EMENTA

 

REPRESENTAÇÃO POR EXCESSO DE PRAZO. COMPETÊNCIA ORIGINAL, AUTÔNOMA E CONCORRENTE DO CNJ PARA APURAÇÃO, A QUAL SE COADUNA COM A DELEGAÇÃO À CORREGEDORIA LOCAL/ESPECIALIZADA.

 

1.         O Supremo Tribunal Federal já assentou em duas oportunidades (AgRg no MS n. 36055/2019 e MS n. 28.513/2015) que a competência do CNJ é original, autônoma e concorrente, no que respeita a procedimentos apuratórios e disciplinares.

 

2.         Essa competência, quando delegada às Corregedorias locais/especializadas, em especial sob controle e fiscalização da Corregedoria Nacional de Justiça, respeita a natureza constitucional que foi explicitada pelo STF e não traz qualquer prejuízo aos representantes, os quais podem, inclusive, voltar a demandar o CNJ, se assim se fizer necessário.

 

A42

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto da Relatora. Declarou suspeição a Conselheira Candice L. Galvão Jobim. Presidiu o julgamento o Ministro Luiz Fux. Plenário Virtual, 28 de maio de 2021. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Luiz Fux, Maria Thereza de Assis Moura, Emmanoel Pereira, Luiz Fernando Tomasi Keppen, Rubens Canuto, Tânia Regina Silva Reckziegel, Mário Guerreiro, Flávia Pessoa, Ivana Farina Navarrete Pena, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, André Godinho, Maria Tereza Uille Gomes e Luiz Fernando Bandeira de Mello. Não votaram os Excelentíssimos Conselheiros Candice L. Galvão Jobim (suspeição declarada) e, em razão da vacância do cargo, o representante do Ministério Público da União.

RELATÓRIO

 

            A EXMA. SRA. MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, CORREGEDORA NACIONAL DE JUSTIÇA (Relatora):

 

           Trata-se de representação por excesso de prazo formulada por ASSOCIACÃO BEBO XIKRIN DO BACAJA contra o Desembargador Federal JOÃO BATISTA MOREIRA, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região.

          

            A peticionante requereu a apuração de morosidade na tramitação do processo de autos nº1023776-80.2019.4.01.0000.

             Relata que se trata de “Agravo de Instrumento interposto contra decisão monocrática proferida nos autos da Ação Civil Pública (Proc. nº 1000305-06.2018.4.01.3901) pelo Juiz da 2ª Vara Federal Cível e Criminal da Subseção Judiciária de Marabá, no Estado do Pará, tendo como partes requerentes a Associação Indígena Baypra de Defesa do Povo Xikrin do O-odja, a Associação Indígena Kakarekre de Defesa do Povo Xikrin do Djudjeko e a Associação Indígena Porekro de Defesa do Povo Xikrin do Catete e, como litisconsorte, a Associação Indígena Bebo Xikrin do Bacaja, referente ao Projeto Salobo S.A, tendo como partes demandadas Vale S.A., Salobo Metais S/A, Fundação Nacional Do Índio – FUNAI -, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, e Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBIO”. Alega que “o magistrado a quo, em apertadíssima síntese, deferiu o pedido para que a empresa VALE S/A e a SALOBO S/A deem início, em 60 dias, ao procedimento descrito no Anexo II-B da Portaria Interministerial nº 60, de 24 de março de2015, submetendo o currículo dos consultores que irão desenvolver os trabalhos e observando as demais especificações lá constantes” e que “a Vale S/A interpôs o presente agravo de instrumento, requerendo a imediata concessão de efeito ativo, para revogar a decisão agravada, unicamente no tocante à determinação da realização de ECI, por absoluta ausência de substrato legal”. Acrescenta que a “Autoridade Representada, em decisão monocrática, julgou negando seguimento ao agravo de instrumento”, tendo a Vale S/A interposto agravo interno. Assevera que todas as partes já apresentaram contrarrazões e o órgão ministerial já apresentou parecer, estando o processo pronto para julgamento, razão pela qual requer a intervenção da Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça para o prosseguimento da causa. 

      

        Em 24/02/2021 (ID 4266771), decidi pelo arquivamento do feito com delegação à Corregedoria-Geral da Justiça Federal, nos seguintes termos:

                     

           Em consulta ao sítio eletrônico do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, verifica-se que o Agravo de instrumento nº 1023776-80.2019.4.01.0000 foi concluso ao relator para o processamento e julgamento em 01/08/2019. Em 02/09/209, o Magistrado prolatou decisão negando provimento ao recurso. Após manifestações das partes contrárias e do Ministério Público Federal em dezembro de 2019, com exceção de juntada de “outras peças” em 19/01/2021 e de juntada de “petições intercorrentes” em 12/02/2021 e 19/02/2021, o feito não recebe qualquer outro impulso oficial desde 29/01/2020, quando foi concluso ao Relator para o julgamento do agravo interno.

Dessa feita, reputo necessária a apuração da existência de eventual morosidade injustificada no trâmite processual.

A Corregedoria à qual o magistrado está vinculado, por ser responsável imediata pela supervisão dos trabalhos desenvolvidos pelos magistrados e pelas varas de primeiro grau de jurisdição, e por conhecer a estrutura e as características relacionadas a todas as unidades judiciais sob sua jurisdição, tem condições adequadas de apurar, com qualidade e efetividade, eventuais irregularidades na tramitação processual do feito em questão.

Ante o exposto, comunique-se à Corregedoria-Geral da Justiça Federal para apuração cientificando-a de que:

a) a ora representante deverá figurar no polo ativo do procedimento administrativo instaurado em âmbito local, sendo necessariamente intimada de todos os atos processuais; b) esta Corregedoria Nacional deve ser informada do número do expediente instaurado pela Corregedoria-Geral; c) não é o caso de aplicação da Resolução CNJ n. 135.

Intime-se a representante cientificando-a de que ulteriores informações devem ser buscadas junto à Corregedoria-Geral da Justiça Federal (https://www.cjf.jus.br/ cjf/corregedoria-da-justica-federal/corregedoria-geral-da-justica-federal).

Com a informação do número do expediente instaurado pela Corregedoria-Geral, arquivem-se os autos, com baixa.

 

                Em 27/02/2021 (ID 4270974) a representante, irresignada, apresentou, tempestivamente, recurso administrativo.

 

            Nas razões recursais alega que a competência para apuração de infrações disciplinares praticadas por juízes é concorrente entre o CNJ e as Corregedorias locais, mas reclama a atuação direta, originária, deste CNJ, em detrimento da apuração pela Corregedoria-Geral da Justiça Federal, já que não há necessidade de esgotamento dessa via. Traz em socorro à sua tese julgado do STF, no MS n. 28.513/2015. Cita também as previsões do art. 103-B, § 4º, III, da CF, e as  contidas no Regimento Interno do CNJ e no Regulamento Geral da Corregedoria Nacional.

 

            O requerido, intimado, não apresentou contrarrazões.

 

            É o relatório.

A42

VOTO

 

            A EXMA. SRA. MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, CORREGEDORA NACIONAL DE JUSTIÇA (Relatora):

 

        O presente recurso assenta suas razões, basicamente, na impropriedade de delegação das atribuições apuratórias desta Corregedoria Nacional de Justiça às Corregedorias locais/especializadas, dado que sua competência correicional seria concorrente e não subsidiária a dessas últimas, razão por que deveria atuar desde logo e diretamente nas representações que recebe. A recorrente traz, em abono à sua tese, decisão do STF, no MS 28.513/2015, Rel., Min. TEORI ZAVASCKI.

 

            Pois bem.

 

            O recurso não prospera por pelo menos duas razões.

 

            A primeira delas tem raiz na própria interpretação dada pelo STF, à natureza da competência do CNJ. Assim é que o precedente trazido pela recorrente, ao invés de reforçar sua tese, antes a enfraquece. Vejamos qual foi o contexto da impetração e como o assunto foi decidido nesse e em outro precedente, de todo semelhante, pelo STF.

 

            No MS 28.513/2015, o impetrante, Antônio Souza Prudente, magistrado do TRF-1, se voltava contra ato praticado pelo Corregedor Nacional de Justiça, que instaurara sindicância para apurar ocorrências de violação à LOMAN. A apuração decorreu de fatos acontecidos no Aeroporto de Palmas/TO, quando o impetrante não teria permitido inspeção de sua bagagem de mão por agentes públicos, responsáveis pela fiscalização. O impetrante alegava que a competência do CNJ é sempre subsidiária e que, na espécie, não foi dada oportunidade ao órgão Especial do TRF-1, ou à Corregedoria do Conselho da Justiça Federal, a fim de que exercesse sua competência para processar e julgar caso de natureza disciplinar.

 

            Em hipótese muito parecida, no MS 36.055/2019, Siro Darlan de Oliveira, Desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, se voltava contra ato praticado pelo Plenário do CNJ, qual seja, a instauração de PAD - Procedimento Administrativo Disciplinar. Asseverava que o Pleno do Conselho reconhecera a existência de indícios de falta grave nas suas condutas. Insistia em que os mesmos fatos que ensejaram a instauração do processo administrativo já eram objeto de investigação pela Corregedoria do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro – a Corregedoria local - e que não se havia de falar, ao contrário do que sustentado pelo Conselho, em competência concorrente. Sustentava que a competência da Corregedoria do Rio de Janeiro precedia e afastava a do CNJ.

 

            Diante dessas controvérsias, nos dois precedentes, o STF assentou que a competência do CNJ é originária e concorrente e não subsidiária à atuação primeira da Corregedoria local. Dito de outra forma, isso significa que o CNJ é quem tem precedência (competência original) para atuar sozinho (competência autônoma) ou em cooperação (competência concorrente) com as Corregedorias Gerais ou Regionais, se assim entender de fazê-lo, usando de seu poder discricionário.  Numa palavra, ele pode mais e não menos, no que respeita às atividades fiscalizatórias e disciplinares que lhe competem.

 

            Confiram-se as ementas:

 

1.            MS 28.513/2015

Órgão julgador: Segunda Turma

Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI

Julgamento: 15/09/2015

Publicação: 28/09/2015

Ementa: CONSTITUCIONAL E ADMIISTRATIVO. CNJ. COMPETÊNCIA AUTÔNOMA. REGULARIDADE NA DESIGNAÇÃO DE MAGISTRADO AUXILIAR PARA INSTRUÇÃO DE SINDICÂNCIA. ORDEM DENEGADA. 1. O Conselho Nacional de Justiça tem competência constitucional autônoma, e não subsidiária, da competência dos demais tribunais. 2. É regular a designação de juiz auxiliar, seja ele originário do Judiciário estadual ou federal, para a condução de sindicância, por delegação do Corregedor-Nacional de Justiça, ainda que o investigado seja magistrado federal. 3. Segurança denegada. Grifamos.

 

   2.        MS 36.055/2019 AgR

Órgão julgador: Segunda Turma

Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI

Julgamento: 22/02/2019

Publicação: 28/02/2019

 

Ementa: AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE SEGURANÇA. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ. COMPETÊNCIA. ATRIBUIÇÃO CORREICIONAL ORIGINÁRIA E AUTÔNOMA DO CONSELHO. AUSÊNCIA DE INJURIDICIDADE OU MANIFESTA IRRAZOABILIDADE DO ATO IMPUGNADO. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. I – O STF assentou que o CNJ possui atribuição correcional originária e autônoma, não se tratando de atuação subsidiária frente aos órgãos de correição local, mas sim de competência concorrente, de modo que seu exercício não se submete a condicionantes relativas ao desempenho da competência disciplinar pelos tribunais locais. II – O controle dos atos do CNJ pelo STF somente se justifica nas hipóteses de (i) inobservância do devido processo legal; (ii) exorbitância das competências do Conselho; e (iii) injuridicidade ou manifesta irrazoabilidade do ato impugnado (MS 35.100 / DF, Relator Min. Roberto Barroso). Tais hipóteses não estão caracterizadas no caso sub judice. III – Agravo regimental a que se nega provimento. Grifamos.

 

               No caso em análise, no exercício pleno de sua competência original, autônoma e concorrente, esta Corregedoria analisou primeiro a representação aqui deduzida, entendeu que a apuração da mora se fazia necessária e determinou o seu processamento pela Corregedoria local e especializada qual seja, a Corregedoria-Geral da Justiça Federal, à luz de certas regras, sob seu controle e fiscalização. São elas: (a) que a representante figurasse no polo ativo do procedimento que viesse a ser instaurado naquele órgão; (b) que fosse intimada de todos os atos praticados; e (c) que esta Corregedoria Nacional recebesse o nº do processo lá instaurado.

 

            Conclui-se, pois, que a delegação nesses moldes observa o quanto decidido pelo Supremo Tribunal Federal, em todos os aspectos da natureza da competência apuratória do CNJ (original, autônoma e concorrente), além de ter o importante propósito de conferir maior celeridade à solução dos casos, em prol dos jurisdicionados.

 

            Em segundo lugar, esta forma cooperativa de proceder não traz à recorrente qualquer prejuízo, na medida em que, além de ter reconhecido previamente o seu direito à apuração da mora, por este Conselho Nacional, com a determinação de acompanhamento de seu processo por um Colegiado aparelhado para tanto, não fica ela impedida de voltar a representar neste CNJ, diante de alguma circunstância superveniente que assim o recomende.

 

            Do exposto, nego provimento ao recurso.

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