Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR - 0007451-08.2020.2.00.0000
Requerente: ROGÉRIO SCHIETTI CRUZ
Requerido: FRANCISCA ADELINEIDE VIANA e outros

 


EMENTA 


RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR. MAGISTRADOS DE PRIMEIRO GRAU. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. AUSÊNCIA DE ANÁLISE, POR 21 DIAS, DA REGULARIDADE DE PRISÃO EM FLAGRANTE. RELAXAMENTO DA PRISÃO PELO STJ. INEXISTÊNCIA DE INFRAÇÃO DISCIPLINAR. ARQUIVAMENTO. NECESSIDADE DE REFORMULAÇÃO DOS NORMATIVOS QUE REGULAM A MATÉRIA NO ÂMBITO DO TJCE.  EXTRAPOLAÇÃO RECORRENTE DO PRAZO PARA EXAMINAR PRISÕES EM FLAGRANTE. ASPECTO RESIDUAL QUE DEMANDA APRECIAÇÃO APROFUNDADA EM NOVA RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR A SER INSTAURADA.

1. Colegiado de magistrados que, em cumprimento do disposto nos normativos vigentes no TJCE, recebe comunicação de prisão em flagrante de outro Juízo e, em razão de trâmite processual decorrente de dúvida sobre a atribuição para a feitura de audiência de custódia e para a homologação da prisão em flagrante, causa constrangimento ilegal pelo tempo excedido para a análise da regularidade da prisão em flagrante, cujo relaxamento sobreveio por decisão do STJ. 

2. A despeito da demora na apreciação da regularidade da prisão, não há elementos caracterizadores do cometimento de infração disciplinar pelos magistrados, que cumpriram as disposições normativas vigentes.

3. As normas que regulam a questão no âmbito do TJCE não favorecem a celeridade necessária na realização das audiências de custódia, razão pela qual devem ser ajustadas para evitar ocorrências futuras. 

4. Arquivamento, com recomendação de reformulação dos atos normativos que regulam a matéria no âmbito do Tribunal de Justiça do Ceará. 

5. Constatação, contudo, de situação específica de recorrente extrapolação do prazo no exame de prisões em flagrante a demandar apreciação mais aprofundada pelo CNJ por meio de nova Reclamação Disciplinar a ser instaurada em face dos juízes Tácio Gurgel Barreto e José Coutinho Tomaz Filho, do Tribunal de Justiça do Ceará.

  

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, decidiu pelo arquivamento da presente reclamação disciplinar, com recomendações ao Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, e determinou a instauração de nova reclamação, nos termos do voto do Relator. Votou a Presidente. Presidiu o julgamento a Ministra Rosa Weber. Plenário, 23 de maio de 2023. Presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Conselheiros Rosa Weber, Luis Felipe Salomão (Relator), Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Marcio Luiz Freitas, Giovanni Olsson, Sidney Madruga, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto, Mário Goulart Maia e Luiz Fernando Bandeira de Mello.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR - 0007451-08.2020.2.00.0000
Requerente: ROGÉRIO SCHIETTI CRUZ
Requerido: FRANCISCA ADELINEIDE VIANA e outros

 

RELATÓRIO 

 

 

                      O SR. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO, CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA (Relator):

 

 

1.            Trata-se de Pedido de Providências, convertido em Reclamação Disciplinar, instaurado por provocação do eminente Ministro Rogerio Schietti Cruz, Relator do HC 603.618/CE no Superior Tribunal de Justiça, com a finalidade de apurar a conduta do Juízo da Vara Única de Delitos de Organizações Criminosas do Ceará, da 2.ª Vara Criminal de Caucaia, daquele mesmo Estado, e da Desembargadora Relatora do HC 0631058-32.2020.8.06.0000, que tramitou na Segunda Câmara Criminal do TJCE.

 

Segundo noticiado pelo douto Ministro comunicante, os representados mantiveram MATEUS JORGE DO NASCIMENTO preso por 21 (vinte e um) dias sem que examinassem a regularidade da prisão em flagrante, mesmo tendo ele sido preso por portar apenas 8 (oito) gramas de crack:

 

 

Consta dos autos que o paciente foi preso em flagrante, no dia 20/7/2020, como incurso nos arts. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006 e 2º da Lei n. 12.850/2013. 

 

O impetrante sustenta que o paciente permanece preso até a presente data sem que houvesse a análise da legalidade do flagrante, em virtude do declínio de competência para processamento e julgamento dos fatos, pela 2ª Vara Criminal da Comarca de Caucaia, à Vara Única de Delitos de Organização Criminosa. 

 

Pondera que, a despeito do impedimento da realização da audiência de custódia (CNJ, Recomendação n. 62, art. 8º), deve ser cumprido o disposto no art. 310 do CPP, "fazendo necessária a análise da legalidade da prisão, sua conversão em preventiva ou concessão da liberdade, com ou sem medidas cautelares diversas da privação da liberdade " (fls. 5-6). 

 

... 

 

Como visto, mesmo registrando como inaceitável a permanência do paciente no cárcere, depois de transcorridos 17 dias dos fatos, que respaldaram o flagrante (decisão juntada aos autos da origem em 5/8/2020, fl. 68), a Desembargadora plantonista determinou à Vara Única de Delitos de Organizações Criminosas do Estado do Ceará a apreciação da regularidade da prisão. 

 

No entanto, esse Juízo, em 3/8/2020, já havia decidido pela devolução do feito à Unidade Judiciária de Origem, para a "homologação da prisão do flagranteado e análise quanto à concessão ou não de sua soltura" (decisão juntada aos autos da origem em 6/8/2020, fl. 70). 

 

À par do desencontro das marchas processuais, é de se perquirir quanto tempo mais deverá o paciente aguardar a análise da legalidade de sua prisão em flagrante, depois de ser dado conhecimento da situação de evidente teratologia a três autoridades judiciárias?! 

 

 

Consignou, ainda, o eminente Ministro Rogerio Schietti Cruz que:

 

A injustificada demora na homologação do flagrante é recorrente no Estado do Ceará, como bem alertado pelo impetrante. Antes da pandemia, outras liminares já haviam sido concedidas por esta relatoria[1]. Ao que tudo indica, não é a exigência pela realização da audiência de custódia motivo pela mora judicial, tendo em vista que tal procedimento está suspenso em virtude da atual crise de saúde, ex vi do art. 8º da Recomendação n. 62 do CNJ. 

 

 

Consoante certificado pela Secretaria Processual, a decisão que declinou a competência da 2ª Vara Criminal da Comarca de Caucaia para a Vara de Delitos de Organizações Criminosas foi subscrita pelo Juiz José Coutinho Tomaz Filho; a decisão que indeferiu o pedido formulado pelo impetrante e concedeu de ofício ordem de Habeas Corpus para determinar, em vinte e quatro horas, o controle judicial sobre a prisão do paciente foi subscrita pela Desembargadora Francisca Adelineide Viana; e a decisão que determinou a devolução dos autos à unidade judiciária de origem para que fossem tomadas as providências quanto à homologação da prisão ou análise de concessão de soltura foi assinada pelos Juízes Tácio Gurgel Barreto, André Teixeira Gurgel e Henrique Lacerda de Vasconcelos

 

Notificados, os magistrados André Teixeira Gurgel e Tácio Gurgel Barreto, Juízes de Direito da Vara de Delitos de Organizações Criminosas da Comarca de Fortaleza/CE, apresentaram manifestação de idêntico teor, no sentido de que a omissão judicial que gerou a ilegalidade constatada no Habeas Corpus 603.618/CE, relacionada à ausência de análise da regularidade da prisão em flagrante do paciente, não seria da alçada daquele Juízo (Id 4188368 e Id 4199907).

 

Na mesma linha, Henrique Lacerda de Vasconcelos, também Juiz de Direito da Vara de Delitos de Organizações Criminosas da Comarca de Fortaleza/CE, apresentou informações no sentido de que não houve qualquer erro ou desídia daquele Juízoque não é competente para analisar homologações de Autos de Prisão em Flagrante, conforme as Resoluções editadas para o seu regular funcionamento (Id 4189123).

 

Por sua vez, José Coutinho Tomaz Filho, Juiz da 2ª Vara Criminal da Comarca de Caucaia-CE, prestou informações ressaltando que, quando da lavratura do APF, prestava serviços jurisdicionais em quatro lotações distintas, sendo, inclusive, necessários deslocamentos, mesmo em época de pandemia. Destacou, também, que a sua única atuação no feito em análise teria sido a prolação de decisão em consonância com parecer ministerial que se manifestou opinando pela não realização da audiência de custódia, em razão das medidas empreendidas para evitar a contaminação pelo SARS-CoV-2, e para que o Juízo declinasse da sua competência para processar o feito para a Vara Única dos Delitos de Organizações Criminosas situada na Comarca de Fortaleza (Id 4191354). 

 

Na sequência, foram encaminhadas as informações prestadas pela Desembargadora Francisca Adelineide Viana, Relatora do HC 0631058-32.2020.8.06.0000 impetrado em favor do paciente no Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, tendo consignado que procedeu à análise fundamentada do pedido de liminar em prazo célere, com a expedição de determinação de ofício à autoridade impetrada a fim de fazer cessar o indevido constrangimento ilegal (Id 4277290).

 

Além de notificados os referidos magistrados, a Corregedoria-Geral de Justiça do Estado do Ceará foi oficiada para prestar informações sobre: (a) a alegação de que “A injustificada demora na homologação do flagrante é recorrente no Estado do Ceará”, informando que providências tomou a esse respeito e se houve a instauração de procedimento para averiguar os fatos noticiados pelo eminente Ministro Rogerio Schietti Cruz; (b) todos os flagrantes que deixaram se ser examinados em 24 (vinte e quatro) horas, nos últimos 3 (três) anos, pelas autoridades ora representadas, explicitando o número de dias em excesso em cada um deles.

 

Em resposta (Id 4188199), a Corregedoria-Geral de Justiça do Estado do Ceará encaminhou manifestação inicial quanto ao item “a” e determinou a adoção de diligências para apuração dos dados requeridos no item “b”.

 

Nesse sentido, acolheu o parecer apresentado pelo Juiz Corregedor Auxiliar, que afastou a responsabilidade do Juízo da Vara de Delitos e Organizações Criminosas, tendo em vista que há normativo vigente naquele Tribunal, a afirmar que a atribuição para realizar a análise do flagrante é do magistrado que tomou conhecimento da prisão (Id 4188199):

 

 

Quanto “a injustificada demora na homologação do flagrante ser recorrente no Estado do Ceará”, referida assertiva merece algumas explicações. Com efeito, estão não é a realidade do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, pelo contrário, nos últimos anos houve concentração de atos nessa área específica, merecendo destaque: 1) A criação da Vara Única de Custódia em Fortaleza; 2) Inauguração de regime de plantão nessa mesma Unidade; 3) Reuniões institucionais com a Secretaria de Segurança Pública do Estado, Secretaria de Administração Penitenciária e Setor de Perícias do Estado, tudo com o objetivo de cumprir a análise do flagrante nas 24h seguintes à prisão do cidadão. 

 

No entanto, o presente imbróglio ocorrera em virtude da mudança de entendimento no que toca à competência para realização da audiência de custódia em casos envolvendo Organizações Criminosas. É que, com o advento da Vara única de combate aos crimes organizados com sede em Fortaleza, mas com competência em todo o Estado, houve esse primeiro momento de desencontro quanto à responsabilidade para análise do flagrante (audiência de custódia) em casos oriundos do interior do Estado com declínio de competência. 

 

Pondo fim as discussões iniciais, houve a edição de INSTRUÇÃO NORMATIVA n. 05/2018, a qual fixou a interpretação sobre a competência da Vara de Combate ao crime organizado, vazada nos seguintes termos: 

 

[...]

 

Portanto, O fato mencionado na peça exordial possui, por óbvio, importância e relevância. 

 

No entanto, há de se reconhecer que houve alteração normativa às vésperas de recesso judiciário, ocasionando o não conhecimento do assunto por parte de diversos magistrados atuantes no 1º grau do Tribunal de Justiça, até porque este não era o entendimento inicial sobre o tema. 

 

A Instrução Normativa nº 05/2018 foi publicada no DJ de 19 de dezembro de 2018, e nela HOUVE DECRETAÇÃO DEFINITIVA que audiência de custódia deve ser REALIZADA pelo Juízo que recebeu a comunicação em flagrante, e, somente após, de acordo com o caso, promover-se o declínio de competência para Vara Única de Combate ao Crime Organizado. 

 

[...]

 

De logo, aos olhos deste Juiz Corregedor Auxiliar, afasta-se qualquer responsabilidade do Juízo da Vara de Delitos e Organizações Criminosas, tendo em vista que há normativo vigente neste Tribunal, a afirmar que a atribuição para realizar a análise do flagrante é do Magistrado que tomou conhecimento da prisão e, mesmo sendo o caso de declínio para outra Unidade, o Juiz deve inicialmente, e sem demora, analisar a prisão em flagrante. 

 

[...]

 

Importante repisar que o Tribunal de Justiça do Estado do Ceará tem adotado todas as providências necessárias imprimir celeridade nessa seara específica, sobretudo nesse cenário que estamos vivenciando, qual seja, PANDEMIA COVID 19, ocasião em que já houve um entendimento com a Perícia Forense quanto ao encaminhamento das fotografias necessárias para homologação do flagrante. 

 

Ademais, a implementação do Sistema de Informações Policiais (sistema próprio das Perícias técnicas) possibilitará acesso mais expedito às perícias técnicas elaboradas pela Perícia Forense do Estado do Ceará, imprimindo ainda mais celeridade na análise dos flagrantes. 

 

Conforme dito alhures, o fato em tela cuida-se de um problema pontual em relação ao declínio de competência, haja vista a alteração normativa já referida. 

 

Infelizmente, nem todos os magistrados atuantes no 1º grau tomaram conhecimento efetivo da referida modificação e, conscientes da incompetência para analisar crimes referentes à organização criminosa, acabaram por declinar, antes mesmo da análise do auto de prisão em flagrante, tanto assim que em recente parecer da lavra deste gabinete, verificou-se a EXTREMA necessidade de RATIFICAR, via ofício circular, a todos os magistrados atuantes no 1º grau, que o declínio de competência para a Vara de Delitos e Organizações Criminosas deve ocorrer tão somente após a homologação da prisão em flagrante. 

 

Por fim, esclareço que não é de conhecimento desse Juiz Corregedor que a situação seja recorrente, bem assim que todas as providências já estão sendo tomadas e, inclusive, implementadas por este Egrégio Tribunal de Justiça. 

 

Outrossim, informo que, até o momento, não é de conhecimento desde gabinete qualquer abertura de procedimento nesta Casa para investigar os fatos em alusão. 

 

Portanto, sugere-se: a) o encaminhamento deste caderno à Gerência Judicial e Gerência Administrativa desta Casa, responsáveis para apresentar manifestação quanto ao solicitado na alínea ‘b’ pelo CNJ; b) a imediata comunicação ao CNJ do inteiro teor da presente manifestação, se este for o entendimento acolhido por Vossa Excelência e c) o retorno do procedimento em tela a este Gabinete após informações complementares para emissão de parecer de mérito. 

 

  

 

 

Posteriormente, tendo sido afastada a responsabilidade dos demais magistrados, concluiu-se que remanesceu a apuração contra o magistrado José Coutinho Tomaz Filho.

 

Nesse sentido, o Corregedor-Geral da Justiça do Estado do Ceará encaminhou o Despacho/Ofício 2435/2021/CJE-CE (Id 4312466), no qual acolhe parecer da lavra do Juiz Corregedor Auxiliar Fernando Teles de Paula Lima, determinando a notificação daquele magistrado, Juiz de Direito do 7º Juizado Auxiliar da 5ª Zona Judiciária, para esclarecimentos quanto aos APFs que lhe foram distribuídos em 2020, com inobservância do prazo de 24 horas para apreciação do flagrante:

 

Extrai-se dos documentos retro que, relativamente aos Magistrados André Teixeira (esteve afastado em razão de mestrado de 18/09/2017 a 17/09/2019) e Henrique Lacerda de Vasconcelos, ambos da Vara Única de Delitos e Organizações Criminosas, inexistem autos de prisão em flagrante no período de 01/11/2017 a 01/11/2020, para si distribuídos originariamente e não apreciados no prazo de 24 horas, corroborando o entendimento outrora esposado de afastamento da responsabilidade dos mesmos [...]. 

 

No concernente ao Dr. Tácio Gurgel Barreto, Juiz de Direito da 34ª Vara Cível de Fortaleza, com várias designações para auxiliar ou responder pela Vara Única Privativa de Audiências de Custódia da Comarca de Fortaleza – VUPAC (17ª Vara Criminal) e Vara Única de Delitos de Organizações Criminosas (repise-se, sem competência para apreciar homologações de APF´s), que prestou informes na esteira dos colegas desta Unidade, constatou-se que a prisão em flagrante não foi examinada pelo Magistrado no prazo de 24 horas em 89 processos (todos da VUPAC), em sua maioria distribuídos em 2018 (51) e 2019 (36). 

 

Os únicos dois APF´s distribuídos no ano passado (em 08/01/2020 e 21/07/2020 – processos nºs 0239787-12.2020.8.06.0001 e 0201038-23.2020.8.06.0001, respectivamente) e não apreciados pelo Judicante, no prazo de 24 horas, tiveram extrapolação mínima (decisão prolatada após pouco mais de 26 horas), motivo pelo qual não vislumbro justa causa para aprofundamento da questão disciplinar também em relação àquele, uma vez que houve claro aprimoramento do serviço público na VUPAC, que saiu do Fórum Clóvis Beviláqua e passou a integrar as novas instalações da Delegacia de Capturas e Polinter, nesta capital, otimizando, assim, o procedimento para apresentação dos presos e, de consequência, o próprio trâmite processual. 

 

Registre-se, ademais, que a morosidade então existente nos anos de 2018 e 2019 na VUPAC estava atrelada à demora da Central Integrada de Apoio à Área Criminal (CIAAC) em juntar aos autos as certidões de antecedentes criminais dos presos, bem como na expedição dos ofícios requisitórios e designatórios das Audiências de Custódia correlatadas pela Secretaria Judiciária, que aconteciam (audiências), em média, 10 dias após a prisão em flagrante à época. 

 

Quanto ao Juiz de Direito José Coutinho Tomaz Filho, do 7º Juizado Auxiliar da 5ª Zona Judiciária, com sede em Caucaia, que, como visto, anteriormente, contrariando à Instrução Normativa nº 05/2018 ao que parece, declinou da competência do processo nº 0053144-48.2020.8.06.0064 à Vara única de Delitos de Organizações Criminosas sem analisar o APF respectivo (fato idêntico aconteceu nos autos de nº 0053009-36.2020.8.06.0064, igualmente constante da relação), percebeu-se que o prazo de 24 horas no particular foi por ele descumprido em outros 47 feitos, todos distribuídos em 2020, a exemplo daqueles, alguns dos quais inclusive conclusos ao Juiz em momento anterior a suspensão das atividades forenses presenciais pela Pandemia de COVID-19.  

 

[...] 

 

Destarte, sugere-se a Vossa Excelência o encaminhamento dos informes de fls. 79/81 e 91/92 ao Conselho Nacional de Justiça, bem como a notificação do Dr. José Coutinho Tomaz Filho, Juiz de Direito do 7º Juizado Auxiliar da 5ª Zona Judiciária, para manifestação complementar àquela apresentada ao CNJ, com os esclarecimentos devidos no que diz respeito aos APF´s que lhe foram distribuídos no ano passado, com considerável inobservância do prazo de 24 horas para apreciação do flagrante (planilha de fls. 98/102).  

 

 

Em seguida, após a manifestação do magistrado José Coutinho Tomaz Filho, concluiu a Corregedoria-Geral da Justiça do Estado do Ceará pelo arquivamento do feito, recomendando que “empreenda esforços para analisar os autos de prisão em flagrante no prazo legal” (Id 4353321). Confiram-se, por oportuno, as razões do parecer acolhido pela Corregedoria-local que “justificam a atuação do magistrado representado”: 

 

 

Extrai-se dos documentos retro o inegável acúmulo de atribuições por parte do Juiz José Coutinho Tomaz Filho, que passou a figura de reclamado por responder à época dos fatos durante férias do Titular da 2ª Vara Criminal da Comarca de Caucaia entre os dias 06 e 25/07/2020. 

 

E mais, decidiu em relação ao APF nº 0053144-48.2020.8.06.0064 com base no parecer ministerial no sentido da não realização da audiência de custódia por conta das medidas empreendidas para evitar a contaminação pelo Covid19 e, ainda, para que o juízo declinasse de sua competência para processar o feito em favor da Vara Única dos Delitos de Organizações Criminosas situada na Comarca de Fortaleza, onde a competência para processar o feito se estabilizou, desculpando-se por este caso isolado em que houve incompetência declarada sem análise do flagrante ao não se atentar à Instrução Normativa nº 05/2018, possivelmente por ter atuado por mais de 10 anos em jurisdição cível especializada, seja à frente da 3ª Vara Cível da Comarca de Caucaia, seja na 10ª Vara Cível da Comarca de Fortaleza. 

 

Além disso, como por ele também destacado, o Juiz Auxiliar no Estado do Ceará normalmente é designado para substituir os titulares em férias e nos demais afastamentos, ficando a depender totalmente da estrutura da Vara para a qual foi designado, geralmente precária no interior do estado, uma vez que não dispõem de Assistentes ou Analistas para qualquer auxílio pessoal como os demais, dificultando o processamento dos APF’s nas filas de trabalho e o cumprimento do prazo de 24h para sua homologação, motivo pelo qual sugeriu a alteração da sistemática vigente, a qual deve ser apreciada em autos próprios. 

 

Considerando as relevantes justificativas trazidas pelo Magistrado José Coutinho Tomaz Filho, cuja boa produtividade foi aferida por esta Corregedoria durante o ano de 2020 (produção média de 104 sentenças mensais, além de milhares de despachos e decisões interlocutórias) não vislumbro justa causa para aprofundamento da questão disciplinar em seu desfavor, até porque destacou que passará a decidir acerca da homologação do flagrante e concessão de liberdade provisória ao flagranteado nas 24 subsequentes a prisão, independente de manifestação do órgão Ministerial, que, segundo afirma, mesmo intimado as vezes não se manifesta com tempo para cumprimento pelo Juiz do prazo regimental. 

 

 

Em despacho de Id 4357001, a Corregedoria Nacional de Justiça determinou o arquivamento da RD em relação à Desembargadora Francisca Adelineide Viana, com a recomendação de que zele pela pronta execução das ordens que conceder em Habeas Corpus e em outros processos de natureza urgente.

 

Além disso, determinou a intimação pessoal dos magistrados José Coutinho Tomaz Filho, Tácio Gurgel Barreto, André Teixeira Gurgel e Henrique Lacerda de Vasconcelos para a apresentação de defesa prévia, diante da possível existência de indícios de suposta prática de infrações disciplinares por aqueles, as quais caracterizam afronta, em tese, ao artigo 35, II, da LOMAN, e ao artigo 20 do Código de Ética da Magistratura Nacional, além do artigo 12, parágrafo único, IV, da Lei n. 13.869/2019.

 

Diante da informação encaminhada aos autos de que, antes da prolação da decisão da Corregedoria Nacional de Justiça que determinou a intimação pessoal do magistrado José Coutinho Tomaz Filho para apresentação de defesa prévia, o requerido aposentou-se voluntariamente, a partir de 26 de abril de 2021 (Id 4378376), foi determinado o arquivamento do feito em relação ao referido magistrado (Id 4403566).

 

Em sua defesa (Id 4367959), reiterou o julgador André Teixeira Gurgel, da Vara de Delitos de Organizações Criminosas da Comarca de Fortaleza/CE, que o referido Juízo não é competente para a realização das audiências de custódia dos autos de prisão em flagrante das comarcas diversas de Fortaleza/CE, as quais devem ser realizadas pelos Juízos a que as prisões foram comunicadas (juízo de origem), conforme estabelecido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Ceará através da Instrução Normativa n. 5, de 19 de dezembro de 2018.

 

Registrou, outrossim, que, mesmo suspensa a realização das audiências de custódia em razão da pandemia de COVID-19, o Juízo a que foi comunicada a prisão em flagrante nas comarcas diversas de Fortaleza continuou competente para examinar a regularidade da prisão em flagrante, à luz do art. 310 do Código de Processo Penal c/c o art. 8.º, caput, e § 1.º, I, da Recomendação CNJ 62/2020, conforme decidido pelo TJCE no julgamento de Habeas Corpus: 

 

 

No dia 20 de julho de 2020, no Município de Caucaia/CE, foi lavrado auto de prisão em flagrante delito em desfavor de Mateus Jorge do Nascimento, pela suposta prática das condutas tipificadas no art. 33 da Lei n. 11.343/06 e no art. 2º da Lei n. 12.850/13. 

 

O juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Caucaia/CE, à vista do auto de prisão em flagrante delito, no dia 23 de julho de 2020, seguindo parecer ministerial, declinou da competência para apreciar o feito para essa Unidade Especializada, sem realizar audiência de custódia (as audiências de custódia estavam suspensas, em virtude da pandemia) e sem apreciar a prisão em flagrante delito e sua conversão em prisão preventiva ou a concessão de liberdade provisória ao autuado. 

 

Os autos foram remetidos a este juízo e conclusos no dia 27 de julho de 2020. Em decisão datada de 3 de agosto de 2020 (assinada por este magistrado e liberada nos autos em 6 de agosto de 2020), o Colegiado da Vara de Delitos de Organizações Criminosas decidiu pela devolução dos autos para a comarca de origem, para que fossem tomadas as providências necessárias ao exame da prisão em flagrante do autuado, bem como da necessidade da sua conversão em preventiva ou da possibilidade de concessão de liberdade provisória. O processo foi remetido à Vara de origem no dia 7 de agosto de 2020. 

 

Em 10 de agosto, foi juntado aos autos ofício oriundo do Superior Tribunal de Justiça, que comunicava a decisão liminar proferida pelo Min. Relator, Rogerio Schietti Cruz, acima mencionada, já na Vara de origem. Na mesma data, o juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Caucaia/CE homologou a prisão em flagrante e deixou de decidir sobre a necessidade ou não da sua conversão em prisão preventiva, tendo em conta, segundo o magistrado, o teor da referida decisão do Tribunal Superior. Ainda nessa data, foi expedido o alvará de soltura do acusado e remetido à Unidade Prisional onde se achava recolhido. 

 

II - DO DIREITO. 

 

Sobre o assunto em pauta, as disposições normativas são bastantes claras. Com efeito, a Resolução n. 13, de 6 de setembro de 2018, do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, que dispôs sobre a instalação e funcionamento da Vara de Delitos de Organizações Criminosas, regulamentou expressamente a competência para a realização das audiências de custódia em feitos afetos à Unidade, nos seguintes termos: 

 

  

 

“Art. 6º As audiências de custódia que devam ter lugar em feitos de competência da Vara de Delitos de Organizações Criminosas serão realizadas, nos termos da legislação atualmente em vigor, sob a responsabilidade do Juízo da 17ª Vara Criminal – Vara Única Privativa de Audiências de Custódia”. 

 

  

 

Assim, o juízo da Vara de Delitos de Organizações Criminosas não é competente para a realização das audiências de custódia dos autos de prisão em flagrante da Comarca de Fortaleza/CE, mesmo de feitos de sua competência, por expressa disposição do ato normativo do Tribunal de Justiça que disciplinou a instalação e funcionamento da Unidade. 

 

Contudo, mencionado ato não regulamentou de modo explícito a realização das audiências de custódia dos autos de prisão em flagrante lavrados nas outras Comarcas, quanto aos processos de competência da Vara de delitos de Organizações Criminosas, já que a competência da Unidade se estende por todo o Estado do Ceará, enquanto a Vara Única Privativa de Audiências de Custódia (17ª Vara Criminal) possui competência apenas para a análise dos autos de prisão em flagrante da Comarca de Fortaleza. 

 

Diante disso, e mediante provocação do juízo da Vara de Delitos de Organizações Criminosas, a fim de sanar qualquer controvérsia acerca da competência para a realização das audiências de custódia de feitos de sua competência decorrentes de autuações em flagrante delito realizadas em outras Comarcas (o que é a hipótese do caso que ensejou o presente procedimento), o Tribunal de Justiça do Estado do Ceará pôs termo à questão, através da Instrução Normativa n. 5, de 19 de dezembro de 2018, que disciplinou a matéria e fixou a interpretação do art. 6º da Resolução n. 13/2018, quanto à competência da 17ª Vara Criminal acerca da realização das audiências de custódia dos feitos desta Unidade, consoante se infere dos seus considerandos e de suas disposições, cuja clareza merece transcrição: 

 

[...]

 

RESOLVE: Art. 1º A competência da 17ª Vara Criminal da Comarca de Fortaleza – Vara Única Privativa de Audiências de Custódia, na forma dos arts. 1º, da Resolução nº 14/2015 e 6º, da Resolução nº 13/2018, quanto aos feitos de competência da Vara de Delitos de Organizações Criminosas, restringe-se às prisões em flagrante realizadas na jurisdição da Comarca de Fortaleza. 

 

Art. 2º As audiências de custódia decorrentes de autuações em flagrante realizadas nas comarcas do interior do Estado, quanto a crimes cujo processo e julgamento estejam abrangidos pela competência Vara de Delitos de Organizações Criminosas, serão realizadas pelos respectivos Juízos que foram comunicados das prisões, procedendo-se, em seguida, à remessa dos autos ao Juízo competente”. (sem grifos no original). 

 

  

 

Portanto, conforme se depreende dos enunciados normativos acima transcritos, este juízo da Vara de Delitos de Organizações Criminosas também não é competente para a realização das audiências de custódia dos autos de prisão em flagrante das comarcas diversas de Fortaleza/CE, as quais devem ser realizadas, pois, pelos juízos a que as prisões foram comunicadas (juízo de origem), antes da remessa dos autos a esta Vara Especializada. 

 

[...]

 

Pois bem. No caso sub examine, segundo acima exposto, este juízo recebeu um auto de prisão em flagrante delito da Comarca de Caucaia/CE, sem o devido exame da regularidade da custódia, e, com fulcro nos atos normativos já mencionados e transcritos, determinou o retorno dos autos ao juízo de origem, para a adoção das providências cabíveis, no sentido da análise da prisão em flagrante, nos termos do art. 310 do Código de Processo Penal, c/c o art. 8º, caput e § 1º, I, da Recomendação n. 62/2020, do Conselho Nacional de Justiça, por ser este juízo especializado absolutamente incompetente para a prática do ato cuja omissão acarretou o relaxamento da prisão do autuado e a instauração da presente reclamação disciplinar.

 

Ressalte-se que a decisão do Colegiado da Vara de Delitos de Organizações Criminosas que remeteu o feito ao juízo de origem se deu ainda antes da decisão da relatora do Habeas Corpus n. 0631058-32.2020.8.06.0000, Desa. Francisca Adelineide Viana, que negou a liminar requerida, mas determinou a realização do necessário controle judicial sobre a prisão do paciente, no prazo impreterível de 24 (vinte e quatro) horas, bem como antes, por óbvio, da decisão liminar do Min. Rogerio Schietti Cruz (HC n. 603.618/CE), que relaxou a prisão do autuado, por ausência de análise judicial da legalidade do flagrante. Na verdade, quando prolatada essa última decisão, em 9 de agosto de 2020, o auto de prisão em flagrante delito já havia sido remetido, desde 7 de agosto de 2020, ao juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Caucaia/CE, juízo esse competente, desde o início, para a apreciação da regularidade da prisão em flagrante do autuado. 

 

É sabido que a situação excepcional gerada pela pandemia de COVID-19 não alterou a competência para a prática desse ato, mas somente a forma pela qual os autos de prisão em flagrante delito passaram a ser examinados. Suspensa a realização das audiências de custódia, o juízo da 17ª Vara Criminal da Comarca de Fortaleza/CE ou o juízo a que foi comunicada a prisão em flagrante nas outras Comarcas continuaram competentes para examinar a regularidade da prisão em flagrante, nos moldes do art. 310 do Código de Processo Penal, c/c o art. 8º, caput e § 1º, I, da Recomendação n. 62/2020, do Conselho Nacional de Justiça. 

 

A competência para apreciar o auto de prisão em flagrante delito do juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Caucaia/CE, no presente caso, foi registrada pelo Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, no já referido Habeas Corpus, segundo se depreende do seguinte trecho do decisum: 

 

[...]

 

Portanto, e em resumo, o Colegiado do qual o magistrado signatário era integrante (VDOC) não apreciou o auto de prisão em flagrante delito que originou a presente reclamação, por ser absolutamente incompetente para tal providência, conforme disciplina normativa e entendimento manifestado em decisões judiciais do próprio Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, de modo que remeteu os autos do processo ao juízo competente, para adoção das providências cabíveis. 

 

Não incorreu este magistrado, pois, em qualquer infração disciplinar, ao adotar, em sua decisão judicial, postura consentânea com os atos normativos que regulam a matéria. 

 

A omissão judicial que gerou a ilegalidade constatada no Habeas Corpus n. 603.618/CE pelo eminente Ministro comunicante e cuja apuração inicial ora se faz nesta reclamação, qual seja, a ausência de análise da regularidade da prisão em flagrante do paciente, não era da alçada deste magistrado, que envidou todos os esforços para que tal ilicitude não permanecesse, com a remessa dos autos ao juízo competente para a providência judicial omitida, antes mesmo de qualquer provocação das instâncias superiores.

 

[...]

 

Este signatário tem a firme convicção de que tomou a decisão judicial corretaE o fez em prazo mais do que razoável. Como já foi relatado, o processo foi concluso em 27 de julho de 2020. A referida decisão é datada de 3 de agosto de 2020 (assinada por este magistrado e liberada nos autos em 6 de agosto de 2020). Ressalte-se que o juízo da Vara de Delitos de Organizações Criminosas é formado por um colegiado, de modo que todas as decisões e sentenças passam pelo exame de 3 (três) magistrados, o que requer, por certo, um tempo um pouco maior para a publicação de tais pronunciamentos judiciais. Destaque-se, ainda, que o juízo recebe autos de prisão em flagrante remetidos de todo o Estado do Ceará, em feitos de sua competência, em razão da matéria. 

 

Não houve, destarte, desídia ou qualquer conduta disciplinarmente reprovável. Foi prolatada a decisão judicial correta, em um prazo satisfatório e possível, dentro das peculiaridades da Vara. E tudo isso foi feito, inclusive com a devida remessa do processo ao juízo competente, antes de qualquer pronunciamento judicial superior. 

 

Com efeito, a Desa. Francisca Adelineide Viana, relatora do Habeas Corpus no Tribunal de Justiça, à vista da prisão em flagrante e da irregularidade pelo excesso de prazo para a sua exigida análise, irregularidade essa cuja responsabilidade está sendo ora apurada, proferiu decisão, cumprida no dia 7 de agosto de 2020, em que determinava que a ilicitude fosse sanada, devendo ser realizado o exame da custódia em flagrante do paciente. 

 

Antes disso, o juízo da Vara de Delitos de Organizações Criminosas, à vista da mesma prisão em flagrante e da mesma ilegalidade consistente na ausência de análise da prisão, em 6 de agosto de 2020, decidiu exatamente no mesmo sentido, com o envio dos autos ao juízo competente, a fim de cessar a ilegalidade, com a compulsória apreciação da prisão em flagrante. 

 

A reclamação disciplinar em face da Desa. Francisca Adelineide Viana foi arquivada, de maneira absolutamente acertada, por não se vislumbrar, ab initio, qualquer infração funcional na sua conduta. Não se afigura justo que tenha destino diferente o procedimento administrativo em face deste magistrado, o qual, diante da mesma situação e ainda antes da decisão judicial superior, acolheu precisamente a mesma postura (correta, repita-se, pois fundamentada em normas do Tribunal de Justiça que regulamentaram a competência para o ato judicial omitido) e adotou todas as providências necessárias para remediar a ilegalidade, em um prazo adequado, tanto que, antes da decisão proferida no Habeas Corpus, que determinava o exame da prisão em flagrante (comunicada somente em 7 de agosto de 2020), o processo já tinha sido decidido por este juízo, composto de 3 (três) magistrados, e remetido ao juízo competente para a providência reclamada. 

 

entendimento adotado por este magistrado, em ato jurisdicional de 6 de agosto de 2020, foi exatamente o mesmo do acolhido pela Desa. Relatora do Habeas Corpus, em decisão comunicada no dia seguinte: não relaxar a prisão do autuado naquele momento, mas empregar todas as diligências necessárias para a imediata reparação da ilegalidade, o que, no caso deste juízo, foi feito com a remessa dos autos ao juízo competente para a providência judicial reclamada, remessa concretizada antes da comunicação da decisão da relatora. À vista da mesma ilegalidade, a mesma postura judicial, praticamente na mesma época. 

 

[...]

 

Não há infração disciplinar neste caso, como também não há em toda a sua carreira. 

 

Segundo informações prestadas pela Corregedoria Geral de Justiça do Ceará, a pedido deste Conselho Nacional de Justiça, inexistem autos de prisão em flagrante delito distribuídos originariamente a este magistrado e não apreciados no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, nos últimos 3 (três) anos. 

 

Tais informações corroboram a escorreita postura do signatário, em quase 15 (quinze) anos de exercício da magistratura, o que é feito com zelo pelo cargo, educação, respeito e urbanidade no trato com outros magistrados, membros do Ministério Público, delegados, defensores públicos, advogados, servidores e partes do processo. Durante todo esse período, jamais respondeu a procedimento disciplinar e não há um único fato que desabone sua conduta. Pelo contrário. Desde o início e durante toda a trajetória, sempre foi reconhecido pelos serviços prestados e pelo fiel desempenho das atribuições do cargo. 

 

[...]

 

Ante o exposto, requer este magistrado, em sintonia com a decisão proferida com relação à Desa. Francisca Adelineide Viana, o ARQUIVAMENTO da presente reclamação disciplinar em face do mesmo, por ausência de infração disciplinar a ser investigada por esse douto Conselho Nacional de Justiça. 

 

 

 

Com amparo em argumentos similares, manifestou-se o magistrado Henrique Lacerda de Vasconcelos, também integrante do colegiado de Juízes que compõem a Vara de Delitos de Organizações Criminosas da Comarca de Fortaleza/CE, no sentido de aquele Juízo não tem competência para realizar audiência de custódia ou decidir sobre a prisão preventiva decorrente de APF pois, conforme as Resoluções editadas pelo TJCE para o seu regular funcionamento, os delitos ocorridos na Capital e que envolvem os crimes em tela ficam a cargo da 17.ª Vara Criminal – Vara Única Privativa de Custódia da Comarca de Fortaleza/CE – e aqueles ocorridos em outros municípios, como é o caso dos autos, ficam a cargo dos juízes que foram comunicados das prisões. 

 

Aduziu, em complemento, que envidou todos os esforços para que fosse sanada a omissão, remetendo os autos ao juízo competente para a providência judicial omitida, antes de qualquer provocação das instâncias superiores (Id  4376025):

 

 

 Inicialmente, o feito da prisão em flagrante delito em comento foi encaminhado para a 2ª Vara Criminal da Comarca de Caucaia, uma vez que a prisão foi efetuada naquele município e aquele juízo seria o competente para a realização da respectiva audiência de custódia e deliberação acerca da manutenção da custódia do autuado, a teor do que dispõe o art. 2º da Instrução Normativa nº 05/2018 do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará (ID. nº 4199909). 

 

 Recebidos os autos, após parecer ministerial, no dia 23 de julho de 2020, o magistrado da vara de origem (2ª Vara Criminal da Comarca de Caucaia) decidiu, de maneira equivocada, pelo declínio de competência dos autos e a consequente remessa do feito para a Vara de Delitos de Organizações Criminosas do Estado do Ceará sem, contudo, realizar a audiência de custódia, nem mesmo dispor acerca da prisão em flagrante ocorrida. 

 

 Os expedientes da aludida decisão foram efetivados no dia seguinte, ou seja, os autos chegaram no juízo da Vara de Delitos de Organizações Criminosas no dia 24 de julho de 2020 (sexta-feira). Tão logo na segunda-feira, dia 27/07/2020, às 15h:46, foi remetido concluso para Despacho. 

 

 Veja-se que o fluxo de trabalho da Vara de Delitos de Organizações Criminosas é muito alto e complexo, não havendo previsão para a análise de Autos de Prisão em Flagrante para realizar audiência de custódia ou decidir sobre a prisão preventiva decorrente de APF, expediente naturalmente urgente, por absoluta incompetência da Vara. Ora, é cediço que a Unidade Jurisdicional supracitada não é estruturada para essa análise urgente, já que não detém tal competência. 

 

 A título de exemplo, no dia 28/05/2021 (sexta-feira), havia no fluxo de trabalho da Vara de Delitos de Organizações Criminosas: 05 (cinco) processos redistribuídos, dentre os quais 02 (dois) com réus presos. Além disso, há 06 (seis) processos conclusos para análise de denúncia, com 03 (três) réus presos, 244 (duzentos e quarenta e quatro) conclusos para decisão, contendo centenas de réus presos, 562 (quinhentos e sessenta e dois) conclusos para despacho, também com centenas de réus presos, 30 (trinta) conclusos para sentença, contendo dezenas de réus presos. 

 

 Ademais, há 42 (quarenta e dois) conclusos para análise de recurso, dentre os quais há dezenas de réus presos, 83 (oitenta e três) conclusos para designação de audiência, com dezenas de réus presos e 280 (duzentos e oitenta) aguardando realização de audiência, nos quais há centenas de réus presos. 

 

 Ocorre que o Colegiado de Juízes que compõem a Vara de Delitos de Organizações Criminosas do Estado do Ceará, ao receber e analisar o feito em tais condições, fundamentadamente, entendeu que a única solução juridicamente possível, em estrita obediência às diretrizes emanadas do TJ-CE, seria a devolução dos autos à Unidade Judiciária de Origem para que então pudesse ser homologada ou não a prisão em flagrante e realizada a análise quanto à concessão da soltura do custodiado, o que fora decidido em 06 de agosto de 2020. 

 

Neste aspecto, insta esclarecer que a Vara de Delitos de Organizações Criminosas do Estado do Ceará, conforme as Resoluções editadas para o seu regular funcionamento, NÃO POSSUI COMPETÊNCIA para analisar homologações de Autos de Prisão em Flagrante, pois os delitos ocorridos nesta Capital e que envolvem os crimes aqui tratados ficam a cargo da 17ª Vara Criminal – Vara Única Privativa de Custódia da Comarca de Fortaleza/CE – e aqueles ocorridos em outros municípios, como é o caso dos autos, ficam a cargo dos juízes que foram comunicados das prisões. 

 

 A atribuição de competência para a Vara de Delitos de Organizações Criminosas inviabilizaria completamente seu trabalho caso ficasse incumbida de proceder com a análise das homologações dos Autos de Prisão em Flagrante de todo o Estado do Ceará, sendo este o motivo pelo qual a questão foi normalizada pelo Egrégio TJ-CE. 

 

 Sendo assim, cabe tão somente ao juízo da Vara de Delitos de Organizações Criminosas, composto pelos juízes Henrique Lacerda de Vasconcelos, Tácio Gurgel Barreto e André Teixeira Gurgel, receber o Auto de Prisão em Flagrante devidamente regular e encaminhar ao Ministério Público para que este adote as providências que achar cabível, como determinar o oferecimento de denúncia. 

 

 Mais uma vez, o juízo da Vara de Delitos de Organizações Criminosas não recebe Autos de Prisão em Flagrante a serem homologados, mas sim, Autos de Prisão em Flagrante já devidamente regulares, não havendo como discriminar, a par do volume de procedimentos que entram diariamente na fila destes magistrados, que seria uma situação sui generis e necessitaria uma decisão mais urgente do que já é peculiar, em prazo menor de 08 (oito) dias úteis do que fora proferida. 

 

  

 

Vale dizer também que a Vara de Delitos de Organizações Criminosas é composta por 3 (três) magistrados, sendo que as decisões aqui proferidas devem ser assinadas por todos eles, de acordo com o art. 49-B, §1º, da Lei nº 16.397/2017 do Estado do Ceará, atualizada pela Lei nº 16.505/2018, o que necessita que cada um se debruce sobre o caso e emane o seu juízo, o que, invariavelmente, leva um tempo maior.  

 

[...]

 

Quanto ao conteúdo da decisão proferida nos autos da Ação Penal nº 0053144-48.2020.8.06.0064 (íntegra do processo em anexo – DOC. 1), que determinou o retorno dos autos ao juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Caucaia, repita-se, outro entendimento não seria possível, pois iria de encontro com todas as normas editadas quando da instalação desta unidade especializada. 

 

[...]

 

É importante destacar, como inclusive notou o próprio Exmo. Ministro Rogerio Schietti Cruz, em decisão de ID. nº 4116084, que a posterior decisão da Exma. Desembargadora Francisca Adelineide Viana, datada de 05/08/2020 (quarta-feira), foi proferida nos autos do Habeas Corpus nº 0631058-32.2020.8.06.0000 (DOC. 2), às fls. 59-63, apenas após o Juízo da Vara de Delitos de Organizações Criminosas da Comarca de Fortaleza/CE já ter remetido o feito à Unidade Judiciária de Origem, o que ocorreu no dia 07 de agosto de 2020 (sexta-feira). 

 

 Desse modo, houve então decisão do Juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Caucaia/CE (fls. 105-106 do DOC. 1), do dia 10/08/2020 (segunda-feira), homologando a prisão em flagrante, o que era de sua competência, e não do Juízo da Vara de Delitos de Organizações Criminosas da Comarca de Fortaleza/CE, e relaxando a prisão em flagrante, em face da já mencionada decisão (ID. nº 4116084) do Excelentíssimo Ministro Rogerio Schietti Cruz. 

 

 Destaque-se ainda, apenas a título de conhecimento, que na realidade o que foi referido como alguém que teria sido preso “por portar apenas 8 (oito) gramas de crack”, como consta no Despacho nº 41668903, é um agente que, ao ser interrogado, declarou ser integrante da Organização Criminosa Comando Vermelho, e que possui tatuagem com o símbolo da facçãoalém de participar de dois grupos ligados a tal organização, o que se descobriu após o agente autorizar o acesso ao conteúdo do seu aparelho celular, informações presentes no Relatório Técnico nº 59/2020/DRACO/DPE/PCCE (ID. nº 4189129), emitido pela Polícia Civil do Ceará, constante às fls. 66-83 dos autos do processo originário, de nº 0053144-48.2020.8.06.0064 (DOC. 1). 

 

 De qualquer forma, reitere-se que não houve qualquer tipo de desídia por parte do Juízo da Vara de Delitos de Organizações Criminosas da Comarca de Fortaleza/CE, que, ao receber o processo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Caucaia/CE sem a homologação do flagrante e análise acerca de possível concessão de soltura, fundamentadamente decidiu que a solução juridicamente adequada seria a devolução dos autos para que a Unidade Judiciária de Origem imediatamente se pronunciasse acerca de tais questões. 

 

Registre-se também que, após a homologação da prisão do agente, o feito retornou à Vara de Delitos de Organizações Criminosas para processamento e julgamento, ao que foi recebida a Denúncia pelos crimes tipificados no art. 33 da Lei nº 11.343/2006 (tráfico de drogas) e no art. 2º, §2º, da Lei nº 12.850/2013 (organização criminosa qualificada pelo emprego de arma de fogo). 

 

Desse modo, plenamente demonstrado que não houve qualquer erro ou desídia por parte do Requerido, que entendeu fundamentadamente, em conjunto com os outros dois magistrados de sua Unidade Jurisdicional, ser de competência da 2ª Vara Criminal da Comarca de Caucaia/CE a homologação da prisão em flagrante e a análise acerca de possível concessão de soltura, o que efetivamente ocorreu após a remessa do feito pela Vara de Delitos de Organizações Criminosas da Comarca de Fortaleza/CE. 

 

 Assim, durante esse tempo em que tramitou o feito na Vara de Delitos de Organizações Criminosas, não foi negligenciado qualquer pedido de soltura, o que poderia abreviar o tempo de análise ou mesmo atrair uma fundamentação na decisão que determinou o retorno dos autos ao juízo de origem. 

 

[...]

 

Parece claro que a via correicional se destina ao exame de eventuais infrações ético-disciplinares, e não à revisão meritória de pronunciamentos judiciais.  

 

 [...]

 

 Dessa maneira, não houve qualquer pedido de soltura nos autos e os magistrados da Vara entenderam não ser o caso de relaxamento da prisão, haja vista que não se tratava de crime de menor potencial ofensivo, já que o réu havia sido preso em flagrante com crack, possuía tatuagens características de integrar o Comando Vermelho e era confesso integrante da violenta facção. 

 

 Não se vislumbra, então, qualquer infração disciplinar a ser imputada ao Requerido.  

 

[...]

 

Não incorreu o magistrado Reclamado, pois, em qualquer infração disciplinar, ao adotar, em sua decisão judicial, postura consentânea com os atos normativos que regulam a matéria. 

 

 A omissão judicial que gerou a ilegalidade constatada no HC nº 0631058-32.2020.8.06.0000 (DOC. 2) pelo eminente Ministro comunicante e cuja apuração ora se faz nesta reclamação, qual seja, a ausência de análise da regularidade da prisão em flagrante do paciente, não é da alçada da Vara de Delitos de Organizações Criminosas, a qual envidou todos os esforços para que tal ilicitude não permanecesse, com a remessa dos autos ao juízo competente para a providência judicial omitidaantes mesmo de qualquer provocação das instâncias superiores. 

 

Por conseguinte, não há como vislumbrar qualquer conduta desidiosa deste magistrado na condução do feito que ensejou o presente procedimento, digna de ser apurada na esfera disciplinar. 

 

Entendimento contrário coloca o magistrado diante de estranha situação: (i) examinar uma prisão em flagrante, para o que é absolutamente incompetente, em frontal descumprimento às determinações e aos atos normativos do TJCE, ficando sujeito à responsabilização disciplinar perante o órgão correicional da Corte; ou (ii) reconhecer sua incompetência para a providência legalmente exigida (audiência de custódia ou apreciação do flagrante) e remeter os autos ao juízo competente e, ainda assim, responder disciplinarmente, o que é o caso dos autos.   

 

[...]

 

De acordo com tudo que foi exposto nos tópicos acima, não há infração disciplinar neste caso, como também não há em toda a carreira do magistrado ora Reclamado, Dr. Henrique Lacerda de Vasconcelos. 

 

 Segundo informações prestadas pela Corregedoria Geral de Justiça do Ceará, a pedido deste Conselho Nacional de Justiça, inexistem autos de prisão em flagrante delito distribuídos originariamente a este magistrado e não apreciados no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, nos últimos 3 (três) anos.  

 

 Tais informações corroboram a escorreita postura do Dr. Henrique Lacerda de Vasconcelos, em quase 15 (quinze) anos de exercício da magistratura, o que é feito com zelo pelo cargo, educação, respeito e urbanidade no trato com outros magistrados, membros do Ministério Público, delegados, defensores públicos, advogados, servidores e partes do processo. 

 

 Durante todo esse período, o Reclamado jamais respondeu a procedimento disciplinar e não há um único fato que desabone sua conduta. Pelo contrário, desde o início e durante toda a trajetória, sempre foi reconhecido pelos serviços prestados e pelo fiel desempenho das atribuições do cargo. 

 

[...]

 

 

 

No mesmo sentido foi a manifestação do magistrado Tácio Gurgel Barreto (Id 4379021), que houve por bem esclarecer que “não é titular da Vara de Delitos de Organizações Criminosas, estando, na época, respondendo em substituição a juíza titular componente da referida unidade colegiada”, consignando ainda que: 

 

 

 

[...] 

 

Com efeito, pertinente registrar que, historicamente, existiam diversos problemas estruturais na Vara Única Privativa de Audiências de Custódia (VUPAC), não apenas pela falta de pessoal em número suficiente, mas também por algumas outras dificuldades burocráticas e tecnológicas mais abaixo descritas. 

 

[...]

 

 Apenas em 2017 a VUPAC passou a funcionar dentro da própria DECAP, o que facilitou consideravelmente a realização das audiências de custódia e contribuiu para que elas fossem ao máximo praticadas dentro do prazo de 24 horas. 

 

As complicações eram tão intensas que um grupo de juízes passou a voluntariamente auxiliar à custódia, quando possível, entre eles estando justamente o magistrado requerido, Tácio Gurgel Barreto, titular da 34ª Vara Cível da Comarca de Fortaleza/CE, demonstrando desde já sua proatividade e interesse em evitar que ocorressem audiências de custódia fora do prazo legal – função exercida, repita-se, voluntariamente e sem prejuízo do desempenho da magistratura na unidade da qual é titular. 

 

 Nesse período, de 2018 a 2019, o magistrado foi designado inúmeras vezes para atuar em audiências de custódia, somando esforços com outros colegas voluntários, em apoio aos magistrados integrantes da VUPAC, justamente para sanar os problemas existentes na referida unidade, que inviabilizava a realização de todas as audiências no prazo legal. 

 

 [...]

 

 Por óbvio, nessas circunstâncias, o Requerido era designado, muitas vezes, para realizar audiências de custódia que já se encontravam com o prazo extrapolado, motivo este do número de atos audienciais realizados por este magistrado além do prazo legal de 24 horas.  

 

 Aliás, pelo número de decisões guardadas por este magistrado, em seus arquivos pessoais, já que os dados não foram possíveis de serem tempestivamente obtidos, por seu volume, foram realizadas, aproximadamente, 170 audiências em 2018 e 240 audiências em 2019. Com isso, é de se observar que, mesmo diante dos problemas estruturais e burocráticos relatados, o apontado número de audiências realizadas fora do prazo, se considerado o total de audiências realizadas no referido período, cuja pauta diária nos dias em que foi designado oscilava entre 10 a 15 autuados entrevistados, não pode ser considerado desarrazoado.  

 

[...] 

 

 Em tal contexto, buscando-se sanar de vez as dificuldades da VUPAC, foi oficialmente instituída, em abril de 2019, a Comissão Temporária de Juízes da Vara Única Privativa de Audiências de Custódia, por meio da Portaria nº 141/2019 – (Doc. 01) –, justamente com a função de “auxiliar na realização das audiências de custódia”.  

 

 Consta em tal Portaria que a Comissão seria composta de três magistrados, da Comarca de Fortaleza, designados em sistema de sobreaviso, que atuariam em substituição aos magistrados designados para a atuação permanente na unidade, em escala diária fixa, quando de suas ausências legais, observando a compatibilidade de dia e horário com as funções originárias da titularidade, e conforme escala estabelecida pela unidade, atentando-se à equidade de atuação entre os magistrados. 

 

 Tendo sido um dos magistrados que chegaram a auxiliar a Vara Única Privativa de Audiência de Custódia voluntariamente antes da instituição de tal Comissão, eventualmente, em julho de 2019, foi o Juiz Tácio Gurgel Barreto designado a, sem prejuízo das suas atribuições como Juiz Titular na 34ª Vara Cível, compor a Comissão Temporária de Juízes de Direito da Vara Única Privativa de Audiência de Custódia, conforme consta na Portaria nº 488/2019 – (Doc. 02). 

 

 Ocorre que, mesmo com a criação de tal Comissão, vários outros obstáculos ainda precisavam ser superados na VUPAC, não apenas em relação a haver uma demanda maior do que a estrutura comportava, mas também pelo fato de que – na época – a expedição da certidão de antecedentes criminais dos presos – necessária para a realização das audiências de custódia – não era feita pela própria Vara, mas pela Central Integrada de Apoio à Área Criminal (CIAAC), entre outros problemas burocráticos que existiam. 

 

 Como mais um fator, mencione-se as recorrentes situações em que, após lavrado o flagrante, o procedimento respectivo era encaminhado pelas autoridades policiais aos fluxos errados dentro do sistema processual do TJ-CE, o que impedia que os magistrados detectassem de imediato a entrada de novos processos, somente estando hábeis a fazê-lo quando os feitos eram regularmente distribuídos ao fluxo da VUPAC. 

 

[...]

 

Em resumo, como é natural, problemas burocráticos e estruturais não se resolvem do dia para a noite e, dentro deste processo de aperfeiçoamento, é que se verifica o apontado número de audiências de custódia realizadas fora do prazo pelo Defendente.  

 

 Com efeito, é de se reconhecer, além da significativa melhora nos números em questão entre os anos de 2018 e 2020, que não é possível imputar ao magistrado requerido a responsabilidade por um problema estrutural da Vara que ele, ao contrário, contribuiu para basicamente extinguir.  

 

 Atualmente, na Vara Única Privativa de Audiência de Custódia, os raríssimos casos em que o prazo de 24 horas é ultrapassado (tendo acontecido apenas dois em 2020, com extrapolação de pouquíssimas horas) ocorrem em situações em que o preso dá um nome falso (o que atrasa a apreciação) ou quando o Auto de Prisão em Flagrante entra no sistema, mas o preso ainda não está na Delegacia de Capturas e Polinter – DECAP (de modo que na realidade não ultrapassado o prazo), o que igualmente não pode ser imputado ao magistrado requerido.  

 

 Reitere-se que a atuação do Juiz de Direito Tácio Gurgel Barreto foi fundamental para reverter a situação da VUPAC para tais números mais recentes, recorrentemente realizando audiências de custódia no próprio dia da prisão em flagrante, inclusive sendo importante pontuar, por exemplo, que os magistrados integrantes da referida Comissão de apoio, como é o caso do Requerido, em regra realizam audiências de custódia em dias de véspera de plantão, porque em tais dias sempre é incluída a 3ª sala de audiências, com o objetivo de, somando-se às permanentes duas salas de audiências de custódia, evitar que algum auto de prisão em flagrante fique para ser analisado pelo juízo plantonista, fiquem apenas para o plantão, sendo completamente infundada qualquer alegação de desídia, pois a realidade fática é justamente no sentido contrário. 

 

 Acresça-se, porque relevante, que no auxílio prestado à VUPAC – sem prejuízo do exercício de sua função à frente da 34ª Vara Cível da Comarca de Fortaleza/CE, da qual é titular –, o juiz Tácio Gurgel Barreto tem apresentado excelentes números, ouvindo, em média, de 08 a 12 (doze) flagranteados em audiências de custódia por dia (nos dias em que lá está). 

 

 Dessa forma, também nesse ponto inexistem mínimos indícios a ensejarem a abertura de Procedimento Administrativo Disciplinar (PAD), devendo ser a presente Reclamação Disciplinar de pronto arquivada, nos termos do art. 68 do Regimento Interno do CNJ e no art. 9º, §2º, da Resolução nº 135/2011 do CNJ. 

 

  

  

 

Em despacho de Id 4442491, a Corregedoria Nacional de Justiça deferiu o ingresso da Associação dos Magistrados Brasileiros – AMB para que seja incluída nos autos na condição de terceira interessada. 

 

No Id. 4466360, o magistrado requerido Tácio Gurgel Barreto juntou documentação referente à integralidade das portarias que o designaram para atuar voluntariamente em auxílio à VUPAC e ao quantitativo total de audiências de custódia por ele realizadas no período verificado.

 

O processo foi incluído em pauta para apreciação na 3ª Sessão Virtual de 2023, mas foi retirado a pedido do e. Conselheiro Marcello Terto, nos termos do art. 118-A, § 5º, II, do RICNJ.

 

Por fim, no id. 5060178, proferi decisão deferindo o ingresso da Associação Cearense de Magistrados como terceira interessada e deixei de acolher a alegação de decadência por ela formulada. É que não se cuida, no presente caso, de Revisão Disciplinar, vez que não houve instauração de Processo Administrativo Disciplinar na Corregedoria Local, que efetuou tão somente um procedimento prévio de apuração, nos termos do art. 9º, § 3º, da Resolução CNJ n. 135 de 2011.

 

Vieram aos autos memoriais, constantes do id 5095613.

 

É o relatório.

 

 

 

 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR - 0007451-08.2020.2.00.0000
Requerente: ROGÉRIO SCHIETTI CRUZ
Requerido: FRANCISCA ADELINEIDE VIANA e outros

 


VOTO

 

O MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO, CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA (Relator): 

2. Consoante relatado, após a apuração dos fatos objeto da presente Reclamação Disciplinar, concluiu a Corregedoria-Geral da Justiça do Estado do Ceará pelo arquivamento do expediente instaurado na origem em razão da ausência de elementos que justificassem a instauração de PAD contra os magistrados.

De fato, após análise acurada dos autos, verifica-se a ausência, na esfera administrativa disciplinar, de elementos reveladores de conduta funcional afrontosa aos deveres do Magistrado elencados na Lei Complementar n. 35/1979 (Lei Orgânica da Magistratura Nacional) e na Resolução CNJ n. 60/2008 (Código de Ética da Magistratura Nacional).

Conforme apurado, Mateus Jorge do Nascimento foi preso em flagrante no Município de Caucaia-CE, em 20/7/2020, pela suposta prática das condutas tipificadas nos arts. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006 e 2.º da Lei n. 12.850/2013 (Ação Penal n. 0053144-48.2020.8.06.0064), tendo permanecido preso por 21 dias sem que houvesse a análise da legalidade do flagrante.

Consta dos autos que o juiz José Coutinho Tomaz Filho, titular da 2ª Vara Criminal da Comarca de Caucaia-CE, com amparo em parecer ministerial exarado em 22/7/2020, declinou da competência em favor do Juízo da Vara de Delitos de Organizações Criminosas do Estado do Ceará, sem realizar a análise do auto de prisão em flagrante, destacando-se que as audiências de custódia estavam suspensas na ocasião.

Em 27/7/2020, o processo foi concluso ao colegiado de juízes que compõem a Vara de Delitos de Organizações Criminosas do Estado do Ceará que, em 3/8/2020, determinou a devolução dos autos à unidade judiciária de origem, sendo o feito remetido ao Juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Caucaia-CE em 7/8/2020.

Em 4/8/2020, a defesa impetrou o Habeas Corpus n. 0631058-32.2020.8.06.0000 no Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, tendo a Desembargadora Francisca Adelineide Viana, em 5/8/2000, indeferido o pedido liminar e concedido a ordem de ofício para determinar ao Juízo da Vara de Delitos de Organizações Criminosas do Estado do Ceará a realização do controle judicial sobre a prisão do paciente no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, sendo os expedientes cumpridos em 7/8/2020, quando foi formulado pedido de reconsideração.

Configurado o excesso de prazo para o controle da legalidade e necessidade da segregação cautelar, o eminente Ministro Rogerio Schietti Cruz, do Superior Tribunal de Justiça, em 9/8/2020, deferiu medida liminar nos autos do Habeas Corpus 603.618/CE, “para relaxar a prisão em flagrante do autuado, cuja precariedade não permite sua subsistência por tantos e tantos dias sem a homologação judicial e convolação em prisão preventiva”.

Nesse sentido, com amparo na mencionada decisão lavrada pelo Ministro Rogerio Schietti Cruz, em 10/8/2020 foi proferida decisão pelo Juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Caucaia/CE homologando a prisão em flagrante, sendo expedido o alvará de soltura do custodiado e remetido à Unidade Prisional onde se achava recolhido, com o ulterior reenvio dos autos à Vara de Delitos de Organizações Criminosas do Estado do Ceará.

Consoante relatado, em virtude da superveniente aposentadoria do requerido José Coutinho Tomaz Filho, Juiz da 2ª Vara Criminal da Comarca de Caucaia-CE, o presente feito foi arquivado em relação ao referido magistrado.

No que se refere à Desembargadora Francisca Adelineide Viana, também foi determinado o arquivamento da Reclamação Disciplinar, com a recomendação para que a magistrada zelasse pela pronta execução das ordens que conceder em Habeas Corpus ou em outros processos de natureza urgente.

Por sua vez, quanto aos magistrados Tácio Gurgel Barreto, André Teixeira Gurgel e Henrique Lacerda de Vasconcelos, do colegiado de Juízes que compõem a Vara de Delitos de Organizações Criminosas do Estado do Ceará, a análise dos autos demonstra que, de fato, não se evidenciam indícios de infração disciplinar.

Por certo, o normativo do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará prevê que a Vara de Delitos de Organizações Criminosas do Estado do Ceará não é o órgão competente para a realização das audiências de custódia dos autos de prisão em flagrante da comarca de Fortaleza/CE, ainda que envolvendo processos de sua competência.

 Confira-se o que prescreve a Resolução nº 13/2018 do TJCE, no ponto que importa:

Art. 6º. As audiências de custódia que devam ter lugar em feitos de competência da Vara de Delitos de Organizações Criminosas serão realizadas, nos termos da legislação atualmente em vigor, sob a responsabilidade do Juízo da 17ª Vara Criminal – Vara única Privativa de Audiências de Custódia. (g.n.)

 

Verifica-se, portanto, que a resolução supracitada não regulamentou, de modo explícito, a realização das audiências de custódia relativas aos flagrantes lavrados em comarcas diversas, quanto aos processos de competência da Vara de delitos de Organizações Criminosas, já que a competência da Unidade se estende por todo o Estado do Ceará, enquanto a Vara Única Privativa de Audiências de Custódia (17ª Vara Criminal) possui competência apenas para a análise dos autos de prisão em flagrante da comarca de Fortaleza.

Nesse sentido, a questão da competência para a realização das audiências de custódia relativas aos processos de competência da Vara de delitos de Organizações Criminosas decorrentes de autuações em flagrante delito realizadas em outras comarcas (hipótese dos autos) restou devidamente esclarecida pelo Tribunal de Justiça do Estado do Ceará por intermédio da Instrução Normativa n. 5, de 19 de dezembro de 2018, que regulamentou o art. 6º da Resolução n. 13/2018.

Veja-se o dispositivo da Instrução Normativa nº 05/2018:

Art. 2º As audiências de custódia decorrentes de autuações em flagrante realizadas nas comarcas do interior do Estado, quanto a crimes cujo processo e julgamento estejam abrangidos pela competência Vara de Delitos de Organizações Criminosas, serão realizadas pelos respectivos Juízos que foram comunicados das prisões, procedendo-se, em seguida, à remessa dos autos ao Juízo competente. (g.n.)

Portanto, conforme se depreende dos normativos transcritos, o Juízo da Vara de Delitos de Organizações Criminosas não era, de fato, competente para a realização da audiência de custódia no caso em apuração.

É certo que poder-se-ia esperar dos magistrados envolvidos cautela adicional, tendo em vista que a prisão perdurava há alguns dias sem a análise do flagrante. Todavia, não há como pretender responsabilizá-los do ponto de vista disciplinar, considerando que os magistrados atuaram em conformidade com o comando normativo vigente.

De outro lado, constata-se evidente imprecisão no normativo que regula a matéria no âmbito do TJCE, ensejando, inclusive, a necessidade de expedição de Instrução Normativa com a finalidade de esclarecer pontos controvertidos.

Assim, revela-se necessária a adequação das orientações normativas a respeito do assunto em instrumento único, claro e preciso, a fim de que sejam extirpadas dúvidas interpretativas capazes de gerar novas ocorrências como as que são objeto de apreciação no caso presente.

Sem prejuízo do que até aqui foi exposto, é necessário registrar que, conforme se extrai do expediente de id 4312466, apurou-se que o magistrado Tácio Gurgel Barreto deixou de examinar a prisão em flagrante no prazo de 24 horas em 89 processos, em sua maioria distribuídos em 2018 (51 feitos) e em 2019 (36 feitos), além de dois APFs no ano de 2020. Do mesmo modo, o magistrado José Coutinho Tomaz Filho deixou de examinar a prisão em flagrante no prazo de 24 horas em 47 processos no ano de 2020 – questões que merecem apreciação mais aprofundada. Nesse cenário, a Corregedoria Nacional adotará as providências necessárias à averiguação específica das mencionadas condutas, instaurando, de ofício, a respectiva Reclamação Disciplinar.

      Consta dos autos que o Magistrado José Coutinho Tomaz Filho se aposentou voluntariamente em 26/04/2021.   No entanto, não há regra legal que impeça a instauração de procedimento disciplinar nesta hipótese. 

Diante desse quadro, não obstante se pudesse esperar alguma prudência adicional dos magistrados, tem-se, na hipótese dos autos, que os julgadores cumpriram as disposições expressas nos normativos vigentes, consoante consta da decisão proferida pela Corregedoria-Geral de Justiça do Estado do Ceará.

 

3. Ante o exposto, inexistindo elementos indiciários de afronta à LOMAN e ao Código de Ética da Magistratura Nacionalvoto pelo arquivamento da presente Reclamação Disciplinar. 

Encaminhe-se expediente ao Tribunal de Justiça do Ceará, propondo a necessária reformulação dos normativos que regulam a matéria, de modo a evitar futuras ocorrências semelhantes. 

Após, à Secretaria Processual para que: 

a-    Promova a baixa e arquivamento da presente Reclamação Disciplinar; e  

b-    Adote as providências necessária à abertura de nova Reclamação Disciplinar, servindo o presente voto como inicial, tendo como Reclamante a Corregedoria Nacional de Justiça e, como reclamados, os juízes Tácio Gurgel Barreto e José Coutinho Tomaz Filho, do Tribunal de Justiça do Ceará, especificamente para apurar situação de recorrente extrapolação do prazo no exame de prisões em flagrante, conforme informações constantes do id 4312466. 

Necessário, portanto, que sejam requisitadas informações dos magistrados Reclamados (art. 67, §3º do RICNJ), fixando-se o prazo de quinze dias. 

Sem prejuízo, certifique a Secretaria Processual a eventual existência de procedimentos em curso neste Conselho Nacional de Justiça em face dos magistrados requeridos. 

Autue-se como Reclamação Disciplinar com cadastro no PJe. 

Por fim, concluído o julgamento nos termos do proposto, expeça-se ofício ao Excelentíssimo Senhor Ministro Rogério Schietti Cruz, dando notícia acerca desta decisão. 

É como voto

Intimadas as partes, arquive-se.  

 


 

Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO

  Corregedor Nacional de Justiça 

  

 J1/F4