Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: NOTA TÉCNICA - 0010642-32.2018.2.00.0000
Requerente: FÓRUM NACIONAL DA MEDIAÇÃO E CONCILIAÇÃO - FONAMEC
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ

 


 

NOTA TÉCNICA. PROJETO DE LEI DA CÂMARA 80/2018. PROPOSTA DE ALTERAÇÃO DA LEI 8.906/94 (ESTATUTO DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL), PARA ESTABELECER A OBRIGATORIEDADE DA PARTICIPAÇÃO DO ADVOGADO NA SOLUÇÃO CONSENSUAL DE CONFLITOS. MANIFESTAÇÃO CONTRÁRIA À PROPOSTA.

1. Projeto de Lei da Câmara dos Deputados n. 80, de 2018, que pretende alterar a Lei 8.906/94, o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, para estabelecer a obrigatoriedade da participação do advogado na solução consensual de conflitos.

2. Conforme jurisprudência consolidada no âmbito deste Conselho a conciliação e a mediação pré-processual é atividade que pode ser realizada sem a necessária participação dos advogados, porque objetiva apenas facilitar a transação, ato de autonomia privada reservado a toda pessoa capaz, a fim de prevenir ou terminar litígios.

4. Emissão de Nota Técnica pelo CNJ contrária à proposta. 

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por maioria: I - conheceu do pedido, vencidos os Conselheiros André Godinho, Henrique Ávila e o Presidente; II - aprovou nota técnica com manifestação contrária à aprovação do projeto de Lei, nos termos do voto da Relatora. Vencidos os Conselheiros Fernando Mattos, Humberto Martins, Iracema do Vale e Valtércio de Oliveira, que votaram pela não aprovação de nota técnica e encaminhamento dos precedentes sobre a matéria e estudo realizados por este Conselho ao Congresso Nacional e os Conselheiros Henrique Ávila e André Godinho, que votaram pela aprovação de nota técnica para manifestação favorável à aprovação do projeto de Lei. Votou o Presidente. Ausente, em razão da vacância do cargo, o representante da Ordem dos Advogados do Brasil. Presidiu o julgamento o Ministro Dias Toffoli. Plenário, 6 de agosto de 2019. Presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Conselheiros Dias Toffoli, Humberto Martins, Aloysio Corrêa da Veiga, Iracema Vale, Daldice Santana, Valtércio de Oliveira, Márcio Schiefler Fontes, Fernando Mattos, Luciano Frota, Maria Cristiana Ziouva, Arnaldo Hossepian, André Godinho, Maria Tereza Uille Gomes e Henrique Ávila.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: NOTA TÉCNICA - 0010642-32.2018.2.00.0000
Requerente: FÓRUM NACIONAL DA MEDIAÇÃO E CONCILIAÇÃO - FONAMEC
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ


RELATÓRIO

 

Trata-se de requerimento de Nota Técnica formulado pelo FÓRUM NACIONAL DE MEDIAÇÃO E CONCILIAÇÃO – FONAMEC sobre o Projeto de Lei da Câmara dos Deputados n. 80, de 2018, que pretende alterar a Lei 8.906/94, Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, para estabelecer a obrigatoriedade da participação do advogado na solução consensual de conflitos.

 Alega a requerente que, com a edição da Resolução n. 125/2013, o Conselho Nacional de Justiça estabeleceu a Política Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses, como uma resposta aos anseios sociais de celeridade e efetividade da prestação jurisdicional.

Aduz, que o intuito da resolução não teria sido apenas estimular à disseminação da conciliação e da mediação no País, mas também prestigiar os meios adequados de resolução de conflitos, levando-se em consideração a natureza e a peculiaridades de cada caso, bem como a participação efetiva do cidadão, em atenção ao princípio do acesso à justiça.

Nesse contexto, pondera que as disposições do art. 133 da Constituição Federal não  pressupõem que a presença do advogado seja indispensável em qualquer expediente de solução de conflitos que é levado ao Poder Judiciário.

Defende que a “relatividade da regra contida no art. 133 da CF, indubitavelmente, é, com efeito, premissa lógico-jurídica fundamental para reconhecer a não obrigatoriedade do advogado nos procedimentos extrajudiciais, mormente quando a ordem processual já reputa imprescindível a participação do advogado nos acordos extrajudiciais

Entende que a exigência de advogados na resolução consensual de conflitos se caracterizaria como subversão da lógica vigente, haja vista que a prescindibilidade do causídico em tais expedientes já é reconhecida, nos termos do art. 784, IV, do CPC pela jurisprudência do STJ.

Refere que a política judiciária de adoção de métodos autocompositivos encontra amparo inclusive no Plano Estratégico e nas Metas do Poder Judiciário.

Enaltece a criação dos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania – CEJUSCs como sendo um serviço público de justiça mais célere, menos oneroso, informal e eficaz “muito porque contempla serviços de solução de conflitos extrajudiciais e de cidadania, geralmente gratuitos e sem a burocracia do tradicional processo judicial”.

Nesse quadro, considera que tornar obrigatória a participação do advogado no contexto da autocomposição extrajudicial seria, então, onerar de modo indevido o cidadão, colocando sob risco iminente de inviabilização os próprios CEJUSCs.

Reflete que o cidadão, não dispondo de condições de arcar com um advogado, malgrado todo o empenho e relevante destaque funcional, também não encontra nas Defensorias Públicas condições adequadas a suportar a demanda dos jurisdicionados.

Destaca, também, o papel do terceiro facilitador, o qual elevado à condição de auxiliar da justiça, possui competências e habilidades técnicas para adequada condução do processo consensual, tanto que com o objetivo de profissionalizar a carreira, a legislação estabeleceu uma política de remuneração dedicada a eles.

Ao final, transcreve precedentes do CNJ sobre a matéria e requer a emissão de NOTA TÉCNICA, dirigida ao Senado Federal, sugerindo a não aprovação do Projeto de Lei da Câmara nº 8.906/94.

Instada a se manifestar, a eminente Conselheira Daldice Santana, Presidente da Comissão de Acesso à Justiça e Cidadania, manifestou-se favoravelmente à aprovação da minuta de Nota Técnica, nos termos do parecer gravado sob o id. 3608667.

 

É o relatório.


 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: NOTA TÉCNICA - 0010642-32.2018.2.00.0000
Requerente: FÓRUM NACIONAL DA MEDIAÇÃO E CONCILIAÇÃO - FONAMEC
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ

 


VOTO

I- Cabimento da Nota Técnica

O presente requerimento de expedição de Nota Técnica, pelo Fórum Nacional de Mediação e Conciliação – FONAMEC, versa sobre o Projeto de Lei da Câmara dos Deputados n. 80/2018, que pretende alterar a Lei 8.906/94, o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, para estabelecer a obrigatoriedade da participação do advogado na solução consensual de conflitos.

Nos termos do art. 103, I, do Regimento Interno deste Conselho poderá o Plenário do CNJ elaborar notas técnicas, de ofício ou mediante requerimento de agentes de outros Poderes, acerca de projeto de lei quando caracterizado interesse do Poder Judiciário, verbis:

Art. 103. O Plenário poderá, de ofício, ou mediante provocação:

I - elaborar notas técnicas, de ofício ou mediante requerimento de agentes de outros Poderes, sobre políticas públicas que afetem o desempenho do Poder Judiciário, anteprojetos de lei, projetos de lei, e quaisquer outros atos com força normativa que tramitam no Congresso Nacional, nas Assembléias Legislativas ou em quaisquer outros entes da Administração Pública Direta ou Indireta, quando caracterizado o interesse do Poder Judiciário;

Desse modo, conquanto a requerente não ostente legitimidade para provocar o pronunciamento deste Conselho, há que se reconhecer que a relevância da matéria para o Poder Judiciário tem o condão de legitimar a atuação de ofício do CNJ, razão pela qual faz-se oportuno o processamento da presente Nota Técnica.

 II- Análise da Proposta

A crescente utilização das técnicas de resolução consensuais tem contribuído com significativas alterações na cultura do litígio e da judicialização de conflitos, sobretudo em razão da abertura ao diálogo que acabam por permitir, além da indiscutível redução de custos, rapidez e valorização das partes.

A edição da Resolução nº 125 pelo Conselho Nacional de Justiça teve como principais fundamentos o tratamento adequado dos problemas jurídicos e conflitos de interesses, especialmente mediante conciliação e  mediação, forte na premissa de que esses instrumentos são efetivos no processo de pacificação social, na prevenção e na solução de litígios.

Um dos pilares da política judiciária nacional implementada pela Resolução nº 125/10 é a mudança de paradigma dos serviços judiciários, fazendo-os abranger também a mediação e a conciliação, com a redução da judicialização excessiva, transformando-se o conceito de acesso à justiça em acesso à ordem jurídica justa.

No novo CPC, essa tendência se confirma ainda com mais vigor, uma vez que a realização de audiências de conciliação tornou-se obrigatória, elevada ao patamar de norma axiológica (art.3º, §§2º e 3º) e o mediador, inserido como auxiliar da Justiça (artigos 165ss).

Mais ainda, tanto o CPC quanto a Lei 13.140/2015 elegeram a independência, a imparcialidade, a autonomia da vontade, a confidencialidade, a oralidade, a informalidade e a decisão informada como princípios informativos da mediação e da conciliação, de sorte que os meios consensuais de resolução de conflitos, antes meros programas institucionais, foram alçados à condição de diretriz processual e caminham na direção de se tornarem mecanismos prioritários de resolução de disputas.

Segundo dados do Relatório Justiça em Números 2018, em 2014 haviam 362 Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania - CEJUSCs na Justiça estadual e esse número vem avançando significativamente, tendo alcançado no final do ano de 2017, 982 unidades.

O relatório também indica crescimento no número de sentenças homologatórias de acordo, as quais representaram 12,1% comparativamente ao total de sentenças e decisões terminativas no ano de 2017.

A Política Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário, prevista na Resolução CNJ n. 125/2010, está estruturada em forma de tripé, em que no ápice está o CNJ, com algumas atribuições de caráter geral e nacional e logo abaixo estão os Núcleos Permanentes de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos (NUPEMECs) de cada tribunal e os Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSCs).

 Os CEJUSCs são as unidades nas quais atuam os conciliadores, mediadores e demais facilitadores de solução de conflitos, bem como os servidores do Judiciário, aos quais cabe a triagem dos casos e a prestação de informação e orientação aos jurisdicionados para garantia do legítimo direito ao acesso à ordem jurídica justa.

O artigo 10, da Resolução CNJ nº 125/2010 determina que cada Centro Judiciário deve abranger, necessariamente, três setores: setor pré-processual, setor processual e um setor de solução de conflitos de cidadania.

A fase pré-processual, conforme sugere o nome, ocorre em momento anterior à distribuição do processo perante o Poder Judiciário. Se houver acordo, o termo assinado pelas partes assume a validade de título executivo e, por outro lado, se a sessão for infrutífera ou prejudicada as partes são aconselhadas a encaminhar seu conflito para solução judicial.

Já a fase processual ocorre em momento posterior ao ajuizamento de ação judicial e pode substituir a audiência de conciliação dos Juizados Especiais ou do Código de Processo Civil.

No setor de cidadania são oferecidos serviços relacionados à obtenção de documentos, assistência social e esclarecimentos.  

Em Consulta formulada ao CNJ sobre a “a dispensabilidade da participação do advogado nesses Centros e a possibilidade de anulação dos atos praticados sem a presença do advogado”, a resposta, que possui caráter normativo geral, nos termos do art. artigo 89, §2º, RICNJ, foi proferida, por unanimidade, nos seguintes termos:

“Os Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania não se destinam, exclusivamente, a realização de atos processuais. A conciliação ou mediação pré-processual é dessas atividades que pode ser realizada sem a necessária participação dos advogados, porque objetiva apenas facilitar a transação, ato de autonomia privada reservado a toda pessoa capaz, de prevenir ou terminar litígios.” (CNJ - CONS - Consulta - 0001702-54.2013.2.00.0000 - Rel. SÍLVIO ROCHA - 173ª Sessão - j. 06/08/2013).

Recentemente, a questão voltou a ser suscitada neste Conselho, nos autos do pedido de providências n. 0004837-35.2017.2.00.0000, de Relatoria da eminente Conselheira Iracema do Vale.

No referido procedimento, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – CFOAB questionava o disposto no art. 11 da Resolução CNJ n. 125/2010, quanto à dispensa de advogados e defensores públicos, invocando o disposto no art. 133 da Constituição Federal.

No julgamento do feito, mais uma vez, o CNJ decidiu que o referido art. 11 da Resolução n. 125/2010 expressamente estipulou que nos CEJUSCs poderão atuar membros do Ministério Público, defensores públicos, procuradores e/ou advogados “em atenção ao espírito da solução de conflitos (conciliação e mediação) e à própria essência dos referidos centros, que foram criados no intuito de estarem disponíveis e acessíveis a todos (id. 2276926):

RECURSO EM SEDE DE PEDIDOS DE PROVIDÊNCIAS. RESOLUÇÃO CNJ Nº 125/2010. PARTICIPAÇÃO FACULTATIVA DE ADVOGADOS NOS CEJUSCS. POSSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE FATO NOVO. NÃO PROVIMENTO.

I. Recurso contra decisão monocrática que julgou improcedente o pedido constante da inicial, por considerar que o artigo 11 da Resolução CNJ nº 125/2010 está em conformidade com a legislação regente sobre o tema.

II. A pretensão recursal cinge-se à intervenção do Conselho Nacional de Justiça para determinar a obrigatoriedade da participação dos advogados nos atos praticados nos CEJUSCS.

III. Não há de cogitar-se exorbitância, desconformidade, tampouco incongruência do quanto disciplinado na Resolução relativamente às disposições processuais que preveem a necessária participação de advogado ou de defensor público no processo judicial, bem como a possibilidade de participação desses atores na fase pré-processual (assegurada quando apenas uma das partes está assistida, reparando-se, dessa forma, o equilíbrio jurídico da negociação

IV. Inexistindo, nas razões recursais, qualquer elemento novo capaz de alterar o entendimento adotado, a decisão monocrática combatida deve ser mantida.

V. Recurso conhecido, uma vez que tempestivo, mas que, no mérito, nega-se provimento.(CNJ - RA – Recurso Administrativo em PP - Pedido de Providências - Conselheiro - 0004837-35.2017.2.00.0000 - Rel. IRACEMA DO VALE - 281ª Sessão Ordinária - j. 06/11/2018 ).

Naquela oportunidade, o próprio Ministro Dias Toffoli, Presidente do CNJ, defendeu menos burocracia no exercício das soluções consensuais de conflito, pontuando que: “Não existe monopólio para mediação ou conciliação. A rigor, os Cejuscs, que todos nós defendemos, deveriam estar fora do Poder Judiciário. É a sociedade resolvendo seus conflitos e o Judiciário sendo apenas um instrumento de pacificação social daqueles conflitos que a própria sociedade, através da sua ciência e consciência, não conseguiu resolver com seus mediadores.[[1]]

Aliás, sobre esse tema, a Conselheira Daldice Santana em brilhante parecer exarado nos autos do PP 0004837-35.2017.2.00.0000, já referido, destacou que:

“...o exercício da cidadania, praticado sem a assistência jurídica de advogado ou de defensor público não mitiga, nem reduz a realização do próprio direito.

... a possibilidade de ajuizamento de ações nos Juizados Especiais Cíveis, sem a compulsória assistência de advogado ou de defensor público, é admitida na legislação brasileira desde 1984 e (...) o Colendo Supremo Tribunal Federal (STF) confirmou a constitucionalidade do exercício direto desse direito postulatório (...) na análise da ADI 1.539” (id. 2258711)

No mesmo sentido, também, dispõe a Lei nº 13.140/2015, segundo a qual, em relação à medição extrajudicial:

Art. 9o Poderá funcionar como mediador extrajudicial qualquer pessoa capaz que tenha a confiança das partes e seja capacitada para fazer mediação, independentemente de integrar qualquer tipo de conselho, entidade de classe ou associação, ou nele inscrever-se. 

Art. 10.  As partes poderão ser assistidas por advogados ou defensores públicos

 

De fato, as formas autônomas de resolução de conflitos como a negociação, a conciliação e a mediação vem caminhando com bastante vigor em direção ao protagonismo na solução de conflitos, em razão do alto custo do processo, do tempo de duração e da elevada remuneração dos advogados.

Portanto, o que se pretende com o Projeto de Lei ora em exame é impor às partes um ônus que vai em sentido contrário à marcha da Política Judiciária Nacional de tratamento adequado aos conflitos de interesses.

III- Conclusão 

Ante o exposto, voto pela aprovação da Proposta de Nota Técnica anexa, que apresenta manifestação contrária à aprovação do Projeto de Lei da Câmara dos Deputados n. 80/2018, que pretende alterar a Lei 8.906/94, o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, para estabelecer a obrigatoriedade da participação do advogado na solução consensual de conflitos.

É como voto.

Inclua-se o feito em pauta para julgamento.

Intime-se.

À Secretaria Processual para providências.

Brasília, data registrada no sistema.

 

Conselheira Maria Cristiana Simões Amorim Ziouva

Relatora


 

 

Minuta

NOTA TÉCNICA N.    /2019

 

 

Assunto: Projeto de Lei da Câmara dos Deputados n. 80, de 2018, que pretende alterar a Lei 8.906/94, o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, para estabelecer a obrigatoriedade da participação do advogado na solução consensual de conflitos.

  

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ), no uso de suas atribuições legais e regimentais;

  CONSIDERANDO que compete ao Conselho Nacional de Justiça o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário, bem como zelar pela observância do art. 37 da Constituição da República;

 CONSIDERANDO que a celeridade e produtividade na prestação jurisdicional e adoção de soluções alternativas de conflito são macrodesafios estratégicos do Poder Judiciário, nos termos da Resolução/CNJ nº 198, de 01 de julho de 2014;

 CONSIDERANDO que o direito de acesso à Justiça, previsto no art. 5º, XXXV, da Constituição Federal além do acesso aos órgãos judiciários, também implica em acesso à ordem jurídica justa e a soluções efetivas;

 CONSIDERANDO a Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário estabelecida pela Resolução 125, de 29 de novembro de 2010;

 CONSIDERANDO que a conciliação e a mediação são instrumentos efetivos de pacificação social, solução e prevenção de litígios que ocorrem em larga e crescente escala na sociedade;

 CONSIDERANDO que a utilização de meios consensuais de solução de conflitos tem contribuído para redução da excessiva judicialização dos conflitos de interesses, a quantidade de recursos e de execução de sentenças;

 CONSIDERANDO o deliberado pelo Plenário do Conselho Nacional de Justiça na XXX Sessão Plenária;

 

 RESOLVE:

 

Dirigir-se ao Congresso Nacional para apresentar manifestação contrária à aprovação do Projeto de Lei da Câmara 80, de 2018, em trâmite no Senado Federal, atualmente sob a relatoria do Senador Rodrigo Pacheco, que visa alterar a Lei 8.906/94, o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, para estabelecer a obrigatoriedade da participação do advogado na solução consensual de conflitos.

A matéria objeto da proposta pretende tornar obrigatória a participação de advogados na solução consensual de conflitos não judicial impondo às partes um ônus que vai em sentido contrário à Política Judiciária Nacional de tratamento adequado aos conflitos de interesses estabelecida pelo pela Resolução CNJ n. 125, de 11 de novembro de 2010.

Contudo, um dos pilares da política judiciária nacional implementada pela Resolução nº 125/10 é a mudança de paradigma dos serviços judiciários, fazendo-os abranger também a mediação e conciliação, com a redução da judicialização excessiva, transformando-se o conceito de acesso à justiça em acesso à ordem jurídica justa e a soluções efetivas.

Ademais, importa registrar que o entendimento deste Conselho, consubstanciado no julgamento da Consulta 0001702-54.2013.2.00.0000 bem como do PP  0004837-35.2017.2.00.0000 também é no sentido de que a conciliação ou mediação pré-processual é atividade que pode ser realizada sem a necessária participação dos advogados, porque objetiva apenas facilitar a transação, ato de autonomia privada reservado a toda pessoa capaz, a fim de prevenir ou terminar litígios.

A presente Nota Técnica foi aprovada, por unanimidade, pelo Plenário do Conselho Nacional de Justiça na Sessão realizada em XX/XX/XXXX, conforme certidão anexa.

Encaminhe-se cópia desta Nota Técnica aos Presidentes do Senado Federal e da Câmara dos Deputados, à Casa Civil da Presidência da República, ao Ministro da Justiça, à Secretaria da Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça e ao Procurador Geral da República.

 

 

Brasília,                 de 2019.

Ministro Dias Toffoli 

 



[[1]] In http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/87969-plenario-decide-nao-obrigar-presenca-de-advogados-em-mediacao-ou-conciliacao. Acesso em 18.02.2018

 

VOTO VISTA DIVERGENTE

 

Adoto, na íntegra, o relatório firmado pela eminente Conselheira Relatora. Quanto ao mérito, no entanto, peço venia a Sua Excelência para apresentar divergência, pelas razões a seguir expostas.

O presente requerimento de expedição de Nota Técnica foi formulado pelo Fórum Nacional de Mediação e Conciliação – FONAMEC, versando sobre o Projeto de Lei da Câmara dos Deputados n. 80/2018, que pretende alterar a Lei 8.906/94 (Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil), estabelecendo a obrigatoriedade da participação do advogado na solução consensual de conflitos. Em rápida consulta aos sítios eletrônicos do Poder Legislativo, consta que o aludido projeto já foi aprovado pela Câmara dos Deputados, onde teve sua tramitação iniciada, e se encontra atualmente em fase de tramitação avançada no Senado Federal.

Penso que o requerimento não deve ser conhecido, por manifestamente incabível.

Com efeito, são claras as disposições regimentais acerca do cabimento de tal modalidade procedimental no âmbito deste Conselho, in verbis:

 

“Da Nota Técnica

Art. 103. O Plenário poderá, de ofício ou mediante provocação:

I - elaborar notas técnicas, de ofício ou mediante requerimento de agentes de outros Poderes, sobre políticas públicas que afetem o desempenho do Poder Judiciário, anteprojetos de lei, projetos de lei, e quaisquer outros atos

com força normativa que tramitam no Congresso Nacional, nas Assembleias Legislativas ou em quaisquer outros entes da Administração Pública Direta ou Indireta, quando caracterizado o interesse do Poder Judiciário;

II - elaborar notas técnicas sobre normas ou situações específicas da Administração Pública quando caracterizado o interesse do Poder Judiciário;

III - elaborar notas técnicas endereçadas ao Supremo Tribunal Federal relativas aos projetos de lei de iniciativa do Poder Judiciário.” 

 

O caso atual não se enquadra nas hipóteses trazidas pelos incisos II e III, eis que não envolvem “situações específicas da Administração Pública” nem se dirige ao egrégio Supremo Tribunal Federal.

De igual modo, não se pode enquadrar a hipótese no primeiro dos incisos, por ser flagrante a falta de interesse do Poder Judiciário no conteúdo do projeto de lei, mormente por envolver a possível participação de advogado em momento pré processual, fora, portanto, do âmbito de atuação e interesse deste Poder.

Raciocínio diverso, ao nosso ver, ocasionaria risco inequívoco de quebra da harmonia entre os Poderes, vez que, ao emitir a Nota Técnica ora aventada, estaria o CNJ fazendo juízo de valor acerca de projeto de lei já aprovado por uma das Casas Legislativas, sem que o Congresso Nacional tenha feito qualquer solicitação nesse sentido. Haveria clara interferência no processo legislativo, sem causa razoável que o justificasse.

Não se desconhece a possibilidade de emissão de Nota Técnica por este Conselho ex officio. Contudo, tal hipótese deve ser usada com absoluta precaução e parcimônia quando envolver atos dos demais Poderes, mormente a fim de preservar a harmonia que deve permear as relações institucionais.

Dessa maneira, ainda que se adotasse como premissa o interesse do Poder Judiciário na situação dos autos, - o que, como já dito, não nos parece acertado -, a emissão da Nota Técnica não se mostraria oportuno. Isto porque a inciativa é de terceiro (FONAMEC), sem solicitação do Congresso Nacional ou de qualquer instância do Poder Judiciário, exatamente por não envolver interesse deste Poder.

É flagrante, aliás, a ilegitimidade da parte Requerente para o patrocínio, no âmbito desta Casa, da pretensão descrita na passagem anterior. Como já se disse, o Regimento Interno do CNJ prevê a emissão de Nota Técnica de ofício ou por iniciativa dos “outros Poderes”, o que não abrange entes como o FONAMEC – Fórum Nacional de Mediação e Conciliação, que sequer possui personalidade jurídica.

Cuida-se, em verdade, como descrito na própria inicial, de “instituição de âmbito nacional composta pelos magistrados Presidentes e Coordenadores dos Núcleos Permanentes de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos (NUPEMEC) dos Estados e do Distrito Federal e pelos magistrados coordenadores dos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania – CEJUSC dos Tribunais de Justiça do país.”  Embora não se discuta a respeitabilidade de que é merecedora e a importância da sua atuação, a verdade é que se trata de instituição informal, vez que não dotada de personalidade jurídica própria e tampouco pertencente à estrutura formal de qualquer dos Poderes.

Não bastassem os argumentados já assentados, há que se observar que a Constituição Federal não outorgou ao CNJ competência específica para, em nome do Poder Judiciário, conferir lastro técnico, com acentuadíssima carga político-ideológica, favorável ou contrário a teses que pretendam instaurar, na legislação ordinária, exceções ao princípio constitucional da indispensabilidade do advogado à administração da justiça (artigo 133 da CF/1988).

Deve, portanto, pelos argumentos alinhavados, ser inadmitido o presente requerimento de Nota Técnica por esse Conselho Nacional de Justiça.

Acaso superada a preliminar de não-conhecimento, no mérito, penso que eventual Nota Técnica deveria ser favorável ao projeto de lei em tela, sentido que melhor se adequaria às diretrizes já assentadas pelo CNJ na Resolução CNJ n. 125/2010 (que dispõe sobre a Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário e deu outras providências), a qual prevê que o Conselho estabelecerá interlocução com a Ordem dos Advogados do Brasil, Defensorias Públicas, Procuradorias e Ministério Público, estimulando sua participação nos CEJUSCs  e valorizando a atuação na prevenção dos litígios.

 

II - Conclusão 

 

Ante o exposto, seja pela flagrante ilegitimidade ativa do Requerente, ou pela falta de previsão regimental de Nota Técnica na hipótese dos autos - ante a falta de interesse do Poder Judiciário na questão -, ou ainda por ser inoportuna a sua emissão, diante da tramitação avançada do projeto de lei, já aprovado pela Câmara dos Deputados, VOTO pelo NÃO CONHECIMENTO da presente Proposta de Nota Técnica, acerca do Projeto de Lei da Câmara dos Deputados n. 80/2018, que pretende alterar a Lei 8.906/94, o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, estabelecendo a obrigatoriedade da participação do advogado na solução consensual de conflitos.

Acaso superada a inadmissibilidade ora propugnada e entendendo o Plenário pelo cabimento de Nota Técnica na hipótese, VOTO pela sua emissão em sentido FAVORÁVEL ao projeto de lei referido.

Brasília, data registrada no sistema.

 

Conselheiro André Godinho

Brasília, 2019-08-07.