Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR - 0004484-92.2017.2.00.0000
Requerente: TIAGO ASSIS DA SILVA
Requerido: MARCELO MARCOS CARDOSO

 


 

EMENTA 

  

RECURSO ADMINISTRATIVO EM RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR. MATÉRIA DE NATUREZA EMINENTEMENTE JURISDICIONAL. IMPOSSIBILIDADE DE REEXAME. 

 

1. O que se alega contra o magistrado, conforme decisão ora recorrida, classifica-se como matéria estritamente jurisdicional, qual seja, indeferimento do pedido de redesignação de audiência e a aplicação de multa ao advogado por litigância de má-fé Em tais casos, deve a parte valer-se dos meios processuais adequados, não cabendo a intervenção do Conselho Nacional de Justiça.

 

2. O CNJ, cuja competência está restrita ao âmbito administrativo do Poder Judiciário, não pode intervir em decisão judicial para corrigir eventual vício de ilegalidade ou nulidade, porquanto a matéria aqui tratada não se insere em nenhuma das previstas no art. 103-B, § 4º, da Constituição Federal.

 

3. A jurisprudência desta Corte Administrativa é no sentido de que, diante da apresentação de denúncia genérica, sem elemento indiciário mínimo de eventual desvio de conduta por parte do recorrido, não cabe ao Conselho Nacional de Justiça apreciar a questão. Precedente.

 

Recurso administrativo improvido.

 

S02/Z10/S13

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator. Plenário Virtual, 30 de agosto de 2019. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Dias Toffoli, Humberto Martins, Aloysio Corrêa da Veiga, Iracema Vale, Daldice Santana (então Conselheira), Valtércio de Oliveira, Márcio Schiefler Fontes, Fernando Mattos (então Conselheiro), Luciano Frota, Maria Cristiana Ziouva, Arnaldo Hossepian, André Godinho e Maria Tereza Uille Gomes. Não votaram os Excelentíssimos Conselheiros Henrique Ávila e, em razão da vacância do cargo, o representante da Ordem dos Advogados do Brasil.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR - 0004484-92.2017.2.00.0000
Requerente: TIAGO ASSIS DA SILVA
Requerido: MARCELO MARCOS CARDOSO


RELATÓRIO


           O EXMO. SR. MINISTRO HUMBERTO MARTINS, CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA (Relator):

Cuida-se de recurso administrativo interposto por TIAGO ASSIS DA SILVA contra decisão monocrática, que determinou o arquivamento da reclamação disciplinar proposta em desfavor de MARCELO MARCOS CARDOSO, Juiz titular da 1ª Vara da Fazenda Pública da comarca de Toledo/PR - id 2308741.

Para melhor compreensão da matéria, transcrevo o relatório do decisum ora recorrido:

“Trata-se de reclamação disciplinar formulada por Tiago Assis da Silva em desfavor de Marcelo Marcos Cardoso, Juiz titular da 1ª Vara da Fazenda Pública da comarca de Toledo (PR). 

O requerente afirma que protocolou, no juízo requerido, pedido de “redesignação” de audiência referente ao Processo n. 0009731-862014.8.16.0170.

Alega que, além de indeferir o pedido sem base legal e com abuso de autoridade, o requerido lhe teria imputado a pecha de “chicaneiro” e aplicado multa.

Sustenta que, não bastassem o destempero e o abuso de autoridade, contra ele o requerido ajuizou ação civil buscando ser indenizado.

Por fim, aduz que o requerido valeu-se do cargo público para obter informações restritas suas para instruir a referida ação civil, configurando novo abuso de autoridade (Id 2188804).

Requer, assim, a apuração dos fatos, a instauração do processo disciplinar e a aplicação das penalidades cabíveis.

A Corregedoria local encaminhou à Corregedoria Nacional (Id 2307924) o resultado da apuração lá efetuada, que concluiu pelo arquivamento do expediente.

Na origem, após a manifestação do magistrado reclamado, concluiu-se pela não ocorrência de descumprimento de dever funcional por parte do juiz.

Verificou-se que o indeferimento do pedido de redesignação de audiência e a aplicação de multa ao advogado por litigância de má-fé fundaram-se em elementos concretos, tendo o magistrado, no exercício de atividade tipicamente jurisdicional, utilizado linguagem adequada.

Assim, registrou-se que o inconformismo do requerente envolve matéria estritamente jurisdicional, uma vez que sustenta que o magistrado teria decidido em desconformidade com as regras jurídicas que lhe outorgariam direito ao adiamento do ato instrutório.”

Nas razões do recurso administrativo, alega o recorrente, que: 

“Entende o recorrente, com vênia ao entendimento de Sua Excelência, que o abuso de autoridade e a conduta ilegal do magistrado representado restaram indubitavelmente comprovadas, vejamos articuladamente:

a)    O magistrado permitiu que uma serventuária alterasse data pré designada de audiência de instrução e julgamento, sendo que, de tal alteração resultou prejuízo ao recorrente, advogado militante sem associados, pois, HAVIA OUTRA AUDIÊNCIA JÁ DESIGNADA POR OUTRO JUÍZO EM OUTRA COMARCA PARA MESMO DIA E MESMA HORA;

b)    Ao ser questionado para que alterasse a data (não foi pedido sequer adiamento, foi requerida alteração para evitar confrontação de data com audiência previamente designada por outro juízo) o representado, abusando de sua autoridade e contrariando as leis vigentes, dentre as quais a Lei Federal 8.906/94, além de não alterar a data, ainda imputou ao recorrente a pecha de “chicaneiro”;

c)    Insatisfeito com os abusos cometidos, o representado ajuizou ação indenizatória contra o recorrente, se dizendo aviltado em seu poder, em linhas gerais por ter um advogado ousado apontar o erro crasso do mesmo;

d)    Para finalizar a barbárie, o representado se valeu de seu cargo como magistrado para consultar os processos onde o recorrente é militante (por meio de pesquisa exclusivo de magistrados) e fez juntar através de seus advogados, tal pesquisa nos autos de processo cível em trâmite.

O recorrente juntou aos autos documentos comprobatórios de todo o alegado. 

No evento 2297456, o recorrente COMPROVOU a diferença de plataformas de pesquisas, sendo uma feita pelo representado (de alcance exclusivo dos magistrados e sigilosa) e outra aberta ao público.

Conforme já ocorreu em passado recente no TJPR, o corporativismo daquele Tribunal é notório, (vide caso da perseguição aos jornalistas do Paraná, que somente cessou após decisão da Ministra Carmem Lúcia do Supremo Tribunal Federal) tendo sido proferida decisão pela corregedoria da corte estadual no sentido que não ter havido nenhuma ilicitude por parte do representado, pugnando pelo arquivamento do feito.

O recorrente não concorda que o arquivamento do feito seja medida adequada, posto que a conduta irregular e danosa do representado não pode ser acobertada pelo manto da impunidade, razão pela qual, por todos os argumentos despendidos desde a petição inicial protocolizada até a presente data, requer o recorrente, alternativamente, de acordo com o previsto no regimento interno deste Conselho Nacional de Justiça, seja reconsiderada a decisão prolatada por Sua Excelência e adotadas as medidas cabíveis ao caso ou seja submetida à apreciação do plenário nos termos do regimento interno.” Id 2316188.

O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – CFOAB foi admitido como terceiro interessado – id 3643766

O recorrido apresentou contrarrazões ao recurso administrativo – id 3635143.

É, no essencial, o relatório.

 

S02/Z10/S13


 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR - 0004484-92.2017.2.00.0000
Requerente: TIAGO ASSIS DA SILVA
Requerido: MARCELO MARCOS CARDOSO

 


VOTO


            

O EXMO. SR. MINISTRO HUMBERTO MARTINS, CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA (Relator): 


Não merece provimento o presente recurso administrativo.

Conforme tratado no decisum ora recorrido, o que se alega contra o magistrado, conforme decisão ora recorrida, classifica-se como matéria estritamente jurisdicional, qual seja, indeferimento do pedido de redesignação de audiência e a aplicação de multa ao advogado por litigância de má-fé.  Em tais casos, deve a parte valer-se dos meios processuais adequados, não cabendo a intervenção do Conselho Nacional de Justiça.

O CNJ, cuja competência está restrita ao âmbito administrativo do Poder Judiciário, não pode intervir em decisão judicial para corrigir eventual vício de ilegalidade ou nulidade, porquanto a matéria aqui tratada não se insere em nenhuma das previstas no art. 103-B, § 4º, da Constituição Federal.

 Nesse sentido:

“RECURSO ADMINISTRATIVO EM RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR. ALEGAÇÃO DE SUSPEIÇÃO. INDEFERIMENTO DE PROVAS E JUSTIÇA GRATUITA. QUESTÕES MERAMENTE JURISDICIONAIS. RECURSO DESPROVIDO. 

1. Alegação de suspeição em razão de suposta parcialidade deve ser realizada no bojo dos autos judiciais, mediante ato processual específico para a espécie. 

2. Magistrada que indeferiu provas e a concessão de justiça gratuita nos autos de ação trabalhista. Irresignação que se volta ao exame de matéria eminentemente jurisdicional, hipótese em que a parte prejudicada deve valer-se dos meios recursais próprios, não se cogitando atuação do CNJ. 

3. Recurso administrativo desprovido.” 

(CNJ - RA – Recurso Administrativo em RD - Reclamação Disciplinar - 0004381-85.2017.2.00.0000 - Rel. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA - 268ª Sessão Ordinária - j. 20/03/2018 ).

 

"RECURSO ADMINISTRATIVO. RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR. EXAME DE MATÉRIA JURISDICIONAL. CONTROLE DE ATO JUDICIAL. DESCABIMENTO. INCOMPETÊNCIA DO CNJ. ART. 103-B, § 4º, DA CF. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 

1. A competência constitucional do Conselho Nacional de Justiça é restrita ao âmbito administrativo do Poder Judiciário, não lhe cabendo exercer o controle de ato de conteúdo judicial para corrigir eventual vício de ilegalidade ou nulidade. 

2. Exame de matéria eminentemente jurisdicional não enseja a intervenção do Conselho Nacional de Justiça por força do disposto no art. 103-B, § 4º, da CF. 

3. Recurso administrativo conhecido e desprovido." 

(CNJ - RA – Recurso Administrativo em PP - Pedido de Providências - Corregedoria - 0002342-86.2015.2.00.0000 - Rel. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA - 22ª Sessão Virtual - j. 05/06/2017).

“RECURSO ADMINISTRATIVO EM PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. ARQUIVAMENTO SUMÁRIO. INEXISTÊNCIA DE INFRAÇÃO DISCIPLINAR. QUESTÃO MERAMENTE JURISDICIONAL. INCIDÊNCIA DO ART. 41, LOMAN. 

1. Pedido de Providências distribuído ao Gabinete da Corregedoria Nacional de Justiça em 10/02/2015. 

2. A simples existência de representação anterior na Corregedoria Nacional de Justiça – para processar, em tempo razoável, ações do interesse do reclamante – não tornam, por si só, suspeito ou impedido o Juiz do processo. 

3. Hipótese em que a parte prejudicada poderia ter se valido dos meios processuais adequados para discutir eventual suspeição ou impedimento do julgador. 

4. Irresignação que se volta ao exame de matéria eminentemente jurisdicional, não se justificando a atuação do CNJ. 

5. Recurso administrativo não provido.” 

(CNJ - RA – Recurso Administrativo em PP - Pedido de Providências - Conselheiro - 0000440-98.2015.2.00.0000 - Rel. Min. NANCY ANDRIGHI - 15ª Sessão Virtual - j. 21/6/2016 ). 

Além disso, o recorrente alega, sem embasamento concreto mínimo de ocorrência de desvio funcional, que o magistrado teria se utilizado do cargo público para a obtenção de informações restritas do recorrente, com o propósito de utilizá-las em ação civil.

A jurisprudência desta Corte Administrativa é no sentido de que diante de apresentação de denúncia genérica, sem elemento indiciário mínimo de eventual desvio de conduta por parte do recorrido, não cabe ao Conselho Nacional de Justiça apreciar a questão.

Nesse sentido: 

RECURSO ADMINISTRATIVO EM RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR. MATÉRIA DE NATUREZA JURISDICIONAL. IMPOSSIBILIDADE. DENÚNCIA GENÉRICA.  ELEMENTOS MÍNIMOS DE PROVA.  JUSTA CAUSA.  NÃO CONFIGURADA. AUSÊNCIA DE IRREGULARIDADE ADMINISTRATIVA OU DISCIPLINAR. RECURSO NÃO PROVIDO.

1. Considerando a natureza exclusivamente administrativa das atribuições que lhe foram conferidas  (art. 103-B, §4º, da CF/88), não cabe ao Conselho Nacional de Justiça apreciar questão discutida em sede jurisdicional.

2. Não se cogita a atuação do CNJ como instância recursal de decisões proferidas na jurisdição, bem como não é cabível sua intervenção baseada em denúncia genérica, sem embasamento concreto mínimo da ocorrência de desvio funcional.

3. Ausência de infringência de deveres funcionais por parte do recorrido.

4. Recurso administrativo não provido.

(CNJ - RA – Recurso Administrativo em RD - Reclamação Disciplinar - 0000388-97.2018.2.00.0000 - Rel. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA - 272ª Sessão Ordináriaª Sessão - j. 22/05/2018 ).

Ante o exposto, nego provimento ao recurso administrativo.

É como penso. É como voto.

 

 

MINISTRO HUMBERTO MARTINS

Corregedor Nacional de Justiça

S02/Z10/S13

Brasília, 2019-09-13.