RECURSO ADMINISTRATIVO. PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO AMAZONAS. REQUERIMENTO COM DENÚNCIAS. PROCEDIMENTO INCORRETO. DESCUMPRIMENTO DE DECISÕES SUPERIORES. NECESSIDADE DE APURAÇÃO. PROVIMENTO.

1 - Este Conselho não pode atuar como instância recursal para intervir na atividade jurisdicional. Todavia, conquanto os autores, na petição inicial, tenham requerido a anulação de decisões judicias – pedido que desde já reconheço a incompetência deste CNJ -, existem outros requerimentos para verificar o possível procedimento incorreto e o descumprimento de decisões superiores pelo magistrado requerido, o que poderia ser feito inclusive de ofício por esta Corte administrativa.

2 - O Plenário deste CNJ já entendeu pela possibilidade de instauração de Processo Administrativo Disciplinar (PAD) em face de magistrado que descumpre decisões de instâncias superiores (precedentes).

3 - Nesse diapasão, no esteio das atribuições deste Conselho, de zelar pelos atos praticados por membros ou órgãos do Poder Judiciário, deve-se determinar a Corregedoria local que averigue o suposto descumprimento de decisões do e. TJAM.

4. Recurso conhecido e provido.

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por maioria, deu provimento ao recurso para determinar à Corregedoria Geral da Justiça do Estado do Amazonas a apuração de supostos descumprimentos de decisões, nos termos do voto do Conselheiro Marcos Vinícius Jardim Rodrigues. Vencidos os Conselheiros Humberto Martins (Relator), Rubens Canuto, Mário Guerreiro e Candice L. Galvão Jobim que, negavam provimento ao recurso. Lavrará o acórdão o Conselheiro Marcos Vinícius Jardim Rodrigues. Declarou suspeição o Presidente Ministro Dias Toffoli. Plenário Virtual, 22 de maio de 2020. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Humberto Martins, Emmanoel Pereira, Luiz Fernando Tomasi Keppen, Rubens Canuto, Tânia Regina Silva Reckziegel, Mário Guerreiro, Candice L. Galvão Jobim, Maria Cristiana Ziouva, Ivana Farina Navarrete Pena, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, André Godinho, Maria Tereza Uille Gomes e Henrique Ávila. Não votou o Excelentíssimo Presidente Dias Toffoli em razão de suspeição declarada e, justificadamente, a Conselheira Flavia Pessoa.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0009395-79.2019.2.00.0000
Requerente: BANCO BRADESCO S/A e outros
Requerido: JUÍZO DA 3ª VARA CÍVEL E DE ACIDENTES DE TRABALHO DA COMARCA DE MANAUS - AM


RELATÓRIO  


O EXMO. SR. MINISTRO HUMBERTO MARTINS, CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA (Relator):  

Cuida-se de recurso administrativo apresentado pelo BANCO BRADESCO, BANCO ALVORADA S.A. e CABEA – CAIXA DE PREVIDÊNCIA DOS FUNCIONÁRIOS DO BANCO DO ESTADO DO AMAZONAS contra decisão proferida pelo Corregedor Nacional de Justiça que determinou o arquivamento sumário deste pedido de providências, sob o fundamento de que a irresignação dos recorrentes se volta contra atos praticados no exercício da atividade judicante, matéria esta que não pode ser examinada/revista pela Corregedoria Nacional por não estar elencada dentro de suas competências.

Extrai-se dos autos que o pedido de providências foi formulado em desfavor do Juiz de Direito da 3ª Vara Cível e de Acidentes de Trabalho Dr. MANUEL AMARO DE LIMA.

No presente recurso, os recorrentes reiteram as razões apresentadas no pedido inicial.

Nesta linha, não se conformam com a decisão do reclamado que, nos autos do Cumprimento de Sentença n. 0338406-85.2007.8.04.0001, homologou os cálculos e determinou a transferência da quantia de R$ 26.000.000,00 (vinte e seis milhões de reais) para a conta judicial vinculada ao referido processo, com aplicação de multa de 20% sobre o total bloqueado em favor dos exequentes.

Dizem que a decisão que concede efeito suspensivo ao agravo e suspende o comando de bloqueio suspende também quaisquer atos de transferência, sendo absurda a interpretação dada pelo juiz reclamado.  

Requerem o provimento do recurso administrativo para determinar a instauração de processo administrativo disciplinar e, ao final, a aplicação da sanção cabível prevista em lei.

Contrarrazões apresentadas (ID 3905056), nas quais a autoridade reclamada consignou, em apertada síntese, que o CNJ não possui competência para o julgamento de matéria jurisdicional e pleiteou a manutenção da decisão de arquivamento.

É, no essencial, o relatório. 

S20/Z03/S34

 

VOTO DIVERGENTE 

 

Adoto o relatório lançado pelo Excelentíssimo Ministro Corregedor, porém, peço vênia para discordar do mérito, notadamente no que concerne ao arquivamento precoce deste Pedido de Providências, pelos fatos e fundamentos a seguir.

Na decisão recorrida, entendeu a douta Corregedoria Nacional de Justiça que os argumentos utilizados pelos autores não são de competência do CNJ, uma vez que “tal irresignação se refere a exame de matéria eminentemente jurisdicional e, nestes casos, a parte deve procurar impugnar a decisão pelos meios próprios que o ordenamento jurídico prevê”.

Decerto, este Conselho não pode atuar como instância recursal para intervir na atividade jurisdicional. Todavia, conquanto os autores, na petição inicial, tenham requerido a anulação de decisões judicias – pedido que desde já reconheço a incompetência deste CNJ -, existem outros requerimentos para verificar o possível procedimento incorreto e o descumprimento de decisões superiores pelo magistrado requerido, o que poderia ser feito inclusive de ofício por esta Corte administrativa.

Na peça recursal, foram expostas as seguintes condutas a serem analisadas por este CNJ:

 

(i)   Negativa de cumprimento do v. acórdão proferido pelas Câmaras Reunidas do E. TJAM, acostado a fls. 2237/2249 dos autos de origem, que reconhece a prescrição da ação em relação a 15 Autores/Exequentes;

 

(ii) Negativa de cumprimento da tutela recursal deferida no agravo de instrumento nº 4005896-07.2019.8.04.0000, suspendendo os efeitos da decisão de fls. 2213/2217 nos autos de origem, que determinou o bloqueio de mais de 26 milhões de reais. 

 

Nesse sentido, o Plenário deste CNJ já entendeu pela possibilidade de instauração de Processo Administrativo Disciplinar (PAD) em face de magistrado que descumpre decisões de instâncias superiores, in verbis:

 

Verifica-se que não cabe a este Conselho analisar se houve descumprimento por parte do magistrado, porquanto o STJ, em sede jurisdicional, já decidiu que suas decisões foram descumpridas pelo requerido.

O magistrado requerido foi devidamente advertido pela Corregedoria Nacional de Justiça sobre a necessidade de observar a decisão proferida pelo Ministro Gilson Dipp na Reclamação n. 18.565/MS [...]

No entanto, como podemos observar do acórdão constante no Id 1771830, o magistrado voltou a descumprir decisões proferidas pelo STJ, determinando a transferência de quantias vultosas.

O magistrado, em sua função jurisdicional, deve atuar de forma prudente e proferir decisões cautelosas, sempre atento às consequências que seu ato pode ocasionar, nos termos dos artigos 24 e 25 do Código de Ética da Magistratura, uma vez que o juiz não pode ser absolutamente insensível às consequências práticas que suas decisões podem ocasionar.

Todavia, o descumprimento das decisões do STJ pode ter gerado um prejuízo de mais de um bilhão de reais aos cofres do Banco do Brasil.

A Douta Corregedoria Nacional de Justiça apoiou suas conclusões na decisão da Corregedoria local que entendeu ser a irresignação afeta à matéria jurisdicional e de forma que não haveria “qualquer conduta do magistrado que configuraria falta disciplinar”. [...]

Vê-se, portanto, presentes os indícios de autoria e materialidade de que o requerido teria realizado procedimentos incorretos de forma reiterada ao descumprir várias decisões proferidas pelo STJ, causando um suposto prejuízo financeiro ao Banco do Brasil.

Nesses termos, peço vênia para divergir e para determinar a instauração de Processo Administrativo Disciplinar para apuração dos fatos, sem o afastamento cautelar, tendo em vista que o requerido foi promovido ao cargo de Desembargador.

(Trechos do voto do relator para o acórdão em substituição) (CNJ - RA – Recurso Administrativo em RD - Reclamação Disciplinar - 0004530-86.2014.2.00.0000 - Rel. ANDRÉ LUIZ GUIMARÃES GODINHO - 49ª Sessão - j. 28/06/2019).

 

 

No caso, observa-se que não houve uma análise mais detalhada sobre o descumprimento ou não de decisões do e. TJAM que culminaram no bloqueio de uma vultuosa quantia superior ao valor de R$ 26.000.000,00 (vinte e seis milhões de reais).

Nesse diapasão, no esteio das atribuições deste Conselho, de zelar pelos atos praticados por membros ou órgãos do Poder Judiciário, deve-se determinar a Corregedoria local que averigue o suposto descumprimento de decisões do e. TJAM.

Ante o exposto, pedindo vênias, divirjo do Excelentíssimo Ministro Corregedor para conhecer do Recurso Administrativo e, no mérito, dar provimento para determinar a Corregedoria Geral da Justiça do Estado do Amazonas a apuração sobre os supostos descumprimentos de decisões do e. TJAM, no prazo de 30 (trinta) dias e, em seguida, encaminhe sua conclusão à Corregedoria Nacional de Justiça para análise e providências cabíveis.

É como voto.

 

Marcos Vinícius Jardim Rodrigues

Conselheiro

 

 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0009395-79.2019.2.00.0000
Requerente: BANCO BRADESCO S/A e outros
Requerido: JUÍZO DA 3ª VARA CÍVEL E DE ACIDENTES DE TRABALHO DA COMARCA DE MANAUS - AM

 


VOTO 


O EXMO. SR. MINISTRO HUMBERTO MARTINS, CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA (Relator):

A decisão monocrática deve ser mantida por seus próprios fundamentos, porquanto o recorrente nada traz de novo em seu recurso administrativo.

Conforme consignado na análise monocrática, os requerentes não apontam nenhuma violação dos deveres funcionais previstos na Lei Orgânica da Magistratura Nacional por parte do juiz reclamado, mas apenas se insurgem contra a decisão que, nos autos do Cumprimento de Sentença n. 0338406-85.2007.8.04.0001, determinou a transferência dos valores devidos para a conta judicial vinculada ao processo.

Deste modo, os argumentos de que o juízo reclamado deu interpretação extensiva à decisão do relator que concedera o efeito suspensivo, de que houve prescrição do direito de alguns dos autores e de que os cálculos da execução estão incorretos não são questões afetas ao exame da Corregedoria Nacional de Justiça por faltar a esta competência para tanto.

Tal irresignação se refere a exame de matéria eminentemente jurisdicional e, nestes casos, a parte deve procurar impugnar a decisão pelos meios próprios que o ordenamento jurídico prevê, o que, aliás, já vem sendo feito, conforme informado pelos reclamados na sua petição.

Nesta linha, não compete à Corregedoria Nacional de Justiça interferir na atividade jurisdicional por determinação expressa do art. 41 da LOMAN (LC n. 35/79), que prevê a independência funcional dos magistrados no exercício da atividade judicante: 

“Art. 41 - Salvo os casos de impropriedade ou excesso de linguagem o magistrado não pode ser punido ou prejudicado pelas opiniões que manifestar ou pelo teor das decisões que proferir”.

O CNJ, cuja competência está restrita ao âmbito administrativo do Poder Judiciário, não pode intervir em decisão judicial para corrigir eventual vício de ilegalidade ou nulidade, porquanto a matéria aqui tratada não se insere em nenhuma das previstas no art. 103-B, § 4º, da Constituição Federal. Em tais casos, deve a parte valer-se dos meios processuais adequados, não cabendo a intervenção do Conselho Nacional de Justiça. 

Nesse sentido: 

 

"RECURSO ADMINISTRATIVO EM PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. MATÉRIA DE NATUREZA EMINENTEMENTE JURISDICIONAL. IMPOSSIBILIDADE DE REEXAME. 

1. O reclamante não logrou apresentar nenhum indício de desvio de conduta por parte do magistrado representado. 

2. O que se alega contra o magistrado, conforme decisão ora recorrida, trata de matéria estritamente jurisdicional. Em tais casos, deve a parte valer-se dos meios processuais adequados, não cabendo a intervenção do Conselho Nacional de Justiça.

3. O CNJ, cuja competência está restrita ao âmbito administrativo do Poder Judiciário, não pode intervir em decisão judicial para corrigir eventual vício de ilegalidade ou nulidade, porquanto a matéria aqui tratada não se insere em nenhuma das previstas no art. 103-B, § 4º, da Constituição Federal.

 Recurso administrativo improvido." (CNJ- Recurso Administrativo em Reclamação Disciplinar - Corregedoria - 0008683-60.2017.2.00.0000, julgado em sessão de 18/10/2019, Rel. Min. Humberto Martins)

 

"RECURSO ADMINISTRATIVO. AÇÃO ORDINÁRIA. DESCONSTITUIÇÃO DE ATO ADMINISTRATIVO. PEDIDO JULGADO IMPROCEDENTE. DECISÃO MANTIDA NO SEGUNDO GRAU. INSURGÊNCIA. MATÉRIA DE NATUREZA JURISDICIONAL. AUSENTE A COMPETÊNCIA DO ÓRGÃO CENSOR. 

1 - O presente expediente dever ser arquivado, porquanto o recorrente nada trouxe de novo que possa ensejar a modificação da decisão recorrida.

2 - O inconformismo do reclamante volta-se contra o conteúdo de acórdão da Quarta Câmara de Direito Público do TJSC, que, no bojo do processo n. 0020930-73.2013.8.24.0023, manteve sentença de primeiro grau que julgou improcedente o pedido do reclamante para desconstituir ato administrativo que havia lhe exonerado do cargo de Policial Civil do Estado de Santa Catarina.

3 - Os princípios da independência e da imunidade funcionais obstam, via de regra, a possibilidade de punição de magistrado pelo teor dos entendimentos manifestados em seus julgados, como se verifica neste caso. Art. 41 da Lei Orgânica da Magistratura Nacional. Precedentes.

Recurso administrativo improvido."  (CNJ- Recurso Administrativo em Reclamação Disciplinar - Corregedoria - 0007680-02.2019.2.00.0000, julgado em sessão de 14/2/2020, Rel. Min. Humberto Martins)


Ante o exposto, nego provimento ao recurso administrativo.

É como penso. É como voto.


MINISTRO HUMBERTO MARTINS

Corregedor Nacional de Justiça  

 

S20/Z03/S34