Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0006464-40.2018.2.00.0000
Requerente: CORREGEDORIA-GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DO MARANHÃO
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO MARANHÃO - TJMA

 

EMENTA: RECURSO ADMINISTRATIVO. PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO MARANHÃO. PROMOÇÕES DE MAGISTRADOS COM FUNDAMENTO NO ART. 42-A DO CÓDIGO DE DIVISÃO E ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIAS DO ESTADO. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DE LEI ESTADUAL. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO CONHECIDO, PORÉM, NÃO PROVIDO.  

1. Recurso administrativo em Procedimento de Controle Administrativo contra o Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, em que se busca o cancelamento de promoções de magistrados efetivadas com base em lei complementar do Estado que faculta ao magistrado promovido para a entrância final permanecer na unidade judiciária de entrância intermediária de que era titular. 

2. A possibilidade de o CNJ afastar a incidência de lei, para controlar ato dela decorrente, pressupõe a prévia manifestação do Supremo Tribunal Federal acerca do tema em debate (STF, Pet 4656/PB, Relatora Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, julgado em 19/12/2016, Acórdão Eletrônico DJe-278 Divulg 01-12-2017 Public 04-12-2017).

3. Não pode ser conhecida a pretensão, sob pena de cometer o Conselho impossível usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal.

4. Inexistência de fato novo ou de elementos capazes de infirmar os fundamentos que lastreiam a decisão impugnada.  

5. Recurso conhecido, porém não provido. 


 

 ACÓRDÃO

Após o voto do Conselheiro vistor, o Conselho, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator. Plenário Virtual, 30 de agosto de 2019. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Dias Toffoli, Humberto Martins, Aloysio Corrêa da Veiga, Iracema Vale, Valtércio de Oliveira, Márcio Schiefler Fontes, Fernando Mattos (então Conselheiro), Luciano Frota, Maria Cristiana Ziouva, Arnaldo Hossepian, André Godinho e Maria Tereza Uille Gomes. Não votaram os Excelentíssimos Conselheiros Daldice Santana (então Conselheira) e Henrique Ávila.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0006464-40.2018.2.00.0000
Requerente: CORREGEDORIA-GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DO MARANHÃO
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO MARANHÃO - TJMA


RELATÓRIO 

  

Trata-se de Recurso Administrativo interposto pelo Desembargador-Corregedor Geral da Justiça do Estado do Maranhão contra decisão que não conheceu do pedido formulado e determinou o arquivamento do feito, nos termos do art. 25, X, do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça.

Na petição inicial, alegou o requerente que o art. 42-A do Código de Divisão e Organização Judiciárias do Estado, ao prever que “o juiz promovido para entrância final, que contar com mais de cinco anos em comarca de entrância intermediária com mais de 150.000 habitantes no termo sede, poderá optar por permanecer na mesma unidade judiciária de entrância intermediária de que era titular”, assegura aos magistrados do e. Tribunal Maranhense a possibilidade de se valerem da chamada “promoção bate e volta”, em patente afronta ao art. 93, II, da Constituição da República, assim como em prejuízo a remoções e à promoção de juízes de entrância inicial, que ficam impossibilitados de alcançar a entrância intermediária.

Nessa perspectiva, afirmou que o que se verifica, em vez de elevação de entrância, é a mera progressão – isto é, aumento de remuneração – e, na maioria dos casos, posse desses magistrados no cargo de “Juiz de Direito de Entrância Final”, e não no de juiz auxiliar de entrância final, para o qual foram promovidos.

Sustentou, ainda, que os referidos cargos de “Juiz de Direito de Entrância Final” não teriam sido criados por lei e que o mesmo vício afetaria o aumento remuneratório, porquanto “inexistindo o cargo, não há falar em remuneração”. Alegou que como alguns magistrados promovidos eram empossados no cargo de “Juiz de Direito de Entrância Final”, o cargo de juiz auxiliar era ofertado novamente à promoção, o que passou a permitir que juízes ocupassem “cargos de Juiz Auxiliar que não existem”.

Aduziu, por fim, que, em razão da afronta à Constituição da República, já teria sido encaminhada à Procuradora Geral da República representação com vistas à propositura de Ação Direta de Inconstitucionalidade, assim como pontuou que pode o CNJ, dado o entendimento assentado pela e. Suprema Corte na PET 4.656/PB, determinar o afastamento da norma tida como inconstitucional.

Diante de tais fatos, pleiteou a suspensão liminar dos Editais 32/2018, 33/2018 e 34/2018, que cuidam da promoção de magistrados maranhenses ao cargo de juiz auxiliar da comarca da Ilha de São Luís. No mérito, requereu fosse afastada, por inconstitucionalidade, a aplicação do referido art. 42-A, com consequente cancelamento dos processos de promoção (Editais 32/2018, 33/2018 e 34/2018).

O feito foi inicialmente distribuído à Corregedoria Nacional de Justiça; porém, em 13-9-2018, foi redistribuído ao Conselheiro Fernando Mattos, uma vez que o Órgão Censor entendeu que a questão extrapolava a sua competência (Id. 3249021).

Ato contínuo, dado que a matéria objeto deste procedimento se relaciona com aquela versada no PCA 0006436-72.2018.2.00.0000, sob minha relatoria, reconheci a prevenção suscitada (art. 44, § 5º, do Regimento Interno CNJ) e determinei a notificação do e. Corte requerida para que apresentasse informações em prazo de até 5 (cinco) dias (Id. 3265573).

Em resposta, o e. Tribunal requerido apontou que: a) as leis são presumidamente constitucionais; b) o controle de constitucionalidade de ato administrativo pelo CNJ ocorre apenas em casos excepcionais; c) o dispositivo ora questionado está em consonância com o art. 93, II, da Constituição da República, com o art. 70 Código de Divisão e Organização Judiciária do Maranhão e com o art. 155 do Regimento Interno daquela Corte, que possibilita aos magistrados, cuja entrância tenha sido elevada, requerer ao Tribunal que sua promoção se efetive na comarca ou vara de que era titular; e d) o CNJ já se manifestou sobre o referido art. 155 e considerou que não continha vícios.

Relatou, também, que: a) 12 (doze) magistrados fizeram uso da prerrogativa disposta no art. 42-A e que o Desembargador-Corregedor esteve presente em 10 (dez) dessas promoções, manifestando-se de forma favorável; b) as promoções relativas aos Editais 32/2018, 33/2018 e 34/2018 ocorreram em 19-9-2018; c) não há prejuízo a magistrados de entrância intermediária ou inicial, porquanto “ao serem promovidos para a entrância final, além de progredirem na carreira, permitiram que outros 12 magistrados da entrância intermediária passassem a compor a primeira quinta parte da lista de antiguidade”; d) os juízes contemplados pelo art. 42-A tomaram posse no cargo de Juiz de Direito de Entrância Final; e) não há inchaço artificial ou ilegal de cargos de juiz auxiliar, já que o Código de Organização Judiciária prevê um número de magistrados fixos por comarca, e não por entrância; e f) encaminhou ofício ao Presidente da Comissão de Divisão e Organização Judiciárias e Assuntos Legislativos, para que fosse realizado estudo destinado  a promover a alteração do art. 42-A (Id. 3336169).

Na sequência, sobreveio requerimento da Associação dos Magistrados do Maranhão (AMMA), por meio da qual pleiteou o ingresso no feito na condição de terceira interessada, assim como defendeu, em síntese, que: a) não haveria possibilidade de suspensão liminar ou cancelamento dos editais 32, 33 e 34/2018, uma vez que as promoções já ocorreram, e em observância ao direito adquirido dos magistrados; b) ainda que se admitisse que o CNJ pudesse afastar a aplicação da lei por inconstitucionalidade só poderia fazê-lo em “hipóteses de cabal e inconteste ultraje à Constituição”; c) este Conselho já teria reconhecido a regularidade da promoção “bate e volta” ao se manifestar sobre o art. 155 do Regimento Interno do TJMA; d) a intenção do legislador em estabelecer a regra do art. 42-A teria sido a de preservar o interesse público na continuidade dos serviços; e e) “a LC 188/2017, em seu art. 42 -A, criou também a despesa e a respectiva rubrica orçamentária” (Id. 3338822).

Em 10-10-2018, foi indeferida a liminar, autorizado o ingresso da AMMA como terceira interessada, assim como requisitadas ao TJMA informações acerca das unidades judiciárias das comarcas da Ilha de São Luís, Imperatriz, Timon e Caxias, com a devida identificação dos juízes de direito titulares, auxiliares e de entrância final (Id. 3338510).

Ao prestar as informações, a e. Corte requerida repisou os argumentos aduzidos, assim como destacou que atualmente a comarca da Ilha de São Luís conta com 89 (oitenta e nove) magistrados titulares e 40 (quarenta) juízes auxiliares; a de Imperatriz com 18 (dezoito) juízes; a de Timon com 9 (nove) magistrados e a de Caxias com 7 (sete) juízes. Registrou, ainda, que há magistrados de entrância inicial e intermediária que são titulares de comarcas de entrância final, porque tais comarcas foram elevadas de entrância quando já eram titularizadas pelos referidos juízes (Id. 3471866).

Em 28-11-2018, foi proferida decisão que não conheceu do pedido e determinou o arquivamento do feito, por se entender que “a pretensão exorbita a competência do CNJ para o controle de atos administrativos e se revela imediato e direto controle de constitucionalidade de lei estadual” (Id. 3214611).

Irresignado, o requerente interpôs o presente recurso, por meio qual renovou as alegações apresentadas, requereu a reforma da decisão, bem como pugnou fosse concedido efeito ativo ao recurso, para determinar o cancelamento das promoções deflagradas pelos Editais 32/2018, 33/2018 e 34/2018.

Asseverou ainda, em síntese, que: a) nunca pretendeu que o CNJ exercesse o controle de constitucionalidade e que a inconstitucionalidade do art. 42-A do CDOJ/MA só teria sido invocada para que fosse determinado o cancelamento das promoções decorrentes dos referidos editais; b) a representação feita à PGR não impede o controle por este Conselho; c) tanto a Lei Maior quanto a LOMAN fixam a necessidade de movimentação dos magistrados de entrância para entrância, o que revelaria a afronta existente no dispositivo atacado; d) ao contrário do que defende a AMMA, não consta autorização de despesa para custear cargos surgidos artificialmente e que a situação revelaria desconformidade com a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF); e) a incongruência verificada no MS 29.077/DF-MC se amoldaria “como luva ao presente caso”  (Id. 3518116).

Em contrarrazões, o e. Tribunal requerido suscitou as preliminares de não conhecimento do pedido, devido à mera repetição de argumentos já expostos, e de inovação da tese recursal. No mérito, reiterou as alegações já aduzidas, assim como argumentou que: a) teriam sido observados os parâmetros impostos pela LRF; b) o dispositivo teria respeitado todos os trâmites legais; c) “nada obstaculiza que o juiz promovido siga titularizado em comarca de entrância diversa, desde que legalmente estabelecido”; d) “a mudança de unidade jurisdicional não é requisito necessário e obrigatório para a efetivação da promoção”; e) as comarcas contempladas pelo art. 42-A, da LC 14/1991, apresentam demandas consideravelmente mais complexas, sensíveis e específicas; f) o citado MS 29.077/DF-MC não se aplicaria ao caso, porque tratava de “magistrados de entrância inferior que atuam em comarcas classificadas como entrância final teriam passado a receber privilégios equivalentes a essa entrância sem passarem pelo devido processo de promoção”; e g) não se mostraria razoável decretar a nulidade de 3 (três) promoções, quando 12 (doze) magistrados foram promovidos em situação idêntica (Id. 3542361).

A AMMA, por seu turno, defendeu as preliminares de “perda de objeto”, porque as promoções já foram concluídas; de inovação recursal e de não conhecimento pela ausência de fatos ou elementos novos. No mérito, reafirmou os argumentos trazidos pelo TJMA (Id. 3547572). 

Em 28-2-2019, foi indeferido o pedido de efeito ativo ao recurso interposto (Id. 3555467).  

É o relatório.

 

 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0006464-40.2018.2.00.0000
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VOTO

 

O recurso é tempestivo e próprio, razão pela qual deve ser conhecido, nos termos do art. 115 do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça. 

Conforme relatado, o recorrente impugna decisão que não conheceu do pedido e determinou o arquivamento do feito em razão de a demanda revelar imediato e direto controle de constitucionalidade de lei estadual.

Em preliminar, sustentou o e. Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão (TJMA) que o pleito recursal não deveria ser conhecido, pois os argumentos trazidos na inicial teriam sido apenas reiterados pelo recorrente, assim como afirmou que haveria inovação do pedido. Já a Associação dos Magistrados do Maranhão (AMMA) acresceu, às alegações da e. Corte Maranhense, a tese de “perda de objeto”, porque as promoções já ocorreram. 

Referidas alegações, porém, não merecem acolhida.

Ainda que se considere que o recorrente tenha tão somente renovado suas razões, tal fato não acarreta o não conhecimento do pedido. Consoante se verifica nos próprios precedentes invocados pelo e. Tribunal requerido, a mera renovação de argumentos dá ensejo ao desprovimento do recurso, e não ao seu não conhecimento.

Outrossim, não prospera o argumento de que a pretensão teria sido modificada no recurso, uma vez que o ora recorrente pleiteia, desde a inicial, o afastamento do art. 42-A da Lei Complementar 14/1991 (Código de Divisão e Organização Judiciárias do Estado do Maranhão), sob a justificativa de cancelamento de promoções (Editais 32/2018, 33/2018 e 34/2018).

Também não se há de falar em perda do interesse processual, porquanto a efetivação das promoções não teria o condão de afastar a atuação deste Conselho, que detém competência constitucional para examinar a legalidade de atos administrativos emanados do Poder Judiciário e proceder à eventual desconstituição daqueles contrários a princípios constitucionais e a previsões legais (art. 103-B, § 4º, II, CF/88) – sejam eles editais ou promoções já concretizadas.

Ao avançar sobre o mérito, entretanto, não se verifica a existência de fato novo ou de elementos capazes de infirmar os fundamentos que lastreiam a decisão impugnada, proferida nos seguintes termos:  

 

II – Não se desconhece que o mais recente posicionamento do Supremo Tribunal Federal (STF) é no sentido de que, entre os poderes conferidos pela Constituição da República a este Conselho, está o de afastar, por decisão da maioria absoluta de seus membros, a incidência de lei contrária à Lei Maior e avançar no exame da validade do ato administrativo dela decorrente (Pet 4656, Relator(a):  Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, julgado em 19/12/2016, Acórdão Eletrônico DJe-278 Divulg 01-12-2017 Public 04-12-2017).

No presente caso, porém, não se está diante de situação que se amolda ao entendimento da Suprema Corte, porquanto o que se pretende é o controle da própria Lei Complementar 14/1991 (Código de Divisão e Organização Judiciárias do Estado do Maranhão), alterada pela LC 188/2017, o que, a toda evidência, extrapola as funções do CNJ, órgão de natureza administrativa, que não detém competência para o controle de constitucionalidade.

Com efeito, ao se voltar contra a previsão do art. 42-A do Código de Organização Judiciária do Estado, que permite a magistrados promovidos para a entrância final permanecer na entrância intermediária, o requerente não busca o controle de um ato administrativo, mas sim pugna para que seja afastada a aplicação do referido dispositivo por inconstitucionalidade.

Nessa perspectiva, não há dúvida de que o que se pretende é discutir a legitimidade da lei em tese, ou seja, o próprio exercício do controle concentrado de constitucionalidade, que compete precipuamente ao Supremo Tribunal, guardião da Lei Maior, e que se efetiva por meio da ação direta de inconstitucionalidade, cujos legitimados à propositura são aqueles previstos no art. 103 da Constituição da República.

Tanto é assim que consta dos autos que já houve o encaminhamento de representação à Procuradora Geral da República para que “proponha a ação direta de inconstitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal, inclusive com pedido de medida cautelar” (Id. 3214611, p. 40).

Além disso, é oportuno registrar que, consoante informações do e. Tribunal Maranhense, foi enviado ofício ao Presidente da Comissão de Divisão e Organização Judiciárias e Assuntos Legislativos, para que fosse realizado estudo com o intuito de alterar o dispositivo ora impugnado (Id. 3336169).

Portanto, dado que a pretensão exorbita a competência do CNJ para o controle de atos administrativos e se revela imediato e direto controle de constitucionalidade de lei estadual, não há como conhecer do pedido (Recurso Administrativo em Pedido de Providências - 0002880-96.2017.2.00.0000 - Rel. Iracema do Vale - 272ª Sessão Ordinária - j. 22/05/2018; Recurso Administrativo em Pedido de Providências 0004945-64.2017.2.00.0000 - Rel. Maria Tereza Uille Gomes - 35ª Sessão Virtual - j. 22/08/2018).

III – Ante o exposto, não conheço do pedido formulado e determino o arquivamento do feito, o que faço por força do art. 25, X, do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça.

 

Como já registrado, não há dúvida de que o e. Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu, no julgamento da Pet 4656/PB (Relatora Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, julgado em 19/12/2016, Acórdão Eletrônico DJe-278 Divulg 01-12-2017 Public 04-12-2017), a possibilidade de o CNJ afastar a incidência de lei contrária à Constituição da República e avançar no exame de ato administrativo que nela se fundamente.

Cuida-se, segundo o e. STF, “de poder implicitamente atribuído aos órgãos autônomos de controle administrativo para fazer valer as competências a eles conferidas pela ordem constitucional”. Poder que – no caso do CNJ – tem o intuito de garantir o exercício de sua competência precípua de controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário.

Não se pode, porém, extrair daquele julgado interpretação que nem a própria e. Suprema Corte pretendeu conferir. Ou seja, forçar entendimento que contrarie frontalmente os mandamentos constitucionais ao cogitar que teria sido atribuído ao CNJ – órgão que não dispõe de nenhuma função jurisdicional (ADI 3367, Relator(a):  Min. Cezar Peluso, Tribunal Pleno, julgado em 13/04/2005, DJ 17-03-2006) – o poder de avançar sobre a competência do Excelso Pretório para o exercício do controle concentrado de constitucionalidade.

Qualquer exegese que se faça daquele julgado deve ser compatível com a Lei Maior, com a natureza eminentemente administrativa do CNJ e, sobretudo, com a preservação da função do STF, lídimo guardião da Constituição, a quem compete “o monopólio da última palavra [...] em matéria de interpretação constitucional. O exercício da jurisdição constitucional – que tem por objetivo preservar a supremacia da Constituição” (ADI 3345, Relator(a):  Min. Celso De Mello, Tribunal Pleno, julgado em 25/08/2005, DJe-154 divulg 19-08-2010 public 20-08-2010).

Nessa perspectiva, há de convir-se que a possibilidade de o CNJ afastar a incidência de lei, para controlar o ato dela decorrente, pressupõe a prévia manifestação da e. Suprema Corte acerca do tema em debate. Ainda que o Supremo Tribunal não tenha declarado a inconstitucionalidade da lei em que se fundamentam os atos questionados no âmbito deste Conselho, é preciso que ele já se tenha pronunciado sobre (in)constitucionalidade da matéria posta, para que o CNJ possa apenas perfilhar o mesmo entendimento, e não inaugurar tese sobre eventual inconstitucionalidade de lei, em patente usurpação de competência daquela Corte.

É dizer: cabe ao STF declarar qual é a correta interpretação que se deve dar à Constituição da República e ao CNJ tão somente valer-se do parâmetro para assegurar a concretização de princípios constitucionais e assim proceder ao controle de atos administrativos.

Nesse sentido: “Noutras palavras, nem o Conselho, nem o Tribunal, poderiam divergir da orientação firmada pelo Supremo Tribunal Federal. Por isso, a jurisprudência desta Corte tem, em tais hipóteses, legitimado a atuação do CNJ no afastamento de normas tidas por inconstitucionais” (MS 36034 MC, Relator(a): Min. Edson Fachin, julgado em 25/10/2018, publicado em processo eletrônico DJe-231 divulg 29/10/2018 public 30/10/2018). Há também a previsão do Enunciado 12/2017, do Conselho Nacional do Ministério Público, que “dispõe sobre a competência do Conselho Nacional do Ministério Público para, no exercício de suas atribuições, afastar a incidência de lei que veicule matéria já declarada inconstitucional pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal”.

Esse tem sido o tradicional e claro posicionamento do próprio CNJ. No PCA 0001876-05.2009.2.00.0000 (Rel. Antônio Umberto Souza Júnior - 86ª Sessão Ordinária - j. 09/06/2009), objeto da aludida PET 4.656/PB, o Conselho só declarou a nulidade dos atos e determinou a exoneração de servidores nomeados para cargos em comissão criados por lei do Estado da Paraíba por inobservância à regra do concurso público, porque seguiu o entendimento da decisão proferida na ADI 3.233/PB (Relator(a):  Min. Joaquim Barbosa, Tribunal Pleno, julgado em 10/05/2007, DJe-101 divulg 13-09-2007 public 14-09-2007 DJ 14-09-2007), em que a Suprema Corte assentou que “ofende o disposto no art. 37, II, da Constituição Federal norma que cria cargos em comissão cujas atribuições não se harmonizam com o princípio da livre nomeação e exoneração, que informa a investidura em comissão”.

Novamente, em recente precedente, de minha Relatoria (PCA 0007054-51.2017.2.00.0000 - Rel. Márcio Schiefler Fontes - 41ª Sessão Virtual - j. 14/12/2018), o Plenário do CNJ afastou a incidência de lei alagoana, para declarar a nulidade de dispositivo da Resolução TJAL 12/2017, que, com base na norma local, conferia aos servidores a possibilidade de migrar para áreas e especialidades distintas das que foram enquadrados. Todavia, o Conselho só assim procedeu porque já havia manifestação do Supremo Tribunal em inúmeros precedentes, que reafirmam a necessidade de prévia aprovação em concurso público para a investidura em cargo ou empregos públicos, ressalvadas as exceções constitucionais (ADI 1342, Relator(a):  Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 02/09/2015, Acórdão Eletrônico DJe-239 Divulg 25-11-2015 Public 26-11-2015 Republicação: DJe-245 Divulg 03-12-2015 Public 04-12-2015); ADI 248, Relator(a):  Min. Celso de Mello, Tribunal Pleno, julgado em 18/11/1993, DJ 08-04-1994 PP-07222 Ement Vol-01739-01 PP-00008), conforme a Súmula Vinculante 43.

Não é, contudo, o que se verifica no caso vertente. Na hipótese dos autos, submetem-se a este Conselho atos concretizados com supedâneo em comando legal que garante a magistrados promovidos para a entrância final a faculdade de permanecerem na mesma unidade judiciária de entrância intermediária de que eram titulares (art. 42-A do Código de Organização Judiciária do Estado).

Trata-se, pois, de previsão que, conquanto questionável, envolve tema que não foi objeto de pronunciamento do STF no que concerne à compatibilidade com a Constituição.

Para que não pairem dúvidas acerca da matéria versada no presente feito, vale dizer que a regra instituída pela lei maranhense sequer coincide com a chamada “promoção virtual” – procedimento mais comum no âmbito dos Tribunais de Justiça e até dos Ministérios Públicos dos Estados – em que leis locais asseguram ao magistrado ou membro do MP, titular de comarca cuja entrância tenha sido elevada, a faculdade de optar por nela permanecer após a sua promoção, sem que a vaga seja oferecida em concurso.

Enquanto o Código de Organização Judiciária do Maranhão (art. 42-A, Lei Complementar Estadual 14/1991) propicia ao magistrado promovido para a entrância final o direito de permanecer na unidade judiciária de entrância intermediária de que era titular, na “promoção virtual” é a comarca que se eleva de entrância primeiro e ao magistrado, ao ser posteriormente promovido, é concedida a possibilidade de se efetivar na mesma unidade de que era titular.

Registre-se, insisto, que nem sobre a “promoção virtual” há pronunciamento definitivo da Suprema Corte. Em que pese a Súmula 40 (STF) estabelecer que “a elevação da entrância da Comarca não promove automaticamente o Juiz, mas não interrompe o exercício de suas funções na mesma Comarca”, ainda são objeto de questionamento no âmbito do Supremo Tribunal leis locais que disciplinam a mencionada promoção (v.g. Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5652/SC – Relator: Min. Luiz Fux).

Não obstante, mesmo diante de todo esse cenário, defende o recorrente que o que se busca, no presente procedimento, é o mero controle das promoções, e não o controle de constitucionalidade do mencionado art. 42-A da norma local. Além disso, insiste que a representação feita à Procuradoria Geral da República para que seja proposta ADI em nada impede a atuação do CNJ.

No entanto, embora ciente de que 12 (doze) promoções foram efetivados com base no dispositivo ora questionado, limita-se a pleitear o cancelamento de apenas 3 (três) dessas promoções. Outrossim, não deixa de assinalar que se faz necessária a intervenção do CNJ “até porque nada garante que de fato a PGR vá ingressar com a ADI” (Id. 3518116, p.8).

Portanto, dada a imediatidade do pedido, não pode valer a pretensão, sob pena de cometer o Conselho impossível usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal, de modo a “reconhecer” – por meio de procedimento com regras menos rígidas, sobretudo de legitimidade – a inconstitucionalidade o art. 42-A da Lei Complementar Estadual 14/1991. Ademais, há de se admitir que qualquer atuação que acabasse por negar – ainda que por via reflexa – vigência à lei local, revelaria autêntico controle concentrado de constitucionalidade exercido por órgão administrativo, o que, por óbvio, não pretendeu o constituinte originário, tampouco o derivado (Emenda Constitucional 45/2004).

Ante o exposto, voto no sentido de conhecer do recurso, mas, no mérito, de negar-lhe provimento, para manter a decisão proferida. 

Brasília/DF, data registrada no sistema 

  

Conselheiro Márcio Schiefler Fontes 

Relator 

 

 

Brasília, 2019-09-09.