EMENTA

RECURSO ADMINISTRATIVO EM RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR. DUPLICIDADE APURATÓRIA. QUESTÃO APRECIADA EM OUTRA RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

1 - “Não cabe a este Conselho Nacional de Justiça, em sede de reclamação disciplinar, proceder a uma nova apuração dos mesmos fatos, não sendo admissível a duplicidade apuratória" (CNJ - RA – Recurso Administrativo em RD - Reclamação Disciplinar - 0005641-08.2014.2.00.0000 - Rel. Min. NANCY ANDRIGHI - 26ª Sessão (EXTRAORDINÁRIA) - j. 19/05/2015). 

2 - Recurso administrativo a que se nega provimento.

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto da Relatora. Presidiu o julgamento o Ministro Luiz Fux. Plenário Virtual, 24 de setembro de 2021. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Luiz Fux, Maria Thereza de Assis Moura, Luiz Fernando Tomasi Keppen, Tânia Regina Silva Reckziegel, Mário Guerreiro, Flávia Pessoa, Sidney Madruga, Ivana Farina Navarrete Pena, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, André Godinho e Mário Goulart Maia. Não votaram os Excelentíssimos Conselheiros Luiz Fernando Bandeira de Mello e, em razão das vacâncias dos cargos, os representantes do Tribunal Superior do Trabalho, Tribunal Regional Federal e Justiça Federal.

RELATÓRIO

A EXMA. SRA. MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, CORREGEDORA NACIONAL DE JUSTIÇA (Relatora):

Cuida-se de recurso administrativo apresentado por ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, SEÇÃO DE SÃO PAULO contra decisão da minha lavra que determinou o arquivamento sumário de reclamação disciplinar formulada pela recorrente em desfavor do Juiz Militar José Álvaro Machado Marques, da 4ª Auditoria Militar do Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo, à motivação de que o tema posto neste expediente aborda questão já analisada no Pedido de Providências n. 0001986-81.2021.2.00.0000 e na RD n. 0009435-27.2020.2.00.0000

No presente recurso, a ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, SEÇÃO DE SÃO PAULO alega que “é necessária a reforma da r. decisão, uma vez que constatada a ilegitimidade da Autora da Reclamação Disciplinar nº 0009435-27.2020.2.00.0000, além de versarem sobre infrações diversas às aqui sustentadas, bem pelo fato de que o Pedido de Providências nº 0001986- 81.2021.2.00.0000 versa sob questão sub judice, objeto de interposição de recurso que tramita na corregedoria local, sendo certo que a competência desta Corregedoria Nacional independe daquela.”

Alega, para tanto, que o Processo SEI nº 21.1.000000488-4” sequer foi definitivamente arquivado pela corregedoria local, estando atualmente em fase de processamento de recurso interposto pela OAB/SP” e que “uma vez que o procedimento original ainda está no aguardo de julgamento do recurso, não se pode concluir que a decisão proferida por esse C. CNJ no Pedido de Providências nº 0001986-81.2021.2.00.0000 seja definitiva, justamente por estar o julgado passível de alteração.”

Sustenta, outrossim, que “o fato de ter sido proferida decisão de arquivamento nos autos do Pedido de Providências nº 0001986-81.2021.2.00.0000 não impede esse Conselho Nacional de Justiça de conhecer os fundamentos trazidos na presente Reclamação Disciplinar.”

Aduz, mais, que “não se pode alegar que a matéria trazida na presente reclamação já foi apreciada quando do julgamento da Reclamação Disciplinar formulada pelo Instituto Nacional de Advocacia - INAD (autos nº 0009435- 27.2020.2.00.0000)” porque o INAD não possui legitimidade ativa e seu pedido está assentado apenas no artigo 56 da LOMAN, enquanto a “OAB/SP, por outro lado, busca demonstrar que os fatos ora sob análise ensejam violação ao artigo 35, incisos I e IV da LOMAN, artigo 65 do Código de Processo Penal militar, artigos 223 e 313, inciso I, ambos do Código de Processo Civil, artigo 3º, §§ 2º e 3º da Resolução 314 do Conselho Nacional de Justiça e ao artigo 6º, parágrafo único, da Lei nº 8.906/94.”

As contrarrazões foram apresentadas no ID 4418457.

É o relatório.

 

VOTO

A EXMA. SRA. MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, CORREGEDORA NACIONAL DE JUSTIÇA (Relatora):

Conforme já ressaltado na decisão recorrida, a questão posta neste expediente cuida de matéria idêntica à da Reclamação Disciplinar n. 0009435-27.2020.2.00.0000, formulada pelo Instituto Nacional de Advocacia – INAD para apuração dos mesmos fatos e que foi arquivada em decisão assim fundamentada (destaquei): 

A presente Reclamação Disciplinar deve ser liminarmente arquivada. 

Primeiro, porque o Instituto ora reclamante não tem legitimidade ativa para desencadear apuração de fato relacionado a questão que interessa exclusivamente a um único advogado e que só a ele diz respeito — indeferimento de audiência em processo criminal. 

O artigo 2.º do Regulamento Geral da Corregedoria Nacional de Justiça é muito claro ao dispor: 

Art. 2º. Cabe à Corregedoria Nacional de Justiça receber e processar reclamações e denúncias de qualquer pessoa ou entidade com interesse legítimo, relativas aos magistrados e aos serviços  judiciários auxiliares, serventias, órgãos prestadores de serviços notariais e de registro que atuem por delegação do poder público ou sejam por este oficializados. 

Parágrafo 1º. Interesse legítimo para o efeito referido é aquele não exclusivamente limitado ao interesse subjetivo individual e preferentemente direcionado para o bom funcionamento dos órgãos judiciários. 

No caso em questão, falece ao Instituto de Advogados ora autor — sediado no Estado do Rio de Janeiro — interesse para propor Reclamação Disciplinar em nome de terceiro e relacionada a episódio ocorrido em São Paulo, independentemente de eventual caráter nacional da entidade autora. Para além, não há prova de que o advogado envolvido no ocorrido seja associado ao dito instituto e também não há nos autos autorização expressa por ele subscrita que o permita a agir em sua substituição. 

Como dito, trata-se de questão eminentemente particular e ligada diretamente ao interesse privado de um único advogado, que teve determinado pedido de adiamento de ato processual indeferido. 

Segundo, porque a questão aqui posta tem reflexo na intimidade e na reserva da vida privada do profissional em questão que, registre-se, não ofereceu Representação Disciplinar — assim como também não o fez a OAB — e que talvez não pretenda ingressar com a medida correicional. Nesses casos de interesse subjetivo próprio e personalíssimo, não cabe representação oferecida por parte estranha ao episódio. É inviável a admissão de Reclamação Disciplinar por quem não tenha interesse direto e imediato na apuração do suposto evento. 

Terceiro, porque o indeferimento de alteração de data de audiência, por si só, não constitui infração disciplinar. Compete exclusivamente aos magistrados estabelecer a pauta de suas audiências e definir a agenda dos eventos das unidades jurisdicionais em que atuam. Além disso, é sempre possível substabelecer os poderes da procuração, se eventualmente todos os advogados que nela constam estiverem impossibilitados de comparecimento. Nesse sentido, os precedentes do STJ: HC 41.597, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima; HC 209.038, Rel. Min. Og Fernandes; RMS 14.454, Rel. Min. Luiz Fux. Do STF, colhe-se: AI 42.105, Rel. Min. Evandro Lins; RE 85.027, Rel. Ministro Cordeiro Guerra. E, mesmo nos casos de procuração outorgada a um único advogado, há a possibilidade do substabelecimento — ainda que para um só ato — e incumbe ao magistrado a prudente avaliação das razões e comprovativos invocados por quem pretende a alteração da data do evento. 

E quarto e, por fim, porque a inicial é genérica, lastreada em documentos extraídos da publicação de notícias na mídia, não traz nem sequer cópia da procuração outorgada — na qual se pudesse verificar a quantos advogados ela foi passada — e não informa como transcorreu a audiência em questão.

 

Contra tal decisão foi interposto recurso administrativo, que restou julgado em Sessão do Plenário deste CNJ do dia 28/5/2021, em voto sob minha relatoria nos seguintes termos (destaquei): 

O Recurso Administrativo não merece provimento. 

A questão aqui posta tem reflexo na intimidade e na reserva da vida privada do profissional em questão, que não ofereceu Representação Disciplinar. 

O indeferimento de alteração de data de audiência, por si só, não constitui infração aos deveres da magistratura. Compete exclusivamente aos magistrados estabelecer a pauta de suas audiências e definir a agenda dos eventos das unidades jurisdicionais em que atuam. Além disso, é sempre possível substabelecer os poderes da procuração, se eventualmente todos os advogados que nela constam estiverem impossibilitados de comparecimento. Nesse sentido, os precedentes do STJ: HC 41.597, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima; HC 209.038, Rel. Min. Og Fernandes; RMS 14.454, Rel. Min. Luiz Fux. Do STF, colhe-se: AI 42.105, Rel. Min. Evandro Lins; RE 85.027, Rel. Ministro Cordeiro Guerra. E, mesmo nos casos de procuração outorgada a um único advogado, há a possibilidade do substabelecimento – ainda que para um só ato – e incumbe ao magistrado a prudente avaliação das razões e comprovativos invocados por quem pretende a alteração da data do evento. 

Ademais, a inicial é genérica, lastreada em documentos extraídos da publicação de notícias na mídia, não traz nem sequer cópia da procuração outorgada – na qual se pudesse verificar a quantos advogados ela foi passada – e não informa como transcorreu a audiência em questão. 

Assim, não tendo sido demonstrada a prática de ilícito funcional pelo magistrado requerido, era mesmo caso de se arquivar sumariamente o expediente. 

Ante o exposto, nego provimento ao Recurso Administrativo.

 

Vê-se, pois, que a reclamação disciplinar n. 0009435-27.2020.2.00.0000, que igualmente imputa a prática de infração disciplinar pelo reclamado na condução do processo criminal militar n. 0002815-02.2019.9.26.0040, decorrente do não adiamento da audiência de instrução diante do quadro de saúde do advogado, foi arquivada, dentre outros fundamentos, à motivação de que: i) “o indeferimento de alteração de data de audiência, por si só, não constitui infração disciplinar”; ii) “compete exclusivamente aos magistrados estabelecer a pauta de suas audiências e definir a agenda dos eventos das unidades jurisdicionais em que atuam”; iii) “é sempre possível substabelecer os poderes da procuração, se eventualmente todos os advogados que nela constam estiverem impossibilitados de comparecimento” e iv) “e, mesmo nos casos de procuração outorgada a um único advogado, há a possibilidade do substabelecimento — ainda que para um só ato — e incumbe ao magistrado a prudente avaliação das razões e comprovativos invocados por quem pretende a alteração da data do evento”.

Destarte, a despeito das considerações acerca da ilegitimidade ativa do reclamante na Reclamação Disciplinar n. 0009435-27.2020.2.00.0000, bem como da deficiência da instrução processual, o fato é que a questão posta no presente expediente  já foi apreciada no âmbito deste Conselho Nacional de Justiça que afastou, às expressas, a prática de infração disciplinar.

E "não cabe a este Conselho Nacional de Justiça, em sede de reclamação disciplinar, proceder a uma nova apuração dos mesmos fatos, não sendo admissível a duplicidade apuratória" (CNJ - RA – Recurso Administrativo em RD - Reclamação Disciplinar - 0005641-08.2014.2.00.0000 - Rel. Min. NANCY ANDRIGHI - 26ª Sessão (EXTRAORDINÁRIA) - j. 19/05/2015). 

Vale anotar, a propósito, que a duplicidade apuratória já foi afastada, pelo mesmo fundamento, nos autos do PP n. 0001986-81.2021.2.00.0000, instaurado, nos termos da Portaria CNJ n. 34 de 13/9/2016, para dar cumprimento ao disposto nos arts. 9º, § 3º, 14, §§ 4º e 6º, 20, § 4º, e 28 da Resolução CNJ n. 135, de 13/7/2011, que exigem que sejam comunicados à Corregedoria Nacional de Justiça o arquivamento dos procedimentos prévios de apuração, a instauração e o julgamento dos procedimentos administrativos relativos a juízes e desembargadores vinculados aos tribunais do País.

Dessa forma, há que se manter o arquivamento da presente reclamação disciplinar.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso administrativo. 

É o voto.