão de ID. 4476666, ora atacada, assentou clara e minuciosamente seus fundamentos, que são elucidativos para o não conhecimento da Consulta, pela inadequação da via eleita, bem assim para negar provimento ao presente Recurso Administrativo. Eis o teor dos fundamentos ali explicitados:

 

DECISÃO TERMINATIVA

 

Trata-se de Consulta formulada por LUIZ CRISPIM DE VERAS FILHO na qual questiona “se os Tribunais que possuem tramitação de processos eletrônicos, regidos pela Lei 11.419/06, são obrigados a prover peticionamento eletrônico a parte desassistida de advogados em Juizados Especiais, em causas de até 20 salários mínimos”. 

O consulente ilustra sua indagação a partir da propositura de ações judiciais no Juizado Especial de Aracaju de “causas que envolvem valor da causa abaixo de 20 salários. Por envolver, montante de até 20 salários mínimos, e o solicitante não possuir OAB. O mesmo vêm utilizando da sua prerrogativa de jus postulandi, conforme art. 9, caput da lei 9.099/95. A qual confere todo cidadão, ingressar com ação nos Juizados Especiais sem a presença de advogado”.

Argumenta, no entanto, que o Tribunal vedaria “que pessoas, que exerçam a sua capacidade postulatória, preconizada pela lei 9.099/95, possam peticionar nos autos. Sendo, vedado, até mesmo a visualização dos autos dos processos de forma remota, ou seja, pela internet. O que decididamente traz grave prejuízo a defesa do seu direito e a paridade processual, preconizada na lei processual, art. 7 do CPC”. 

Em questionamento ao TJSE, o consulente relata ter recebido a resposta do Presidente de que somente a consulta processual pública estaria disponível a ele, pois o conteúdo do processo seria de exclusividade do advogado.

Ao final, pede que este Conselho “forneça, de maneira monocraticamente, a consulta, se os Tribunais que possuem tramitação de processos eletrônicos, regidos pela lei 11.419/06, são obrigados a prover peticionamento eletrônico a parte desassistida de advogados em Juizados Especiais, em causas de até 20 salários. mínimos. Conforme decisão aprovada por unanimidade no plenário do CNJ, nos PP 0007318-15.2010.200.0000 e 0004525-98.2013.2.00.0000. E de forma reflexa no PCA 0007414-20.2016.2.00.0000”.

 

É o relatório.

 

Fundamento e DECIDO.

 

A despeito das razões que ensejaram a formulação da Consulta ao CNJ, entendo que esta não deve ser conhecida.

A classe processual está prevista no art. 89 do Regimento Interno, visando ao esclarecimento, em tese, sobre matérias de interesse e repercussão gerais envolvendo a aplicação de dispositivos legais e regulamentares concernentes à competência administrativa deste Órgão.

Os termos da petição inicial demonstram com a clareza se tratar de caso concreto, inclusive com a enumeração dos feitos em que o consulente é parte (008198-97.2020.8.25.0084; 0000955-68.2021.8.25.0084; 0003076-09.2020.8.25.0083; 0028839-30.2021.8.25.0001 e 0022580-19.2021.8.25.0001) e almejaria visualizar os atos processuais neles praticados, pois, em seu entender:

 

O Tribunal de Sergipe veda que pessoas, que exerçam a sua  capacidade postulatória, preconizada pela lei 9.099/95, possam peticionar nos autos. Sendo, vedado, até mesmo a visualização dos autos dos processos de forma remota, ou seja, pela internet. O que decididamente traz grave prejuízo a defesa do seu direito e a paridade processual, preconizada na lei processual, art. 7 do CPC)

A despeito de não ser o pleito cognoscível, é preciso destacar a atenção concedida pelo TJSE ao envidar esforços no sentido de solucionar eventuais problemas de acesso aos autos das partes que não estejam assistidas por advogados nas causas de valor inferior a 20 salários mínimos (Id 4473468):

(...)

Diante do interesse subjacente do consulente, se admitida a Consulta e eventualmente elucidada a questão, haveria o risco de este Conselho, a título de responder questionamento teórico, antecipar, involuntariamente, um juízo ou julgamento, o que não é admitido pela jurisprudência desta Corte:

RECURSO ADMINISTRATIVO EM CONSULTA. RESOLUÇÃO 81, DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. ANÁLISE DE TÍTULOS. AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL. NÃO CABIMENTO DA CONSULTA. ARQUIVAMENTO.

1. Consulta acerca da Resolução nº 081/2009 do Conselho Nacional de Justiça, que dispõe sobre os concursos públicos para outorga das Delegações de Notas e de Registro e sobre a minuta de edital para referidos concursos.

2. Não cabe a este Conselho responder a consultas emergentes de questões administrativas concretas submetidas ou que possam ser submetidas à apreciação por órgãos do Poder Judiciário (PP 15987).

3. Não é cabível a consulta para a solução de dúvidas dos particulares sobre normas jurídicas, sem interesse geral, ou que importe a fixação pelo CNJ de interpretação acerca das hipóteses apresentadas, antecipando solução para situações reais escondidas na formulação em tese.

Recurso a que se nega provimento.

(CNJ - RA – Recurso Administrativo em CONS - Consulta - 0004740-79.2010.2.00.0000 - Rel. JOSÉ ADONIS CALLOU DE ARAÚJO SÁ - 112ª Sessão - j. 14/09/2010). (destaquei)

 

RECURSO EM PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. CONSULTA. SINDICATO. RESOLUÇÃO No 80/2009. DESCABIMENTO. INCONFORMISMO SOBRE O TEOR DA NORMA.  PRETENSÃO DE REVISÃO. NÃO PROVIMENTO.

1. É firme a orientação deste Conselho no sentido do não cabimento da consulta para solver dúvidas de particulares ou para fixar interpretação acerca das hipóteses abstratamente apresentadas, de maneira a fazer o Conselho assumir compromisso com a validade de possíveis normas a serem criadas com base nesse entendimento.

2. O pedido não consubstancia vera consulta acerca dos dispositivos da Resolução no 80/2009, mas nítido inconformismo contra suas regras, objetivando-lhe por via transversa a modificação.

3. “A Resolução no 80 deste Conselho, editada após longos estudos e debates, não possui caráter inovador, pois apenas reflete normas legais e constitucionais já previamente estabelecidas no ordenamento jurídico brasileiro, dando-lhes efetividade. Outrossim, as insurgências enunciadas pelo requerente já foram amplamente discutidas e afastadas nas esferas administrativa (PP CNJ no 000384-41.2010.2.00.0000 e outros) e judicial” (manifestação da Corregedoria Nacional do CNJ).

Recurso a que se nega provimento.

(CNJ - RA – Recurso Administrativo em CONS - Consulta - 0006061-18.2011.2.00.0000 - Rel. WELLINGTON CABRAL SARAIVA - 142ª Sessão Ordinária - julgado em 28/02/2012). (destaquei)

 

RECURSO ADMINISTRATIVO. CONSULTA. CASO CONCRETO. ANTECIPAÇÃO DE SOLUÇÃO. VIA INADEQUADA. NÃO CONHECIMENTO. PRECEDENTES.

1. Pedido formulado por magistrado para manifestação acerca questão relacionada à aplicação da Resolução CNJ 7/2005.

2. É firme o entendimento do CNJ de não conhecer consultas quando os elementos coligidos aos autos denotem o objetivo de sanar dúvida jurídica ou antecipar a solução de caso concreto.

3. O significado da palavra “dúvida” é a incerteza acerca de uma realidade ou fato. Se há entendimento firmado sobre a matéria, inexiste dúvida a ser dirimida.

4. A defesa de um posicionamento acerca da questão suscitada nos autos demonstra o objetivo de provocar a manifestação do Plenário para ratificação de tese jurídica e esta medida é estranha às finalidades constitucionais deste Conselho.

4. Recurso a que se nega provimento.

(CNJ - RA – Recurso Administrativo em CONS - Consulta - 0003164-41.2016.2.00.0000 - Rel. FERNANDO MATTOS - 21ª Sessão Virtual - julgado em 26/05/2017). (destaquei)

 

Pelo exposto, NÃO CONHEÇO da Consulta, com fundamento no art. 25, X, do RICNJ, prejudicado o pedido liminar.

Após as intimações de praxe, determino o arquivamento dos autos.”

 

Em primeira ordem, cumpre assinalar que, nos termos do art. 89 do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça (RICNJ), “o Plenário decidirá sobre consultas, em tese, de interesse e repercussão gerais quanto à dúvida suscitada na aplicação de dispositivos legais e regulamentares concernentes à matéria de sua competência”. Com efeito, verifica-se que esta classe processual não tem por escopo a apreciação de caso concreto, nem tampouco a impugnação de atos praticados por Órgãos do Poder Judiciário, mas sim, nos moldes acima delineados, tem por objetivo aclarar – em tese – os questionamentos relacionados a matérias de interesse e repercussão gerais que envolvam a aplicação dos dispositivos legais e regulamentares inerentes aos temas inseridos na competência administrativa do Conselho Nacional de Justiça.

Na hipótese dos autos, consoante bem explicitado na r. decisão recorrida, a atenta leitura da petição inicial (ID. 4473364) autoriza a conclusão de que o recorrente enfoca, em verdade, situação concreta inerente às demandas propostas perante o Juizado Especial do Tribunal de Justiça de Sergipe, nas quais ostenta a condição de parte autora, ao relato de que, a despeito do exercício da “capacidade postulatória”, na forma do artigo 9º, caput, da Lei 9.099/95, não teria acesso remoto aos autos eletrônicos, seja para a prática de atos processuais, seja para a visualização dos feitos. Tanto assim que são identificados os processos nos quais o Consulente atua como parte (Processos 0008198-97.2020.8.25.0084, 0000955-68.2021.8.25.0084, 0003076-09.2020.8.25.0083, 0028839-30.2021.8.25.0001 e 0022580-19.2021.8.25.0001), com expressa narrativa no sentido de que se trata de ações com valor da causa inferior a 20 (vinte) salários mínimos, de modo que o recorrente ali utiliza “sua prerrogativa de jus postulandi” e, nada obstante, o Tribunal de Justiça de Sergipe “veda que pessoas, que exerçam a sua capacidade postulatória, preconizada pela lei 9.099/95, possam peticionar nos autos”. Acrescenta o Consulente que “sendo, vedado, até mesmo a visualização dos autos dos processos de forma remota, ou seja, pela internet. O que decididamente traz grave prejuízo a defesa do seu direito e a paridade processual, preconizada na lei processual, art. 7 do CPC”.

Note-se que Consulente prossegue discorrendo sobre as medidas adotadas pessoalmente, no intuito de solucionar o suposto impasse, afirmando que os escrivães dos “juizados”, em diversas situações, se recusam a fornecer dados dos processos, protocolizam a petição de forma incompleta, “entre ou outros percalços”, razões pelas quais o “solicitante”, ora Consulente-Recorrente, exerceu o direito de petição, endereçando questionamento ao Excelentíssimo Senhor Desembargador Presidente do Tribunal de Justiça de Sergipe, daí sobrevindo a informação de que somente a consulta processual pública – a qual possibilitaria unicamente a  visualização dos atos processuais – estaria disponível ao recorrente, ao passo que o acesso pleno ao conteúdo do processo seria exclusividade do advogado.

Nesse cenário, o Consulente-Recorrente invocou os termos dos artigos 1º, parágrafo 1º, 2º e 11, parágrafo 6º, da Lei 11.419/06 e do artigo 9º, da Lei 9.099/95, reportando a existência de 03 (três) pronunciamentos definitivos do Plenário do CNJ, os quais versariam idêntico tema, na linha de que os Tribunais devem prover o peticionamento eletrônico para as pessoas desassistidas de advogados em Juizados Especiais, em processos eletrônicos de até 20 (vinte) salários mínimos.

E, com tais razões, com arrimo no artigo 90, RICNJ, formulou consulta, indagando “se os Tribunais que possuem tramitação de processos eletrônicos, regidos pela lei 11.419/06, são obrigados a prover peticionamento eletrônico a parte desassistida de advogados em Juizados Especiais, em causas de até 20 salários mínimos.”, remetendo ao teor das decisões exaradas pelo Plenário do CNJ nos Pedidos de Providências 0007318-15.2010.200.0000 e 0004525-98.2013.2.00.0000 e, “de forma reflexa”, no Procedimento de Controle Administrativo 0007414-20.2016.2.00.0000.

Como se verifica, repita-se, do detido exame do próprio relato e da direção argumentativa exposta na causa de pedir, sob o pretexto de que a presente medida abarcaria, em tese, tema de interesse e repercussão gerais, à luz do decidido pelo Plenário deste Órgão em casos que reputa simétricos ao questionamento veiculado na presente “Consulta”, exsurge nítido que o ora recorrente, na realidade, expõe uma narrativa de índole nitidamente individual e concreta, ou seja, pela via transversa e inadequada, tenciona a prolação de decisão com caráter normativo, no intuito de nortear a própria atuação administrativa do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe frente à situação exposta na peça vestibular e viabilizar o pleno acesso do Consulente às demandas propostas diretamente por ele próprio perante o Juizado Especial (causas inferiores a 20 salários mínimos) - .

Todavia, olvida-se o recorrente que a função consultiva do CNJ reveste-se de conotação excepcional e, portanto, resulta cabível apenas para dirimir questões formuladas em tese, as quais denotem efetivo interesse e repercussão gerais, vinculadas às dúvidas quanto à aplicação da lei ou dos atos normativos. Assim, a questão em tese, para o fim de viabilizar o conhecimento da medida, na forma do já mencionado art. 89, do RICNJ, há de resultar de uma situação abstrata e hipotética, extraída do dispositivo de lei ou ato normativo objeto da “Consulta” e cuja diretriz a ser adotada ostente alcance geral, de modo a balizar a atuação administrativa de todos os Órgãos do Poder Judiciário, o que não se amolda propriamente à situação trazida pelo Consulente, considerados os contornos da causa de pedir, já anteriormente explicitados.

O que pretende o Consulente, em outras palavras, é elucidar questão individual, direcionada à ampla visualização remota dos autos eletrônicos nos quais atua como autor perante o Juizado Especial. Assim, o questionamento suscitado ostenta nítido caráter particular, isto é, reflete interesse subjacente individual, além do que resulta manifesta a defesa de um posicionamento pelo Consulente, cujo objetivo maior é extrair o posicionamento deste Conselho em eventual resposta à “Consulta”, favorável à tese inicial, embasada no suposto prejuízo à defesa do “seu direito” e “à paridade processual”.

Tendo em vista que o Recorrente tem em mira a confirmação do seu próprio entendimento quanto à questão suscitada nos autos, no intuito de obter subsídios para a defesa de situação de seu próprio interesse, emerge claro que tal pretensão refoge à finalidade estabelecida no art. 89, do RICNJ. Logo, merece ser reafirmada a conclusão externada na decisão recorrida, da qual não se extrai qualquer incongruência frente aos aportes jurisprudenciais ali reproduzidos, no sentido de que a “Consulta” tem por objetivo maior antecipar a interpretação deste Conselho acerca da questão e solucionar caso real apresentado sob a forma de situação hipotética.

A jurisprudência deste Conselho é firme no sentido de não conhecer de Consultas que visem meramente sanar dúvidas jurídicas de feição particular do interessado ou que constituam instrumento de antecipação da solução de casos concretos apresentados sob a forma de situações hipotéticas. Eis os precedentes:

 

RECURSO ADMINISTRATIVO – CONSULTA – ESCLARECIMENTOS SOBRE A POSSIBILIDADE DE OS MAGISTRADOS DAS VARAS DO TRABALHO DE JOÃO PESSOA, CAMPINA GRANDE E SANTA RITA, EXPEDIREM DIRETAMENTE MANDADOS RELATIVAMENTE AOS PROCEDIMENTOS EXECUTÓRIOS. SITUAÇÃO ESPECÍFICA E CONCRETA. AUSÊNCIA DE INTERESSE E REPERCUSSÃO GERAIS. NÃO CONHECIMENTO. INTELIGÊNCIA DO DISPOSTO NO ART. 89 DO RICN – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

1. Recurso administrativo contra decisão que não conheceu de Consulta que indagava quanto possibilidade de, após a modificação ocorrida no Regulamento Geral do Tribunal Regional do Trabalho da 13ª Região, os magistrados de uma das Varas do Trabalho de João Pessoa, Campina Grande e Santa Rita, expedirem diretamente mandados relativos a procedimentos executórios.

2. Especificamente quanto ao procedimento de Consulta, conforme dispõe o artigo 89 do RICNJ, estas, além de serem dotadas de interesse e repercussão gerais, devem suscitadas em tese, não se admitindo as que tenham sido formuladas sobre situação específica e concreta.

3. Recurso a que se nega provimento. (Processo 0003231-64.2020.2.00.0000, Relator LUIZ FERNANDO TOMASI KEPPEN, 73ª Sessão Virtual, j. 09.09.2020 )

 

RECURSO ADMINISTRATIVO. CONSULTA. RESOLUÇÃO CNJ N. 75/2009. ATIVIDADE JURÍDICA. INTERESSE INDIVIDUAL. NÃO CONHECIMENTO. PRECEDENTES.

1. Questionamento acerca da Interpretação da Resolução CNJ n. 75/2009 quanto à exigência de atividade jurídica para fins de ingresso na carreira da Magistratura.

2. Não cabe ao CNJ conhecer de Consultas relacionadas a fatos concretos e particulares, que remetem ao interesse individual do requerente.

3. A inexistência de argumentos novos e suficientes a alterar a decisão monocrática impede o provimento do recurso administrativo.

4. Recurso desprovido. (Processo 0009361-07.2019.2.00.0000 - Relator RUBENS CANUTO, 64ª Sessão Virtual,  j. 08/05/2020)

 

RECURSO ADMINISTRATIVO EM CONSULTA. CASO CONCRETO. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS NOVOS CAPAZES DE ALTERAR O ENTENDIMENTO ADOTADO NA DECISÃO COMBATIDA. RECURSO CONHECIDO E A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
I. A matéria versada nos presentes autos trata de caso concreto e a mera alegação de que associação de magistrado reclama resposta, em site de notícias, igualmente não possui condão de modificação da decisão recorrida;
II. A requerente pleitea que o CNJ sane dúvidas pessoais que, pelo fato de ser ele “proprietário de imóvel residencial que se encontra locado”, estaria ou não autorizado a constituir holding unipessoal ou societária para administração de seus bens;
III. Ausência, nas razões recursais, de elementos novos capazes de alterar o entendimento adotado na decisão combatida;
IV. Recurso conhecido. Desprovido. (Processo 0004404-36.2014.2.00.0000, Relator NORBERTO CAMPELO, 12ª Sessão Virtual, j. 10.05.2016).

 

RECURSO ADMINISTRATIVO. CONSULTA. QUESTÃO CONCRETA INDIVIDUAL. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DO ART. 89 DO RICNJ. 1. Consulta formulada com a finalidade de se obter deste Conselho orientação jurídica acerca da possibilidade de participação do próprio magistrado em programa de docência, remunerado por bolsa oferecida por universidade. 2. Não é cabível a Consulta para a solução de dúvidas dos particulares sobre normas jurídicas, sem interesse geral, ou que importe a fixação pelo CNJ de interpretação acerca das hipóteses apresentadas, antecipando solução para situações reais na formulação em tese. 3. Recurso desprovido. (CNJ - RA – Recurso Administrativo em CONS - Consulta - 0000502-12.2013.2.00.0000 - Rel. LUIZA CRISTINA FONSECA FRISCHEISEN - 181ª Sessão - j. 17/12/2013)

RECURSO ADMINISTRATIVO EM CONSULTA. RESOLUÇÃO/CNJ 34, ALTERADA PELA RESOLUÇÃO/CNJ 226. DECISÃO MONOCRÁTICA QUE DETERMINOU O ARQUIVAMENTO DOS AUTOS. INEXISTÊNCIA DE FATO NOVO. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

I. Insurgência contra decisão que, baseada em Parecer da CPEOGP de relatoria do Conselheiro Carlos Eduardo e precedentes, não conhece da Consulta.

II. Dez indagações formuladas que, na verdade, não constituem dúvidas na efetiva interpretação ou aplicação de ato normativo deste CNJ, mas configuram incertezas individuais travestidas de categorias hipotéticas, o que impede a admissibilidade do procedimento.

III. Repetição de argumentos expostos na inicial e refutados na decisão monocrática não autorizam a reforma do julgado. (Processo 0004436-70.2016.2.00.0000, Relator VALDETÁRIO ANDRADE MONTEIRO, 32ª Sessão Virtual, j. 07.03.2018)

 

De outra parte, impende acrescentar, que o caso concreto apresentado pela recorrente possui peculiaridades próprias a desafiar análise especifica junto ao próprio Tribunal de Origem, o que igualmente afasta a possibilidade de prolação de decisão que assuma caráter normativo geral. Não passa despercebido, portanto - consoante, aliás, observado com argúcia na decisão recorrida -   o teor do documento de ID. 4473468, trazido com a própria inicial, evidenciando a peculiaridade da hipótese versada nos autos, sinalizando que o Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe vem envidando esforços no intuito de viabilizar o acesso dos autos eletrônicos às partes que não estejam assistidas por advogados nas causas de valor inferior a 20 (vinte) salários mínimos. Tanto o é que o citado documento aponta deliberações da DD. Presidência daquele E. Tribunal, determinando aos setores internos (DIMOJ e SETECI) que aprofundem estudos e processos visando a otimização do mais amplo possível acesso dos postulantes junto ao JEC, em causas inferiores a 20 salários, bem assim que os serventuários que atuem nos JECs fiquem atentos às dificuldades apresentadas pelas partes desassistidas de advogados em referidas causas, no intuito de evitar equívocos processuais.

Frise-se, ainda, que a propalada restrição ao peticionamento eletrônico nos Tribunais de Justiça dos Estados do Espírito Santo e da Bahia, além de sobrevir aos autos desacompanhada de qualquer suporte probatório, não foi nem mesmo mencionada na peça vestibular. Cuida-se de questão inovatória que não se alça à cognição deste Conselho, assomando imperativa a total desconsideração.

Não se admite, portanto, a utilização da estreita via da “Consulta” para obtenção de juízo prévio frente à situação concreta e/ou para mera ratificação da tese defendida pelo Consulente, consoante se vislumbra da situação exposta nos autos.

Resulta totalmente inócua, portanto, a alusão ao teor do decidido pelo Plenário do CNJ nos Pedidos de Providências 0007318-15.2010.200.0000 e 0004525-98.2013.2.00.0000, bem assim no Procedimento de Controle Administrativo 0007414-20.2016.2.00.0000, cujo teor, diante dos fundamentos já acima didaticamente expostos, não tem o condão de viabilizar o conhecimento da presente medida, nos moldes em que proposta.

Afasta-se, nessas condições, a alegada ofensa ao artigo 90, do RICNJ.

Destarte, a argumentação renovada no recurso já foi objeto de ampla análise na decisão monocrática combatida e não apresenta quaisquer elementos aptos à modificação do entendimento ali adotado, inviabilizando o provimento do recurso.

É como voto.

Ante o exposto, conheço do presente Recurso Administrativo e, no mérito, nego-lhe provimento.

Intimem-se. 

Brasília, data registrada no sistema.

 

 

 

Jane Granzoto 

Conselheira