ATO NORMATIVO. RESOLUÇÃO. REGULAMENTAÇÃO DA AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA. APRESENTAÇÃO DO PRESO À AUTORIDADE JUDICIAL EM ATÉ 24 HORAS. OBRIGATORIEDADE. MEDIDA QUE BUSCA DAR CONCRETUDE A DIREITOS FUNDAMENTAIS E ASSEGURAR A EFETIVIDADE AOS DIREITOS HUMANOS. PROVIDÊNCIA EFICAZ À MELHOR AFERIÇÃO DOS ELEMENTOS RELATIVOS À LEGALIDADE E NECESSIDADE DA CUSTÓDIA E APLICAÇÃO DAS MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS À PRISÃO (ART. 310 DO CPP). DIREITO À INTEGRIDADE FÍSICA E PSICOLÓGICA DAS PESSOAS SUBMETIDAS À CUSTÓDIA ESTATAL.


 

 

 ACÓRDÃO

O Conselho decidiu, por unanimidade: I - incluir em pauta o presente procedimento, nos termos do § 1º do artigo 120 do Regimento Interno; II - aprovar a resolução, nos termos do voto do Relator. Presidiu o julgamento o Conselheiro Ricardo Lewandowski. Plenário, 15 de dezembro de 2015. Presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Conselheiros Ricardo Lewandowski, Nancy Andrighi, Lelio Bentes Corrêa, Carlos Levenhagen, Daldice Santana, Gustavo Tadeu Alkmim, Bruno Ronchetti, Fernando Mattos, Carlos Eduardo Dias, Arnaldo Hossepian, Norberto Campelo, Luiz Cláudio Allemand, Emmanoel Campelo e Fabiano Silveira.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: ATO NORMATIVO - 0005913-65.2015.2.00.0000
Requerente: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ

 


RELATÓRIO


Vistos.

 

Trata-se de procedimento de Ato Normativo com o objetivo de disciplinar a Audiência de Custódia, consistente na apresentação de toda pessoa presa em flagrante delito à autoridade judicial no prazo de 24 horas.

 

A partir de informações aferidas em junho do ano de 2014 com base na Resolução CNJ 47/2007[1], que enunciavam Novo Diagnóstico de Pessoas Presas no Brasil[2] e demonstravam que a população carcerária do país alcançara o quantitativo de 563.526 pessoas, das quais 41% estavam presas provisoriamente, e em cumprimento aos preceitos contidos nos instrumentos internacionais de proteção aos direitos humanos ratificados pelo Brasil (Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e Convenção Americana sobre Direitos Humanos), o Departamento de Monitoração e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas – DMF deste Conselho, sob a coordenação do Juiz de Direito Luís Geraldo Santana Lanfredi e na presidência de Sua Excelência Ministro RICARDO LEWANDOWSKI, desenvolveu o Projeto Audiência de Custódia, destinado a difundir, no âmbito da Justiça Estadual e Federal, a rotina de apresentação em juízo de toda pessoa presa em flagrante delito, mantida sob custódia do Estado, a fim de que a autoridade judicial possa ouvi-la sobre as circunstâncias em que se realizou o ato de prisão, e decidir, no prazo de 24 horas, sobre a sua legalidade, necessidade e a apuração de eventuais excessos.

 

Com a finalidade de concretizar os objetivos do referido projeto, este Conselho estabeleceu parcerias com importantes atores do sistema de justiça, dentre eles o Ministério da Justiça (MJ) e o Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), com os quais celebrou o Termo de Cooperação Técnica nº 007/2015[3], cujo objeto é a conjugação de esforços para a efetiva implantação da audiência de custódia, além da necessária operacionalização para o funcionamento de centrais integradas de alternativas penais, centrais de monitoração eletrônica e serviços correlatos.

 

Outrossim, foram firmados acordos com Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – CFOAB (TCT nº 010/2015)[4] e com o Conselho da Justiça Federal – CJF (TCT nº 016/2015)[5], com vistas a difundir e fomentar a prática como opção concreta ao vertiginoso encarceramento provisório de pessoas, assim como método capaz de promover a aproximação do juiz com os jurisdicionados, em momento imprescindível à análise da legalidade/cabimento/necessidade da prisão.

 

Assim, desde a sua implementação no Estado de São Paulo, em 24 de fevereiro de 2015, até sua gradativa execução em todos os estados e no Distrito Federal, o projeto tem demonstrado resultados exitosos: já foram realizadas 29.441 audiências, com a concessão de 14.847 liberdades provisórias, com ou sem aplicação de medidas cautelares, ou relaxamento da prisão, que podem ser traduzidos em um percentual de 50,42% de soltura[6].

 

Ademais, sobreleva notar que o Colendo Supremo Tribunal Federal (STF), para além de ter afirmado a constitucionalidade da denominada Audiência de Custódia, na forma como levada a efeito pela Presidência do CNJ (ADI 5240), determinou “aos juízes e tribunais que, observados os artigos 9.3 do Pacto dos Direitos Civis e Políticos e 7.5 da Convenção Interamericana de Direitos Humanos, realizem, em até noventa dias, audiências de custódia, viabilizando o comparecimento do preso perante a autoridade judiciária no prazo máximo de 24 horas, contados do momento da prisão.” (ADPF 347)

 

Desse modo, e com o intuito de dar concretude a direitos fundamentais e assegurar a efetividade aos direitos humanos, bem como de uniformizar o procedimento previsto em diplomas internacionais aquiescidos pelo Brasil, hoje fomentados e em aplicação em todo o território nacional, propõe-se a regulamentação da Audiência de Custódia, por meio da presente resolução.

 

É o relatório.



[1] Resolução CNJ 47, de 18 de dezembro de 2007 - Dispõe sobre a inspeção nos estabelecimentos penais pelos juízes de execução criminal 

[2]Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/images/imprensa/diagnostico_de_pessoas_presas_correcao.pdf>. Acesso em: dez. 2015. Atente-se que tais dados não consideram o número de presos em cumprimento de prisão domiciliar. 

[3] Disponível em <http://www.cnj.jus.br/transparencia/acordos-termos-e-convenios/acordos-de-cooperacao-tecnica/79069-tcot-007-2015>. Acesso em dez. 2015. 

[4] Termo de Cooperação Técnica CNJ e CFOAB nº 010/2015. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/Termo.pdf>. Acesso em dez. 2015.

[5] Termo de Cooperação Técnica CNJ e CJF nº 016/2015. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/files/conteudo/arquivo/2015/10/b16d31d90cc505b6f0c17b951e6c7f06.pdf>. Acesso em dez. 2015 

[6] Dados estatísticos levantados pelo DMF a partir das informações recebidas dos Tribunais de Justiça em 30.11.2015. 

  

 

 


 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: ATO NORMATIVO - 0005913-65.2015.2.00.0000
Requerente: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ

 


VOTO

 

2-     DA AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA

2.1- A Audiência de custódia e seu fundamento legal


A denominada audiência de custódia ou, simplesmente, audiência de apresentação, consubstancia-se no ato processual consecutivo à prisão em flagrante delito e se concretiza pela apresentação imediata, perante um juiz, da pessoa submetida à referida constrição.

Cuida-se, assim, de autêntico direito subjetivo da pessoa privada de liberdade, decorrente do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos de 1966 (art. 9.3[1]) e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos de 1969 (art. 7.5[2]), promulgados, internamente, em nosso ordenamento jurídico, por meio do Decreto 592, de 06 de julho de 1992, e do Decreto 678, de 06 de novembro de 1992, respectivamente[3].

Tais diplomas normativos, em razão do status supralegal que assumem ao internalizarem em nosso sistema, apresentam-se com eficácia jurídica bastante para esvaziarem leis ordinárias que lhes sejam anteriores ou posteriores[4], conforme entendimento firmado em precedentes da Suprema Corte (RE 466.343[5] e 349.703[6] e Habeas Corpus 87.585[7] e 92.566[8]), mesmo porque repercutem o que está contido no art. 5º, §2º, da Constituição Federal[9].

Vale acentuar, também, que, não raras vezes, entre a prisão em flagrante de uma pessoa e seu interrogatório perante um juiz, costuma transcorrer demasiado lapso temporal e, após a reforma processual de 2008 (Lei 11.719/2008[10]), essa situação agravou-se ainda mais, porquanto o interrogatório passou a ser o último ato da instrução, acarretando, assim, maior sacrifício à liberdade pessoal.

Por tal razão, a solenidade assim definida guarda, igualmente, a conotação de “garantia”, na medida em que se constitui em “meio de controle idôneo para evitar capturas arbitrárias e ilegais, e que, além da proteção do direito de liberdade, também assegura e resguarda outros direitos, como a vida e a integridade pessoal”, conforme assim já definiu a Corte Interamericana de Direitos Humanos” (Caso Tibi v. Equador, sentença de 07.09.2004, §§ 114 e 118), tanto ou mais importantes diante de Estados que vejam “a brutalidade policial e as práticas de tortura”, como violações a direitos dessa fase pré-processual, e, infelizmente, ainda corriqueiros, tal como detalham os dados do último relatório do Subcomitê de Prevenção da Tortura das Nações Unidas[11].

A mudança procedimental que ora se propõe, portanto, traz outro significado, pois se alinha com a importância e dimensão assumidas, desde a Carta Magna de 1988, pela dignidade da pessoa humana, criando condições para a plena eficácia da “garantia de jurisdição”, desburocratizando, pela oralidade, o “direito de audiência”, também dando curso e conformação, em nosso sistema de justiça, “ao direito de ser julgado em prazo razoável”, aqui contemplado sob a perspectiva de “não se submeter à dilação de qualquer prisão cautelar ilegal, incabível ou mesmo que admita a imposição de medida alternativa que a substitua” (art. 5, LXV e LXVI, da Constituição Federal).

Ademais, outro passo importante que decorre da novidade procedimental consiste em um “maior e melhor controle de qualidade das prisões provisórias”, que, hodiernamente, sobrecarregam em mais de 42% o insuficiente sistema penitenciário brasileiro, índice bastante superior aos 21% de presos provisórios nos Estados Unidos, 14% de presos provisórios da China e 17% de presos provisórios na Rússia[12], países esses que concentram populações carcerárias absolutas e maiores que a do Estado Brasileiro.

Nessa perspectiva, o juiz assume o papel de “agente que intervirá, efetivamente, para a proteção da pessoa privada de liberdade”, humanizando a aplicação da Lei Penal através do controle da legalidade da prisão, já que só ele detém condições de normalizar a aplicação da prisão provisória como ultima ratio, avaliando os aspectos pessoais e processuais, intrínsecos e extrínsecos à prisão, mormente considerando que a pessoa a ela submetida não é, nem pode ser tratada como objeto desse instrumento.

Por consequência, a audiência de custódia representa para o Estado um instrumento eficiente e ágil para a obtenção e verificação de informações precisas sobre os procedimentos policiais, evitando que maus-tratos e práticas de extorsões venham a ocorrer impunemente.

Ademais, o controle da legalidade, da necessidade e da adequação de medida extrema, que é a prisão cautelar, representa uma forma eficiente de combater a superpopulação carcerária, constituída, em sua maioria, pela camada mais pobre e marginalizada da população brasileira[13].

Quanto ao particular, consoante pondera Gustavo Badaró[14], a audiência de custódia permite não só o controle da legalidade do ato, mas também a necessidade e adequação da prisão cautelar, pois:

 

 [...]o juízo a ser realizado na chamada audiência de custódia é complexo ou bifronte: não se destina apenas a controlar a legalidade do ato já realizado, mas também a valorar a necessidade e adequação da prisão cautelar, para o futuro. Há uma atividade retrospectiva, voltada para o passado, com vista a analisar a legalidade da prisão em flagrante, e outra, prospectiva, projetada para o futuro, com o escopo de apreciar a necessidade e adequação da manutenção da prisão, ou de sua substituição por medida alternativa à prisão ou, até mesmo, a simples revogação sem imposição de medida cautelar”

 

E o festejado processualista acrescenta que:


Ao ouvir o defensor e o acusado, o juiz terá oportunidade de examinar todos os fatos que militam a favor de sua prisão – e que foram considerados pela autoridade policial ao prendê-lo em flagrante delito – bem como considerar os argumentos contrários à prisão preventiva e decidir sobre a sua manutenção, substituição por medida alternativa à prisão ou mesmo a sua simples revogação, tendo uma visão mais completa da situação.

 

Nessa esteira, a oitiva do preso tem característica precípua de um interrogatório pro libertate, prescindindo de uma finalidade investigativa e possibilitando-lhe o exercício da autodefesa, com o devido esclarecimento acerca de sua posição em relação à individualização das exigências cautelares contra ele consideradas existentes.

A apresentação imediata da pessoa presa ao juiz é, portanto, o meio de garantir que um cidadão passe o menor tempo possível com sua liberdade de locomoção cerceada desnecessariamente, ainda que não possua advogado constituído, circunstância comum à maior parcela da população prisional.

Enfim, afigura-se inaceitável que um direito fundamental dessa magnitude venha sendo ignorado pelo ordenamento jurídico nacional por tão longo tempo.  

 

2.2 – A Audiência de custódia no Direito Comparado

 

No Brasil, desde 2011, persegue-se a alteração do Código de Processo Penal, com o objetivo de se estabelecer a obrigatoriedade da realização da “audiência de custódia”, perante um juiz, no prazo de 24 horas, após prisão em flagrante.

Contudo, constata-se que, em outros países da América Latina,  essa prática já foi incorporada por seus ordenamentos.

Na Argentina, por exemplo, o Código de Processo Penal Federal exige que, em casos de prisão sem ordem judicial, o detento compareça perante uma autoridade judicial competente no prazo de seis horas após a prisão[15]. Ainda que o juiz tenha expedido uma ordem de detenção, o suspeito da prática de um delito será submetido, em um prazo não superior a 24 horas, à denominada “indagatória”, ocasião em que o juiz o interrogará, informando-o, detalhadamente, sobre o crime que lhe está sendo imputado, as provas existentes em seu detrimento, bem como a faculdade que tem de se calar, sem que daí derive nenhuma presunção de culpa[16].

No Chile, a seu turno, o Código de Processo Penal determina que, em casos de flagrante, o suspeito seja apresentado dentro de 12 horas a um promotor, que poderá soltá-lo ou apresentá-lo a um juiz, no prazo de 24 horas da prisão[17].

Já na Colômbia, os arts. 426 e seguintes, do Código de Processo Penal, preveem que, em casos de flagrante, o detento precisa ser apresentado ao juiz, no prazo de 36 horas[18].

No México, por sua vez, para a maioria dos tipos penais, pessoas detidas em flagrante precisam ser entregues, imediatamente, aos promotores, que, por sua vez, devem apresentar os suspeitos a um juiz, no prazo de 48 horas ou liberá-los[19].

Observa-se, outrossim, que alguns ordenamentos também exigem que as pessoas presas, após ordem judicial, sejam levadas imediatamente à presença de um juiz.

A Constituição mexicana, por exemplo, afirma que a autoridade que executa a ordem judicial de prisão deve trazer o suspeito perante um juiz “sem demora e sob sua estrita responsabilidade”.

De forma semelhante, no Chile, o detido sob ordem judicial deve ser apresentado imediatamente ao juiz que deu a respectiva ordem (se a apresentação imediata do preso não for possível, ele somente poderá ser mantido sob custódia policial pelas 24 horas seguintes).

Na Colômbia, o Código de Processo Penal também estabelece que, em casos de prisão por ordem judicial, o detento precisa ser colocado “à disposição” do juiz no prazo de 36 horas.

 

2.3 – A audiência de custódia e o Conselho Nacional de Justiça


Embora a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, também conhecida como “Pacto de São José da Costa Rica”, tenha sido promulgada, pela República Federativa do Brasil, por meio do Decreto 678, em 6 de novembro de 1992, ou seja, há 23 anos, e nela conste a previsão de que “toda pessoa detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada pela lei a exercer funções judiciais e tem direito a ser julgada dentro de um prazo razoável ou a ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo. (...)”(art. 7°, 5), não houve, até o presente momento, a internalização desse procedimento no ordenamento jurídico brasileiro, tampouco a sua aplicação irrestrita pelo Judiciário.

De igual modo, é o que ocorre com o art. 9°, 3, do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos - diploma também ratificado pelo Brasil, por meio do Decreto 592 de 6 de julho de 1992 – o qual prevê que “qualquer pessoa presa ou encarcerada em virtude de infração penal deverá ser conduzida, sem demora, à presença do juiz ou de outra autoridade habilitada por lei a exercer funções judiciais e terá o direito de ser julgada em prazo razoável ou de ser posta em liberdade. (...)”.

Todavia, em razão do status supralegal dos referidos diplomas internacionais, conforme entendimento firmado em precedentes da Suprema Corte (RE 466.343[20] e 349.703[21] e Habeas Corpus 87.585[22] e 92.566[23]), há que se reconhecer os seus efeitos e sua eficácia normativa imediata no âmbito nacional.

Oportuno ressaltar, ainda, que a previsão legal presente na legislação processual penal brasileira, consubstanciada no art. 306, § 1°[24], já não é capaz, por si só, de suprir ou assegurar o que enuncia os mencionados tratados.

Nessa senda, a Corte Interamericana consignou, no caso López Álvarez VS. Honduras[25], que o simples conhecimento judicial de que uma pessoa está detida não satisfaz a garantia prevista no art. 7°, 5, do “Pacto de São José da Costa Rica”.

Fixou, ainda, em diversos julgados (caso Suárez Rosero Vs. Equador[26]; Acosta Calderón Vs. Equador[27];  Chaparro Álvarez e Lapo Íñiguez Vs. Equador[28], Cantoral Benavides Vs. Perú[29] e Palamara Iribarne Vs. Chile[30]) que, na apuração da razoabilidade do prazo de um processo, devem ser levados em consideração a complexidade do assunto, a atividade processual do interessado e a conduta das autoridades judiciais; e, que, não atende aos preceitos do Pacto de São José da Costa Rica a apresentação de pessoa detida ou retida perante agente fiscal do Ministério Público, Juiz Penal Militar e Fiscal Naval, pois não se vislumbra nessas autoridades os requisitos da imparcialidade e da isenção necessários para a condução do processo eventualmente instaurado.

Destarte, ao reconhecer a competência obrigatória da Corte Interamericana de Direitos Humanos, sem, contudo, cumprir as convenções às quais aderiu, o Estado Brasileiro está sujeito a ser demandado e condenado no plano internacional por conta da violação reiterada de dispositivos internacionais de proteção dos Direitos Humanos, na medida em que os precedentes analisados pela Corte Interamericana conduzem a esse entendimento.

Ademais, o impacto gerado pelo inadimplemento dos compromissos internacionais assumidos refletirá, inexoravelmente, nas relações internacionais do país que consagra, no art. 4°, inciso II de sua Constituição[31], o princípio da primazia dos direitos humanos. Tem-se, pois, condutas conflitantes do Estado Brasileiro que, ora assegura a prevalência dos Direitos Humanos no plano internacional, ora descumpre as obrigações de proteção desses mesmos direitos no plano interno.

Portanto, considerando que o Brasil ratificou os tratados internacionais em comento, forçoso concluir pela existência de norma em vigor estabelecendo a necessidade da apresentação da pessoa custodiada pelo Estado à autoridade judicial. Dessa forma, o projeto de lei (PL 554/2011[32]) e de emenda constitucional (PEC 112/2011[33]) ainda em tramitação no Congresso Nacional não constituem óbice à edição da presente resolução.

Outrossim, vale repisar que o STF, para além de ter afirmado a constitucionalidade da denominada audiência de custódia (ADI 5240), determinou “aos juízes e tribunais que, observados os artigos 9.3 do Pacto dos Direitos Civis e Políticos e 7.5 da Convenção Interamericana de Direitos Humanos, realizem, em até noventa dias, audiências de custódia, viabilizando o comparecimento do preso perante a autoridade judiciária no prazo máximo de 24 horas, contados do momento da prisão.” (ADPF 347) 

Apoiado nessas premissas, e entendendo caber ao CNJ a disciplina da matéria em razão do disposto no art. 103-B, § 4º, I, da Constituição Federal[34], faz-se premente a regulamentação do rito de apresentação da pessoa presa à autoridade judicial.

Como cediço, a iniciativa de difusão da prática da audiência de custódia com base nos tratados internacionais ratificados pelo Brasil vem sendo estimulada por meio de projeto concebido, com ineditismo, pelo Departamento de Monitoração e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas – DMF deste Conselho, sob a coordenação do Juiz de Direito Luís Geraldo Santana Lanfredi e na presidência de Sua Excelência Ministro Ricardo Lewandowski.

A iniciativa pioneira está assentada em dados que enunciavam o Novo Diagnóstico das Pessoas Presas no Brasil[35] e na percepção de que a instrumentalização da audiência de custódia acabará convergindo com o propósito da prevenção e combate à tortura, autorizando o juiz, o membro do Ministério Público e a defesa técnica a constatarem eventuais ocorrências contempladas na Lei 9.455/1997[36].

Outrossim, a medida tem o propósito de inibir práticas de maus-tratos das pessoas custodiadas pelo Estado e de instituir maior rigor à porta de entrada do sistema prisional, refletindo-se em uma melhor e mais apropriada aplicação das medidas cautelares alternativas à prisão, introduzidas no ordenamento jurídico pátrio pela Lei 12.403/2011[37].

Nesse contexto, sobreleva notar que, de acordo como o Novo Diagnóstico de Pessoas Presas no Brasil, cujas informações foram aferidas em junho de 2014, com base na Resolução CNJ 47/2007[38] e por meio do sistema Geopresídios (CNIEP), a população carcerária do país alcançava o quantitativo de 563.526 pessoas, dentre as quais, 41% seriam de pessoas presas provisoriamente.

Também no ano de 2014, relatório editado pelo grupo de trabalho sobre Detenção Arbitrária da ONU[39] descrevia a situação brasileira como alarmante. Constava do relatório que, embora o sistema de justiça criminal brasileiro estivesse embasado em matrizes garantistas, a decretação da prisão cautelar continuava sendo largamente aplicada pelo Judiciário local sem maiores reflexões. A exceção, portanto, constituía-se regra e os efeitos nefastos de práticas encarceradoras incrementavam a crise que se instalou e ainda perdura no sistema prisional de todo o país.

O relatório mundial anual de 2015 promovido pela Human Rigths Watch[40], por seu turno, abordou a tortura como um problema crônico nas delegacias de polícia e nos centros de detenção do Brasil. Segundo o relatório, entre janeiro de 2012 e junho de 2014, o Departamento da Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos contabilizava 5.431 queixas de tortura e tratamento cruel, desumano ou degradante (aproximadamente 180 queixas por mês) oriundas de todo o país, por meio do serviço Disque Direitos Humanos – Disque 100; deste quantitativo global apurado, 84% referiam-se a incidentes que ocorreram nas delegacias, prisões e centros de detenção juvenil.

O informe 2014/2015[41] produzido pela Anistia Internacional chegou a constatações similares. Além de trazer um breve relato das condições prisionais no Brasil, denunciando a superlotação e as condições degradantes presentes no sistema, apontou o grande número de denúncias de tortura e outros maus-tratos existentes tanto no momento da prisão, quanto durante os interrogatórios e a detenção nas delegacias de polícia.

Não por outro motivo, cumprindo o papel legal a si reservado pela Lei 12.106/2009[42], e com o especial fim de acompanhar e propor soluções para o sistema carcerário, o DMF/CNJ vem replicando a prática da audiência de custódia nos Tribunais de modo a traçar novo cenário ao sistema prisional e visando a mudança de conduta do Judiciário, outrora apontado como violador do princípio da presunção da inocência por conta da decretação indiscriminada de prisões cautelares.

Assim, o aludido projeto, inicialmente implementado no Tribunal de Justiça de São Paulo no mês de fevereiro de 2015, encontra-se, atualmente, difundido em todos os tribunais estaduais, que seguem adotando-o com a devida adequação do modelo oferecido à realidade local.

Na esfera federal, por seu turno, tem-se que a Subseção Judiciária de Foz do Iguaçu (TRF da 4º Região) também incorporou à sua rotina a audiência de custódia e que outras unidades judiciárias federais, igualmente, já se preparam para incorporá-la.

Desse modo, as expectativas são inúmeras e o foco é evitar o encarceramento quando este revelar-se desnecessário.

Oportuno destacar, ainda, que, desde o lançamento do projeto, várias manifestações de apoio à iniciativa despontaram. A Associação do Magistrados Brasileiros[43] compactuou com a iniciativa promovida pelo CNJ; a 2°, 5° e 7° Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, no mesmo sentido, expediram nota técnica conjunta sobre a instituição da audiência de custódia em 24 horas após a prisão em flagrante; no 68° Encontro do Colégio de Corregedores dos Tribunais de Justiça do Brasil[44], o Colégio Permanente de Corregedores-Gerais dos Tribunais Estaduais manifestou apoio às iniciativas de implementação e normatização das audiências de custódia, como forma de política pública de controle do ingresso de presos no sistema carcerário e garantia dos direitos constitucionais do preso.

Por outro lado, foi proposta a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5240[45] pela Associação dos Delegados de Polícia do Brasil (ADEPOL), objetivando a declaração de inconstitucionalidade do Provimento Conjunto 03/2015 expedido pelo Presidente e pelo Corregedor-Geral do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, o qual determinou a apresentação de pessoa detida em flagrante delito, até 24 horas após sua prisão, para participar de audiência de custódia.

A Associação requereu a declaração de inconstitucionalidade do provimento por ofensa à competência federal para legislar sobre direito processual e ao princípio da legalidade. Ademais, somou-se à defesa da tese de inconstitucionalidade, a alegação de que o instrumento normativo editado pelo Tribunal viola o princípio da separação de Poderes.

A despeito das ponderações feitas pela ADEPOL, a Suprema Corte decidiu pela improcedência do pedido. O Ministro Luiz Fux, Relator da ADI 5240 e cujo voto foi acompanhado pela maioria dos membros, entendeu que o provimento questionado configura, apenas, um instrumento de autogestão do Tribunal. A edição do ato normativo ora questionado não implica em regulamentação de normas de direito, tão somente reafirma a efetividade a um direito básico do preso, impedindo prisões ilegais e desnecessárias, com reflexo positivo direto no problema da superpopulação carcerária.

 Voltando-se ao projeto desenvolvido pelo DMF/CNJ, vale mencionar que a mediação penal, prevista na diagramação da iniciativa fomentada, sinaliza uma política institucional[46] orientada à desjudicialização do conflito e à introdução de práticas restaurativas, quando possível, desde que respeitados o princípio da obrigatoriedade e da indisponibilidade da ação penal pública.

Outrossim, cabe salientar que não há, no projeto, qualquer previsão da instituição de audiência de custódia por videoconferência, pois perdura o entendimento de que a previsibilidade da audiência de custódia em meio virtual desnaturaria o sentido do ato, inviabilizando, dessa forma, eventual apuração de tortura e maus-tratos no momento da prisão.

Isso porque a apresentação pessoal permite a aproximação do jurisdicionado com o magistrado e, assim, melhor análise da situação em que se deu a apreensão e a prolação de decisão fundamentada pela manutenção ou não da prisão perpetrada.

Destarte, em que pese as especificidades do projeto concebido no âmbito do DMF/CNJ e o seu alcance restrito às pessoas presas em flagrante, a iniciativa planeja traçar respostas ao Poder Judiciário que, por longos anos, é acusado de negligenciar princípios constitucionais como o da presunção da inocência.

Nesse sentido, a atuação incisiva do Conselho Nacional de Justiça, no que tange à proposição de soluções para o sistema prisional, por meio do DMF, sinaliza a edificação de uma política judiciária preocupada com a situação do sistema carcerário que hoje conta com quase 50% de pessoas presas provisoriamente.

 A sociedade civil organizada, há algum tempo, enxergava a audiência de custódia como uma saída para o caos instaurado no sistema de justiça criminal e, nessa toada, seguiam as publicações da Rede de Justiça Criminal[47],  da Associação pela Reforma Prisional (ARP), da Conectas Direitos Humanos, Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), da Instituto de Defensores de Direitos Humanos (DDH), do Instituto Sou da Paz, Instituto Terra, Trabalho e Cidadania (ITTC), da Justiça Global e Pastoral Carcerária Nacional.

O próprio Poder Público, por meio de órgãos como a Defensoria Pública da União e as Defensorias Estaduais, também pleiteava e ainda pleiteia, perante o Judiciário, a necessidade da audiência de apresentação, como pressuposto indispensável para legalidade da manutenção da prisão.

 A jurisprudência nacional, por seu turno, embora de forma tímida, também tem sinalizado positivamente à introdução da rotina da audiência de custódia, o que releva uma mudança de postura dos atores do Poder Judiciário, porquanto se tem entendido que o Judiciário deve quebrar paradigmas fundamentando-se na interpretação constitucional e convencional dos dispositivos processuais:


HABEAS CORPUS. DELITOS PREVISTOS NOS ARTIGOS 311, 296, § 1º, I E 328 TODOS DO CÓDIGO PENAL E ARTIGO 309 DA LEI 9.503/1997. PRISÃO PREVENTIVA. IMPETRANTE QUE PLEITEIA A REVOGAÇÃO DA PRISÃO, COM A APLICAÇÃO DE MEDIDA CAUTELAR PREVISTA NO ARTIGO 319 DO CPP. SUBSIDIARIAMENTE REQUER A DESIGNAÇÃO DA AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA. ADMISSIBILIDADE. 1- Desnecessidade da prisão cautelar. In casu, em que pese a decisão encontrar-se satisfatoriamente fundamentada, em consonância com o disposto no artigo 93, IX da CRFB/88 e no artigo 315 do CPP, não se vislumbra o periculum libertatis a justificar a segregação do paciente. 2- As circunstâncias do caso, ora analisado, não denotam a imperiosa necessidade da segregação cautelar ou apontam qualquer fato concreto que justifique a premissa de que a liberdade do paciente pode ocasionar óbice à ordem pública. 3- No entanto, a despeito da desnecessidade da segregação cautelar, não se pode olvidar que a instrução ainda se encontra em estágio embrionário, motivo pelo qual, em observância aos critérios da necessidade e da adequabilidade, devem ser adotadas as medidas cautelares previstas nos incisos I e IV do art. 319 do CPP, quais sejam, comparecimento mensal ao Juízo e proibição de ausentar-se da Comarca, sem prévia autorização judicial. 4- CONCESSÃO DA ORDEM.

(TJ-RJ - HC: 00089125920158190000 RJ 0008912-59.2015.8.19.0000, Relator: DES. MARIA ANGELICA GUIMARAES GUERRA GUEDES, Data de Julgamento: 24/03/2015, SÉTIMA CAMARA CRIMINAL, Data de Publicação: 30/03/2015 11:31)

 

Ademais, a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 347 já anuncia o “estado de coisas inconstitucional” relativo ao sistema carcerário e corrobora a proposição aqui tencionada, porquanto, em sede de liminar, o C. STF reafirmou a necessidade de adoção das audiências de custódias pelos Tribunais no prazo de 90 dias.

Destarte, à vista dessas ponderações é que se apresenta a presente proposta de resolução, com o objetivo de assegurar a efetividade dos direitos fundamentais e dos direitos humanos pelo Judiciário brasileiro, valendo asseverar que a recalcitrância da adesão da audiência de custódia pelo sistema jurídico processual brasileiro fundamentada no art. 306, § 1° do Código de Processo Penal jaz, não só pela leitura constitucional dos arts. 5° LXII, LXIII, LXIV, LXV, LVI e § 2° da CF/88, como um dos compromissos internacionais que o Brasil expressamente anuiu.

 

2.4 - A audiência de custódia como meio apto a difusão das alternativas penais


A difusão de política de alternativas penais voltada para o Judiciário, especialmente no âmbito do CNJ, iniciou-se em 2009, por meio da Resolução CNJ 101/2009[48], que buscou definir uma política institucional na execução das penas e medidas alternativas à prisão.

Buscava-se, naquela ocasião, semear o discurso da punição adequada, revisitando conceitos da pena e seu potencial reabilitador. Nascera, assim, uma política judiciária voltada à expansão das penas e medidas alternativas, com estímulo à criação de varas privativas e especializadas sobre a temática, reavaliando o papel da instalação das centrais de alternativas penais na condução e monitoramento das decisões aplicadas.

A Lei 12.403/2011, nesse prospecto, somou-se às soluções que buscavam combater o fenômeno do hiperencarceramento. Por meio dela, positivou-se modalidades de cautelares pessoais, propondo-se opções factíveis à decretação da prisão preventiva. Isso porque, à época da proposta legislativa, já era patente a necessidade de se atenuar a pena antecipada antes do trânsito em julgado, buscando-se, assim, a diminuição de custos e o alinhamento às disposições constitucionais que traduzem o princípio da presunção da inocência. 

Todo o contexto normativo nacional em voga, então, alinhava-se às Regras de Tóquio[49], cujo objetivo central vem a calhar, da mesma maneira, com a promoção e difusão de medidas eficazes que possam ser substitutivas ao cárcere.

Todavia, em que pese o plexo de normas produzidas a indicar um novo olhar para realidade prisional, o impacto produzido pelos dispositivos pouco ressoou no encarceramento de pessoas, seja pela não expansão das alternativas penais pelo Judiciário sob a justificativa de inexistência de aparato compatível com monitoramento da medida, seja pela própria concepção de segurança pública instituída nesse Poder.

Recente publicação do Ministério da Justiça bem retrata a situação em comento. No recorte da população prisional feito em junho de 2014, 41% das pessoas privadas de liberdade estavam presas sem condenação[50]; ou seja, a Lei das Cautelares, mesmo após 3 anos de vigência, não trouxe os resultados que dela se esperava.

No entanto, ressalvas devem ser apontadas. Por meio da pesquisa feita pelo Instituto Sou da Paz, intitulada “Monitorando a aplicação da lei das cautelares e o uso da prisão provisória nas cidades do Rio de Janeiro e São Paulo”[51], é possível identificar uma janela. O trabalho em evidência adverte que a Lei 12.403/2011 trouxe efeitos positivos, refletindo na diminuição de prisões provisórias. Em São Paulo, especificamente, houve a diminuição de 26,6% na decretação de prisões cautelares. Se, antes da lei das cautelares, 87,9% das decisões proferidas levavam à decretação de preventiva, após a sua vigência, esse índice passou a ser de 61,3%.

Eis que em um contexto de nuances sombrias do retrato prisional, surge o “Projeto Audiência de Custódia”, almejando promover o controle da “porta de entrada” do sistema carcerário. Acredita-se que a apresentação célere da pessoa autuada em flagrante à presença do juiz atende ao princípio da duração razoável do processo, assegura a fiscalização e a legalidade da apreensão, e permite a apuração tempestiva de eventuais maus-tratos e tortura.

Trata-se, portanto, de instrumento “polivalente” e, especificamente nesse ponto, apto a difundir as alternativas penais, levando à imposição de prisão preventiva somente quando se afigurar impossível a substituição por cautelar prevista no art. 319 do CPP.

Como forma de trazer subsídios concretos para o desdobramento do projeto, firmou-se Termos de Cooperação Técnica – TCOT 007/2015[52], TCOT 005/2015[53] e TCOT 006/2015[54] - entre diversas instituições, nos quais se sublinhou a importância da difusão da política de alternativas penais com o enfoque restaurativo, e o fortalecimento da política de monitoração eletrônica, como instrumento desencarcerador.

Quanto a esse último instrumento - a adoção da vigilância eletrônica - reforça-se a ideia de que a “tornozeleira” apenas deve se situar como ferramenta da política penal, tão somente, quando se revelar adequada e necessária, estimulando o potencial desencarcerador e inserção do monitorado na sociedade.

Para que assim o mecanismo seja observado, o termo celebrado – TCOT 005/2015 - prevê a expansão da medida na imposição de cautelares, quando demonstrada a sua adoção como alternativa à prisão preventiva. Essa referência não é despretensiosa; na verdade, tem por objetivo impactar no índice de presos provisórios, haja vista que a monitoração eletrônica, hoje, é adotada precipuamente na execução penal, afinando-se como ferramenta de controle penal e não como substitutiva à privação de liberdade de pessoas não condenadas. Daí porque o baixo impacto por ela produzido como meio alternativo à privação de liberdade antes da condenação judicial.

Trazer ponderações sobre o uso do dispositivo eletrônico em consonância com garantias fundamentais expressas constitucionalmente, portanto, também é pauta relevante de discussão. A ausência de normativas uniformes a nortear a política de monitoração acena um cenário de abusos, seja pela heterogeneidade de conduções em caso de violações do dispositivo, sejam pelas deficiências estruturais presentes nas “Centrais de Monitoração” instaladas nos Estados da federação.

Há um certo esvaziamento do monitorado enquanto sujeito da política de monitoração e o pretenso discurso “é melhor ser monitorado do que estar privado de liberdade” padece de legitimidade quando consideradas as carências e déficits existentes na “prestação do serviço”.

Saltam aos olhos a possibilidade do desvirtuamento dos dados angariados no curso do monitoramento que podem servir para investigações arbitrárias, corroborando para propulsão de um serviço baseado no discurso da segurança pública.

Contudo, mesmo diante desse cenário, é necessário reconhecer a importância das alternativas penais e da própria monitoração eletrônica enquanto instrumentos de equilíbrio ao fenômeno do “encarceramento massivo”, atenuando a seletividade do Direito Penal,

Assim, a audiência de custódia, nesse ponto, coloca-se como uma ferramenta à disposição da difusão das alternativas penais, dando vazão aos antigos e atuais anseios que se espera da Lei de Cautelares, fazendo da prisão a ultima ratio dentro do sistema de justiça criminal.

 

2.5 - A audiência de custódia como instrumento de combate à tortura e aos maus-tratos


Atos de tortura ainda são recorrentes em muitos estabelecimentos prisionais brasileiros. Apesar de o Brasil já haver ratificado convenções e tratados de direitos humanos para combatê-la e já ter, em seu ordenamento pátrio, lei com objetivos comuns (Convenção das Nações Unidas contra a Tortura e Outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos e Degradantes, de 1984[55]; Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura, de 1985[56]; Lei 9.455/97[57]), a prática de tortura é algo “endêmico”, segundo resultados preliminares de uma inspeção feita em agosto deste ano, pelo Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas (ONU), em presídios brasileiros[58].

De acordo com o relator especial do Conselho, Juan Méndez, “apesar de os presos relatarem a organizações de direitos humanos os maus-tratos sofridos, dificilmente eles oficializam denúncias nos órgãos públicos. Segundo ele, isso ocorre por medo de represálias e também porque os detentos acreditam que os torturadores não serão punidos”.[59]

Ainda em 2010, o relatório sobre tortura da Pastoral Carcerária Nacional divulgou que, dentre os 26 estados e o Distrito Federal, 20 apresentaram registros de tortura contra pessoas presas, sendo o maior número de casos nos estados de São Paulo (71), Maranhão (30), Goiás (25) e Rio Grande do Norte (12)[60].

Embora esses resultados sejam expressivos diante das premissas da Carta Magna, que tem por fundamento a dignidade da pessoa humana, constata-se que muitos mais casos sequer chegam ao conhecimento dos institutos de proteção ou às autoridades incumbidas de exterminar esse mal.

Nessa esteira, a apresentação da pessoa presa à autoridade judicial tem o condão de coibir a inaceitável prática de tortura em relação àqueles que se encontram sob a custódia do Estado.

A apresentação da pessoa presa ao juiz, em curto espaço de tempo, será instrumento eficaz para conhecer, investigar e punir os autores de crimes bárbaros que possam ficar encobertos, geralmente, por ausência de provas, já que o primeiro contato do juiz com o encarcerado ocorre, em geral, meses após a prisão, o que acarreta o desaparecimento de indícios de violência.

 

2.6 - A audiência de custódia e a instituição de mecanismo de acompanhamento da decretação e controle da prisão provisória


A partir da difusão do projeto “Audiência de Custódia” pelo Presidente do Conselho Nacional de Justiça, Ministro Ricardo Lewandowski, o DMF e o Departamento de Tecnologia da Informação e Comunicação desenvolveram o chamado Sistema de Audiência de Custódia – SISTAC.

Referido sistema foi criado com o objetivo de dar celeridade ao procedimento de registro das apresentações dos cidadãos presos em flagrante a um juiz, no prazo de 24 horas, e com o propósito de disponibilizar ferramenta apta a dar efetividade aos preceitos da Resolução CNJ 66/ 2009[61].

A possibilidade de produzir relatórios e estatísticas sobre o número de pessoas presas em flagrante, número de pessoas beneficiadas com liberdade provisória, número de medidas cautelares deferidas, inclusive com a indicação da respectiva modalidade, número de denúncias relativas a torturas ou maus-tratos, número de encaminhamentos sociais determinados pela autoridade judicial, entre outras, o transforma em um mecanismo eficiente e capaz de subsidiar estudos para implementação de políticas públicas voltadas ao sistema prisional brasileiro.

Dessa feita, a fim de permitir a sua adoção por todos os entes da federação, como instrumento uniforme para registro de atos judiciais e produção de estatísticas no âmbito do sistema de justiça criminal, necessária se faz a regulamentação de sua utilização no ato de audiência com o registro dos dados neste momento captador, por meio do ato normativo que ora se propõe.

 

3-                CONCLUSÃO

 

Diante do exposto, com fundamento nas razões acima aduzidas, proponho a aprovação, pelo Plenário, da seguinte minuta de resolução e seus anexos, com vistas a disciplinar a denominada Audiência de Custódia, consistente na apresentação de toda pessoa presa em flagrante delito à autoridade judicial no prazo de 24 horas, a fim de que a autoridade judicial melhor possa avaliar as condições da prisão efetuada com base na Convenção Americana de Diretos Humanos e no Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, instrumentos internacionais que, ratificados, devem ser aplicados no plano interno e cumpridos pelo Judiciário. 


É como voto. 


Brasília, 14 de dezembro de 2015. 

  

BRUNO RONCHETTI DE CASTRO 

Conselheiro Relator 

 

 

                                                                                                                   MINUTA

 

RESOLUÇÃO      , DE      DE DEZEMBRO DE 2015 

 

 

Dispõe sobre a apresentação de toda pessoa presa à autoridade judicial no prazo de 24 horas.

 

 

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ), no uso de suas atribuições legais e regimentais;

 

CONSIDERANDO o art. 9º, item 3, do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos das Nações Unidas, bem como o art. 7º, item 5, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica);

 

CONSIDERANDO a decisão nos autos da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 347 do Supremo Tribunal Federal, consignando a obrigatoriedade da apresentação da pessoa presa à autoridade judicial competente;

 

CONSIDERANDO o que dispõe a letra “a” do inciso I do art. 96 da Constituição Federal, que defere aos tribunais a possibilidade de tratarem da competência e do funcionamento dos seus serviços e órgãos jurisdicionais e administrativos;

 

CONSIDERANDO a decisão prolatada na Ação Direta de Inconstitucionalidade 5240 do Supremo Tribunal Federal, declarando a constitucionalidade da disciplina pelos Tribunais da apresentação da pessoa presa à autoridade judicial competente;

 

CONSIDERANDO o relatório produzido pelo Subcomitê de Prevenção à Tortura da ONU (CAT/OP/BRA/R.1, 2011), pelo Grupo de Trabalho sobre Detenção Arbitrária da ONU (A/HRC/27/48/Add.3, 2014) e o relatório sobre o uso da prisão provisória nas Américas da Organização dos Estados Americanos;

 

CONSIDERANDO o diagnóstico de pessoas presas apresentado pelo CNJ e o INFOPEN do Departamento Penitenciário Nacional do Ministério da Justiça (DEPEN/MJ), publicados, respectivamente, nos anos de 2014 e 2015, revelando o contingente desproporcional de pessoas presas provisoriamente;

 

CONSIDERANDO que a prisão, conforme previsão constitucional (CF, art. 5º, LXV, LXVI), é medida extrema que se aplica somente nos casos expressos em lei e quando a hipótese não comportar nenhuma das medidas cautelares alternativas;

 

CONSIDERANDO que as inovações introduzidas no Código de Processo Penal pela Lei 12.403, de 4 de maio de 2011, impuseram ao juiz a obrigação de converter em prisão preventiva a prisão em flagrante delito, somente quando apurada a impossibilidade de relaxamento ou concessão de liberdade provisória, com ou sem medida cautelar diversa da prisão; 

 

CONSIDERANDO que a condução imediata da pessoa presa à autoridade judicial é o meio mais eficaz para prevenir e reprimir a prática de tortura no momento da prisão, assegurando, portanto, o direito à integridade física e psicológica das pessoas submetidas à custódia estatal, previsto no art. 5.2 da Convenção Americana de Direitos Humanos e no art. 2.1 da Convenção Contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes; 

 

CONSIDERANDO o disposto na Recomendação CNJ 49 de 1º de abril de 2014;

 

CONSIDERANDO a decisão plenária tomada no julgamento do Ato Normativo 0005913-65.2015.2.00.0000, na 223ª Sessão Ordinária, realizada em 15 de dezembro de 2015;

  

RESOLVE:

 

Art. 1º Determinar que toda pessoa presa em flagrante delito, independentemente da motivação ou natureza do ato, seja obrigatoriamente apresentada, em até 24 horas da comunicação do flagrante, à autoridade judicial competente, e ouvida sobre as circunstâncias em que se realizou sua prisão ou apreensão.

§ 1º A comunicação da prisão em flagrante à autoridade judicial, que se dará por meio do encaminhamento do auto de prisão em flagrante, de acordo com as rotinas previstas em cada Estado da Federação, não supre a apresentação pessoal determinada no caput.

§ 2º Entende-se por autoridade judicial competente aquela assim disposta pelas leis de organização judiciária locais, ou, salvo omissão, definida por ato normativo do Tribunal de Justiça ou Tribunal Federal local que instituir as audiências de apresentação, incluído o juiz plantonista.

 § 3º No caso de prisão em flagrante delito da competência originária de Tribunal, a apresentação do preso poderá ser feita ao juiz que o Presidente do Tribunal ou Relator designar para esse fim.

§ 4º Estando a pessoa presa acometida de grave enfermidade, ou havendo circunstância comprovadamente excepcional que a impossibilite de ser apresentada ao juiz no prazo do caput, deverá ser assegurada a realização da audiência no local em que ela se encontre e, nos casos em que o deslocamento se mostre inviável, deverá ser providenciada a condução para a audiência de custódia imediatamente após restabelecida sua condição de saúde ou de apresentação. 

§ 5º O CNJ, ouvidos os órgãos jurisdicionais locais, editará ato complementar a esta Resolução, regulamentando, em caráter excepcional, os prazos para apresentação à autoridade judicial da pessoa presa em Municípios ou sedes regionais a serem especificados, em que o juiz competente ou plantonista esteja impossibilitado de cumprir o prazo estabelecido no caput. 

Art. 2º O deslocamento da pessoa presa em flagrante delito ao local da audiência e desse, eventualmente, para alguma unidade prisional específica, no caso de aplicação da prisão preventiva, será de responsabilidade da Secretaria de Administração Penitenciária ou da Secretaria de Segurança Pública, conforme os regramentos locais.

Parágrafo único.  Os tribunais poderão celebrar convênios de modo a viabilizar a realização da audiência de custódia fora da unidade judiciária correspondente. 

Art. 3º Se, por qualquer motivo, não houver juiz na comarca até o final do prazo do art. 1º, a pessoa presa será levada imediatamente ao substituto legal, observado, no que couber, o § 5º do art. 1º.

Art. 4º A audiência de custódia será realizada na presença do Ministério Público e da Defensoria Pública, caso a pessoa detida não possua defensor constituído no momento da lavratura do flagrante.  

Parágrafo único.  É vedada a presença dos agentes policiais responsáveis pela prisão ou pela investigação durante a audiência de custódia.

Art. 5º Se a pessoa presa em flagrante delito constituir advogado até o término da lavratura do auto de prisão em flagrante, o Delegado de polícia deverá notificá-lo, pelos meios mais comuns, tais como correio eletrônico, telefone ou mensagem de texto, para que compareça à audiência de custódia, consignando nos autos.

Parágrafo único.  Não havendo defensor constituído, a pessoa presa será atendida pela Defensoria Pública. 

Art. 6º Antes da apresentação da pessoa presa ao juiz, será assegurado seu atendimento prévio e reservado por advogado por ela constituído ou defensor público, sem a presença de agentes policiais, sendo esclarecidos por funcionário credenciado os motivos, fundamentos e ritos que versam a audiência de custódia.

Parágrafo único. Será reservado local apropriado visando a garantia da confidencialidade do atendimento prévio com advogado ou defensor público. 

Art. 7º A apresentação da pessoa presa em flagrante delito à autoridade judicial competente será obrigatoriamente precedida de cadastro no Sistema de Audiência de Custódia (SISTAC).

§ 1º O SISTAC, sistema eletrônico de amplitude nacional, disponibilizado pelo CNJ, gratuitamente, para todas as unidades judiciais responsáveis pela realização da audiência de custódia, é destinado a facilitar a coleta dos dados produzidos na audiência e que decorram da apresentação de pessoa presa em flagrante delito a um juiz e tem por objetivos:

I – registrar formalmente o fluxo das audiências de custódia nos tribunais;

II – sistematizar os dados coletados durante a audiência de custódia, de forma a viabilizar o controle das informações produzidas, relativas às prisões em flagrante, às decisões judiciais e ao ingresso no sistema prisional;

III – produzir estatísticas sobre o número de pessoas presas em flagrante delito, de pessoas a quem foi concedida liberdade provisória, de medidas cautelares aplicadas com a indicação da respectiva modalidade, de denúncias relativas a tortura e maus tratos, entre outras;

IV – elaborar ata padronizada da audiência de custódia;

V – facilitar a consulta a assentamentos anteriores, com o objetivo de permitir a atualização do perfil das pessoas presas em flagrante delito a qualquer momento e a vinculação do cadastro de seus dados pessoais a novos atos processuais;

VI – permitir o registro de denúncias de torturas e maus tratos, para posterior encaminhamento para investigação;

VII – manter o registro dos encaminhamentos sociais, de caráter voluntário, recomendados pelo juiz ou indicados pela equipe técnica, bem como os de exame de corpo de delito, solicitados pelo juiz;

VIII – analisar os efeitos, impactos e resultados da implementação da audiência de custódia.

§ 2º A apresentação da pessoa presa em flagrante delito em juízo acontecerá após o protocolo e distribuição do auto de prisão em flagrante e respectiva nota de culpa perante a unidade judiciária correspondente, dela constando o motivo da prisão, o nome do condutor e das testemunhas do flagrante, perante a unidade responsável para operacionalizar o ato, de acordo com regramentos locais.

§ 3º O auto de prisão em flagrante subsidiará as informações a serem registradas no SISTAC, conjuntamente com aquelas obtidas a partir do relato do próprio autuado.

§ 4º Os dados extraídos dos relatórios mencionados no inciso III do § 1º serão disponibilizados no sítio eletrônico do CNJ, razão pela qual as autoridades judiciárias responsáveis devem assegurar a correta e contínua alimentação do SISTAC.

Art. 8º  Na audiência de custódia, a autoridade judicial entrevistará a pessoa presa em flagrante, devendo:

I – esclarecer o que é a audiência de custódia, ressaltando as questões a serem analisadas pela autoridade judicial;

II – assegurar que a pessoa presa não esteja algemada, salvo em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, devendo a excepcionalidade ser justificada por escrito;

III – dar ciência sobre seu direito de permanecer em silêncio;

IV – questionar se lhe foi dada ciência e efetiva oportunidade de exercício dos direitos constitucionais inerentes à sua condição, particularmente o direito de consultar-se com advogado ou defensor público, o de ser atendido por médico e o de comunicar-se com seus familiares;

V – indagar sobre as circunstâncias de sua prisão ou apreensão;

VI perguntar sobre o tratamento recebido em todos os locais por onde passou antes da apresentação à audiência, questionando sobre a ocorrência de tortura e maus tratos e adotando as providências cabíveis;

VII verificar se houve a realização de exame de corpo de delito, determinando sua realização nos casos em que:

a) não tiver sido realizado;

b) os registros se mostrarem insuficientes;

c) a alegação de tortura e maus tratos referir-se a momento posterior ao exame realizado;

d) o exame tiver sido realizado na presença de agente policial, observando-se a Recomendação CNJ 49/2014 quanto à formulação de quesitos ao perito; 

VIII – abster-se de formular perguntas com finalidade de produzir prova para a investigação ou ação penal relativas aos fatos objeto do auto de prisão em flagrante;

IX – adotar as providências a seu cargo para sanar possíveis irregularidades;

X – averiguar, por perguntas e visualmente, hipóteses de gravidez, existência de filhos ou dependentes sob cuidados da pessoa presa em flagrante delito, histórico de doença grave, incluídos os transtornos mentais e a dependência química, para analisar o cabimento de encaminhamento assistencial e da concessão da liberdade provisória, sem ou com a imposição de medida cautelar.

§ 1º Após a oitiva da pessoa presa em flagrante delito, o juiz deferirá ao Ministério Público e à defesa técnica, nesta ordem, reperguntas compatíveis com a natureza do ato, devendo indeferir as perguntas relativas ao mérito dos fatos que possam constituir eventual imputação, permitindo-lhes, em seguida, requerer:

I – o relaxamento da prisão em flagrante;

II – a concessão da liberdade provisória sem ou com aplicação de medida cautelar diversa da prisão;

III – a decretação de prisão preventiva;

IV – a adoção de outras medidas necessárias à preservação de direitos da pessoa presa.

§ 2º A oitiva da pessoa presa será registrada, preferencialmente, em mídia, dispensando-se a formalização de termo de manifestação da pessoa presa ou do conteúdo das postulações das partes, e ficará arquivada na unidade responsável pela audiência de custódia.

§ 3º A ata da audiência conterá, apenas e resumidamente, a deliberação fundamentada do magistrado quanto à legalidade e manutenção da prisão, cabimento de liberdade provisória sem ou com a imposição de medidas cautelares diversas da prisão, considerando-se o pedido de cada parte, como também as providências tomadas, em caso da constatação de indícios de tortura e maus tratos.

§ 4º Concluída a audiência de custódia, cópia da sua ata será entregue à pessoa presa em flagrante delito, ao Defensor e ao Ministério Público, tomando-se a ciência de todos, e apenas o auto de prisão em flagrante, com antecedentes e cópia da ata, seguirá para livre distribuição.

§ 5º Proferida a decisão que resultar no relaxamento da prisão em flagrante, na concessão da liberdade provisória sem ou com a imposição de medida cautelar alternativa à prisão, ou quando determinado o imediato arquivamento do inquérito, a pessoa presa em flagrante delito será prontamente colocada em liberdade, mediante a expedição de alvará de soltura, e será informada sobre seus direitos e obrigações, salvo se por outro motivo tenha que continuar presa.

Art. 9º A aplicação de medidas cautelares diversas da prisão previstas no art. 319 do CPP deverá compreender a avaliação da real adequação e necessidade das medidas, com estipulação de prazos para seu cumprimento e para a reavaliação de sua manutenção, observando-se o Protocolo I desta Resolução.

§ 1º O acompanhamento das medidas cautelares diversas da prisão determinadas judicialmente ficará a cargo dos serviços de acompanhamento de alternativas penais, denominados Centrais Integradas de Alternativas Penais, estruturados preferencialmente no âmbito do Poder Executivo estadual, contando com equipes multidisciplinares, responsáveis, ainda, pela realização dos encaminhamentos necessários à Rede de Atenção à Saúde do Sistema Único de Saúde (SUS) e à rede de assistência social do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), bem como a outras políticas e programas ofertados pelo Poder Público, sendo os resultados do atendimento e do acompanhamento comunicados regularmente ao juízo ao qual for distribuído o auto de prisão em flagrante após a realização da audiência de custódia.

§ 2º Identificadas demandas abrangidas por políticas de proteção ou de inclusão social implementadas pelo Poder Público, caberá ao juiz encaminhar a pessoa presa em flagrante delito ao serviço de acompanhamento de alternativas penais, ao qual cabe a articulação com a rede de proteção social e a identificação das políticas e dos programas adequados a cada caso ou, nas Comarcas em que inexistirem serviços de acompanhamento de alternativas penais, indicar o encaminhamento direto às políticas de proteção ou inclusão social existentes, sensibilizando a pessoa presa em flagrante delito para o comparecimento de forma não obrigatória.

§ 3° O juiz deve buscar garantir às pessoas presas em flagrante delito o direito à atenção médica e psicossocial eventualmente necessária, resguardada a natureza voluntária desses serviços, a partir do encaminhamento ao serviço de acompanhamento de alternativas penais, não sendo cabível a aplicação de medidas cautelares para tratamento ou internação compulsória de pessoas autuadas em flagrante que apresentem quadro de transtorno mental ou de dependência química, em desconformidade com o previsto no art. 4º da Lei 10.216, de 6 de abril de 2001, e no art. 319, inciso VII, do CPP.

Art. 10.  A aplicação da medida cautelar diversa da prisão prevista no art. 319, inciso IX, do Código de Processo Penal, será excepcional e determinada apenas quando demonstrada a impossibilidade de concessão da liberdade provisória sem cautelar ou de aplicação de outra medida cautelar menos gravosa, sujeitando-se à reavaliação periódica quanto à necessidade e adequação de sua manutenção, sendo destinada exclusivamente a pessoas presas em flagrante delito por crimes dolosos puníveis com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos ou condenadas por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no inciso I do caput do art. 64 do Código Penal, bem como pessoas em cumprimento de medidas protetivas de urgência acusadas por crimes que envolvam violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, quando não couber outra medida menos gravosa.

Parágrafo único.  Por abranger dados que pressupõem sigilo, a utilização de informações coletadas durante a monitoração eletrônica de pessoas dependerá de autorização judicial, em atenção ao art. 5°, XII, da Constituição Federal. 

Art. 11.  Havendo declaração da pessoa presa em flagrante delito de que foi vítima de tortura e maus tratos ou entendimento da autoridade judicial de que há indícios da prática de tortura, será determinado o registro das informações, adotadas as providências cabíveis para a investigação da denúncia e preservação da segurança física e psicológica da vítima, que será encaminhada para atendimento médico e psicossocial especializado.

§ 1º Com o objetivo de assegurar o efetivo combate à tortura e maus tratos, a autoridade jurídica e funcionários deverão observar o Protocolo II desta Resolução com vistas a garantir condições adequadas para a oitiva e coleta idônea de depoimento das pessoas presas em flagrante delito na audiência de custódia, a adoção de procedimentos durante o depoimento que permitam a apuração de indícios de práticas de tortura e de providências cabíveis em caso de identificação de práticas de tortura.

§ 2º O funcionário responsável pela coleta de dados da pessoa presa em flagrante delito deve cuidar para que sejam coletadas as seguintes informações, respeitando a vontade da vítima:

I – identificação dos agressores, indicando sua instituição e sua unidade de atuação;

II – locais, datas e horários aproximados dos fatos;

III – descrição dos fatos, inclusive dos métodos adotados pelo agressor e a indicação das lesões sofridas;

IV – identificação de testemunhas que possam colaborar para a averiguação dos fatos;

V – verificação de registros das lesões sofridas pela vítima;

VI – existência de registro que indique prática de tortura ou maus tratos no laudo elaborado pelos peritos do Instituto Médico Legal;

VII – registro dos encaminhamentos dados pela autoridade judicial para requisitar investigação dos relatos;

VIII – registro da aplicação de medida protetiva ao autuado pela autoridade judicial, caso a natureza ou gravidade dos fatos relatados coloque em risco a vida ou a segurança da pessoa presa em flagrante delito, de seus familiares ou de testemunhas.

§ 3º Os registros das lesões poderão ser feitos em modo fotográfico ou audiovisual, respeitando a intimidade e consignando o consentimento da vítima.

§ 4º Averiguada pela autoridade judicial a necessidade da imposição de alguma medida de proteção à pessoa presa em flagrante delito, em razão da comunicação ou denúncia da prática de tortura e maus tratos, será assegurada, primordialmente, a integridade pessoal do denunciante, das testemunhas, do funcionário que constatou a ocorrência da prática abusiva e de seus familiares, e, se pertinente, o sigilo das informações.

§ 5º Os encaminhamentos dados pela autoridade judicial e as informações deles resultantes deverão ser comunicadas ao juiz responsável pela instrução do processo.

Art. 12.  O termo da audiência de custódia será apensado ao inquérito ou à ação penal. 

Art. 13. A apresentação à autoridade judicial no prazo de 24 horas também será assegurada às pessoas presas em decorrência de cumprimento de mandados de prisão cautelar ou definitiva, aplicando-se, no que couber, os procedimentos previstos nesta Resolução.

Parágrafo único.  Todos os mandados de prisão deverão conter, expressamente, a determinação para que, no momento de seu cumprimento, a pessoa presa seja imediatamente apresentada à autoridade judicial que determinou a expedição da ordem de custódia ou, nos casos em que forem cumpridos fora da jurisdição do juiz processante, à autoridade judicial competente, conforme lei de organização judiciária local. 

Art. 14.  Os tribunais expedirão os atos necessários e auxiliarão os juízes no cumprimento desta Resolução, em consideração à realidade local, podendo realizar os convênios e gestões necessárias ao seu pleno cumprimento. 

Art. 15.  Os Tribunais de Justiça e os Tribunais Regionais Federais terão o prazo de 90 dias, contados a partir da entrada em vigor desta Resolução, para implantar a audiência de custódia no âmbito de suas respectivas jurisdições.

Parágrafo único. No mesmo prazo será assegurado, às pessoas presas em flagrante antes da implantação da audiência de custódia que não tenham sido apresentadas em outra audiência no curso do processo de conhecimento, a apresentação à autoridade judicial, nos termos desta Resolução.

Art. 16.  O acompanhamento do cumprimento da presente Resolução contará com o apoio técnico do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e Execução das Medidas Socioeducativas.

 Art. 17.  Esta Resolução entra em vigor a partir de 1º de fevereiro de 2016.

 

 

Ministro Ricardo Lewandowski 

 

 

 


PROTOCOLO I

 

Procedimentos para a aplicação e o acompanhamento de medidas cautelares diversas da prisão para custodiados apresentados nas audiências de custódia

 

Este documento tem por objetivo apresentar orientações e diretrizes sobre a aplicação e o acompanhamento de medidas cautelares diversas da prisão para custodiados apresentados nas audiências de custódia.

 

1. Fundamentos legais e finalidade das medidas cautelares diversas da prisão

A Lei das Cautelares (Lei 12.403/11) foi instituída com o objetivo de conter o uso excessivo da prisão provisória. Ao ampliar o leque de possibilidades das medidas cautelares, a Lei das Cautelares introduziu no ordenamento jurídico penal modalidades alternativas ao encarceramento provisório.

Com a disseminação das audiências de custódia no Brasil, e diante da apresentação do preso em flagrante a um juiz, é possível calibrar melhor a necessidade da conversão das prisões em flagrante em prisões provisórias, tal como já demonstram as estatísticas dessa prática em todas as Unidades da Federação.

Quanto mais demorado é o processo criminal, menor é a chance de que a pessoa tenha garantido o seu direito a uma pena alternativa à prisão.

Também menores são os índices de reincidência quando os réus não são submetidos à experiência de prisionalização.

O cárcere reforça o ciclo da violência ao contribuir para a ruptura dos vínculos familiares e comunitários da pessoa privada de liberdade, que sofre ainda com a estigmatização e as consequentes dificuldades de acesso ao mercado de trabalho, ampliando a situação de marginalização e a chance de ocorrerem novos processos de criminalização.  

Apesar desse cenário, o Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (2015), consolidado pelo Departamento Penitenciário Nacional, aponta que 41% da população prisional no país é composta por presos sem condenação, que aguardam privados de liberdade o julgamento de seu processo.

A esse respeito, pesquisa publicada pelo IPEA (2015), sobre a Aplicação de Penas e Medidas Alternativas, aponta que em 37,2% dos casos em que réus estiveram presos provisoriamente, não houve condenação à prisão ao final do processo, resultando em absolvição ou condenação a penas restritivas de direitos em sua maioria. A pesquisa confirma, no país, diagnósticos de observadores internacionais, quanto "ao sistemático, abusivo e desproporcional uso da prisão provisória pelo sistema de justiça".

As medidas cautelares devem agregar novos paradigmas a sua imposição, de modo que a adequação da medida se traduza na responsabilização do autuado, assegurando-lhe, ao mesmo tempo, condições de cumprimento dessas modalidades autonomia e liberdade, sem prejuízo do encaminhamento a programas e políticas de proteção e inclusão social já instituídos e disponibilizados pelo poder público.

Nesse sentido, conforme previsto nos Acordos de Cooperação nº 05, nº 06 e nº 07, de 09 de abril de 2015, firmados entre o Conselho Nacional de Justiça e o Ministério da Justiça, as medidas cautelares diversas da prisão aplicadas no âmbito das audiências de custódia serão encaminhadas para acompanhamento em serviços instituídos preferencialmente no âmbito do Poder Executivo estadual, denominados Centrais Integradas de Alternativas Penais ou com outra nomenclatura, bem como às Centrais de Monitoração Eletrônica, em casos específicos. Caberá ao Departamento Penitenciário Nacional, órgão vinculado ao Ministério da Justiça, em parceria com o Conselho Nacional de Justiça, elaborar manuais de gestão dessas práticas, com indicação das metodologias de acompanhamento dessas medidas.

Ainda de acordo com os acordos de cooperação, as medidas cautelares diversas da prisão deverão atentar às seguintes finalidades:

I. a promoção da autonomia e da cidadania da pessoa submetida à medida;

II. o incentivo à participação da comunidade e da vítima na resolução dos conflitos;

III. a autoresponsabilização e a manutenção do vínculo da pessoa submetida à medida com a comunidade, com a garantia de seus direitos individuais e sociais; e

IV. a restauração das relações sociais.

 

2. Diretrizes para a aplicação e o acompanhamento das medidas cautelares diversas da prisão

De forma a assegurar os fundamentos legais e as finalidades para a aplicação e o acompanhamento das medidas cautelares diversas da prisão, o juiz deverá observar as seguintes diretrizes:

I. Reserva da lei ou da legalidade: A aplicação e o acompanhamento das medidas cautelares diversas da prisão devem se ater às hipóteses previstas na legislação, não sendo cabíveis aplicações de medidas restritivas que extrapolem a legalidade.

II. Subsidiariedade e intervenção penal mínima: É preciso limitar a intervenção penal ao mínimo e garantir que o uso da prisão seja recurso residual junto ao sistema penal, privilegiando outras respostas aos problemas e conflitos sociais. As intervenções penais devem se ater às mais graves violações aos direitos humanos e se restringir ao mínimo necessário para fazer cessar a violação, considerando os custos sociais envolvidos na aplicação da prisão provisória ou de medidas cautelares que imponham restrições à liberdade.

III. Presunção de inocência: A presunção da inocência deve garantir às pessoas o direito à liberdade, à defesa e ao devido processo legal, devendo a prisão preventiva, bem como a aplicação de medidas cautelares diversas da prisão serem aplicadas de forma residual. A concessão da liberdade provisória sem ou com cautelares diversas da prisão é direito e não benefício, devendo sempre ser considerada a presunção de inocência das pessoas acusadas. Dessa forma, a regra deve ser a concessão da liberdade provisória sem a aplicação de cautelares, resguardando este direito sobretudo em relação a segmentos da população mais vulneráveis a processos de criminalização e com menor acesso à justiça.

                IV. Dignidade e liberdade: A aplicação e o acompanhamento das medidas cautelares diversas da prisão devem primar pela dignidade e liberdade das pessoas. Esta liberdade pressupõe participação ativa das partes na construção das medidas, garantindo a individualização, a reparação, a restauração das relações e a justa medida para todos os envolvidos.

                V. Individuação, respeito às trajetórias individuais e reconhecimento das potencialidades: Na aplicação e no acompanhamento das medidas cautelares diversas da prisão, deve-se respeitar as trajetórias individuais, promovendo soluções que comprometam positivamente as partes, observando-se as potencialidades pessoais dos sujeitos, destituindo as medidas de um sentido de mera retribuição sobre atos do passado, incompatíveis com a presunção de inocência assegurada constitucionalmente. É necessário promover sentidos emancipatórios para as pessoas envolvidas, contribuindo para a construção da cultura da paz e para a redução das diversas formas de violência.

VI. Respeito e promoção das diversidades: Na aplicação e no acompanhamento das medidas cautelares diversas da prisão, o Poder Judiciário e os programas de apoio à execução deverão garantir o respeito às diversidades geracionais, sociais, étnico/raciais, de gênero/sexualidade, de origem e nacionalidade, renda e classe social, de religião, crença, entre outras.

VII. Responsabilização: As medidas cautelares diversas da prisão devem promover a responsabilização com autonomia e liberdade dos indivíduos nelas envolvidas. Nesse sentido, a aplicação e o acompanhamento das medidas cautelares diversas da prisão devem ser estabelecidos a partir e com o compromisso das partes, de forma que a adequação da medida e seu cumprimento se traduzam em viabilidade e sentido para os envolvidos.

VIII. Provisoriedade: A aplicação e o acompanhamento das medidas cautelares diversas da prisão devem se ater à provisoriedade das medidas, considerando o impacto dessocializador que as restrições implicam. A morosidade do processo penal poderá significar um tempo de medida indeterminado ou injustificadamente prolongado, o que fere a razoabilidade e o princípio do mínimo penal. Nesse sentido, as medidas cautelares diversas da prisão deverão ser aplicadas sempre com a determinação do término da medida, além de se assegurar a reavaliação periódica das medidas restritivas aplicadas.

IX. Normalidade: A aplicação e o acompanhamento das medidas cautelares diversas da prisão devem ser delineadas a partir de cada situação concreta, em sintonia com os direitos e as trajetórias individuais das pessoas a cumprir. Assim, tais medidas devem primar por não interferir ou fazê-lo de forma menos impactante nas rotinas e relações cotidianas das pessoas envolvidas, limitando-se ao mínimo necessário para a tutela pretendida pela medida, sob risco de aprofundar os processos de marginalização e de criminalização das pessoas submetidas às medidas.

X. Não penalização da pobreza: A situação de vulnerabilidade social das pessoas autuadas e conduzidas à audiência de custódia não pode ser critério de seletividade em seu desfavor na consideração sobre a conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva. Especialmente no caso de moradores de rua, a conveniência para a instrução criminal ou a dificuldade de intimação para comparecimento a atos processuais não é circunstância apta a justificar a prisão processual ou medida cautelar, devendo-se garantir, ainda, os encaminhamentos sociais de forma não obrigatória, sempre que necessários, preservada a liberdade e a autonomia dos sujeitos.

 

3. Procedimentos para acompanhamento das medidas cautelares e inclusão social

As medidas cautelares, quando aplicadas, devem atender a procedimentos capazes de garantir a sua exequibilidade, considerando:

I.          a adequação da medida à capacidade de se garantir o seu acompanhamento, sem que o ônus de dificuldades na gestão recaia sobre o autuado;

II.         as condições e capacidade de cumprimento pelo autuado;

III.       a necessidade de garantia de encaminhamentos às demandas sociais do autuado, de forma não obrigatória.

 

Para garantir a efetividade das medidas cautelares diversas da prisão, cada órgão ou instância deve se ater às suas competências e conhecimentos, de forma sistêmica e complementar.

 

Para além da aplicação da medida, é necessário garantir instâncias de execução das medidas cautelares, com metodologias e equipes qualificadas capazes de permitir um acompanhamento adequado ao cumprimento das medidas cautelares diversas da prisão.

Para tanto, caberá ao Ministério da Justiça, em parceria com o Conselho Nacional de Justiça, desenvolver manuais de gestão, com metodologias, procedimentos e fluxos de trabalho, além de fomentar técnica e financeiramente a criação de estruturas de acompanhamento das medidas, conforme previsto nos Acordos de Cooperação nº 05, nº 06 e nº 07, de 09 de abril de 2015.

 

Nesse sentido, as Centrais Integradas de Alternativas Penais ou órgãos equivalentes, bem como as Centrais de Monitoração Eletrônica, serão estruturados preferencialmente no âmbito do Poder Executivo estadual e contarão com equipes multidisciplinares regularmente capacitadas para atuarem no acompanhamento das medidas cautelares.

 

 3.1. A atuação do Juiz deverá considerar os seguintes procedimentos:

 

I. A partir da apresentação de motivação para a sua decisão nos termos do art. 310 do CPP, resguardando o princípio da presunção de inocência, caberá ao juiz conceder a liberdade provisória ou impor, de forma fundamentada, a aplicação de medidas cautelares diversas da prisão, somente quando necessárias, justificando o porquê de sua não aplicação quando se entender pela decretação de prisão preventiva;

II. Garantir ao autuado o direito à atenção médica e psicossocial eventualmente necessária(s), resguardada a natureza voluntária desses serviços, a partir do encaminhamento às Centrais Integradas de Alternativas Penais ou órgãos similares, evitando a aplicação de medidas cautelares para tratamento ou internação compulsória de pessoas em conflito com a lei autuadas em flagrante com transtorno mental, incluída a dependência química, em desconformidade com o previsto no Art. 4º da Lei 10.216, de 2001 e no Art. 319, inciso VII, do Decreto-Lei 3.689, de 1941

III. Articular, em nível local, os procedimentos adequados ao encaminhamento das pessoas em cumprimento de medidas cautelares diversas da prisão para as Centrais Integradas de Alternativas Penais ou órgãos similares, bem como os procedimentos de acolhimento dos cumpridores, acompanhamento das medidas aplicadas e encaminhamentos para políticas públicas de inclusão social;

i. Nas Comarcas onde não existam as Centrais mencionadas, a partir da equipe psicossocial da vara responsável pelas audiências de custódia buscar-se-á a integração do autuado em redes amplas junto aos governos do estado e município, buscando garantir-lhe a inclusão social de forma não obrigatória, a partir das especificidades de cada caso.

IV. Articular, em nível local, os procedimentos adequados ao encaminhamento das pessoas em cumprimento da medida cautelar diversa da prisão prevista no Art. 319, inciso IX, do Código de Processo Penal, para as Centrais de Monitoração Eletrônica de Pessoas, bem como os procedimentos de acolhimento das pessoas monitoradas, acompanhamento das medidas aplicadas e encaminhamentos para políticas públicas de inclusão social.

V. Garantir o respeito e cumprimento às seguintes diretrizes quando da aplicação da medida cautelar de monitoração eletrônica:

a) Efetiva alternativa à prisão provisória: A aplicação da monitoração eletrônica será excepcional, devendo ser utilizada como alternativa à prisão provisória e não como elemento adicional de controle para autuados que, pelas circunstâncias apuradas em juízo, já responderiam ao processo em liberdade. Assim, a monitoração eletrônica, enquanto medida cautelar diversa da prisão, deverá ser aplicada exclusivamente a pessoas acusadas por crimes dolosos puníveis com pena privativa de liberdade máxima superior a 04 (quatro) anos ou condenadas por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no inciso I do caput do art. 64 do Código Penal Brasileiro, bem como a pessoas em cumprimento de medidas protetivas de urgência acusadas por crime que envolva violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, sempre de forma excepcional, quando não couber outra medida cautelar menos gravosa.

b) Necessidade e Adequação: A medida cautelar da monitoração eletrônica somente poderá ser aplicada quando verificada e fundamentada a necessidade da vigilância eletrônica da pessoa processada ou investigada, após demonstrada a inaplicabilidade da concessão da liberdade provisória, com ou sem fiança, e a insuficiência ou inadequação das demais medidas cautelares diversas da prisão, considerando-se, sempre, a presunção de inocência. Da mesma forma, a monitoração somente deverá ser aplicada quando verificada a adequação da medida com a situação da pessoa processada ou investigada, bem como aspectos objetivos, relacionados ao processo-crime, sobretudo quanto à desproporcionalidade de aplicação da medida de monitoração eletrônica em casos nos quais não será aplicada pena privativa de liberdade ao final do processo, caso haja condenação.

c) Provisoriedade: Considerando a gravidade e a amplitude das restrições que a monitoração eletrônica impõe às pessoas submetidas à medida, sua aplicação deverá se atentar especialmente à provisoriedade, garantindo a reavaliação periódica de sua necessidade e adequação. Não são admitidas medidas de monitoração eletrônica aplicadas por prazo indeterminado ou por prazos demasiadamente elevados (exemplo: seis meses). O cumprimento regular das condições impostas judicialmente deve ser considerado como elemento para a revisão da monitoração eletrônica aplicada, revelando a desnecessidade do controle excessivo que impõe, que poderá ser substituída por medidas menos gravosas que favoreçam a autoresponsabilização do autuado no cumprimento das obrigações estabelecidas, bem como sua efetiva inclusão social.

d) Menor dano: A aplicação e o acompanhamento de medidas de monitoração eletrônica devem estar orientadas para a minimização de danos físicos e psicológicos causados às pessoas monitoradas eletronicamente. Deve-se buscar o fomento a adoção de fluxos, procedimentos, metodologias e tecnologias menos danosas à pessoa monitorada, minimizando-se a estigmatização e os constrangimentos causados pela utilização do aparelho.

e) Normalidade: A aplicação e o acompanhamento das medidas cautelares de monitoração eletrônica deverão buscar reduzir o impacto causado pelas restrições impostas e pelo uso do dispositivo, limitando-se ao mínimo necessário para a tutela pretendida pela medida, sob risco de aprofundar os processos de marginalização e de criminalização das pessoas submetidas às medidas. Deve-se buscar a aproximação ao máximo da rotina da pessoa monitorada em relação à rotina das pessoas não submetidas à monitoração eletrônica, favorecendo assim a inclusão social. Assim, é imprescindível que as áreas de inclusão e exclusão e demais restrições impostas, como eventuais limitações de horários, sejam determinadas de forma módica, atentando para as características individuais das pessoas monitoradas e suas necessidades de realização de atividades cotidianas das mais diversas dimensões (educação, trabalho, saúde, cultura, lazer, esporte, religião, convivência familiar e comunitária, entre outras).

 

 3.2. A atuação das Centrais Integradas de Alternativas Penais ou órgãos similares deverá considerar os seguintes procedimentos:

 

I. Buscar integrar-se em redes amplas de atendimento e assistência social para a inclusão de forma não obrigatória dos autuados a partir das indicações do juiz, das especificidades de cada caso e das demandas sociais apresentadas diretamente pelos autuados, com destaque para as seguintes áreas ou outras que se mostrarem necessárias:

a) demandas emergenciais como alimentação, vestuário, moradia, transporte, dentre outras;

b) trabalho, renda e qualificação profissional;

c) assistência judiciária;

d) desenvolvimento, produção, formação e difusão cultural principalmente para o público jovem.

II. Realizar encaminhamentos necessários à Rede de Atenção à Saúde do Sistema Único de Saúde (SUS) e à rede de assistência social do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), além de outras políticas e programas ofertadas pelo poder público, sendo os resultados do atendimento e do acompanhamento do autuado, assim indicados na decisão judicial, comunicados regularmente ao Juízo ao qual for distribuído o auto de prisão em flagrante após o encerramento da rotina da audiência de custódia;

       III. Consolidar redes adequadas para a internação e tratamento dos autuados, assegurado o direito à atenção médica e psicossocial sempre que necessária, resguardada a natureza voluntária desses serviços, não sendo cabível o encaminhamento de pessoas em conflito com a lei autuadas em flagrante portadoras de transtorno mental, incluída a dependência química, para tratamento ou internação compulsória, em desconformidade com o previsto no Art. 4º da Lei 10.216, de 2001 e no Art. 319, inciso VII, do Decreto-Lei 3.689, de 1941.

IV. Executar ou construir parcerias com outras instituições especialistas para a execução de grupos temáticos ou de responsabilização dos autuados a partir do tipo de delito cometido, inclusive nos casos relativos à violência contra as mulheres no contexto da Lei Maria da Penha

i. Estes grupos serão executados somente a partir da determinação judicial e como modalidade da medida cautelar de comparecimento obrigatório em juízo, prevista no inciso I do Art. 319 do Código de Processo Penal. 

 

 3.3. A atuação das Centrais de Monitoração Eletrônica de Pessoas deverá considerar os seguintes procedimentos:

I. Assegurar o acolhimento e acompanhamento por equipes multidisciplinares,  responsáveis pela articulação da rede de serviços de proteção e inclusão social disponibilizada pelo poder público e pelo acompanhamento do cumprimento das medidas estabelecidas judicialmente, a partir da interação individualizada com as pessoas monitoradas.

II. Assegurar a prioridade ao cumprimento, manutenção e restauração da medida em liberdade, inclusive em casos de incidentes de violação, adotando-se preferencialmente medidas de conscientização e atendimento por equipe psicossocial, devendo o acionamento da autoridade judicial ser subsidiário e excepcional, após esgotadas todas as medidas adotadas pela equipe técnica responsável pelo acompanhamento das pessoas em monitoração.

III. Primar pela adoção de padrões adequados de segurança, sigilo, proteção e uso dos dados das pessoas em monitoração, respeitado o tratamento dos dados em conformidade com a finalidade das coletas. Nesse sentido, deve-se considerar que os dados coletados durante a execução das medidas de monitoração eletrônica possuem finalidade específica, relacionada com o acompanhamento das condições estabelecidas judicialmente. As informações das pessoas monitoradas não poderão ser compartilhadas com terceiros estranhos ao processo de investigação ou de instrução criminal que justificou a aplicação da medida. O acesso aos dados, inclusive por instituições de segurança pública, somente poderá ser requisitado no âmbito de inquérito policial específico no qual a pessoa monitorada devidamente identificada já figure como suspeita, sendo submetido a autoridade judicial, que analisará o caso concreto e deferirá ou não o pedido.

IV. Buscar integra-se em redes amplas de atendimento e assistência social para a inclusão de forma não obrigatória dos autuados a partir das indicações do juiz, das especificidades de cada caso e das demandas sociais apresentadas diretamente pelos autuados, com destaque para as seguintes áreas ou outras que se mostrarem necessárias: 

a) demandas emergenciais como alimentação, vestuário, moradia, transporte, dentre outras;

b) trabalho, renda e qualificação profissional;

c) assistência judiciária;

d) desenvolvimento, produção, formação e difusão cultural principalmente para o público jovem.

V. Realizar encaminhamentos necessários à Rede de Atenção à Saúde do Sistema Único de Saúde (SUS) e à rede de assistência social do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), além de outras políticas e programas ofertadas pelo poder público, sendo os resultados do atendimento e do acompanhamento do autuado, assim indicados na decisão judicial, comunicados regularmente ao Juízo ao qual for distribuído o auto de prisão em flagrante após o encerramento da rotina da audiência de custódia.

 

 

 

 

PROTOCOLO II

 

Procedimentos para oitiva, registro e encaminhamento de denúncias de tortura e outros tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes[62]

 

 

Este documento tem por objetivo orientar tribunais e magistrados sobre procedimentos para denúncias de tortura e tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.

 

Serão apresentados o conceito de tortura, as orientações quanto a condições adequadas para a oitiva do custodiado na audiência, os procedimentos relativos à apuração de indícios da práticas de tortura durante a oitiva da pessoa custodiada e as providências a serem adotadas em caso de identificação de práticas de tortura e tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.

 

1.         DEFINIÇÃO DE TORTURA

 

Considerando a Convenção das Nações Unidas contra a Tortura e Outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos e Degradantes, de 1984; a Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura de 9 de dezembro de 1985, e a Lei 9.455/97 de 7 de abril de 1997, que define os crimes de tortura e dá outras providências, observa-se que a definição de tortura na legislação internacional e nacional apresenta dois elementos essenciais:

 

  1. A finalidade do ato, voltada para a obtenção de informações ou confissões, aplicação de castigo, intimidação ou coação, ou qualquer outro motivo baseado em discriminação de qualquer natureza; e

 

  1. A aflição deliberada de dor ou sofrimentos físicos e mentais.

 

Assim, recomenda-se à autoridade judicial atenção às condições de apresentação da pessoa mantida sob custódia a fim de averiguar a prática de tortura ou tratamento cruel, desumano ou degradante considerando duas premissas:

 

  1. a prática da tortura constitui grave violação ao direito da pessoa custodiada;

 

  1. a pessoa custodiada deve ser informada que a tortura é ilegal e injustificada, independentemente da acusação ou da condição de culpada de algum delito a si imputável.

 

Poderão ser consideradas como indícios quanto à ocorrência de práticas de tortura e outros tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes:

 

  1. Quando a pessoa custodiada tiver sido mantida em um local de detenção não oficial ou secreto;

 

  1. Quando a pessoa custodiada tiver sido mantida incomunicável por qualquer período de tempo;

 

  1. Quando a pessoa custodiada tiver sido mantida em veículos oficiais ou de escolta policial por um período maior do que o necessário para o seu transporte direto entre instituições;

 

  1. Quando os devidos registros de custódia não tiverem sido mantidos corretamente ou quando existirem discrepâncias significativas entre esses registros;

 

  1. Quando a pessoa custodiada não tiver sido informada corretamente sobre seus direitos no momento da detenção;

 

  1. Quando houver informações de que o agente público ofereceu benefícios mediante favores ou pagamento de dinheiro por parte da pessoa custodiada;

 

  1. Quando tiver sido negado à pessoa custodiada pronto acesso a um advogado ou defensor público;

 

  1. Quando tiver sido negado acesso consular a uma pessoa custodiada de nacionalidade estrangeira;

 

  1. Quando a pessoa custodiada não tiver passado por exame médico imediato após a detenção ou quando o exame constatar agressão ou lesão;

 

  1. Quando os registros médicos não tiverem sido devidamente guardados ou tenha havido interferência inadequada ou falsificação;

 

  1. Quando o(s) depoimento(s) tiverem sido tomados por autoridades de investigação sem a presença de um advogado ou de um defensor público;

 

  1. Quando as circunstâncias nas quais os depoimentos foram tomados não tiverem sido devidamente registradas e os depoimentos em si não tiverem sido transcritos em sua totalidade na ocasião;

 

  1. Quando os depoimentos tiverem sido indevidamente alterados posteriormente;

 

  1. Quando a pessoa custodiada tiver sido vendada, encapuzada, amordaçada, algemada sem justificativa registrada por escrito ou sujeita a outro tipo de coibição física, ou tiver sido privada de suas próprias roupas, sem causa razoável, em qualquer momento durante a detenção;

 

  1. Quando inspeções ou visitas independentes ao local de detenção por parte de instituições competentes, organizações de direitos humanos, programas de visitas pré-estabelecidos ou especialistas tiverem sido impedidas, postergadas ou sofrido qualquer interferência;

 

  1. Quando a pessoa tiver sido apresentada à autoridade judicial fora do prazo máximo estipulado para a realização da audiência de custódia ou sequer tiver sido apresentada;

 

  1. Quando outros relatos de tortura e tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes em circunstâncias similares ou pelos mesmos agentes indicarem a verossimilhança das alegações.

 

2.         CONDIÇÕES ADEQUADAS PARA A OITIVA DO CUSTODIADO NA AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA

 

A audiência de custódia deve ocorrer em condições adequadas que tornem possível o depoimento por parte da pessoa custodiada, livre de ameaças ou intimidações em potencial que possam inibir o relato de práticas de tortura e outros tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes a que tenha sido submetida.

 

Entre as condições necessárias para a oitiva adequada da pessoa custodiada, recomenda-se que:

 

  1. A pessoa custodiada não deve estar algemada durante sua oitiva na audiência de apresentação, somente admitindo-se o uso de algumas “em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ator processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado” (STF – Súmula Vinculante nº 11);

 

  1. A pessoa custodiada deve estar sempre acompanhada de advogado ou defensor público, assegurando-lhes entrevista prévia sigilosa, sem a presença de agente policial e em local adequado/reservado, de modo a garantir-lhe a efetiva assistência judiciária;

 

  1. A pessoa custodiada estrangeira deve ter assegurada a assistência de intérprete e a pessoa surda a assistência de intérprete de LIBRAS, requisito essencial para a plena compreensão dos questionamentos e para a coleta do depoimento, atentando-se para a necessidade de (i) a pessoa custodiada estar de acordo com o uso de intérprete, (ii) o intérprete ser informado da confidencialidade das informações e (iii) o entrevistador manter contato com o entrevistado, evitando se dirigir exclusivamente ao intérprete;

 

  1. Os agentes responsáveis pela segurança do tribunal e, quando necessário, pela audiência de custódia devem ser organizacionalmente separados e independentes dos agentes responsáveis pela prisão ou pela investigação dos crimes. A pessoa custodiada deve aguardar a audiência em local fisicamente separado dos agentes responsáveis pela sua prisão ou investigação do crime;

 

  1. O agente responsável pela custódia, prisão ou investigação do crime não deve estar presente durante a oitiva da pessoa custodiada.

                      

  1. Os agentes responsáveis pela segurança da audiência da custódia não devem portar armamento letal.

 

  1. Os agentes responsáveis pela segurança da audiência de custódia não devem participar ou emitir opinião sobre a pessoa custodiada no decorrer da audiência.

 

3.         PROCEDIMENTOS RELATIVOS À COLETA DE INFORMAÇÕES SOBRE PRÁTICAS TORTURA DURANTE A OITIVA DA PESSOA CUSTODIADA

 

Observadas as condições adequadas para a apuração, durante a oitiva da pessoa custodiada, de práticas de tortura e outros tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes a que possa ter sido submetida, é importante que o Juiz adote uma série de procedimentos visando assegurar a coleta idônea do depoimento da pessoa custodiada.

 

Sendo um dos objetivos da audiência de custódia a coleta de informações sobre práticas de tortura, o Juiz deverá sempre questionar sobre ocorrência de agressão, abuso, ameaça, entre outras formas de violência, adotando os seguintes procedimentos:

 

  1. Informar à pessoa custodiada que a tortura é expressamente proibida, não sendo comportamento aceitável, de modo que as denúncias de tortura serão encaminhadas às autoridades competentes para a investigação;

 

  1. Informar à pessoa custodiada sobre a finalidade da oitiva, destacando eventuais riscos de prestar as informações e as medidas protetivas que poderão ser adotadas para garantia de sua segurança e de terceiros, bem como as providências a serem adotadas quanto à investigação das práticas de tortura e outros tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes que forem relatadas;

 

  1. Assegurar a indicação de testemunhas ou outras fontes de informação que possam corroborar a veracidade do relato de tortura ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes, com garantia de sigilo;

 

  1. Solicitar suporte de equipe psicossocial em casos de grave expressão de sofrimento, físico ou mental, ou dificuldades de orientação mental (memória, noção de espaço e tempo, linguagem, compreensão e expressão, fluxo do raciocínio) para acolher o indivíduo e orientar quanto a melhor abordagem ou encaminhamento imediato do caso.

 

  1. Questionar a pessoa custodiada sobre o tratamento recebido desde a sua prisão, em todos os locais e órgãos por onde foi conduzido, mantendo-se atento a relatos e sinais que indiquem ocorrência de práticas de tortura e outros tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.

 

4.         PROCEDIMENTOS PARA COLETA DO DEPOIMENTO DA VÍTIMA DE TORTURA

 

A oitiva realizada durante a audiência de custódia não tem o objetivo de comprovar a ocorrência de práticas de tortura, o que deverá ser apurado em procedimentos específicos com essa finalidade.

 

Sua finalidade é perceber e materializar indícios quanto à ocorrência de tortura e outros tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes, considerando as graves consequências que podem decorrer da manutenção da custódia do preso sob responsabilidade de agentes supostamente responsáveis por práticas de tortura, sobretudo após o relato das práticas realizado pela pessoa custodiada perante a autoridade judicial.

 

Na coleta do depoimento, o Juiz deve considerar a situação particular de vulnerabilidade da pessoa submetida a práticas de tortura ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes, adotando as seguintes práticas na oitiva, sempre que necessário:

 

  1. Repetir as perguntas. Questões terão que ser repetidas ou reformuladas uma vez que algumas pessoas podem demorar mais tempo para absorver, compreender e recordar informações.

 

  1. Manter as perguntas simples. As perguntas devem ser simples, pois algumas pessoas podem ter dificuldade em entender e respondê-las. Elas também podem ter um vocabulário limitado e encontrar dificuldade em explicar coisas de uma forma que os outros achem fácil de seguir.

 

  1. Manter as perguntas abertas e não ameaçadoras. As perguntas não devem ser ameaçadoras uma vez que as pessoas podem responder a uma inquirição áspera de forma excessivamente agressiva ou tentando agradar o interrogador. As questões também devem ser abertas já que algumas pessoas são propensas a repetir as informações fornecidas ou sugeridas pelo entrevistador.

 

  1. Priorizar a escuta. É comum a imprecisão ou mesmo confusão mental no relato de casos de tortura, assim, eventuais incoerências não indicam invalidade dos relatos. Em casos de difícil entendimento do relato, orienta-se que a pergunta seja refeita de forma diferente. É importante respeitar a decisão das vítimas de não querer comentar as violações sofridas.

 

  1. Adotar uma postura respeitosa ao gênero da pessoa custodiada. Mulheres e pessoas LGBT podem se sentir especialmente desencorajadas a prestar informações sobre violências sofridas, sobretudo assédios e violência sexual, na presença de homens. Homens também podem sentir constrangimento ao relatar abusos de natureza sexual que tenham sofrido. A adequação da linguagem e do tom do entrevistador, bem como a presença de mulheres, podem ser necessários nesse contexto.

 

  1. Respeitar os limites da vítima de tortura, já que a pessoa pode não se sentir a vontade para comentar as violações sofridas por ela, assegurando, inclusive, o tempo necessário para os relatos.

 

5.         QUESTIONÁRIO PARA AUXILIAR NA IDENTIFICAÇÃO E REGISTRO DA TORTURA DURANTE OITIVA DA VÍTIMA

 

Um breve questionário pode subsidiar a autoridade judicial quanto à identificação da prática de tortura, na ocasião das audiências de custódia, permitindo-lhe desencadear, caso identificada, os procedimentos de investigação do suposto crime de tortura.

 

  1. Qual foi o tratamento recebido desde a sua detenção?

Comentário: Pretende-se com esta questão que o custodiado relate o histórico, desde a abordagem policial até o momento da audiência, da relação ocorrida entre ele e os agentes públicos encarregados de sua custódia.

 

  1. O que aconteceu?

Comentário: Havendo o custodiado relatado a prática de ato violento por parte de agente público responsável pela abordagem e custódia, é necessário que seja pormenorizado o relato sobre a conduta dos agentes, para identificação de suposta desmedida do uso da força, ou violência que se possa configurar como a prática de tortura.

 

  1. Onde aconteceu?

Comentário: O relato sobre o local onde ocorreu a violência relatada pode ajudar a monitorar a possibilidade de retaliação por parte do agente que praticou a violência relatada, e pode fornecer à autoridade judicial informações sobre a frequência de atos com pessoas custodiadas em delegacias, batalhões, entre outros.

 

  1. Qual a data e hora aproximada da ocorrência da atitude violenta por parte do agente público, incluindo a mais recente?

Comentário: A informação sobre horário e data é importante para identificar possíveis contradições entre informações constantes no boletim de ocorrência, autorizando alcançar informações úteis sobre as reais circunstâncias da prisão do custodiado.

 

  1. Qual o conteúdo de quaisquer conversas mantidas com a pessoa (torturadora)? O que lhe foi dito ou perguntado?

Comentário: Esta pergunta visa identificar qualquer ameaça realizada pelo agente público, assim como métodos ilegais para se obter a delação de outrem. Todas as formas ilegais de extrair informação do preso são necessariamente possibilitadas pela prática da tortura.

 

  1. Houve a comunicação do ocorrido para mais alguém? Quem? O que foi dito em resposta a esse relato?

Comentário: Esta pergunta visa averiguar possíveis pessoas que possam ter sofrido ameaças de agentes públicos, autorizando, caso a autoridade judicial assim decida, a indicação de pessoas ameaçadas para participação em programas de proteção de vítimas.

 

 

6.         PROVIDÊNCIAS EM CASO DE APURAÇÃO DE INDÍCIOS DE TORTURA E OUTROS TRATAMENTOS CRUÉIS, DESUMANOS OU DEGRADANTES

 

Constada a existência de indícios de tortura e outros tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes, o Juiz deverá adotar as providências cabíveis para garantia da segurança da pessoa custodiada, tomando as medidas necessárias para que ela não seja exposta aos agentes supostamente responsáveis pelas práticas de tortura.

 

Abaixo estão listadas possíveis medidas a serem adotadas pela autoridade judicial que se deparar com a situação, conforme as circunstâncias e particularidades de cada caso, sem prejuízo de outras que o Juiz reputar necessárias para a imediata interrupção das práticas de tortura ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes, para a garantia da saúde e segurança da pessoa custodiada e para subsidiar futura apuração de responsabilidade dos agentes:

 

  1. Registrar o depoimento detalhado da pessoa custodiada em relação às práticas de tortura e outros tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes a que alega ter sido submetida, com descrição minuciosa da situação e dos envolvidos;

 

  1. Questionar se as práticas foram relatadas quando da lavratura do auto de prisão em flagrante, verificando se houve o devido registro documental;

 

  1. Realizar registro fotográfico e/ou audiovisual sempre que a pessoa custodiada apresentar relatos ou sinais de tortura ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes, considerando se tratar de prova, muitas vezes, irrepetível;

 

  1. Aplicar, de ofício, medidas protetivas para a garantia da segurança e integridade da pessoa custodiada, de seus familiares e de eventuais testemunhas, entre elas a transferência imediata da custódia, com substituição de sua responsabilidade para outro órgão ou para outros agentes; a imposição de liberdade provisória, independente da existência dos requisitos que autorizem a conversão em prisão preventiva, sempre que não for possível garantir a segurança e a integridade da pessoa custodiada; e outras medidas necessárias à garantia da segurança e integridade da pessoa custodiada.

 

  1. Determinar a realização de exame corpo de delito:

 

(i)           quando não houver sido realizado;

(ii)          quando os registros se mostrarem insuficientes,

(iii)        quando a possível prática de tortura e outros tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes tiver sido realizada em momento posterior à realização do exame realizado;

(iv)        quando o exame tiver sido realizado na presença de agente de segurança.

 

  1. Ainda sobre o exame de corpo de delito, observar: a) as medidas protetivas aplicadas durante a condução da pessoa custodiada para a garantia de sua segurança e integridade, b) a Recomendação nº 49/2014 do Conselho Nacional de Justiça quanto à formulação de quesitos ao perito em casos de identificação de práticas de tortura e outros tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes, c) a presença de advogado ou defensor público durante a realização do exame.

 

  1. Assegurar o necessário e imediato atendimento de saúde integral da pessoa vítima de tortura e outros tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes, visando reduzir os danos e o sofrimento físico e mental e a possibilidade de elaborar e resignificar a experiência vivida;

 

  1. Enviar cópia do depoimento e demais documentos pertinentes para órgãos responsáveis pela apuração de responsabilidades, especialmente Ministério Público e Corregedoria e/ou Ouvidoria do órgão a que o agente responsável pela prática de tortura ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes esteja vinculado;

 

  1. Notificar o juiz de conhecimento do processo penal sobre os encaminhamentos dados pela autoridade judicial e as informações advindas desse procedimento.

 

  1. Recomendar ao Ministério Público a inclusão da pessoa em programas de proteção a vítimas ou testemunha, bem como familiares ou testemunhas, quando aplicável o encaminhamento.

 

 




[1] Art. 9.3. Qualquer pessoa presa ou encarcerada em virtude de infração penal deverá ser conduzida, sem demora, à presença do juiz ou de outra autoridade habilitada por lei a exercer funções judiciais e terá o direito de ser julgada em prazo razoável ou de ser posta em liberdade. A prisão preventiva de pessoas que aguardam julgamento não deverá constituir a regra geral, mas a soltura poderá estar condicionada a garantias que assegurem o comparecimento da pessoa em questão à audiência, a todos os atos do processo e, se necessário for, para a execução da sentença.

[2] Art. 7.5 Toda pessoa presa, detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais e tem o direito de ser julgada em prazo razoável ou de ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo. Sua liberdade pode ser condicionada a garantias que assegurem o seu comparecimento em juízo.

[3] Além de contar com previsão normativa nos sistemas global e interamericano de proteção dos direitos humanos, a audiência de custódia também está assegurada na Convenção Europeia dos Direitos do Homem, cujo art. 5º dispõe: “Qualquer pessoa presa ou detida nas condições previstas no parágrafo 1, alínea “c”, do presente artigo deve ser apresentada imediatamente a um juiz ou outro magistrado habilitado pela lei para exercer funções judiciais”.

[4] Para refletir sobre a importante mudança de posicionamento do Colendo STF a respeito da hierarquia dos tratados internacionais de direitos humanos, quando internalizados em nosso ordenamento jurídico, cf. o RExt. nº 466.343/SP, rel. Min. Cezar Peluso, j. 22.11.2006. Posteriormente, em outros julgados, o STF, definitivamente, reconheceu que os tratados internacionais de direitos humanos subscritos pelo Brasil possuem status normativo supralegal: STF, 2ª Turma, HC nº 90.172/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, j. 05.06.2007, v.u. 

[5] Disponível em <http://www.stf.jus.br/imprensa/pdf/re466343.pdf>. Acesso em dez. 2015.

[6] Disponível em <http://www.sbdp.org.br/arquivos/material/514_RE_349703%20-%20Voto%20Celso%20de%20Mello%20parte%201.pdf>. Acesso em dez. 2015.

[7] Disponível em <http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/Civel_Geral/mg_processo_civil/voto.pdf>. Acesso em dez. 2015.

[8] Disponível em <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=595384>. Acesso em dez. 2015.

[9] Aury Lopes Júnior e Caio Paiva explicam que o processo penal, certamente, é o ramo do Direito que mais sofre (ou melhor, que mais se beneficia) da normativa dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos, não sendo exagero se falar, atualmente, que para se alcançar um devido processo, esse deve ser não apenas legal e constitucional, mas sobretudo convencional (in Revista Liberdades, nº 17, setembro-dezembro de 2014, acessível pelo sítio: <http://www.ibccrim.org.br/revista_liberdades_artigo/209-Artigos>).

[10] Lei 11.719, de 20 de junho de 2008 - Altera dispositivos do Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal, relativos à suspensão do processo, emendatio libelli, mutatio libelli e aos procedimentos.

 

[11] Disponível em: <http://www.onu.org.br/relatorio-do-subcomite-de-prevencao-da-tortura-spt-sobre-o-brasil-2012/>. Também cf., no mesmo sentido, o Relatório Tecer Justiça – Repensando a Prisão Provisória, elaborado pelo Instituto Terra, Trabalho e Cidadania, acessível em: <http://www.tecerjustica.com.br/>.

[12] Dados subsidiados pelo International Centre for Prison Studies – ICPS. Disponível em:< http://www.prisonstudies.org>. Acesso em dez. 2015.

[13] Pesquisa recente do IDDD mostra que 74% dos presos entrevistados pelo Instituto tinham entre 18 e 34 anos, 84% tem renda de até três salários mínimos mensais, 63% tem no máximo ensino fundamental completo e 59% autodeclaram-se negros ou pardos (SOS Liberdade. Relatório de pesquisa: o impacto da lei nº 12.403/2011 nas decisões judiciais de análise da legalidade da custódia cautelar na capital paulista. Instituto de Defesa do Direito de Defesa, 2014), estatísticas comprovadas por inúmeras outras pesquisas realizadas por organizações que compõem a Rede Justiça Criminal, entre as quais destacamos a pesquisa Prisões em Flagrante na Cidade de São Paulo, do Instituto Sou da Paz, publicada em junho de 2012, segundo a qual 91,9% dos presos paulistas são homens, 73,4% estão abaixo dos 30 anos, 75,7% tem, no máximo, ensino fundamental completo e 55,4% são pardos ou negros.

[14] Conjur - Audiência de custódia no Rio de Janeiro tem três aspectos preocupantes. Disponível em <http://www.conjur.com.br/2015-set-09/gustavo-badaro-audiencia-custodia-rj-pontos-preocupantes>. Acesso em dez. 2015.

[15] Art.286 – El funcionario o auxiliar de la policía que haya practicado una detención sin orden judicial, deberá presentar al detenido inmediatamente en un plazo que no exceda de seis (6) horas, ante la autoridad judicial competente.

[16] Art. 294. – Cuando hubiere motivo bastante para sospechar que una persona ha participado en la comisión de un delito, el juez procederá a interrogarla; si estuviere detenida, inmediatamente, o a más tardar en el término de veinticuatro (24) horas desde su detención. Este término podrá prorrogarse por otro tanto cuando el magistrado no hubiere podido recibir la declaración, o cuando lo pidiere el imputado para designar defensor.

[17] Artículo 131 – Plazos de la detención. Cuando la detención se practicare en cumplimiento de una orden judicial, los agentes policiales que la hubieren realizado o el encargado del recinto de detención conducirán inmediatamente al detenido a presencia del juez que hubiere expedido la orden. Si ello no fuere posible por no ser hora de despacho, el detenido podrá permanecer en el recinto policial o de detención hasta el momento de la primera audiencia judicial, por un período que en caso alguno excederá las veinticuatro horas. 

[18] Art. 371.- Captura en flagrancia. Quien sea sorprendido en flagrancia será capturado por cualquier autoridad o persona y conducido en el acto, o a más tardar en el término de la distancia [170, párr. 2º], ante el fiscal o funcionário competente para iniciar la investigación [329], a quien deberá rendir informe sobre las causas de la captura.

Cuando por cualquier circunstancia no atribuída a quien hubiere realizado la captura, el aprehendido no pudiere ser conducido inmediatamente ante el fiscal, será recluído en la cárcel del lugar o en otro establecimiento oficial destinado al efecto, debiéndose poner a disposición del funcionario judicial [572] dentro de la primera hora hábil del día siguiente, con el informe de que trata el inciso anterior. Para los efectos de esta disposición todos los días y horas son hábiles.

(...)

En ningún caso el capturado puede permanecer más de treinta y seis horas por cuenta de funcionario diferente al fiscal o juez [572].

[19] Art. 287.- Dentro de las cuarenta y ocho horas, contadas desde que un detenido ha quedado a la disposición de la autoridad judicial encargada de practicar la instrucción, se procederá a tomarle su declaración preparatoria.

[20] Disponível em <http://www.stf.jus.br/imprensa/pdf/re466343.pdf>. Acesso em dez. 2015.

[21] Disponível em <http://www.sbdp.org.br/arquivos/material/514_RE_349703%20-%20Voto%20Celso%20de%20Mello%20parte%201.pdf>. Acesso em dez. 2015.

[22] Disponível em <http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/Civel_Geral/mg_processo_civil/voto.pdf>. Acesso em dez. 2015.

[23] Disponível em <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=595384>. Acesso em dez. 2015.

[24] Art. 306.  A prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente, ao Ministério Público e à família do preso ou à pessoa por ele indicada. (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

§ 1o Em até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, será encaminhado ao juiz competente o auto de prisão em flagrante e, caso o autuado não informe o nome de seu advogado, cópia integral para a Defensoria Pública.  (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

[25] Caso López Álvarez Vs. Honduras. 70. Conforme al artículo 71 de la Constitución de Honduras[25], cuando se practica una detención, la persona no puede permanecer detenida ni incomunicada por más de 24 horas sin ser puesta a la orden de la autoridad competente, la cual debe emitir una orden de detención judicial para inquirir, que no podrá exceder de seis días.  En el presente caso, el Juzgado de Letras Seccional de Tela dictó auto de prisión preventiva en contra del señor Alfredo López Álvarez, el 2 de mayo de 1997, cinco días después de la detención. (…) 87.         Conforme al artículo 7.5 de la Convención y de acuerdo con los principios de control judicial e inmediación procesal, la persona detenida o retenida debe ser llevada, sin demora, ante un juez o autoridad judicial competente.  Esto es esencial para la protección del derecho a la libertad personal y de otros derechos, como la vida y la integridad personal.  El simple conocimiento judicial de que una persona está detenida no satisface esa garantía; el detenido debe comparecer personalmente y rendir declaración ante el juez o autoridad competente. Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_141_esp.pdf>. Acesso em: dez. 2015.

[26] Caso Suárez Rosero Vs. Ecuador. 70. El principio de “plazo razonable” al que hacen referencia los artículos 7.5 y 8.1 de la Convención Americana tiene como finalidad impedir que los acusados permanezcan largo tiempo bajo acusación y asegurar que ésta se decida prontamente.  En el presente caso, el primer acto del procedimiento lo constituye la aprehensión del señor Suárez Rosero el 23 de junio de 1992 y, por lo tanto, a partir de ese momento debe comenzar a apreciarse el plazo.

(...) 72. Esta Corte comparte el criterio de la Corte Europea de Derechos Humanos, la cual ha analizado en varios fallos el concepto de plazo razonable y ha dicho que se debe tomar en cuenta tres elementos para determinar la razonabilidad del plazo en el cual se desarrolla el proceso: a) la complejidad del asunto, b) la actividad procesal del interesado y c) la conducta de las autoridades judiciales (cf. Caso Genie Lacayo, Sentencia de 29 de enero de 1997.  Serie C No. 30, párr 77; y Eur. Court H.R., Motta judgment of 19 February 1991, Series A No. 195-A, párr. 30; Eur. Court H.R., Ruiz Mateos v. Spain Judgment of 23 June 1993, Series A No. 262, párr. 30). Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_35_esp.pdf>. Acesso em dez. 2015.

[27] Caso Acosta Calderón Vs. Ecuador . 79.     En el caso en análisis, el señor Acosta Calderón, al momento de su detención, sólo rindió declaración ante la Policía y un Fiscal, sin la presencia de su abogado.  No consta en el expediente que el señor Acosta Calderón haya rendido declaración alguna ante un juez, sino hasta transcurridos casi dos años de su detención. En este sentido, el 8 de octubre de 1991 el mismo Tribunal de Lago Agrio expresó que “dentro del proceso no consta[ba el testimonio indagatorio de la presunta víctima], presumiéndose que el actuario de ese entonces no ha[bía] incorporado en el expediente dicha diligencia”, por lo que ésta se tomó el 18 de octubre de 1991 (supra párr. 50.23, 50.25 y 50.27).(…) 80.  En segundo lugar, un “juez u otro funcionario autorizado por la ley para ejercer funciones judiciales” debe satisfacer los requisitos establecidos en el primer párrafo del artículo 8 de la Convención[27].  En las circunstancias del presente caso, la Corte entiende que el Agente Fiscal del Ministerio Público que recibió la declaración preprocesal del señor Acosta Calderón no estaba dotado de atribuciones para ser considerado “funcionario autorizado para ejercer funciones judiciales”, en el sentido del artículo 7.5 de la Convención, ya que la propia Constitución Política del Ecuador, en ese entonces vigente, establecía en su artículo 98, cuáles eran los órganos que tenían facultades para ejercer funciones judiciales y no otorgaba esa competencia a los agentes fiscales.  Por tanto, el agente fiscal que actuó en el caso no poseía facultades suficientes para garantizar el derecho a la libertad y la integridad personales de la presunta víctima.  Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_129_esp1.pdf >. Acesso em dez. 2015.

[28] Caso Chaparro Álvarez e Lapo Íñiguez Vs. Equador .81.   La parte inicial del artículo 7.5 de la Convención dispone que la detención de una persona debe ser sometida sin demora a revisión judicial. El control judicial inmediato es una medida tendiente a evitar la arbitrariedad o ilegalidad de las detenciones, tomando en cuenta que en un Estado de Derecho corresponde al juzgador garantizar los derechos del detenido, autorizar la adopción de medidas cautelares o de coerción, cuando sea estrictamente necesario y procurar, en general, que se trate al inculpado de manera consecuente con la presunción de inocencia[28].(...) 84.          Conforme a la jurisprudencia de esta Corte en otro caso relativo al Estado ecuatoriano, no puede considerarse que la declaración de las víctimas ante el fiscal cumpla con el derecho consagrado en el artículo 7.5 de la Convención de ser llevado ante un “juez u otro funcionario autorizado por la ley para ejercer funciones judiciales”[28]. Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_170_esp.pdf>. Acesso em dez. 2015.

[29] Caso Cantoral Benavides Vs. Perú. 75. Además, se pronuncia la Corte en el sentido de que el proceso adelantado contra el señor Luis Alberto Cantoral Benavides por la justicia penal militar violó lo dispuesto por el artículo 8.1 de la Convención Americana, referente al enjuiciamiento por juez competente, independiente e imparcial (infra párr. 115). En consecuencia, el hecho de que Cantoral Benavides hubier a sido puesto a disposición de un juez penal militar, no satisfizo las exigencias del artículo 7.5 de la Convención. Asimismo, la continuación de la privación de su libertad por órdenes de los jueces militares constituyó una detención arbitraria, en el sentido del artículo 7.3 de la Convención. 76. La prescripción del artículo 7.5 de la Convención sólo fue atendida en el presente caso cuando el detenido fue llevado ante un juez del fuero ordinario. No existe en el expediente prueba sobre la fecha en que ocurrió esto último, pero puede  concluirse razonablemente que sucedió alrededor de principios de octubre de 1993, puesto que el 8 de ese mes y año el 43o. Juzgado Penal de Lima dictó Auto Apertorio de Instrucción en contra de Cantoral Benavides.  Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/Seriec_69_esp.pdf>. Acesso em: Dez. 2015.

[30] Caso Palamara Iribarne Vs. Chile. 219. Tanto la Corte Interamericana como la Corte Europea de Derechos Humanos han destacado la importancia que reviste el pronto control judicial de las detenciones. Quien es privado de libertad sin control judicial debe ser liberado o puesto inmediatamente a disposición de un juez. 221. Este Tribunal estima necesario realizar algunas precisiones sobre este punto. Los términos de la garantía establecida en el artículo 7.5 de la Convención son claros en cuanto a que la persona detenida debe ser llevada sin demora ante un juez o autoridad judicial competente conforme a los principios de control judicial e in mediación procesal. Esto es esencial para la protección del derecho a la libertad personal y para otorgar protección a otros derechos, como la vida y la integridad personal. El simple conocimiento por parte de un juez de que una persona está detenida no satisface esa garantía, ya que el detenido debe comparecer personalmente y rendir su declaración ante el juez o autoridad competente. 223. Al respecto, la Corte estima que el hecho de que el señor Palamara Iribarne al ser detenido fuera puesto a disposición del Fiscal Naval, quien de acuerdo a la normativa interna tenía funciones jurisdiccionales, no garantizó el derecho a que una autoridad judicial revise la legalidad de su detención. Al ser el Fiscal Naval la autoridad que ordenó las prisiones preventivas en contra del señor Palamara Iribarne no puede controlar la legalidad de su propia orden. Por lo anterior, el hecho de que el señor Palamara Iribarne haya sido puesto a disposición de la Fiscalía Naval de Magallanes no satisfizo las exigencias del artículo 7.5 de la Convención.  Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_135_esp.pdf>. Acesso em dez. 2015.

[31] Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:

(...)

II - prevalência dos direitos humanos;

[32] Altera o § 1º do art. 306 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), para determinar o prazo de vinte e quatro horas para a apresentação do preso à autoridade judicial, após efetivada sua prisão em flagrante.

[33] Dá nova redação ao inciso LXII do artigo 5º da Constituição Federal, que dispõe sobre a prisão de qualquer pessoa, para contemplar a sua imediata apresentação em juízo.

[34] Art. 103-B. (...)

§ 4º Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, cabendo-lhe, além de outras atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004):

I – zelar pela autonomia do Poder Judiciário e pelo cumprimento do Estatuto da Magistratura, podendo expedir atos regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar providências; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45 de 2004).

[35] Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/images/imprensa/diagnostico_de_pessoas_presas_correcao.pdf>. Acesso em: dez. 2015. Atente-se que tais dados não consideram o número de presos em cumprimento de prisão domiciliar.

[36] Define os crimes de tortura e dá outras providências.

[37] Lei 12.403, de 4 de maio de 2011 - Altera dispositivos do Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal, relativos à prisão processual, fiança, liberdade provisória, demais medidas cautelares, e dá outras providências.

[38] Resolução CNJ 47, de 18 de dezembro de 2007 - Dispõe sobre a inspeção nos estabelecimentos penais pelos juízes de execução criminal

[39] Report of the Working Group on Arbitrary Detention on its visit to Brazil (18 to 28 March 2013). Disponível em: <http://ap.ohchr.org/documents/dpage_e.aspx?si=A/HRC/27/48/Add.3>. Acesso em: dez. 2015.

[40] Disponível em: <http://www.hrw.org/world-report/2015/country-chapters/brazil>. Acesso em: dez. 2015.

[41] Disponível em: <https://anistia.org.br/wp-content/uploads/2015/02/Informe-2014-2015-O-Estado-dos-Direitos-Humanos-no-Mundo.pdf>. Acesso em: dez. 2015.

[42] Lei 12.106, de 2 de dezembro de 2009 - Cria, no âmbito do Conselho Nacional de Justiça, o Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas e dá outras providências.

 [43] AMB defende audiências de custódia. Disponível em: <http://www.amb.com.br/novo/?p=20580>. Acesso em: dez. 2015.

[44] Carta de Teresina ratifica apoio de corregedores a implantação de audiências de custódia. Disponível em: <http://www.encoge68.com.br/post/carta-de-teresina-ratifica-apoio-de-corregedores-a-implantacao-de-audiencias-de-custodia>. Acesso em: dez. 2015.

[45] Acompanhamento Processual. ADI 5240 – Ação direta de Inconstitucionalidade. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=4711319>. Acesso em: dez. 2015.

[46] Vide Portaria CNJ 16 de 26 de fevereiro de 2015. Disponível em. <http://www.cnj.jus.br///images/atos_normativos/portaria/portaria_16_26022015_03032015133613.pdf>.  Acesso em: dez.2015.

[47] Informativo Rede de Justiça Criminal. Disponível em: <https://redejusticacriminal.files.wordpress.com/2013/07/rjc-boletim05-aud-custodia-2013.pdf>. Acesso em: dez. 2015.

[48] Define a política institucional do Poder Judiciário na Execução das Penas e Medidas Alternativas à Prisão.

[49] Regras mínimas padrão das Nações Unidas para a elaboração de medidas não privativas de liberdade (Regras de Tóquio)

6. A prisão preventiva como medida de último recurso

6.1 A prisão preventiva deve ser uma medida de último recurso nos procedimentos penais, com a devida consideração ao inquérito referente à infração presumida e à proteção da sociedade e da vítima.

6.2 As medidas substitutivas da prisão pré-julgamento devem ser utilizadas o mais cedo possível. A prisão pré-julgamento não deve durar mais do que o tempo necessário para atingir os objetivos enunciados na regra 6.1 e deve ser administrada com humanidade e respeito à dignidade da pessoa.

6.3 O infrator deve ter o direito de recorrer, em caso de prisão pré-julgamento, a uma autoridade judiciária ou qualquer outra autoridade independente.

Disponível em: <https://www.unodc.org/documents/justice-and-prison-reform/projects/UN_Standards_and_Norms_CPCJ_-_Portuguese1.pdf>. Acesso em: dez. 2015.

[50] Disponível em: <http://www.justica.gov.br/seus-direitos/politica-penal>. Acesso em: dez. 2015.

[51] Disponível em: <http://www.soudapaz.org/upload/pdf/pesquisa_lei_das_cautelares_comparativo_sp_e_rj.pdf>. Acesso em: dez. 2015.

[52] Disponível em <http://www.cnj.jus.br/transparencia/acordos-termos-e-convenios/acordos-de-cooperacao-tecnica/79069-tcot-007-2015>. Acesso em dez. 2015.

[53] Disponível em <http://www.cnj.jus.br/transparencia/acordos-termos-e-convenios/acordos-de-cooperacao-tecnica/79059-tcot-005-2015>. Acesso em dez. 2015.

[54] Disponível em <http://www.cnj.jus.br/transparencia/acordos-termos-e-convenios/acordos-de-cooperacao-tecnica/79060-tcot-006-2015>. Acesso em dez. 2015.

[55] Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/D0040.htm>. Acesso em dez. 2015.

[56] Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1980-1989/D98386.htm>. Acesso em dez. 2015.

[57] Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9455.htm>. Acesso em dez. 2015.

[58] Disponível em <http://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2015-08/tortura-em-presidios-brasileiros-e-endemica-aponta-relator-da-onu>. Acesso em dez. 2015.

[59] Disponível em <http://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2015-08/tortura-em-presidios-brasileiros-e-endemica-aponta-relator-da-onu>. Acesso em dez. 2015.

[60] Relatório sobre tortura: uma experiência de monitoramento dos locais de detenção para prevenção da tortura. Disponível em <http://carceraria.org.br/wp-content/uploads/2012/10/Relatorio_tortura_revisado1.pdf>. Acesso em dez. 2015.

[61] Cria mecanismo de controle estatístico e disciplina o acompanhamento, pelos juízes e Tribunais, dos procedimentos relacionados à decretação e ao controle dos casos de prisão provisória. 

[62] Na elaboração do protocolo foram consideradas orientações presentes em manuais e guias sobre prevenção e combate à tortura, especialmente o “Protocolo de Istambul – Manual para a investigação e documentação eficazes da tortura e outras penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes, “The torture reporting handbook” (1ª edição de Camille Giffard – 2000, e 2ª edição de Polona Tepina – 2015), e “Protegendo os brasileiros conta a tortura: Um Manual para Juízes, Promotores, Defensores Públicos e Advogados” (Conor Foley, 2013), além da experiência acumulada com as práticas de audiências de custódia e do desenvolvimento de ações de prevenção à tortura no país.

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA

223ª Sessão Ordinária

ATO NORMATIVO - 0005913-65.2015.2.00.0000

Relator:  BRUNO RONCHETTI
Requerente: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ
Terceiros: Não definido

CERTIDÃO DE JULGAMENTO

CERTIFICO que o PLENÁRIO, ao apreciar o processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

"O Conselho decidiu, por unanimidade:

I - incluir em pauta o presente procedimento, nos termos do § 1º do artigo 120 do Regimento Interno;

II - aprovar a resolução, nos termos do voto do Relator. Presidiu o julgamento o Conselheiro Ricardo Lewandowski. Plenário, 15 de dezembro de 2015."

Presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Conselheiros Ricardo Lewandowski, Nancy Andrighi, Lelio Bentes Corrêa, Carlos Levenhagen, Daldice Santana, Gustavo Tadeu Alkmim, Bruno Ronchetti, Fernando Mattos, Carlos Eduardo Dias, Arnaldo Hossepian, Norberto Campelo, Luiz Cláudio Allemand, Emmanoel Campelo e Fabiano Silveira.

Brasília, 15 de dezembro de 2015.

MARIANA SILVA CAMPOS DUTRA

Secretária Processual

Brasília, 2015-12-16.