Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: NOTA TÉCNICA - 0003733-32.2022.2.00.0000
Requerente: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ

 

 

NOTA TÉCNICA. MANIFESTAÇÃO. GRUPO DE TRABALHO-RECUPERAÇÃO EMPRESARIALPROJETO DE LEI Nº 33/2020. MARCO LEGAL DO REEMPREENDEDORISMO. RENEGOCIAÇÃO ESPECIAL EXTRAJUDICIAL e JUDICIAL. LIQUIDAÇÃO ESPECIAL SUMÁRIA. MICROEMPRESAS E EMPRESAS DE PEQUENO PORTE. ALTERAÇÃO DA LEI COMPLEMENTAR Nº 123, DE 14 DE DEZEMBRO DE 2006. MANIFESTAÇÃO FAVORÁVEL AO PROJETO, COM RECOMENDAÇÃO DE AJUSTE.

I. Encontra-se caracterizado o interesse do Poder Judiciário na matéria, a justificar a elaboração de Nota Técnica pelo Conselho Nacional de Justiça, nos termos do art. 103 do seu Regimento Interno.

II. O Projeto é meritório, porquanto reconhece a necessidade de reduzir a burocracia e propiciar medidas de desjudicialização e de celeridade em processos de recuperação de microempresas e empresas de pequeno porte.

III. Em acréscimo, o PL complementa a sistemática instituída pela LC 123/2006 (Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte).

IV. Revela-se recomendável - conforme manifestação do Grupo de Trabalho instituído para o aprimoramento da atuação do Poder Judiciário em processos de recuperação empresarial e falências - ajuste pontual de modo compatibilizar a Lei nº 13.140, de 26 de junho de 2015 (Lei de Mediação) para que a mediação possa ser utilizada nos processos regulados pelo PL 33/2020.

V. Emissão de Nota Técnica favorável ao Projeto de Lei. 

 

 ACÓRDÃO

O Conselho decidiu, por unanimidade: I - incluir em pauta o presente procedimento, nos termos do § 1º do artigo 120 do Regimento Interno; II - aprovar o Nota Técnica, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, a Conselheira Maria Thereza de Assis Moura. Presidiu o julgamento o Ministro Luiz Fux. Plenário, 21 de junho de 2022. Presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Conselheiros Luiz Fux, Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Marcio Luiz Freitas, Giovanni Olsson, Sidney Madruga, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues (Relator), Marcello Terto, Mário Goulart Maia e Luiz Fernando Bandeira de Mello.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: NOTA TÉCNICA - 0003733-32.2022.2.00.0000
Requerente: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ
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RELATÓRIO


          Trata-se de processo de Nota Técnica autuado por solicitação do Grupo de Trabalho instituído para contribuir com a modernização e efetividade da atuação do Poder Judiciário nos processos de recuperação judicial e de falência.        

                    Em 19 de dezembro de 2018, foi publicada a Portaria nº 162 do Conselho Nacional de Justiça, que instituiu Grupo de Trabalho (GT) destinado a apresentar contribuições para a modernização e a efetividade da atuação do Poder Judiciário nos processos de recuperação judicial e de falência.

                   Referido ato - alterado posteriormente pelas Portarias nº 40, de 27 de fevereiro de 2019; nº 74, de 13 de maio de 2019; nº 199 de 30 de setembro de 2020; nº 61, de 23 de fevereiro de 2021; nº 192 de 37 de julho de 2021 e, finalmente, nº 228, de 21 de setembro de 2021 - previu a seguinte composição para o Grupo de Trabalho:

I – Marcos Vinicius Jardim Rodrigues, Conselheiro do Conselho Nacional de Justiça;

II – Luís Felipe Salomão, ministro do Superior Tribunal de Justiça;

III – Paulo Dias de Moura Ribeiro, ministro do Superior Tribunal de Justiça;

IV – Alexandre de Souza Agra Belmonte, ministro do Tribunal Superior do Trabalho;

V – Mônica Maria Costa Di Piero, desembargadora do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro;

VI – Agostinho Teixeira de Almeida Filho, desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro;

VII – José Roberto Coutinho de Arruda, desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo;

VIII – Marcelo Fortes Barbosa Filho, desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo;

IX – Alexandre Alves Lazzarini, desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo;

X – Daniel Carnio Costa, juiz de direito do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo;

XI – Luiz Roberto Ayoub, advogado;

XII – Flávio Antônio Esteves Galdino, advogado;

XIII – Marcelo Vieira de Campos, advogado;

XIV – Paulo Penalva Santos, advogado;

XV – Samantha Mendes Longo, advogada;

XVI – Bruno Galvão Souza Pinto de Rezende, advogado;

XVII – Luiz Fernando Valente de Paiva, advogado;

XVIII – Juliana Bumachar, advogada; 

XIX – Victória Vaccari Villela Boacnin, advogada;

XX – Giovana Farenzena, juíza de direito do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul;

XXI – Anglizey Solivan de Oliveira, juíza de direito do Tribunal de Justiça de Mato Grosso;

XXII – Geraldo Fonseca de Barros Neto, advogado; e 

XXIII – Henrique de Almeida Ávila, advogado.

 

Foram afetadas ao Grupo de Trabalho as seguintes atribuições: 

I- apresentar cronograma de execução das atividades; 

II- realizar estudos e apresentar diagnósticos sobre a necessidade de aperfeiçoamento do marco institucional, no âmbito do Poder Judiciário, para conferir maior celeridade, efetividade e segurança jurídica aos processos de recuperação judicial e de falência; 

III- propor a realização de audiências públicas, consultas públicas, palestras ou seminários com representantes de órgãos públicos e de entidades da sociedade civil, especialistas e operadores do Direito para colher subsídios e aprofundar estudos; 

IV- sugerir a realização de eventos e atividades de capacitação de magistrados atuantes em processos recuperacionais e falimentares, inclusive na modalidade a distância; 

V- apresentar propostas de recomendações, provimentos, instruções, orientações e outros atos normativos, destinadas ao aperfeiçoamento das atividades dos órgãos do Poder Judiciário; e 

VI- apresentar relatório final das atividades desempenhadas. 


Com efeito, a proposta do referido GT versa sobre o Projeto de Lei Complementar nº 33/2020, concebido com o escopo de estabelecer e disciplinar a renegociação especial extrajudicial, a renegociação especial, a liquidação simplificada, além de dispor sobre a falência das microempresas e das empresas de pequeno porte.

Durante a última reunião do GT, ocorrida em 9 de junho de 2022, seus integrantes apreciaram a versão final das minutas de Manifestação e de Nota Técnica que integram o presente VOTO e que ora apresento, aprovando-as, de forma unânime.

Submeto, pois, a redação final do texto ao escrutínio do Plenário do Conselho Nacional de Justiça, reiterando os agradecimentos ao Grupo de Trabalho que tenho a hora de integrar e que vem cumprindo tão elevada missão, de modo a contribuir sobremodo para um Sistema de Justiça mais eficiente na seara processualística de demandas referentes à recuperação empresarial e falência. 

É o relatório.


 


Brasília, 17 de junho de 2022.


 

Conselheiro Marcos Vinícius Jardim

Relator


 

VOTO

Cuida-se de processo de Nota Técnica para manifestação favorável ao Projeto de Lei n. 33/2020, autuado por força de deliberação tida no âmbito do Grupo de Trabalho para contribuir com a modernização e efetividade da atuação do Poder Judiciário nos processos de recuperação judicial e de falência, presidido pelo Ministro Luís Felipe Salomão, do Superior Tribunal de Justiça.

Contexto do PL 33/2020

Tendo em vista o tratamento escasso do ordenamento jurídico no que se refere às reestruturações de dívidas de Pequenas e Microempresas no Brasil (MPE), o PL nº 33/2020 busca sanar e mitigar as lacunas, com o fim de assegurar a desburocratização de processos e estimular o empreendedorismo no país.

O projeto pauta-se pela desoneração do chamado Reempreendedorismo, tornando-o mais ágil e operativo para as MPE, instituindo a renegociação especial extrajudicial, a renegociação especial judicial, a liquidação especial sumária e adequações na falência dessas empresas. Para tanto, prevê procedimentos com o escopo específico de potencialização da celeridade para credores, para o Estado e para a devedora, sem descurar da segurança jurídica.

Atualmente, as MPE representam 98,5% das sociedades brasileiras e carecem de estrutura adequada para superarem a crise econômico-financeira que eventualmente pode acometê-las. Embora a relevância da matéria tenha sido reconhecida pela Lei 11.101/05 (“LREF”), não foram atendidas as especificidades das MPE, uma vez que insignificante ainda o número de MPE que opta pelo procedimento especial da recuperação judicial.

Isso ocorre por variados motivos, com destaque ao alto custo dos processos de Recuperação Judicial.

Primeiramente, destaca-se que a rigidez do parcelamento - restrito a 36 parcelas mensais, iguais e sucessivas, com correção e juros equivalentes à taxa SELIC - é relevante desestímulo ao procedimento especial, por ser muito inferior à media dos prazos de pagamento utilizados pelos empresários nas recuperações judiciais, em que o parcelamento adotado tem mediana de 11 anos e atualização predominantemente pela Taxa Referencial (TR).

Ainda, mesmo sendo possível o deságio, a obrigatoriedade de previsão das parcelas fixas, idênticas, revela rigidez incompatível com a dinâmica do mercado e com a própria realidade do micro e pequeno empresário e suas vias de recomposição do seu capital de giro e do faturamento esperado.

Por fim, destaca-se que a necessidade de publicação de editais e a remuneração do administrador judicial oneram demasiadamente o empresário devedor de pequeno porte, impondo custos desnecessários ao devedor, tendo em vista o seu reduzido número de credores.

Assim, embora o procedimento especial tenha suprimido a necessidade de convocação de assembleia geral de credores, o que reduziu sensivelmente os custos do processo, são vários os obstáculos enfrentados pelos pequenos e microempresários que acabam por obstar sua reestruturação.

É nesse contexto que o PL nº 33/2020 busca reduzir significativamente a onerosidade dos procedimentos e privilegia sua celeridade. Dentre as previsões do PL, destacam-se as medidas a seguir expostas.  

 

Destaques do PL 33/2020

      A ampliação do conceito de MPE para inclusão de startups.

Embora a restrição tenha sido pensada para evitar a concessão indevida de benefícios tributários ou vantagens competitivas em processos licitatórios a empresas no cenário de crise, essas restrições impedem que tais pessoas se valham da renegociação especial extrajudicial e judicial, bem como de realizar a liquidação especial sumária, as sujeitando às regras gerais da recuperação judicial e da falência, mais onerosa, burocrática e, portanto, desestimulando no país o espírito empreendedor que circundam tais iniciativas.

      Fim da restrição temporal para as MPE

Diante da alta taxa de ‘mortalidade’ de MPE nos primeiros dois anos de existência e da necessária criação de estímulos para que o empreendedor adote medidas logo no início da constatação de situação de crise, o projeto propõe revogar esta restrição temporal para as MPE.

      Criação de procedimentos simplificados de renegociação, extrajudicial e judicial

Possibilidade de renegociação extrajudicial com os credores sujeita apenas à homologação posterior pelo Poder Judiciário, considerando a inexistência de patrimônio extenso e de valor significativo ou de estrutura que possibilite o cumprimento, pelo devedor, de obrigações complexas, além do desinteresse dos credores para participar e supervisionar o processo.

      Criação de procedimentos simplificados de Liquidação simplificada, extrajudicial e judicial

Propõe-se, ainda, a regularização do encerramento das MPE estabelecendo-se duas formas de liquidações simplificadas, também extrajudicial e judicial No primeiro caso, trata-se de um procedimento que se assemelha à liquidação e encerramento já estabelecido para as sociedades limitadas, enquanto que o procedimento judicial, estabelece procedimentos simples, desburocratizado e eficiente objetivando o encerramento do processo de maneira célere, buscando reduzir de forma substancial o tempo de duração de falências das MPEs e o acúmulo de trabalho do Poder Judiciário.

Objetiva-se a segurança ao devedor da quitação de todas as obrigações relacionadas aos seus bens, desde que evidenciada sua boa-fé objetiva e ausência de atos meramente protelatórios ou que possam prejudicar credores, como a ocultação de bens.

      Manutenção de garantias dos coobrigados, mas novadas

O Projeto almeja possibilitar a recuperação das MPE, tendo em vista sua crise ser indissociável e de seus administradores, titulares, sócios e familiares, sem, contudo, prejudicar os interesses dos credores, por meio de importantes alterações no atual arcabouço. São elas: novação da obrigação principal; suspensão do curso da prescrição e de todas as ações e execuções, entre outras.

 

Justificativa para a complementação

Para além dos aprimoramentos trazidos pela PL 33/2020, destacamos as propostas de emendas que já receberam apoio do Grupo Permanente de Aperfeiçoamento do Direito de Insolvência (GPAI), grupo que congrega 25 entidades de profissionais especializados em recuperação de empresas e falências dos mais diversos estados do país.

Nesse sentido, importante se faz a aproximação da Lei nº 13.140, de 26 de junho de 2015 (a “Lei de Mediação”), que apesar de não ter sido projetada com o objetivo de instituições de mediações em processos multifacetados, sobretudo os processos de insolvência, pode garantir uma maior fluidez das negociações dotadas de segurança jurídica em processos dessa natureza.

Assim, recomenda-se fortemente apoio à inclusão no PLP 33/2020 de modificações e adequações à Lei de Mediação, com o fim de adequá-la e compatibilizá-la à realidade e necessidade dos processos de insolvência, incluindo os de pequenas e microempresas, garantindo, outrossim, maior segurança jurídica para a mediação, um dos pilares fundamentais para o sucesso do PLP 33/2020, removendo as incertezas que podem impedir a sua utilização de forma adequada e em maior escala.

São as seguintes as modificações recomendadas na Lei 13.140, de 26 de junho de 2015:

 

Art. 5º.

§ 1º. A pessoa designada para atuar como mediador tem o dever de revelar às partes, antes da aceitação da função, qualquer fato ou circunstância que possa suscitar dúvida justificada em relação à sua imparcialidade para mediar o conflito, oportunidade em que poderá ser recusado por qualquer delas. [RN]

§2º. Não constituirá fato ou circunstância a suscitar dúvida em relação à imparcialidade e à independência do candidato a mediador em mediação antecedente ou incidental, o fato de já ter representado, pessoalmente ou por intermédio do escritório a que pertence, uma das partes da mediação, salvo se tiver atuado nas questões objeto da mediação.

 

Art. 6º

Parágrafo único. Exceto nos casos em que o mediador tenha atuado na questão objeto de mediação como advogado de uma das partes envolvidas na mediação, o impedimento previsto no caput deste artigo não se aplica à atuação dos mediadores em processos, judiciais e extrajudiciais, de insolvência, incluindo aqueles regidos pela Lei 11.101/05, pela Lei 14.193/21 e pela Lei que instituir o Marco Legal do Reempreendedorismo.

 

 

Art. 11.

§ 1º. A capacitação de mediador para a atuação em litígios envolvendo matéria de direito empresarial, incluindo os processos, judiciais e extrajudiciais, de insolvência, incluindo aqueles regidos pela Lei 11.101/05, pela Lei 14.193/21 e pela Lei que instituir o Marco Legal do Reempreendedorismo, deve ser distinto da capacitação de mediador para atuação em processos comuns e deve exigir conhecimentos mínimos de direito empresarial, além de técnicas de mediação e negociação complexas com múltiplas partes.

§ 2º A formação de mediador para atuação em processos de direito empresarial pode ser dispensada:

I - em caso de notório conhecimento e atuação em processos nos quais o profissional for chamado a mediar;

II -  na hipótese de nomeação por consenso entre as partes ou de nomeação de um comediador que possua referida experiência.

 

Art. 13.

Parágrafo único. O mediador, o árbitro e o conciliador poderão requerer que o pagamento dos honorários que lhes caibam seja efetuado em favor da sociedade de advogados que integra na qualidade de sócio, sem que o exercício de referidas funções, nem tampouco o recebimento dos honorários pela sociedade da qual integra, implique em alteração da natureza uniprofissional de sua atuação e do regime tributário a que ele e/ou à sociedade que integra estão sujeitos na prática da advocacia.

 

Tendo-se em vista a multiplicidade de partes nos processos de recuperação judicial e falência, a falta de orientação e previsão legal pode levar a uma série de limitações à atuação dos profissionais habilitados para os exercícios da função mediadora, o que inclui a necessidade de o mediador ter reconhecida experiência em processos de insolvência, previsto na Recomendação nº 58 do Conselho Nacional de Justiça, e incerteza quanto à aplicabilidade dos requisitos para a formação do mediador de processos comuns. E mais, a dúvida quanto a sujeição ao regime tributário do advogado candidato a mediador também acaba por constituir obstáculo à aceitação da nomeação por profissionais com especialização e reconhecida experiência na matéria.

 

Considerações Finais

Por todo o exposto, propomos a edição de NOTA TÉCNICA em apoio ao PLP 33/2020 - Novo Marco Legal do Reempreendedorismo, com as emendas que objetivam promover as necessárias adequações à Lei nº 13.140, de 26 de junho de 2015.

É o VOTO que submeto ao Egrégio Plenário, conforme proposta dos membros do Grupo de Trabalho instituído para contribuir com a modernização e efetividade da atuação do Poder Judiciário nos processos de recuperação judicial e de falência (GTRJF), pugnado pela sua aprovação pelo Plenário.

 

Brasília, 15 de junho de 2022.

 

 

 

Conselheiro Marcos Vinícius Jardim Rodrigues

Relator

 

 

 


NOTA TÉCNICA  

 

EMENTA: Dirige-se ao Congresso Nacional para apresentar manifestação favorável à aprovação do Projeto de Lei nº 33/2020, denominado ‘Marco Legal do Reempreendedorismo. 

 

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições legais e regimentais;

 

CONSIDERANDO a competência prevista no artigo 103, inciso I do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça;

 

CONSIDERANDO o compromisso constitucional estabelecido pelo artigo 103B, §4º, II, em zelar pela observância do princípio da eficiência na atuação do Poder Judiciário, determinada pelo caput do artigo 37 da Constituição Federal;

 

 CONSIDERANDO que o direito de acesso à Justiça, previsto no art. 5o, XXXV, da Constituição Federal, além do acesso aos órgãos judiciários, também implica acesso à ordem jurídica justa e a soluções efetivas;

  

CONSIDERANDO que, por isso, cabe ao Judiciário estabelecer política pública de tratamento adequado dos problemas jurídicos e dos conflitos de interesses, que ocorrem em larga e crescente escala na sociedade, de forma a organizar, em âmbito nacional, não somente os serviços prestados nos processos judiciais, como também os que possam sê-lo mediante outros mecanismos de solução de conflitos, em especial dos consensuais, como a mediação e a conciliação;

 

CONSIDERANDO a necessidade de se consolidar uma política pública permanente de incentivo e aperfeiçoamento dos mecanismos consensuais de solução de litígios;

 

CONSIDERANDO que a conciliação e a mediação são instrumentos efetivos de pacificação social, solução e prevenção de litígios e que a utilização de meios consensuais de solução de conflitos tem contribuído para a redução da excessiva judicialização dos conflitos de interesses, a quantidade de recursos e de execução de sentenças;

 

 CONSIDERANDO a Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário estabelecida pela Resolução CNJ nº 125, de 29 de novembro de 2010;

 

CONSIDERANDO que a celeridade e produtividade na prestação jurisdicional, a prevenção de litígios e adoção de soluções consensuais para os conflitos, a garantia dos direitos fundamentais e o fortalecimento da relação institucional do poder judiciário com a sociedade são macrodesafios estratégicos do Poder Judiciário, nos termos da Resolução/CNJ nº 325/2020;

 

CONSIDERANDO ser imprescindível estimular, apoiar e difundir a sistematização e o aprimoramento das práticas já adotadas pelos tribunais;

 

 CONSIDERANDO a deliberação do Plenário do CNJ, nos autos da Nota Técnica no XXXXXXXX, na XXXª Sessão Ordinária, realizada em XXXXXX,

 

RESOLVE: 

Dirigir-se ao Congresso Nacional para apresentar manifestação favorável à aprovação do Projeto de Lei Complementar nº 33/2020 (PLP 33), na forma do relatório e substitutivo aprovados na Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio e Serviços da Câmara dos Deputados, com a inclusão de emendas para modificação dos artigos 5º, 6º e 13 da Lei 13.140/2015, que pretende instituir o marco legal do reempreendedorismo, estabelecendo e disciplinando a renegociação especial extrajudicial, a renegociação especial judicial, a liquidação simplificada extrajudicial e a liquidação simplificada judicial do microempreendedor individual, das microempresas e das empresas de pequeno porte e das pessoas naturais e jurídicas que especifica, e dá outras providências.

 

I)                   RESUMO DA PROPOSTA

1.                   O Projeto de Lei Complementar nº 33/2020, na forma do relatório e substitutivo aprovado na Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio e Serviços da Câmara dos Deputados, foi concebido com o escopo de estabelecer e disciplinar a renegociação especial extrajudicial, a renegociação especial, a liquidação simplificada, além de dispor sobre a falência das microempresas e das empresas de pequeno porte.

 

2.                   Após aprovação no Senado Federal, o Projeto de Lei nº 33/2020, denominado ‘Marco Legal do Reempreendedorismo” seguiu para a Câmara dos Deputados e foi apreciado pela Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio e Serviços, aprovado na forma do relatório e substitutivo do então Relator, considerado para elaboração desta Nota Técnica.

 

3.                   A exposição de motivos do Projeto, bem como a motivação do então Relator esclarecem a necessidade de criação de dispositivo específico ao chamado reempreendedorismo de micro e pequenas empresas, arguindo que a vigente Lei de Recuperação e Falências (Lei 11.101/2005) não bastou para atender às particularidades deste segmento do empresariado, destacando que esta criação não inviabiliza a celeridade dos procedimentos e almejada eficiência do Poder Judiciário.

 

4.                   O Projeto aguarda análise da Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados, sendo objeto de pedido de urgência na referida Casa Legislativa.

 

II)                 CABIMENTO DA NOTA TÉCNICA

 

5.       A atuação do CNJ está legitimada no art. 103, I e II do RICNJ:

Art. 103. O Plenário poderá, de ofício ou mediante provocação:

I - elaborar notas técnicas, de ofício ou mediante requerimento de agentes de outros Poderes, sobre políticas públicas que afetem o desempenho do Poder Judiciário, anteprojetos de lei, projetos de lei, e quaisquer outros atos com força normativa que tramitam no Congresso Nacional, nas Assembleias Legislativas ou em quaisquer outros entes da Administração Pública Direta ou Indireta, quando caracterizado o interesse do Poder Judiciário;

II - elaborar notas técnicas sobre normas ou situações específicas da Administração Pública quando caracterizado o interesse do Poder Judiciário;

III - elaborar notas técnicas endereçadas ao Supremo Tribunal Federal relativas aos projetos de lei de iniciativa do Poder Judiciário.

 

 

 

III)              CONVENIÊNCIA E OPORTUNIDADE DE EXPEDIÇÃO DE NOTA TÉCNICA

6.                   A matéria objeto da proposta do Projeto do Marco Legal do Reempreendedorismo encontra-se no âmbito de competências constitucionais expressas no Conselho Nacional de Justiça, porquanto afeta – direta ou indiretamente – o exercício da função jurisdicional e da atuação dos registros públicos e ao atribuir ao Conselho a competência para estabelecer procedimentos e documentos padronizados com o objetivo de permitir o acesso aos procedimentos dispostos no Projeto em análise.

 

7.                   Ademais, este Conselho editou a Resolução nº 125/2010, instituindo a Política Jurídica Nacional de Tratamento Adequado de Conflitos de Interesses, conjunto de medidas para assegurar a todos o direito à solução de conflitos por meios adequados à sua natureza e peculiaridades.

 

8.                   De igual modo, o CNJ, ao aprovar a Resolução nº 325/2020, estabeleceu: a garantia dos direitos fundamentais, o fortalecimento da relação institucional do Poder Judiciário com a sociedade, a celeridade e produtividade na prestação jurisdicional e a adoção de soluções alternativas de conflito como macrodesafios estratégicos do Poder Judiciário.

 

9.                   Assim, mostra-se conveniente e oportuna a tomada de posição institucional do Conselho Nacional de Justiça quanto ao Projeto de Lei referido.

 

 

IV)               ANÁLISE DA PROPOSTA

 

10.               O Projeto de Lei nº 33/2020, preocupando-se com a expressividade das micro e pequenas empresas no cenário nacional, tendo em vista a insuficiência da legislação vigente, pretende a criação de quatro mecanismos de soerguimento dos pequenos e microempresários em dificuldades financeiras, quais sejam: (i) Renegociação Especial Extrajudicial; (ii) Renegociação Especial Judicial; (iii) Liquidação Simplificada Extrajudicial e (iv) Liquidação Simplificada Judicial.

 

11.               O Procedimento de Renegociação Especial Extrajudicial estimula a realização de mediação entre devedor e seus credores, conduzida por entidade de classe do segmento empresário postulante, bem como nos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSC), além de atribuir às partes, assistidas por advogados e profissionais contábeis, a legitimidade para verificar a conformidade legal da documentação do devedor, bem como acordar as condições do plano de pagamento, arquivando-se na forma da Lei, independente da tutela jurisdicional, encorajando a resolução extrajudicial de conflitos – objetivada também por este Conselho.

 

12.               A necessidade de serem arquivados nos registros públicos os instrumentos que formalizarem a composição entre devedor e credores busca atribuir maior transparência e segurança jurídica, dando maior celeridade e eficiência ao procedimento. 

 

13.               De igual sorte, a Liquidação Simplificada Extrajudicial estabelece ao Micro e Pequeno empresário, cuja atividade se tornou inviável, procedimento similar à liquidação e encerramento estabelecidos para as sociedades limitadas, desonerando o Poder Judiciário.

 

14.               Assim como previsto para a Renegociação Especial Extrajudicial, o procedimento de Liquidação Simplificada Extrajudicial também estabelece a necessidade de serem arquivados, nos registros públicos, os instrumentos que formalizarem a liquidação dos ativos do devedor de pequeno porte.

 

15.               Ao dispor sobre a Renegociação Especial Judicial, em que pese se tratar de criação de novo procedimento jurídico, verifica-se esforço do legislador em desonerar o Poder Judiciário, permitindo a realização de mediação e conciliação prévias com os credores, perante entidade de classe do segmento empresário postulante, bem como nos CEJUSC, determinando que o plano de pagamento dos credores, já com a concordância destes, seja acostado juntamente com os demais documentos exigidos, imprimindo celeridade e eficiência ao procedimento.

 

16.               A Liquidação Simplificada Judicial estabelece mecanismo ao Micro e Pequeno empresário cuja atividade se tornou inviável que desejar valer-se do Poder Judiciário para regular o encerramento de sua atividade, dando baixa em seus registros. Nesse procedimento, há avanços em relação à legislação em vigor, como a primazia da celeridade e efetividade jurisdicional, referendados por este Conselho na Resolução nº 325 de 29 de junho de 2020.

 

17.               Ao criar disposições que visam democratizar e imprimir eficiência no acesso à Justiça de segmento que representa aproximadamente 99% do empresariado nacional[1], o Projeto de Lei referenda o quanto aprovado por este Conselho à Resolução nº 325 de 29 de junho de 2020, especialmente os macrodesafios de garantia dos direitos fundamentais, fortalecimento da relação institucional do Poder Judiciário com a sociedade, agilidade e produtividade na prestação jurisdicional e prevenção de litígios e adoção de soluções consensuais para os conflitos, além de primar pela melhoria no ambiente de negócios do Brasil.

 

18.               Com o objetivo de compatibilizar a Lei nº 13.140, de 26 de junho de 2015 (a “Lei de Mediação”) para que a mediação também seja utilizada em processos envolvendo múltiplas partes, em especial processos de insolvência, recomendamos que seja incluído no PLP 33/2020 modificações e adequações à Lei de Mediação, com o objetivo de adequá-la e compatibilizá-la à realidade e necessidade dos processos regulados pelo PLP 33/2020, de forma a garantir maior segurança jurídica para a mediação, um dos pilares fundamentais para o sucesso do PLP 33/2020, removendo as incertezas que podem impedir a sua utilização de forma adequada e em maior escala, conforme abaixo segue:

 

Art. 5º.

 

§ 1º. A pessoa designada para atuar como mediador tem o dever de revelar às partes, antes da aceitação da função, qualquer fato ou circunstância que possa suscitar dúvida justificada em relação à sua imparcialidade para mediar o conflito, oportunidade em que poderá ser recusado por qualquer delas. [RN]

 

§2º. Não constituirá fato ou circunstância a suscitar dúvida em relação à imparcialidade e à independência do candidato a mediador em mediação antecedente ou incidental, o fato de já ter representado, pessoalmente ou por intermédio do escritório a que pertence, uma das partes da mediação, salvo se tiver atuado nas questões objeto da mediação.

 

Art. 6º

 

Parágrafo único. Exceto nos casos em que o mediador tenha atuado na questão objeto de mediação como advogado de uma das partes envolvidas na mediação, o impedimento previsto no caput deste artigo não se aplica à atuação dos mediadores em processos, judiciais e extrajudiciais, de insolvência, incluindo aqueles regidos pela Lei 11.101/05, pela Lei 14.193/21 e pela Lei que instituir o Marco Legal do Reempreendedorismo.

 

Art. 11.

 

§ 1º. A capacitação de mediador para a atuação em litígios envolvendo matéria de direito empresarial, incluindo os processos, judiciais e extrajudiciais, de insolvência, incluindo aqueles regidos pela Lei 11.101/05, pela Lei 14.193/21 e pela Lei que instituir o Marco Legal do Reempreendedorismo, deve ser distinto da capacitação de mediador para atuação em processos comuns e deve exigir conhecimentos mínimos de direito empresarial, além de técnicas de mediação e negociação complexas com múltiplas partes.

 

§ 2º A formação de mediador para atuação em processos de direito empresarial pode ser dispensada:

 

I - em caso de notório conhecimento e atuação em processos nos quais o profissional for chamado a mediar;

 

II -  na hipótese de nomeação por consenso entre as partes ou de nomeação de um comediador que possua referida experiência.

 

Art. 13.

Parágrafo único. O mediador, o árbitro e o conciliador poderão requerer que o pagamento dos honorários que lhes caibam seja efetuado em favor da sociedade de advogados que integra na qualidade de sócio, sem que o exercício de referidas funções, nem tampouco o recebimento dos honorários pela sociedade da qual integra, implique em alteração da natureza uniprofissional de sua atuação e do regime tributário a que ele e/ou à sociedade que integra estão sujeitos na prática da advocacia

 

 

19.               As emendas ao Projeto de Lei para modificação artigos 5º, 6º e 13 da Lei 13.140/2015, acima sugeridas, tem por objetivo sanar limitações à atuação dos profissionais habilitados para os exercícios da função mediadora nos processos de recuperação judicial e falência, dado o envolvimento de múltiplas partes. Da mesma forma, a necessidade de o(a) mediador(a) ter reconhecida experiência em processos de insolvência, prevista na Recomendação nº 58 deste Conselho Nacional de Justiça, distingue a formação exigida para que o mediador atue em processos comuns. E mais, a dúvida quanto a sujeição ao regime tributário do advogado candidato a mediador também acaba por constituir obstáculo à aceitação da nomeação por profissionais com especialização e reconhecida experiência na matéria.

 

20.               Nessa esteira, as emendas propostas produzirão a adequação da legislação em vigor à nova realidade trazida pela Lei 14.112/2020 e a ampliação da utilização da mediação em processos judiciais.

 

21.               Assim, ao ampliar e adequar os mecanismos de mediação e conciliação - seja atribuindo às partes legitimidade para solução da controvérsia mediante procedimentos extrajudiciais, seja facilitando a composição perante entidades de classe, ou mesmo obstáculos para um uso mais amplo dos mecanismos em processos de recuperação e falência - o Projeto de Lei se alia às diretrizes aprovadas por este Conselho, em especial, as Resoluções nº 125 de 29 de novembro de 2010 e nº 325 de 29 de junho de 2020.

 

22.               Por fim, destaca-se a relevância do artigo 56 do Projeto de Lei que reconhece a competência deste Conselho para estabelecer procedimentos e documentos patronizados com o objetivo de assegurar maior eficiência e controle dos atos praticados, o que também se alia à Estratégia Nacional do poder Judiciário de 2021 a 2026.

 

IV        CONCLUSÃO

Em conclusão, e por tais motivos, o Conselho Nacional de Justiça manifesta-se favoravelmente à aprovação do Projeto de Lei Complementar nº 33/2020, na forma do relatório e substitutivo aprovado na Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio e Serviços da Câmara dos Deputados, com as emendas para modificação dos artigos 5º, 6º e 13 da Lei 13.140/2015.

A presente Nota Técnica foi aprovada, por unanimidade, pelo Plenário do Conselho Nacional da Justiça na sessão realizada nesta data, conforme certidão anexa.

Encaminhe-se cópia desta Nota Técnica aos Presidentes do Senado Federal e da Câmara dos Deputados, à Casa Civil da Presidência da República, ao Ministro da Justiça, à Secretaria da Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça e ao Procurador-Geral da República.

 

 

Ministro LUIZ FUX

 

 



[1]https://www.sebrae.com.br/sites/PortalSebrae/ufs/sp/sebraeaz/pequenos-negocios-em-numeros,12e8794363447510VgnVCM1000004c00210aRCRD#:~:text=No%20Brasil%20existem%206%2C4,(16%2C1%20milh%C3%B5es), acesso em 15-jun-22.