Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR - 0004399-04.2020.2.00.0000
Requerente: HENRIQUE DE PAULA FUDOLI
Requerido: EDUARDO GIBSON MARTINS

 


                                                                        EMENTA

 

RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR. PARCIALIDADE E PERSEGUIÇÃO NÃO DEMONSTRADAS. INEXISTÊNCIA DE INDICATIVO DE VIOLAÇÃO DOS DEVERES FUNCIONAIS. INSTAURAÇÃO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. INVIABILIDADE.  

1. Reclamante contumaz, que não logrou apresentar mínimos indícios do alegado desvio disciplinar imputado ao magistrado. 

2. Não constatada parcialidade ou perseguição do magistrado que caracterize infração disciplinar, deve ser arquivado o procedimento de natureza disciplinar em que se pede a aplicação de penalidade ao julgador. 


Reclamação disciplinar arquivada. 

S26/Z10/S22

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, determinou o arquivamento do feito, nos termos do voto da Relatora. Presidiu o julgamento o Ministro Luiz Fux. Plenário Virtual, 20 de novembro de 2020. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Luiz Fux, Maria Thereza de Assis Moura, Emmanoel Pereira, Luiz Fernando Tomasi Keppen, Rubens Canuto, Tânia Regina Silva Reckziegel, Mário Guerreiro, Candice L. Galvão Jobim, Flávia Pessoa, Maria Cristiana Ziouva, Ivana Farina Navarrete Pena, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, André Godinho, Maria Tereza Uille Gomes e Henrique Ávila.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR - 0004399-04.2020.2.00.0000
Requerente: HENRIQUE DE PAULA FUDOLI
Requerido: EDUARDO GIBSON MARTINS


RELATÓRIO

  

                MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, CORREGEDORA NACIONAL DE JUSTIÇA (Relatora):   

Cuida-se de reclamação disciplinar formulada por HENRIQUE DE PAULA FUDOLI em desfavor de EDUARDO GIBSON MARTINS, Juiz de Direito do Juizado da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de Fortaleza – CE.

O requerente, peticionante contumaz no CNJ, sustenta suposta irregularidade na condução do Processo n. 0020004-82.2016.8.06.0025.

Relata que, após decretada sua prisão em decisão alegadamente sem fundamento, houve coação do magistrado e do Presidente da OAB-CE para que o reclamante renunciasse aos seus processos e retornasse à sua cidade natal, no Estado de Minas Gerais.

Solicita providências do CNJ ao afirmar que “claramente o JUIZADO DA MULHER agiu como uma organização criminosa, coagindo, sequestrando, amordaçando, ameaçando e sem deixar que o Denunciante tivesse qualquer chance de Defesa ou apreciasse as suas provas” (fl. 4, Id. 4006167).

Requer a apuração dos fatos narrados com a instauração do processo administrativo e aplicação das penalidades cabíveis.

De início, esta Corregedoria determinou o arquivamento sumário do expediente. A decisão de arquivamento foi fundamentada, em razão de a discussão trazida na petição tratar de matéria jurisdicional, e foi arquivada nos termos do art. 8º, I, do Regimento Interno da Corregedoria Nacional de Justiça.

O requerente, na sequência, pediu reconsideração argumentando que teve a prisão decretada por simplesmente “ir à Justiça”.

Alega que foi coagido a desistir de todos os processos por ele propostos como condição para sua soltura. Sustenta que o Poder Judiciário estadual agiu como “organização criminosa” e junta documentos.

 Tendo em vista o teor dos documentos juntados e considerando a tênue linha existente entre as decisões judiciais e as condutas que guardam relevância correicional, bem como a cautela peculiar afeta à atuação da Corregedoria Nacional de Justiça, a decisão de arquivamento proferida (Id. 4011445) foi reconsiderada para solicitar informações à Corregedoria-Geral do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará (Id. 4031669).

A Corregedoria local arquivou o procedimento, por não vislumbrar indício de conduta irregular ou violação de deveres funcionais do magistrado.

Com base no art. 25, incisos I e III, do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça, submeto o presente feito diretamente ao Plenário para julgamento.

É, no essencial, o relatório.

 

S26/Z10/S22

 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR - 0004399-04.2020.2.00.0000
Requerente: HENRIQUE DE PAULA FUDOLI
Requerido: EDUARDO GIBSON MARTINS

 


VOTO

 

 MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, CORREGEDORA NACIONAL DE JUSTIÇA (Relatora):  


Submeto o presente feito diretamente ao Plenário para o julgamento desta Reclamação Disciplinar com base na faculdade conferida ao relator pelo art. 25, incisos I e III, do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça.

No caso em apreço, o reclamante alega ter sofrido coação e perseguição, apontando suposta irregularidade na condução do Processo n. 0020004-82.2016.8.06.0025.

Verifica-se que a Corregedoria local arquivou o procedimento com base nos seguintes fundamentos (Id. 4074247):

 

“Devidamente oficiada, às fls. 61/74, e-SAJADM-CPA, consta manifestação trazida aos autos pela Dra. Fátima Maria Rosa Mendonça, Juíza de Direito Titular do Juizado da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de Fortaleza/CE, asseverando: 1) que o reclamante tem por hábito tumultuar os procedimentos judiciais a que responde, formulando reclamações disciplinares e ações judiciais contra os operadores do direito, com a finalidade de afastar dos feitos os profissionais atuantes nas causas e ocasionar morosidade processual; 2) que já foi atacada pelo reclamante, de modo leviano e infundado em outros feitos apresentados na Corregedoria-Geral de Justiça, porém ele nunca procurou, com recursos legais, buscar a reforma das decisões desfavoráveis contra si prolatadas no Juizado; 3) que, quanto aos procedimentos tramitantes no Juizado, foi requerida, pela senhora Elane Cristina Menezes Silva, medida protetiva de urgência contra o ora reclamante, sendo decretada, com farta fundamentação, sua prisão preventiva, inclusive já revogada, tudo atendendo aos preceitos legais; 4) que a decisão do reclamante de retornar ao seu Estado natal foi de cunho pessoal e familiar, sem nenhuma imposição do Juízo, o qual apenas determinou que, caso ele retornasse ao Ceará, comunicasse ao Juizado, para avaliação da necessidade ou não de imposição de alguma medida cautelar; 5) que o inconformismo do reclamante é contra a decisão de sua prisão preventiva, decretada no ano de 2016, todavia não manejou nenhum recurso nas Instâncias Superiores, preferindo ingressar com reclamações disciplinares em Órgãos Censores; 6) que a ação penal instaurada contra o reclamante possui regular andamento, estando em fase de instrução processual.

Conforme analisado dos autos, não é possível identificar o suposto ato ilícito narrado na representação, a despeito da alegação de ‘que, após decretada a sua prisão em decisão alegadamente sem fundamento, lhe coagiu para que renunciasse aos seus processos e retornasse à sua cidade natal no Estado de Minas Gerais, agindo como uma organização criminosa, coagindo, sequestrando, amordaçando, ameaçando e sem deixar que o Denunciante tivesse qualquer chance de Defesa ou apreciasse as suas provas’, CONTUDO sem indicar as provas ou fatos que ratificassem a tese de forma contundente, a parte autora pugna pela procedência da presente demanda investigativa/disciplinar.

As alegações da parte representante indicam a existência de vícios nas condutas do Juízo representado, contudo, sem a comprovação fática das teses alegadas.

É notório o intuito da parte representante de, por meio desta representação, tentar reverter decisão judicial que lhe foi desfavorável, ou até mesmo o curso processual da demanda judicial citada nos autos, situação que se mostra incabível ante o sistema jurídico vigente.

Registre-se que não é da competência desta Corregedoria-Geral da Justiça a análise do mérito das decisões judiciais proferidas pelos magistrados alencarinos. As decisões estão inerentes ao mérito judicial, o que foge a competência desta esfera administrativa.

Em caso de discordância com o decisum prolatado, cabe ao litigante ingressar com o recurso cabível, nos termos da legislação vigentes. A via administrativa não pode ser utilizada como sucedâneo recursal

(...)

Em consulta ao sistema SAJPG, observa-se que a tramitação no Juizado da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de Fortaleza/CE da Medida Protetiva de Urgência nº 0014681-33.2015.8.06.0025 e da ação penal nº 00200004-82.2016.8.06.0025, instauradas em desfavor do reclamante Henrique de Paula Fudoli (representante), as quais possuem regular andamento, e decisões devidamente fundamentada, senão vejamos:

(...)

Em verdade, consoante a detida análise dos processos, foi possível perceber que os judicantes conduziram os feitos de forma regular, não se podendo aferir conduta que pudesse refletir ofensa à sistemática penal/processual penal vigente, emitindo despachos/decisões devidamente fundamentadas e atreladas à prova dos autos.

Além disso, às fls. 36/38, e-SAJADM-CPA dos autos nº 8502155-56.2020.8.06.0026, fora anexada pela Gerência Administrativa desta Corregedoria, relação de demandas nas quais a parte, ora representante, figura no polo ativo, fazendo-se destaque ao fato de que quase a totalidade das demandas instauradas encontram-se arquivadas, o que demonstra o, aparente, intuito incessante de mover representações em face dos magistrados alencarinos sem procedência nas queixas/argumentações apresentadas pela parte.

Ante o exposto, verificada a inadequação da via eleita pela parte representante, bem como a não comprovação da conduta irregular, desabonadora ou ilegal, além da inexistência de indícios mínimos de violação de deveres funcionais do Juízo representado, REJEITO a argumentação/teses apresentadas na exordial da presente representação e determino o arquivamento do presente processo”.

 

Da análise dos elementos que instruem este feito depreende-se que, de fato, não foram apresentados indícios mínimos que demonstrem, no curso do processo indicado, perseguição, abuso, má-fé ou qualquer violação de dever funcional por parte do magistrado reclamado capazes de caracterizar a indispensável justa causa para a instauração de processo administrativo disciplinar.

Ademais, ressalte-se que o CNJ, cuja competência está restrita ao âmbito administrativo do Poder Judiciário, não pode intervir em decisão judicial para corrigir eventual vício de ilegalidade ou nulidade, porquanto a matéria aqui tratada não se insere em quaisquer daquelas previstas no art. 103-B, § 4º, da Constituição Federal.

Nesse sentido: 

 

“RECURSO ADMINISTRATIVO EM REPRESENTAÇÃO POR EXCESSO DE PRAZO.MATÉRIA DE NATUREZA JURISDICIONAL. NÃO DEMONSTRADO ELEMENTO SUBJETIVO DA CONDUTA. ART. 26, § 1º, DO REGULAMENTO GERAL DA CORREGEDORIA NACIONAL DE JUSTIÇA. 1. Ausentes indícios de conduta caracterizadora de infração dos deveres funcionais da magistratura. 2. Valoração quanto ao conteúdo, adequação e justiça das decisões proferidas pelo recorrido é de natureza jurisdicional. 3. Atribuição do julgador, como gestor maior do processo, para certificar atos do processo. 4. Regularidade na tramitação da demanda, com o proferimento de sentença em 11/5/2020. 5. O art. 26, § 1º, do Regulamento Geral da Corregedoria Nacional de Justiça, exige o arquivamento das representações com a prática do ato, a normalização do andamento ou a solução do processo. 6. Não há justa causa ou razoabilidade para instauração de procedimento administrativo-disciplinar. Recurso administrativo não provido.” (CNJ - RA -Recurso Administrativo em REP - Representação por Excesso de Prazo - 0003337-26.2020.2.00.0000 - Rel. HUMBERTO MARTINS - 70ª Sessão Virtual - julgado em 31/7/2020.)

 

“PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. PARCIALIDADE E IRREGULARIDADES NÃO DEMONSTRADAS. INCONFORMISMO COM ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL. INCOMPETÊNCIA DOS ÓRGÃOS CORRECIONAIS.

1. Os argumentos desenvolvidos pelo reclamante têm natureza estritamente jurisdicional por demonstrarem insatisfação com a manifestação emanada pela desembargadora relatora no seu ofício judicante, o que afasta, a priori, a atuação das corregedorias.

2. O caráter jurisdicional fica mais evidenciado quando se observa que a pretensão do reclamante é promover o CNJ à instância revisora de todo o acervo probatório dos autos, de modo a substituir os órgãos julgadores e declarar, de pronto, a falsidade dos documentos carreados nos autos da ação possessória, o que deve ser exercido por meio dos instrumentos processuais próprios, não servindo o CNJ para tal desiderato.

3. Do mesmo modo, as questões quanto a uma suposta parcialidade de magistrado desafiam meio processual próprio (exceção de suspeição ou impedimento), tornando a via administrativa inadequada para tal fim.

4. Outrossim, verifica-se que, salvo suas impressões pessoais, o requerente não apresenta nenhum elemento concreto indicativo de comportamento ilícito por parte de membro do Poder Judiciário. Não há, portanto, elementos mínimos de prova que deem justa causa ao prosseguimento do expediente.

Pedido de providências arquivado.” (CNJ - PP - Pedido de Providências - Corregedoria - 0003400-51.2020.2.00.0000 - Rel. HUMBERTO MARTINS - 70ª Sessão Virtual - julgado em 31/7/2020.)

 

Portanto, a questão foi adequadamente tratada, sendo satisfatórios os esclarecimentos prestados sobre a apuração dos fatos na origem, o que torna desnecessária qualquer outra atuação da Corregedoria Nacional de Justiça no caso em comento.

Ante o exposto, a presente reclamação disciplinar deve ser arquivada com fundamento no art. 68 do RICNJ.

É como voto.

 

MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA

 

   Corregedora Nacional de Justiça

 

S26/Z10/S22