Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0007779-98.2021.2.00.0000
Requerente: FRANCISCO JOSE DE CARVALHO NETO
Requerido: TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 16ª REGIÃO - TRT 16

 


RATIFICAÇÃO DE LIMINAR. PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 16ª REGIÃO. ELEIÇÃO CARGOS DIRETIVOS. CONTRARIEDADE DO § 3º, DO ART. 12, DO REGIMENTO INTERNO COM A LEI COMPLEMENTAR Nº 35/1979 (LOMAN).  SUSPENSÃO DO DISPOSITIVO ATÉ O JULGAMENTO FINAL DE MÉRITO. 

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, ratificou a liminar, nos termos do voto do Relator. Presidiu o julgamento a Ministra Rosa Weber. Plenário Virtual, 18 de novembro de 2022. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Rosa Weber, Maria Thereza de Assis Moura (então Conselheira), Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Marcio Luiz Freitas, Giovanni Olsson, Sidney Madruga, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto, Mário Goulart Maia e Luiz Fernando Bandeira de Mello.

 

RELATÓRIO

O EXMO. SR. CONSELHEIRO MÁRIO GOULART MAIA (RELATOR): Submeto ao Plenário do Conselho Nacional de Justiça decisão proferida em 26 de outubro de 2021 pela então Conselheira Tania Regina Silva Reckziegel, para ratificação de liminar, nos termos do artigo 25, XI, do RICNJ (Id 4523290).

O presente procedimento foi a mim redistribuído em 20 de janeiro de 2022, nos termos do § 2º do art. 45-A do RICNJ. 

Trata-se de Pedido de Providências (PP), com pedido liminar, proposto pelo Desembargador Francisco José de Carvalho Neto, no qual questiona a legalidade do art. 12, § 3º, do Regimento Interno do Tribunal Regional do Trabalho da 16ª Região (TRT-16), que estaria a restringir sua condição de elegibilidade aos cargos diretivos do Tribunal nas eleições designadas para o dia 28/10/2021.

No exame superficial da matéria, a Conselheira Tania Regina Silva Reckziegel compreendeu que “a LOMAN exclui do universo de magistrados elegíveis, sem reservas, aqueles que já exerceram quaisquer cargos de direção por quatro anos, ou o de Presidente, até que se esgotem todos os nomes na ordem de antiguidade. Não há na referida Lei Complementar nenhuma disposição quanto à renovação de ciclo, tampouco qualquer menção à não interrupção do referido ciclo com a eventual posse de novo Desembargador, o que conduz à conclusão de que, nesse ponto, o Regimento Interno do TRT-16 se afastou do regramento contido na LOMAN.”.

A fim de evitar a ocorrência de danos irreparáveis ou de difícil reparação, a então Conselheira entendeu ser prudente suspender a parte final do §3º, do art. 12, do Regimento Interno do Tribunal Regional do Trabalho da 16ª Região (TRT-16) até o julgamento do mérito, nos termos da fundamentação.

É o relatório.

Brasília, data registrada no sistema.

 

Mário Goulart Maia

Conselheiro

 

 

 

VOTO

O EXMO. SR. CONSELHEIRO MÁRIO GOULART MAIA (RELATOR): Eis o inteiro teor da decisão a qual submeto a referendo do Plenário, nos termos do art. 25, XI, do Regimento Interno do CNJ (Id 4523290):

DECISÃO 

Trata-se de Pedido de Providências (PP), com pedido liminar, proposto pelo Desembargador Francisco José de Carvalho Neto, no qual questiona a legalidade do art. 12, § 3º, do Regimento Interno do Tribunal Regional do Trabalho da 16ª Região (TRT-16), que estaria a restringir sua condição de elegibilidade aos cargos diretivos do Tribunal nas eleições designadas para o dia 28/10/2021.

O requerente afirma ser o único Desembargador do Tribunal que ainda não exerceu nenhum cargo de direção.

Aduz que o processo de escolha da nova administração, para o biênio de 2022/2023, ocorrerá em eleição marcada para o dia 28/10/2021, às 9h00, em pauta administrativa extraordinária.

Argumenta ser o único elegível para a Presidência ou cargo da administração ao qual delibera concorrer, conforme se depreende do art. 102 da Lei Orgânica da Magistratura Nacional (LOMAN).

Menciona que pretende concorrer ao cargo de Presidente da Corte, mas que vislumbra a possibilidade concreta de violação de seu direito de ser eleito.

Aponta que há norma ilegal inserta no art. 12, § 3º, do Regimento Interno do TRT-16, que restringe sua condição de único elegível ao estabelecer que “exaurida a lista de antigüidade com a eleição do seu último integrante, iniciar-se-á novo ciclo, que não será interrompido com a eventual posse de novo Desembargador do Trabalho”.

Sustenta que tal disposição tem o propósito de dificultar a candidatura à administração de magistrados que estejam em vias de ingressar no Tribunal, sendo ainda mais prejudicial para os juízes titulares de longa e ordeira carreira, além de permitir que Desembargadores inelegíveis, segundo a LOMAN, obtenham um segundo ou terceiro mandato de Presidente e/ou Vice-Presidente Corregedor.

Enfatiza que o critério que cria o “novo ciclo”, que não é interrompido pela posse no cargo de novo Desembargador, viola a literalidade da LOMAN, permitindo que pessoas que já ocuparam o cargo, por duas ou mais vezes, sejam candidatos em detrimento de Desembargador que ainda não ocupou qualquer cargo, embora tenha longos anos de magistratura.

Destaca que, como regra geral, o Supremo Tribunal Federal (STF) entende que o art. 102 da LOMAN foi recepcionado pela nova ordem constitucional.

Esclarece, nesse ponto, que decisão do STF na ADI n. 3.976 e no MS n. 32.451 reconheceu a não recepção apenas parcial do art. 102 da LOMAN, tão somente na parte em que restringe aos juízes mais antigos o universo daqueles aptos a concorrer aos cargos de direção.

Defende que, à luz dos princípios constitucionais da transparência, da alternância na gestão pública, da moralidade, da não discriminação, da igualdade de oportunidades aos iguais, a regra do Regimento Interno do TRT-16 (§3º do art. 12) deve ser concretamente afastada na eleição que se avizinha, bem como definitivamente revogada pelo Tribunal, com o reconhecimento de sua ineficácia imediata pelo CNJ.

Ao final, formula o pedido nos seguintes termos:

“Do exposto e demonstrado, requer:

a. Concessão de Medida Liminar, inaudita altera pars, de natureza antecipatória, para que seja ordenado ao TRT-16 e aos seus respectivos Desembargadores integrantes que, quando da sessão administrativa designada para eleição de sua nova administração, em 28/10/2021, seja observado o art. 102, da LOMAN, reconhecendo a condição de elegibilidade exclusiva do requerente para os Cargos de Presidente e Vice-Presidente-Corregedor do TRT-16, afastando a regra ilegal prevista no § 3º do art. 12 do RI/TRT-16, apenas podendo ser eleito para cargo de administração da Corte outro Desembargador, somente quando e se não apresentada candidatura do Desembargador requerente na respectiva sessão administrativa da eleição;

b. Sucessivamente, em relação ao pedido de tutela antecipada deduzido na alínea “a”, caso não seja imediatamente deferido, que se defira providência de natureza cautelar determinando-se a suspensão da sessão designada e do processo de escolha da administração até o pronunciamento definitivo do CNJ, observando-se o término do mandato da atual administração e início da nova gestão em 01/01/2022;

c. Ao final, após o regular processamento do Pedido de Providência, com ratificação da tutela concedida, sendo reconhecida a ilegalidade da regra prevista no § 3º do art. 12 do RI/TRT-16, com a determinação da perda de sua eficácia, bem como, reconhecendo-se em concreto a condição de elegibilidade exclusiva do Desembargador Francisco José de Carvalho Neto para os cargos de Presidente ou VicePresidente-Corregedor, em literal observância do art. 102 da LOMAN;

d. Seja determinado ao egrégio TRT-16 que, em prazo a ser fixado por este venerando CNJ, modifique o seu Regimento Interno (§3º do art. 12), de modo a excluir a figura dos “ciclos”, porque normativo extralegal, cumprindo-se tudo, já agora, em acatamento e obediência à vigência da atual Lei Orgânica da Magistratura Nacional (LOMAN).”

Os autos foram encaminhados a esta Conselheira para deliberação acerca da medida de urgência, nos termos do art. 24, I, do Regimento Interno, em razão do término do mandato do então Conselheiro Relator Rubens Canuto.

Após ser instado a manifestar-se no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, o TRT-16 juntou aos autos as informações de Id 4516783, que vieram acompanhadas de manifestações subscritas pelos demais membros da Corte.

O Tribunal destaca que a Constituição Federal de 1988 (CF/1988) inaugurou uma fase em que prestigiou a autonomia dos Tribunais (arts. 96 e 99, da CF/1988) em seus regimentos internos (princípio do autogoveno), havendo a coexistência de critérios outros que não exclusivamente o da antiguidade para as eleições a cargos diretivos e composição de Órgão Especial.

Salienta que o STF tem ratificando a prevalência da autonomia dos Tribunais, a exemplo das decisões proferidas na ADI n. 3976 e MS n. 32451, que sufragaram o entendimento de que os Tribunais possuem autonomia administrativa e financeira e, portanto, podem estabelecer as regras da eleição para os cargos de direção compreendidos em seu regime organizacional.

Afirma que o julgamento da ADI n. 3976 evidenciou que os Tribunais, por serem autônomos, não precisam seguir critério único definido em Lei Complementar anterior à Constituição e por ela não recepcionada.

Conclui que, ao adotar o critério de antiguidade e o regramento de renovação do ciclo para escolha de seus dirigentes, age o TRT-16 em estrita consonância com o permissivo constitucional vigente, atuando no exercício pleno da sua autonomia administrativa.

Por fim, postula a manutenção da norma regimental em apreço e o total indeferimento da medida proposta pelo requerente.

Considerada a informação de que pedido semelhante ao deduzido neste feito fora apresentado ao TRT-16 pelo requerente, e que por se tratar de matéria que não poderia ser dirimida por decisão singular do Presidente, seria submetida à deliberação do Pleno, em sessão marcada para ocorrer em 25/10/2021, antes das eleições, determinei a intimação do Tribunal para que informasse nos autos sobre o resultado da deliberação imediatamente após o término da referida sessão. O TRT-16, então, informou que, com desempate pelo voto de qualidade do Presidente, foi rejeitado o requerimento para declaração de “elegibilidade exclusiva” do Desembargador Francisco José de Carvalho Neto (Id 4521762).

Em seguida, o requerente atravessou nova petição, na qual reiterou a necessidade de concessão da medida de urgência (Id 4523099).

É o Relatório.

DECIDO.

O Regimento Interno deste Conselho estabelece, em seu artigo 25, XI, os seguintes requisitos para a concessão de medidas urgentes e acauteladoras: (i) existência de fundado receio de prejuízo ou de dano irreparável;

(ii) risco de perecimento do direito invocado.

Interpretando esse dispositivo, o Plenário do CNJ consolidou o entendimento de que a concessão da tutela de urgência exige a demonstração conjunta do fumus boni iuris, consistente na comprovação da plausibilidade do direito, e do periculum in mora, caracterizado pela possibilidade da ocorrência de danos irreparáveis, ou de difícil reparação.

Num juízo de cognição sumária, próprio desta fase processual, é possível vislumbrar a presença de ambos os requisitos.

Para melhor compreensão da controvérsia, convém transcrever o dispositivo do Regimento Interno do TRT-16 questionado pelo requerente:

“Art. 12. O Tribunal, pela maioria dos seus membros efetivos, em votação aberta e nominal, elegerá dentre seus Desembargadores do Trabalho mais antigos, em número correspondente ao dos cargos de direção (art. 11), os titulares destes, com mandato por dois anos, proibida a reeleição. Quem tiver exercido quaisquer cargos de direção por quatro anos, ou, o de Presidente, não figurará mais entre os elegíveis, até que se esgotem todos os nomes, na ordem de antiguidade. É obrigatória a aceitação do cargo, salvo recusa manifestada e aceita antes da eleição.

(...)

§ 3º - A antigüidade, para efeito de eleição do Presidente e do Vice-Presidente ou para quaisquer outros efeitos, será apurada de acordo com o efetivo exercício do cargo, o qual será considerado a partir da data da instalação do Tribunal, ocorrida no dia 26 de maio de 1.989. Exaurida a lista de antigüidade com a eleição do seu último integrante, iniciar-se-á novo ciclo, que não será interrompido com a eventual posse de novo Desembargador do Trabalho.”

Todavia, a LOMAN exclui do universo de magistrados elegíveis, sem reservas, aqueles que já exerceram quaisquer cargos de direção por quatro anos, ou o de Presidente, até que se esgotem todos os nomes na ordem de antiguidade.

Não há na referida Lei Complementar nenhuma disposição quanto à renovação de ciclo, tampouco qualquer menção à não interrupção do referido ciclo com a eventual posse de novo Desembargador, o que conduz à conclusão de que, nesse ponto, o Regimento Interno do TRT-16 se afastou do regramento contido na LOMAN.

É certo que a Constituição Federal de 1988 conferiu aos Tribunais autonomia administrativa e o poder de autogoverno. No entanto, é preciso ter em mente que tais prerrogativas não lhes permitem atuar à margem da legalidade.

Nesse contexto, quanto ao fumus boni iuris, sem prejuízo de uma análise mais aprofundada por ocasião do julgamento do mérito, parece-me que os elementos trazidos aos autos até este momento indicam, de fato, que o TRT-16 extrapolou os limites da legalidade ao criar, em seu Regimento Interno, a figura do “novo ciclo”, que não é interrompido pela posse no cargo de novo Desembargador.

Quanto ao periculum in mora, desnecessárias maiores digressões, considerando que a eleição em tela está agendada para ocorrer no dia 28/10/2021.

Diante do exposto, defiro o pedido liminar para, até o julgamento final deste Pedido de Providências, suspender a parte final do §3º, do art. 12, do Regimento Interno do Tribunal Regional do Trabalho da 16ª Região (TRT-16), no trecho em que estabelece o início de novo ciclo após o exaurimento da lista de antiguidade e determina a sua não interrupção com a eventual posse de novo Desembargador.

Intimem-se.

Brasília, data registrada no sistema.

Conselheira Tânia Regina Silva Reckziegel

Substituta Regimental

 

 

Ante o exposto, proponho a ratificação da liminar.

É como voto.

Brasília, data registrada no sistema. 

 

Mário Goulart Maia

Conselheiro