Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0001838-41.2019.2.00.0000
Requerente: MUNICÍPIO DE SALVADOR
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA - TJBA

 

 

EMENTA 


 

PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. RATIFICAÇÃO DE LIMINAR. PRESENÇA DOS REQUISITOS. PRECATÓRIO. REGIME ESPECIAL. CUMPRIMENTO DOS PLANOS DE PAGAMENTO DE 2017 E 2018 HOMOLOGADOS. RECÁLCULO DA PARCELA MENSAL SUFICIENTE E MONTANTE DA DÍVIDA EM ATRASO.

1. Presentes os requisitos do art. 25, XI, do RICNJ, caberá ao relator deferir a medida liminar urgente e acauteladora de forma motivada.

2. No caso concreto, não houve revogação expressa dos Planos Anuais de Pagamento de Precatórios relativos aos anos de 2017 e 2018, anteriormente homologados pelo TJBA, sendo eles, portanto, formalmente válidos e regularmente cumpridos pelo ente municipal com os repasses das verbas mensais.

3. Os vultosos recursos públicos envolvidos no sequestro de verbas públicas – determinado pelo TJBA sem observância das normas constitucionais e regulamentares – e que são necessários à consecução das demais obrigações constitucionais do ente federado devedor, igualmente relevantes para a sociedade, justificam a concessão da medida em caráter liminar com o recálculo do valor da parcela mensal e do montante da dívida em atraso.

4. Estabelecidos os critérios para que o Tribunal de Justiça fixe corretamente o valor da parcela mensal suficiente para a quitação dos precatórios devidos pelo ente federado, no regime especial, no prazo constitucionalmente estabelecido pela Emenda Constitucional n. 94/2016, com as alterações promovidas pela Emenda Constitucional n. 99/2017, bem como o valor da dívida em atraso.

Ratificada a liminar parcialmente deferida. 

 

 

S27/Z07/S22

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, ratificou a liminar, nos termos do voto do Relator. Plenário Virtual, 20 de setembro de 2019. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Dias Toffoli, Humberto Martins, Emmanoel Pereira, Iracema Vale, Rubens Canuto, Valtércio de Oliveira, Candice L Galvão Jobim, Maria Cristiana Ziouva, Arnaldo Hossepian, Maria Tereza Uille Gomes e Henrique Ávila. Não votaram os Excelentíssimos Conselheiros Márcio Schiefler Fontes, Luciano Frota e, em razão da vacância dos cargos, os representantes da Ordem dos Advogados do Brasil.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0001838-41.2019.2.00.0000
Requerente: MUNICÍPIO DE SALVADOR
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA - TJBA

 

 

RELATÓRIO

 


O EXMO. SR. MINISTRO HUMBERTO MARTINS, CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA (Relator):


            

Cuida-se de pedido de providências formulado pelo MUNICÍPIO DE SALVADOR em desfavor do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA – TJBA.

O Município de Salvador insurge-se, em síntese, contra decisão do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia proferida nos autos do Processo Administrativo n. 0003025-79.2018.8.05.0000, a qual recusou a homologação do plano de pagamento de precatórios do ano de 2019 e a expedição de certidão de regularidade, apontando irregularidades nos planos de pagamento dos anos de 2017 e 2018, bem como impôs o depósito de aproximadamente R$ 100.000.000,00 (cem milhões de reais), concernentes a supostas diferenças de exercícios anteriores, sob pena de sequestro.

Sustenta que os parâmetros adotados pelo setor de cálculos para apuração dos repasses devidos estão em desconformidade com a literalidade do disposto nos regimes especiais regulados pelas ECs n. 94/2016 e 99/2017 e desprezam as diversas fontes de recurso e mecanismos de redução do saldo devedor que estão à disposição do Administrador Público. Ademais, trazem enormes prejuízos ao erário, comprometendo a boa prestação de outros serviços essenciais do município.

Requereu, liminarmente, determinação ao Tribunal de Justiça do Estado da Bahia para que suspenda os efeitos do ato até que seja concluída a apreciação do presente procedimento administrativo, bem como para que se abstenha de promover medidas restritivas, sendo concedida a certidão de regularidade enquanto o Município de Salvador estiver realizando os pagamentos na forma do plano apresentado para o exercício de 2019. No mérito, pediu para que se confirme a medida liminar requerida e que seja revisado o ato impugnado, adequando-o à Constituição Federal e à realidade financeira da municipalidade, homologando o plano de pagamento apresentado para o exercício de 2019 e abstendo-se de adotar medidas constritivas em desfavor da municipalidade e sancionatórias em desfavor das autoridades judiciárias do Tribunal de Justiça no que concerne a tal aspecto no bojo da Inspeção n. 4760-89.2018.2.00.0000.

Em 25/3/2019, foi deferida em parte a liminar requerida (Id. 3584144) por estarem presentes a plausibilidade do direito invocado e o perigo na demora.

Agora, submete-se a medida liminar ao referendo do Plenário nos termos do art. 25, XI, RICNJ.

É, no essencial, o relatório.

 

 

MINISTRO HUMBERTO MARTINS 

Corregedor Nacional de Justiça 

 

 

S27/Z07/S22

 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0001838-41.2019.2.00.0000
Requerente: MUNICÍPIO DE SALVADOR
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA - TJBA

 

VOTO 

 

O EXMO. SR. MINISTRO HUMBERTO MARTINS, CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA (Relator): 

 

Nos termos do art. 25, XI, do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça, submeto ao referendo do Plenário a liminar parcialmente deferida por decisão exarada em 25/3/2019, votando, desde logo, por sua ratificação, nos termos da fundamentação adiante invocada. 

Cabe ao relator deferir a medida liminar urgente e acauteladora de forma motivada quando presentes os requisitos do art. 25, XI, do RICNJ.

No caso concreto, estão configurados os requisitos para o deferimento da medida urgente, conforme destaco dos fatos e fundamentos constantes da decisão que concedeu a liminar (Id. 3584144), que transcrevo:

 

“Analisando as informações apresentadas, verifico que houve a homologação do Plano de Pagamento apresentado pelo Município de Salvador para os exercícios de 2017 e 2018, considerando que o percentual anual de comprometimento da Receita Corrente Líquida pode ser variável, desde que não inferior à média do que se pagou nos exercícios de 2012 a 2014 e que, de acordo com o planejamento, seja suficiente para quitar a dívida até 2020, como prevê o art. 101, do ADCT, com a redação da EC 94/2016.

Sob tais premissas, o Município apresentou plano de pagamento para o exercício de 2017, tomando como referência que o comprometimento médio da Receita Corrente Líquida (RCL) com pagamento de precatórios entre os anos de 2012 a 2014 foi de 0,517%, enquanto que a média dos últimos cinco anos (2010 a 2015) foi de 0,630%. Ou seja, foi adotado o percentual de 0,630%, acima do mínimo, para o ano de 2017, o que foi cumprido corretamente, com previsão de incremento nos anos de 2018, 2019 e 2020 para 1,26%, 1,89% e 2,535%, respectivamente.

Vê-se que a desconsideração do Plano Anual de Pagamento foi realizada em decorrência de alteração de entendimento do TJBA, fundamentada em orientação proferida pela Corregedoria Nacional, e não em decorrência do inadimplemento do ente devedor quanto às obrigações assumidas no Plano Anual de Pagamento homologado.

A decisão do Presidente do Tribunal de Justiça (id 3583279) rejeitou o Plano Anual de Pagamento apresentado pelo Município para o ano de 2019 e determinou o sequestro, fixando-se os valores dos repasses mensais.

Ademais, conforme as informações prestadas, não houve revogação expressa dos Planos de Pagamento de 2017 e 2018 homologados anteriormente por ato do Presidente do Tribunal e, segundo consta, foram regularmente cumpridos pelo ente municipal.

Dessa forma, verifico que os Plano Anuais de Pagamento relativos ao Município de Salvador são formalmente válidos, possuindo a definição dos valores devidos pelo ente devedor, a título de repasse da verba mensal, para pagamento de precatórios nos meses de 2017 e 2018.

Quanto ao procedimento previsto no art. 33 da Resolução CNJ n. 115/2010, para a realização do sequestro dos valores não adimplidos pelos tribunais no âmbito do regime especial, também não se justifica, uma vez que o Município de Salvador vem cumprindo regularmente os acordos propostos.

No caso de bloqueio para adimplemento de repasse de valores do ente devedor para pagamento de precatórios, a intimação prévia é obrigatória e prevista em norma vigente. Tem por finalidade possibilitar ao Chefe do Poder Executivo regularizar a situação e evitar as consequências previstas na Constituição Federal, inclusive pessoais para o gestor público. O risco de inadimplemento é baixo, devido à regularidade das transferências constitucionais aos municípios.

Dessa forma, o descumprimento do procedimento legal para a realização do sequestro não restou justificado pelas informações prestadas.

Ressalte-se, ainda, que relativamente aos parâmetros adotados para a fixação do repasse mensal e da dívida do Município, o Tribunal de Justiça do Estado da Bahia consignou expressamente  que “submetido à análise do Setor de Cálculos, este concluiu que, apesar de suficiente para quitação do estoque de precatórios - até então existentes - dentro do prazo previsto na EC 99/2017 (o ano de 2024), os percentuais constantes no Plano de Pagamento apresentado não teriam respeitado o percentual mínimo da RCL apurado (1,58018%), resultando, desta forma, em uma diferença a menor também para o exercício em curso e subsequentes”.

Repete, afirmando que “deste modo, ainda que suficiente para quitação de todo o seu estoque de precatórios até 2024, o novo Plano de Pagamento, mais uma vez, não respeitou o percentual mínimo da receita corrente líquida apurado (1,58018%), indo de encontro às diretrizes das Emendas Constitucionais 94/2016 e 99/2017, do artigo 101 ADCT, da Resolução CNJ 115/2010, às recomendações do Conselho Nacional de Justiça e da Nota Técnica n 05/2018, da Câmara Nacional de Gestores de Precatórios.”

A mera referência a nota técnica emitida por entidade de natureza privada equivale à simples referência a lições doutrinárias, não sendo suficiente para indicar quais foram efetivamente os parâmetros ou metodologia utilizada no caso concreto para definição do saldo devedor do Município de Salvador.

Tais fundamentos considero suficientes para, neste momento processual prévio, caracterizar a plausibilidade do direito invocado pelo Município requerente.

Quanto ao perigo na demora da solução do presente feito administrativo, resta evidente diante dos vultuosos recursos públicos envolvidos no sequestro determinado sem observância das normas constitucionais e regulamentares, recursos esses necessários à consecução das demais obrigações constitucionais do ente federado devedor, igualmente relevantes para a sociedade.

Conclusões

Ante o exposto, concedo parcialmente a liminar pedida para determinar ao Tribunal de Justiça do Estado da Bahia que adote as seguintes providências em relação ao Município de Salvador:

1. Diante da existência de Plano de Pagamento homologado pelo TJBA para os anos de 2017 e 2018, exija somente os valores nele consignados para o referido exercício.

2. Consolide a dívida de precatórios do Município de Salvador considerando todo o passivo existente em 31.12.2018, incluindo os valores não repassados durante a vigência das EC’s 62 e 94.

3. Refaça os cálculos do percentual mínimo de comprometimento da Receita Corrente Líquida considerando a data de promulgação da EC nº 94/2016, em 15 de dezembro de 2016, como data de entrada em vigor do regime especial estabelecido pelo art. 101 do ADCT;

4. Refaça os cálculos do percentual suficiente de comprometimento da Receita Corrente Líquida para o ano de 2019 considerando a dívida consolidada em 31.12.2018 (item 2) e o número de parcelas faltantes para o término do regime especial (dezembro de 2024), para se obter o valor do repasse mensal para o ano de 2019.

5. Utilize, para definição da parcela mensal de repasse, o percentual de comprometimento da RCL que for maior entre o percentual mínimo e o percentual suficiente.

6. Aplique o percentual de comprometimento da RCL apurado (item 5) para obtenção do valor da parcela mensal de repasse para o ano de 2019.

7. Obtido o valor da parcela mensal de repasse para o ano de 2019, deve ser intimado o Município para, querendo, apresentar um novo Plano de Pagamento para o ano de 2019, que poderá contemplar a seu critério, além dos recursos orçamentários, os seguintes os meios adicionais de pagamento de precatórios no regime especial:

a) Acordo Direto (ADCT, art. 102, § 1º) mediante destinação específica de até 50% dos recursos orçamentários a serem repassados diretamente para a respectiva conta especial do TJBA, cujas audiências, se houverem, podem ser realizadas pelo NACP;

b) Compensações Tributárias realizadas junto à Fazenda Pública devedora (ADCT, art. 105)

c) Depósitos judiciais e depósitos administrativos (ADCT, art. 101, § 2º, incisos I e II)

d) Empréstimos financeiros (ADCT, art. 101, § 2º, inciso III)

e) Depósitos de precatórios não sacados (ADCT, art. 101, § 2º, inciso IV);

f) Linha Especial de Crédito que vier a ser disponibilizada pela União (ADCT, art. 101, § 4º);

g) Recursos orçamentários extras.

8. Os recursos adicionais efetivamente repassados/utilizados devem abatidos dos valores mensais devidos a título de repasse no de 2019.

9. As meras tratativas para obtenção de recursos adicionais não suspendem a exigibilidade do repasse mensal vinculado à RCL;

10. Os valores bloqueados em excesso pelo TJBA, se houver, considerando o que efetivamente era devido em 2017 e 2018 (item 1), devem ser devolvidos ao Município de Salvador, após o abatimento do que se tornou devido pelo ente federado a título de repasse mensal a partir de janeiro de 2019 (item 6);

11. Não havendo saldo suficiente para a devolução dos valores bloqueados em excesso, em decorrência dos pagamentos de precatórios já efetuados desde o bloqueio, estes devem ser creditados como adiantamento dos repasses devidos no ano de 2019.

12. Cumpridas as determinações acima, o TJBA deve informar nestes autos o valor consolidado da dívida de precatórios do município, a RCL considerada, o percentual mínimo, o percentual suficiente e o valor do repasse mensal apurados, bem como o Plano Anual de Pagamento para 2019 e os valores devolvidos ao Município de Salvador.

13. Prazo para cumprimento, pelo TJBA, das determinações contidas nesta decisão: 30 (trinta) dias.

Após as intimações, retornem os autos conclusos para submissão da presente decisão ao referendo do Plenário, nos termos do art. 25, XI do Regimento Interno.”

Invocando os fundamentos constantes da própria decisão, submeto a referendo do Plenário do Conselho a decisão que deferiu parcialmente o pedido liminar nos termos da decisão prolatada monocraticamente. 

É como penso. É como voto. 

   

MINISTRO HUMBERTO MARTINS 

Corregedor Nacional de Justiça 

 

 

S27/Z07/S13/S22

 

Brasília, 2019-10-01.