Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0001123-91.2022.2.00.0000
Requerente: ÁUREO MARCOS RODRIGUES
Requerido: JULIANO PEDRO GIRARDELLO

 


 

RECURSO ADMINISTRATIVO EM PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. MATÉRIA DE NATUREZA EMINENTEMENTE JURISDICIONAL. IMPOSSIBILIDADE DE REEXAME. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS MÍNIMOS INDICATIVOS DA OCORRÊNCIA DE INFRAÇÃO DISCIPLINAR. FALTA DE JUSTA CAUSA. RECURSO ADMINISTRATIVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.  

1. Os fatos narrados neste expediente tratam de matéria eminentemente jurisdicional. Em tais casos, deve a parte valer-se dos meios processuais adequados, não cabendo a intervenção do Conselho Nacional de Justiça.

2. A correção do alegado equívoco jurídico praticado pelo Magistrado, na condução do Processo, deve ser requerida pela via jurisdicional. O CNJ, cuja competência está restrita ao âmbito administrativo do Poder Judiciário, não pode intervir em decisão judicial para corrigir eventual vício de ilegalidade ou nulidade, porquanto a matéria aqui tratada não se insere em nenhuma daquelas atribuições previstas no art. 103-B, § 4º, da Constituição Federal.

3. É inadmissível a instauração de procedimento disciplinar quando inexistentes indícios ou fatos que demonstrem que o magistrado tenha descumprido deveres funcionais ou incorrido em desobediência às normas éticas da magistratura.

4. A demonstração de justa causa é requisito essencial para a instauração de PAD, conforme reiterada jurisprudência do Conselho Nacional de Justiça.

5. Recurso Administrativo a que se nega provimento. 

 

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto da Relatora. Presidiu o julgamento o Ministro Luiz Fux. Plenário Virtual, 12 de agosto de 2022. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Luiz Fux, Maria Thereza de Assis Moura (Relatora), Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Marcio Luiz Freitas, Giovanni Olsson, Sidney Madruga, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto, Mário Goulart Maia e Luiz Fernando Bandeira de Mello.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0001123-91.2022.2.00.0000
Requerente: ÁUREO MARCOS RODRIGUES
Requerido: JULIANO PEDRO GIRARDELLO


RELATÓRIO


            

A MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, CORREGEDORA NACIONAL DE JUSTIÇA (Relatora): 

Cuida-se de Recurso Administrativo interposto por ÁUREO MARCOS RODRIGUES contra decisão da Corregedoria Nacional de Justiça que arquivou o Pedido de Providências apresentado em desfavor de JULIANO PEDRO GIRARDELLO, Juiz do Trabalho na comarca de Cáceres-MT.  

Na inicial, insurgiu-se o requerente contra o reclamado por violação reiterada dos crimes descritos nos artigos 155, 171, 288, 299, 317, 319 e 339, todos do Código Penal e dos crimes descritos nos artigos 1º, 4º, 27, 30, 33, 36 e 37, todos da Lei n. 13.869/2019, que dispõe sobre os crimes de abuso de autoridades.

Questionou a competência para julgamento do Processo 0000024- 07.2019.5.23.0031, afirmando não se tratar de matéria afeta à Justiça do Trabalho.

Apresentou argumentação confusa, afirmando a existência de bloqueio ilegal em sua conta corrente e a aplicação indevida de multa prevista no artigo 1.026, § 2º, do CPC.

Requereu a abertura de procedimento administrativo, pois a justiça do trabalho seria suspeita e incompetente para processar e julgar o feito, que versaria sobre cobrança de honorários advocatícios; fosse reconhecida uma justa indenização no valor de dez vezes o valor da causa, com base nos artigos 37, § 6º, da Constituição Federal, 143 do Código de Processo Civil e 49 da LOMAN; fossem desbloqueados os valores que teriam sido saqueados e roubados das contas bancárias do querelante, por decisão de magistrado suspeito e incompetente; e fosse instaurada Ação Penal para investigar o magistrado.

A Corregedoria Nacional de Justiça arquivou sumariamente o expediente, em razão da natureza jurisdicional do ato impugnado e da ausência de justa causa para a instauração de procedimento disciplinar (Id. 4666406).

O requerente interpôs este Recurso Administrativo, no qual alega, de início, a suspeição da Corregedora Nacional de Justiça para o julgamento deste procedimento administrativo.  

Afirma que a Reclamação Disciplinar não pode ser indeferida sob o argumento da impossibilidade de apreciar matéria de índole jurisdicional, uma vez que o que se busca é demonstrar o desvio de conduta humana.

Alega que a competência para o julgamento do Processo 0000024- 07.2019.5.23.0031 não é da Justiça do Trabalho, pois possui natureza unicamente cível.

Sustenta que o magistrado requerido deve ser punido pois praticou infração disciplinar, bem como falta funcional.

Requer o provimento do Recurso Administrativo.  

O requerido não apresentou contrarrazões.

É o relatório.    

 

A08/Z10

 

 

 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0001123-91.2022.2.00.0000
Requerente: ÁUREO MARCOS RODRIGUES
Requerido: JULIANO PEDRO GIRARDELLO

 


VOTO

            

A MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, CORREGEDORA NACIONAL DE JUSTIÇA (Relatora):   

Inicialmente, quanto à Arguição de Suspeição desta Corregedora Nacional, verifico que o incidente não pode ser processado neste Procedimento Administrativo.  

Com efeito, a Arguição de Suspeição deve ser endereçada de forma autônoma ao Presidente do CNJ e na classe própria (ASI), conforme determinam os artigos 43, inciso XI e 47, ambos do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça. 

Ademais, não se verificam as hipóteses objetivas e subjetivas ocasionadoras de suspeição, sendo importante mencionar que as exceções de suspeição apresentadas em desfavor desta Corregedora já foram arquivadas pelo Presidente do CNJ (ASI 0000903-93.2022.2.00.0000, 0008985-50.2021.2.00.0000 e 0008681-51.2021.2.00.0000).

Dito isto, compulsando os autos, constata-se que as razões recursais não são suficientes para alterar a compreensão de que a pretensão do recorrente se direciona à revisão de atos de natureza estritamente jurisdicional, sem repercussão disciplinar.  

Conforme consta na decisão impugnada, toda a irresignação do requerente busca, ao fim, discutir aspectos jurídicos relacionados às decisões proferidas nos autos do Processo 0000024-07.2019.5.23.0031, matéria eminentemente jurisdicional e não afeta ao Conselho Nacional de Justiça.

O acerto ou desacerto das decisões deve ser debatido no campo processual próprio e escapa das atribuições da Corregedoria Nacional de Justiça. 

O que se verifica, neste caso, é a tentativa de trazer para o âmbito disciplinar questões que devem ser solvidas nos autos do processo e nos incidentes e recursos colocados à disposição das partes pela legislação processual civil. A utilização de via correcional para solucionar ato jurisdicional, contra o qual a lei processual previu o recurso cabível, é expediente que não deve ser admitido, em respeito à independência funcional do magistrado. Do contrário, inviabilizaria o exercício do seu munus público, livre de qualquer pressão ou de interferência externa. 

Com efeito, a solução de eventual equívoco incorrido pelo julgador na condução do processo deve ser buscada na jurisdição e não pela via correcional, que se restringe, nos termos do art. 103-B, § 4º, da Constituição Federal, "ao controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes".  

Nesse sentido, menciono o seguinte precedente:

 

“RECURSO ADMINISTRATIVO. RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR. DESVIO DE CONDUTA DO MAGISTRADO. NÃO OCORRÊNCIA. MATÉRIA JURISDICIONAL.

1. Não se verificam elementos probatórios mínimos de falta funcional da magistrada que justifiquem a instauração de procedimento disciplinar no âmbito desta Corregedoria.

2. Conforme assentado na decisão de arquivamento, nota-se que a irresignação do reclamante se refere a exame de matéria eminentemente jurisdicional. Em tais casos, deve a parte valer-se dos meios processuais adequados, não cabendo a intervenção do Conselho Nacional de Justiça.

3. O CNJ, cuja competência está restrita ao âmbito administrativo do Poder Judiciário, não pode intervir em decisão judicial para corrigir eventual vício de ilegalidade ou nulidade, porquanto a matéria aqui tratada não se insere em nenhuma das previstas no art. 103-B, § 4º, da Constituição Federal.

Recurso administrativo improvido.” (CNJ - RA – Recurso Administrativo em RD - Reclamação Disciplinar - 0009249-38.2019.2.00.0000 - Rel. HUMBERTO MARTINS - 70ª Sessão Virtual - julgado em 31/07/2020) 

 

Demais disso, as questões relativas à eventual parcialidade de magistrado possuem via própria e prevista na legislação processual, devendo ser sanadas por meio das exceções de suspeição ou impedimento, não se destinando a via administrativa a tal desiderato.

Nesse sentido: 

“RECURSO ADMINISTRATIVO. RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR. DESVIO DE CONDUTA DO MAGISTRADO. NÃO OCORRÊNCIA. MATÉRIA JURISDICIONAL.

1. Não se verificam elementos probatórios mínimos de falta funcional da magistrada que justifiquem a instauração de procedimento disciplinar no âmbito desta Corregedoria.

2. Conforme assentado na decisão de arquivamento, nota-se que a irresignação do reclamante se refere a exame de matéria eminentemente jurisdicional. Em tais casos, deve a parte valer-se dos meios processuais adequados, não cabendo a intervenção do Conselho Nacional de Justiça.

3. O CNJ, cuja competência está restrita ao âmbito administrativo do Poder Judiciário, não pode intervir em decisão judicial para corrigir eventual vício de ilegalidade ou nulidade, porquanto a matéria aqui tratada não se insere em nenhuma das previstas no art. 103-B, § 4º, da Constituição Federal.

Recurso administrativo improvido.” (CNJ - RA – Recurso Administrativo em RD - Reclamação Disciplinar - 0009249-38.2019.2.00.0000 - Rel. HUMBERTO MARTINS - 70ª Sessão Virtual - julgado em 31/07/2020)

 

Outrossim, nos termos do entendimento do Conselho Nacional de Justiça, é inadmissível a instauração de procedimento disciplinar quando inexistentes indícios ou fatos que demonstrem que o magistrado tenha descumprido deveres funcionais ou incorrido em desobediência às normas éticas da magistratura.

A instauração de PAD pressupõe que as imputações tenham sido respaldadas por provas ou indícios suficientes, que evidenciem a prática de condutas ilícitas por parte do magistrado, não podendo os procedimentos disciplinares ter prosseguimento em hipóteses circunscritas a simples ilações, referências genéricas e conjecturas pessoais.

Dessarte, a demonstração de justa causa é requisito essencial para a instauração de PAD, conforme ressaltado no seguinte julgado:

 

“RECURSO ADMINISTRATIVO EM RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR. AUSÊNCIA DE CONDUTA ILÍCITA. NÃO DEMONSTRADO ELEMENTO SUBJETIVO DA CONDUTA. ART. 8º, INCISO I, DO REGIMENTO INTERNO DA CORREGEDORIA NACIONAL DE JUSTIÇA.

1. Exame de matéria eminentemente jurisdicional. Impossibilidade de análise do acerto ou desacerto das decisões jurídicas pela via correcional.

2. Em âmbito administrativo-disciplinar, é necessário que se leve em conta o caso concreto e o elemento subjetivo da conduta do magistrado para verificação da existência de indícios de desvio de conduta na prática de ato jurisdicional, o que não se verifica neste caso.

3. O art. 8º, inciso I, do Regimento Interno da Corregedoria Nacional de Justiça exige o arquivamento sumário das reclamações que, entre outras, se apresentem manifestamente improcedentes.

4. Não há justa causa ou razoabilidade para instauração de procedimento administrativo disciplinar.

5. Ausência de infringência aos deveres funcionais ou de conduta ilícita da magistrada.

Recurso administrativo improvido.”

(CNJ - RA – Recurso Administrativo em RD - Reclamação Disciplinar – 0008092- 30.2019.2.00.0000 – Rel. HUMBERTO MARTINS – 62ª Sessão Virtual - julgado em 27/3/2020).  

 

No presente caso, a insurgência tal como posta não revela a existência de elementos mínimos que configurem a prática de infração disciplinar ou de desvio funcional pelo requerido. 

Por fim, vale registrar que, em consulta ao Sistema de Informações Processuais do Conselho Nacional de Justiça, observou-se que o Sr. AUREO MARCOS RODRIGUES figura no polo ativo em 36 procedimentos deste Conselho Nacional de Justiça, alguns inclusive manejados em demérito desta Corregedora Nacional – vide pedido de providências n. 0004964-31.2021.2.00.0000, que restou arquivado pelo Ministro Luiz Fux no dia 3/8/2021. Ademais, diversos dos procedimentos protocolados trazem alegações muito parecidas, que buscam imputar demérito aos julgadores ora requeridos, em razão de suas atuações na condução do processo n. 0000024-07.2019.5.23.0031. 

Ante o exposto, nego provimento ao Recurso Administrativo. 

É como voto. 

 

MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA 

Corregedora Nacional de Justiça

 

 

 

A08/Z10.