Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: CONSULTA - 0000093-21.2022.2.00.0000
Requerente: LEANDRO FERNANDES DE SOUZA
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ

 

 

RECURSO ADMINISTRATIVO. CONSULTA. REQUISITOS REGIMENTAIS. NÃO OBSERVÂNCIA. QUESTIONAMENTO. MÉDICO. ACUMULAÇÃO DE CARGOS PÚBLICOS. CASO CONCRETO. PRETENSÃO. ORIENTAÇÃO JURÍDICA. AUSÊNCIA DE RELAÇÃO COM O PODER JUDICIÁRIO. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

I – Recurso Administrativo interposto contra decisão que não conheceu da Consulta e determinou se arquivamento liminar, nos termos do art. 25, inciso X, do RICNJ.

II – A orientação consolidada no âmbito do Conselho Nacional de Justiça é no sentido de não conhecer de consultas que tenham por objetivo dirimir dúvidas jurídicas do interessado ou antecipar a solução de casos concretos apresentados sob a forma de situações hipotéticas.

III – Nas razões recursais, foi reiterado que o questionamento é baseado em situação de servidora do Poder Executivo do Estado de Rondônia que é médica com carga horária de 40 (quarenta) horas e foi contratada para prestar serviços emergenciais ao ente federativo.

IV – Inexiste fundamento para conhecer da pretensão deduzida nos autos, haja vista a intenção de convolar este Conselho em órgão de orientação jurídica para dirimir dúvida de caráter particular.

V – Recurso conhecido e não provido.

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator. Presidiu o julgamento o Ministro Luiz Fux. Plenário Virtual, 24 de junho de 2022. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Luiz Fux, Maria Thereza de Assis Moura, Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Marcio Luiz Freitas, Giovanni Olsson (Relator), Sidney Madruga, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto, Mário Goulart Maia e Luiz Fernando Bandeira de Mello.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: CONSULTA - 0000093-21.2022.2.00.0000
Requerente: LEANDRO FERNANDES DE SOUZA
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ

 

RELATÓRIO

 

Trata-se de RECURSO ADMINISTRATIVO interposto por LEANDRO FERNANDES DE SOUZA contra decisão monocrática que não conheceu do pedido formulado na CONSULTA sob exame (ID n.4587241).

Neste procedimento, o Recorrente indagou sobre a possibilidade de acumulação remunerada do cargo de Médico do Estado de Rondônia com carga horária de 40 (quarenta) horas semanais e regido pela Lei Complementar Estadual n. 68, de 9 de dezembro de 1992, com o cargo de Assistente Técnico do Estado de Rondônia.

Na peça recursal, os argumentos deduzidos na inicial foram reiterados e o Recorrente frisou que a presente Consulta tem um caso concreto como plano de fundo, qual seja, a situação funcional de servidora do Poder Executivo do Estado de Rondônia.

Destacou que os órgãos do Poder Judiciário têm interesse na questão suscitada nos autos e, ao final, renovou o pedido formulado na exordial.

É o relatório.

 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: CONSULTA - 0000093-21.2022.2.00.0000
Requerente: LEANDRO FERNANDES DE SOUZA
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ

 

VOTO

 

I – CONHECIMENTO

Não vislumbro razão para reconsiderar a decisão ID n. 4587241, sobretudo porque o Recorrente não apresentou fatos ou fundamentos novos capazes de infirmar o entendimento externado nos autos.

Lado outro, o presente recurso é cabível e foi interposto tempestivamente, razão pela qual deve ser conhecido, a teor do disposto no art. 115, §1º, do RICNJ.

 

II – MÉRITO

O Recorrente pugnou pela reforma de decisão que não conheceu do pedido formulado na inicial, nos seguintes termos:

Trata-se de procedimento CONSULTA formulada por LEANDRO FERNANDES DE SOUZA sobre questão relacionada a acumulação do cargo de Médico com o de Assistente Técnico do Estado de Rondônia (ID n. 4585122).

O consulente indagou sobre a “possibilidade de acumulação remunerada do cargo de Médico 40 horas, regido pela Lei Complementar Estadual n. 68/92, com o de Assistente Técnico do Estado de Rondônia para acompanhar perícia médica judicial, elaborar quesitos e emitir parecer médico”

A fim de subsidiar o pedido, foram juntados aos autos documentos indicativos de que servidora da carreira médica do Estado de Rondônia submetida a jornada de trabalho de 40 (quarenta) horas semanais celebrou contratos de prestação   de serviços emergenciais com a citada unidade da federação por meio de dispensa de licitação.

É o necessário a relatar. Decido.

A Consulta não deve ser conhecida.

Nos termos do artigo 89, caput, do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça, a Consulta é o instrumento adequado para que sejam submetidas ao Plenário dúvidas na aplicação de dispositivos legais e regulamentares de competência deste Conselho e a resposta, quando proferida por maioria absoluta, tem caráter normativo geral.

Cumpre anotar que a jurisprudência deste Conselho é firme no sentido de não conhecer de Consultas que tenham por objetivo dirimir dúvidas jurídicas do interessado ou antecipar a solução de casos concretos apresentados sob a forma de situações hipotéticas. Nesse sentido são os seguintes julgados:

CONSULTA. TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO. PAGAMENTO DE AUXÍLIO-MORADIA A MAGISTRADO AFASTADO DO CARGO OU DO EXERCÍCIO DAS FUNÇÕES POR FORÇA DE SANÇÃO DISCIPLINAR. INTERESSE SUBJACENTE NA RESOLUÇÃO DE CASO CONCRETO. INADMISSIBILIDADE. PROCEDIMENTO VOCACIONADO A SOLVER DÚVIDA EM ABSTRATO. INTELIGÊNCIA DO ART. 89 DO RICNJ.

CONSULTA NÃO CONHECIDA. 1. A Consulta visa que este Conselho responda se é possível a concessão de auxílio-moradia a magistrado afastado do cargo ou do exercício das funções, nos termos do art. 93, VIII, da Constituição Federal e do art. 29 da LC nº 35/79. 2. O tribunal consulente, longe de uma dúvida abstrata, se encontra frente ao caso concreto de uma juíza federal, em disponibilidade, e que havia sido afastada do exercício das suas funções, sem prejuízo dos seus vencimentos e demais vantagens do cargo, até o julgamento de ação penal em trâmite perante o tribunal consulente. 3. O procedimento de Consulta, nos termos do art. 89 do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça, não se destina a resolver, em substituição ao consulente, determinada situação concreta, competindo ao próprio tribunal de origem, no exercício de sua autonomia constitucional, conferir-lhe a solução jurídica que entender pertinente, a qual poderá, ulteriormente, se sujeitar ao controle administrativo do Conselho Nacional de Justiça, nos termos do art. 103-B, § 4º, da Constituição Federal. Precedentes do CNJ. 4. Consulta não conhecida. (CNJ - CONS - Consulta - 00117-93.2015.2.00.0000 - Rel. DIAS TOFFOLI - 63ª Sessão Virtual - julgado em 17/04/2020)

 

RECURSO ADMINISTRATIVO. CONSULTA. QUESTÃO CONCRETA INDIVIDUAL. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DO ART.  89 DO RICNJ. 1. Consulta formulada com a finalidade de se obter deste Conselho orientação jurídica acerca da possibilidade de participação do próprio magistrado em programa de docência, remunerado por bolsa oferecida por universidade. 2. Não é cabível a Consulta para a solução de dúvidas dos particulares sobre normas jurídicas, sem interesse geral, ou que importe a fixação pelo CNJ de interpretação acerca das hipóteses apresentadas, antecipando solução para situações reais na formulação em tese. 3. Recurso desprovido. (CNJ - RA – Recurso Administrativo em CONS - Consulta - 0000502-12.2013.2.00.0000 - Rel.  LUIZA CRISTINA FONSECA FRISCHEISEN - 181ª Sessão Ordinária - julgado em 17/12/2013)

 

No caso em comento, não ficou demonstrado que algum órgão do Poder Judiciário tenha dúvida quanto à matéria ou que o Conselho Nacional de Justiça tenha competência para apreciar a questão ventilada nos autos. Ao revés, a Consulta foi apresentada por um particular e foi direcionada para análise da situação de uma servidora do Poder Executivo do Estado de Rondônia.

Cumpre anotar que o questionamento formulado na inicial possui nítido caráter individual e com o intuito de solucionar dúvida jurídica vinculada a um caso concreto que, por seu turno, não está vinculado a atuação administrativa de órgãos do Poder Judiciário.

Outrossim, necessário se faz destacar que a indicação da situação específica de servidora do Estado de Rondônia para subsidiar eventual análise deste Conselho evidencia a intenção de extrair manifestação do Plenário sobre de questão jurídica individual e passível de controle a posteriori, de modo a antecipar a solução um caso concreto.

Nesse contexto, não há fundamento para que a pretensão do consulente seja conhecida, haja vista ser incabível a utilização da Consulta para sanar dúvidas jurídicas ou solucionar casos individuais.

Portanto, diante da especificidade do questionamento, é possível concluir que o consulente busca orientação jurídica acerca de matéria estranha à competência administrativa do Conselho Nacional de Justiça.

Ante o exposto, nos termos do art. 25, inciso X, do RICNJ, não conheço da presente Consulta e determino seu arquivamento.

Intime-se.

Em seguida, arquivem-se independentemente de nova conclusão (ID n. 4587241, sem grifos originais).

 

Não diviso no recurso administrativo interposto a presença de fundamentos capazes de abalar a decisão monocrática que não conheceu do pedido formulado na inicial.

Conforme ressaltado nos autos, a orientação consolidada no âmbito do Conselho Nacional de Justiça é no sentido de não conhecer de consultas que tenham por objetivo dirimir dúvidas jurídicas do interessado ou antecipar a solução de casos concretos apresentados sob a forma de situações hipotéticas. Vejamos:

CONSULTA. TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 5ª REGIÃO. PAD. AFASTAMENTO CAUTELAR DE MAGISTRADOS E MAGISTRADAS. FORMAÇÃO DA LISTA DE ANTIGUIDADE. CONTAGEM DO TEMPO DE SERVIÇO. INTERESSE NA SOLUÇÃO DE CASO CONCRETO. INADEQUAÇÃO AO RITO DO ART. 89 DO RICNJ. NÃO CONHECIMENTO. 1. Consulta formulada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região indagando, em caso concreto, quais os efeitos do afastamento cautelar de magistrados e magistradas determinado pelo CNJ em Processo Administrativo Disciplinar em tramitação (PAD 8118-28), na contagem do tempo de serviço, para fins de antiguidade na carreira. 2. O art. 89 do Regimento Interno é claro em exigir que o objeto da consulta seja formulado em tese e tenha interesse e repercussão geral à magistratura. 3. Inadequação da via eleita por se tratar de reiteração de questionamento específico anteriormente formulado nos autos do PAD 8118-28, de relatoria do Conselheiro Marcos Vinícius Jardim Rodrigues. 4. A jurisprudência do CNJ é pacífica no sentido de não admitir que consulta perante este órgão seja utilizada para a solução de casos específicos. Precedentes. 5. Não compete ao CNJ resolver situação concreta adstrita a matérias inerentes ao exercício da autonomia constitucional dos Tribunais (art. 99, CF). 6. Consulta não conhecida. (CNJ - CONS - Consulta - 0007522-10.2020.2.00.0000 - Rel. IVANA FARINA NAVARRETE PENA - 95ª Sessão Virtual - julgado em 22/10/2021)

 

CONSULTA RELATIVA À LEGALIDADE DE ATOS INSTRUTÓRIOS PRATICADOS EM PROCEDIMENTOS DISCIPLINARES. OBTENÇÃO DE DADOS ATRAVÉS DA REDE MUNDIAL DE COMPUTADORES E REDES SOCIAIS. Não conhecimento. 1. Responder às questões formuladas implica a antecipação de juízo que deve ser construído na apreciação de casos concretos e suas peculiaridades. 2. Caso conhecida e respondida a consulta, este Conselho corre o risco de legislar indevidamente sobre a matéria, já que a resposta à consulta, quando proferida pela maioria absoluta do Plenário, tem caráter normativo geral (§ 2º do art. 89 do RICNJ). 3. Por fim, o conhecimento da consulta poderá violar o princípio livre convencimento motivado do juiz. Consulta não conhecida, nos termos da fundamentação. (CNJ - CONS - Consulta - 0001481-66.2016.2.00.0000 - Rel. LUIZ FERNANDO TOMASI KEPPEN - 92ª Sessão Virtual - julgado em 10/09/2021)

 

No recurso, foi expressamente consignado que o objetivo desta Consulta é questionar a legalidade da situação funcional de servidora do Poder Executivo do Estado de Rondônia, a Senhora Andressa Police dos Santos. Segundo relatado, a referida servidora ocupa o cargo da carreira médica com carga horária de 40 (quarenta) horas e foi contratada pelo ente federativo para prestar serviços em caráter emergencial.

É inarredável concluir que a intenção do Recorrente é submeter ao Plenário o controle de legalidade de um caso concreto que, por seu turno, envolve servidor não integrante do Poder Judiciário.

Peço vênia para transcrever trechos das razões recursais que ilustram com propriedade a finalidade deste procedimento:

[...]

Data vênia ao acatamento e ao que foi decidido, em sede monocrática, o questionamento apresentado preenche, sim, os requisitos do RICNJ em sua integralidade, pois trata-se de caso concreto, consistente na possibilidade de acumulação remunerada do cargo de Médico 40 horas semanais, regido pela Lei Complementar Estadual n. 68/92 (Estatuto dos Servidores), com o de Assistente Técnico do Estado de Rondônia para acompanhar a perícia médica judicial, elaborar pareceres, laudos, apresentar quesitos, exames técnicos e análises técnicas, objeto da ação judicial de reversão de aposentadoria por “invalidez” contra Estado de Rondônia

[...]

Ademais, o recorrente acostou aos autos do processo, prova documental, de que a servidora ANDRESSA POLICE DOS SANTOS, matrícula n. 300145107, Efetivo Médico 40h, celebrou contratos de prestação de serviços "emergenciais" com o Tribunal de Contas do Estado de Rondônia, conforme descrito no processo de Dispensa de Licitação n. 644/2018, no valor de R$ 3.500,00 (Três Mil e Quinhentos Reais), e Processo SEI n. 5.015/2019, no valor de R$ 9.500,00 (Nove Mil e Quinhentos Reais), totalizando R$ 13.000,00 (Treze Mil Reais).

[...]

Ao que tudo indica, o ex-Presidente do Tribunal de Contas do Estado de Rondônia, Conselheiro EDILSON DE SOUSA SILVA, autorizou a contratação direta da servidora da carreira médica do Estado de Rondônia submetida a jornada de trabalho de 40 (quarenta) horas semanais, por meio de dispensa de licitação, sob a frágil argumentação de que Andressa encontra-se lotada em outra unidade da federação, qual seja, a Secretaria Estadual de Saúde. (sic, Id4589646, sem grifos originais) 

 

Como se vê, ficou sobejamente evidenciado nos autos que o Recorrente buscou utilizar a Consulta para dirimir dúvida particular e a respeito de questão que sequer envolve servidores do Poder Judiciário. Dessa forma, inexiste fundamento para conhecer da pretensão deduzida nos autos, porquanto este Conselho não constitui órgão de consultoria jurídica ou pode interferir na atividade de outros poderes.

Outrossim, eventual irresignação acerca da situação narrada na inicial deve ser submetida aos órgãos de controle interno e externo do Poder Executivo do Estado de Rondônia, uma vez que não cabe ao Conselho Nacional de Justiça adentrar em questões estranhas à atividade administrativa do Poder Judiciário.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso administrativo e determino o arquivamento do feito.

É como voto.

Intimem-se as partes. Em seguida, arquivem-se os autos, independentemente de nova conclusão.

Brasília, data registrada no sistema.

 

 

GIOVANNI OLSSON

Conselheiro