Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0010191-07.2018.2.00.0000
Requerente: PRISCILA DE CASTRO MURAD
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO - TJES

 


EMENTA: RECURSO EM SEDE DE PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. RESTITUIÇÃO DE VALORES AO ERÁRIO. GRATIFICAÇÃO POR DIREÇÃO DO FORO. INTERESSE MERAMENTE INDIVIDUAL. INEXISTÊNCIA DE FATO NOVO. NÃO PROVIMENTO.

I. Recurso contra decisão monocrática que não conheceu do procedimento, por entender que o pedido está relacionado a interesse manifestamente individual.

II. A pretensão recursal cinge-se à reforma da decisão proferida pelo Tribunal que determinou a restituição ao erário de valores recebidos a título de gratificação por Direção de Foro.

III. Ausência da repercussão geral necessária que autorize o conhecimento do tema pelo Conselho Nacional de Justiça.

IV. Inexistindo, nas razões recursais, qualquer elemento novo capaz de alterar o entendimento adotado, a decisão monocrática combatida deve ser mantida.

V. Recurso conhecido, uma vez que tempestivo, mas que, no mérito, nega-se provimento.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto da Relatora. Plenário Virtual, 28 de junho de 2019. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Dias Toffoli, Humberto Martins, Aloysio Corrêa da Veiga, Iracema Vale, Daldice Santana, Valtércio de Oliveira, Márcio Schiefler Fontes, Fernando Mattos, Luciano Frota, Maria Cristiana Ziouva, Arnaldo Hossepian, André Godinho, Maria Tereza Uille Gomes e o então Conselheiro Valdetário Andrade Monteiro. Não votou o Excelentíssimo Conselheiro Henrique Ávila.

 

 

Conselho Nacional de Justiça

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0010191-07.2018.2.00.0000
Requerente: PRISCILA DE CASTRO MURAD
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO - TJES

 

RELATÓRIO

 

Cuida-se de Recurso Administrativo em Procedimento de Controle Administrativo interposto por Priscila de Castro Murad, Juíza de Direito, contra o Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo (TJES), objetivando a reforma da decisão monocrática que não conheceu do pedido por ausência de repercussão geral.

O caso: a magistrada afirma que o TJES instaurou o procedimento administrativo nº 0021245-44.2018.8.08.0000, por recomendação da Secretaria de Controle Interno daquela Corte, para verificar eventual irregularidade no pagamento de gratificação de Direção do Foro da Comarca de Fundão/ES à recorrente, durante o período em que se encontrava em gozo de licença médica (19/01/2015 a 26/12/2016).

Aduz que a Presidência do Tribunal, acolhendo parecer da assessoria, entendeu pela necessidade de devolução dos valores ao erário, com esteio no art. 79, II, da Lei Complementar Estadual nº 46/1994, que seria aplicável à magistratura, conforme art. 187, §5º, da Lei Complementar Estadual nº 234/2002.

Entende que a determinação é contrária às decisões do próprio TJES, além de estar em desacordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça. Afirma que interpôs recurso administrativo contra a decisão do Presidente do TJES, ao qual o Conselho da Magistratura negou provimento, por entender que não haveria dúvida plausível sobre a interpretação da norma que autorizou o pagamento da vantagem, nem interpretação razoável, embora errônea, da lei pela Administração.

A recorrente, contudo, assevera que “a dúvida razoável quanto a aplicação da lei constitui alternativa ao erro da administração para a vedação à devolução ao erário; e não requisito autônomo e concorrente”. Ademais, afirma que o relatório final de auditoria efetuada pela Secretaria de Controle Interno atribuiria o equívoco no pagamento ao comportamento da Administração Pública e à complexidade da legislação.

Defende que o objeto deste procedimento “transcende o interesse meramente individual”, pois abarcaria “o interesse da coletividade de magistrados, na medida em que a postura do e. TJES macula o direito constitucional de irredutibilidade de vencimentos”.

O pedido: liminarmente, requer seja determinada a suspensão de qualquer desconto em folha, referente a reposição dos valores da gratificação de Direção do Foro, até julgamento final deste procedimento. No mérito, pede a reforma da decisão do proferida pelo TJES nos autos do processo administrativo nº 0021245-44.2018.8.08.0000, para afastar a recomposição dos valores ao erário.

Despacho: determinei a intimação do Tribunal requerido para ciência e manifestação (Id nº 3491174).

A resposta: o TJES comunica que a magistrada recebeu gratificação por Direção do Foro durante licença médica, o que foi apurado posteriormente pela Secretaria de Controle Interno, ensejando a determinação da reposição do valor, com fundamento no art. 128 da Lei Complementar Estadual nº 234/2002.

Assevera que o citado dispositivo é claro ao prever que o magistrado tem direito à gratificação quando estiver no exercício da função de Diretor de Foro cumulado com o exercício da atividade judicante. Sustenta, ainda, que a devolução da quantia encontra amparo na Lei Complementar Estadual nº 46/1994, sendo irrelevante a percepção de boa-fé dos valores.

Decisão monocrática: por tratar de interesse meramente individual e não apresentar repercussão geral apta a ensejar a apreciação da matéria por este Conselho, o procedimento não foi conhecido, por meio de decisão proferida pela Conselheira Daldice Santana, em substituição regimental (Id 3505518).

O recurso administrativo: inconformada, a requerente interpôs Recurso Administrativo (Id nº 3530078) reiterando os argumentos anteriormente apresentados e requerendo a apreciação e reconsideração da decisão proferida.

Destaca que a pretensão não diz respeito a direito meramente individual, pois haveria desrespeito ao art. 95, II, da Constituição da República, acrescentando ainda que, apesar de “a ofensa ser direcionada ao subsídio da magistrada, verdade é que a decisão originária parte do colendo Conselho da Magistratura, órgão de vértice no âmbito local”. Requer, assim, o provimento do recurso para julgar procedente o pedido.

Admissão de terceiro interessado: a Associação Nacional dos Magistrados Brasileiros – AMB solicitou seu ingresso como terceira interessada (Id 3556289) sendo deferido o pedido no Id nº 3576471. A AMB corrobora o entendimento apresentado pela recorrente, no sentido de que não se trataria de interesse de cunho individual, e defende “o descabimento de restituição ao erário dos valores recebidos de boa-fé em decorrência de errônea ou inadequada interpretação da lei por parte da Administração Pública”.

As contrarrazões: o Tribunal ratificou integralmente as informações já prestadas, declarando que todos os fundamentos apresentados pela recorrente foram enfrentados pelo órgão em sua manifestação (Id nº 3570323).

É o relatório. Passo a decidir.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 

 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0010191-07.2018.2.00.0000
Requerente: PRISCILA DE CASTRO MURAD
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO - TJES

 


 

VOTO

 

Cumpre destacar que após o pedido de inclusão em pauta, a AMB apresentou pleito liminar incidental alegando fato novo, qual seja, o desconto na folha de pagamento da recorrente (subsídio de abril/2019) no valor de R$ 7.411,60 (sete mil quatrocentos e onze reais e sessenta centavos), referente a uma parte da gratificação de Direção de Foro, recebida de boa-fé durante seu período de licença médica (de 19.01.2015 a 26.12.2016), do total de R$ 66.941,33 (sessenta e seis mil novecentos e quarenta e um reais)”.

Defendeu que a matéria tratada nos presentes autos é de repercussão geral e juntou precedente do CNJ, que no entender da Associação deve ser aplicado ao caso sob análise (PCA nº 0004156-46.2009.2.00.0000).  Requereu, então, a suspensão imediata dos descontos realizados nos contracheques da recorrente até julgamento de mérito e a abertura de procedimento para apurar eventuais ilegalidades cometidas pelo Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo.

Em 22/05/2019, não conheci do pedido liminar incidental, por entender que está relacionado a interesse meramente individual.

Feitas essas considerações, passo à análise da pretensão recursal.

O recurso é tempestivo e próprio, razão pela qual dele conheço, nos termos do artigo 115 do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça.

Examinando os autos, verifica-se que a parte recorrente não trouxe em sede recursal qualquer razão jurídica capaz de alterar o entendimento sobre a causa, motivo pelo qual mantenho a decisão por seus jurídicos fundamentos abaixo transcritos, os quais submeto ao crivo deste Colegiado:

“Da análise dos autos, verifica-se que a pretensão está relacionada a interesse eminentemente individual, não restando configurada repercussão geral apta a ensejar o controle por parte deste Conselho.

Com efeito, não subsiste o argumento apresentado pela requerente quanto ao interesse coletivo dos magistrados fundado na garantia constitucional da irredutibilidade dos vencimentos.

Isso porque o procedimento discute questão pontual, que somente diz respeito à magistrada envolvida.

Além disso, não se trata de concessão/supressão de vantagem inerente à carreira da magistratura, questionando-se somente se, em vista das características específicas do caso concreto, seria ou não viável a restituição da verba que teria sido paga indevidamente.

O Conselho Nacional de Justiça possui entendimento pacífico de que sua competência está adstrita às hipóteses em que a questão ultrapassar interesses subjetivos e apresentar relevância geral, o que não foi demonstrado no caso  sob exame.

Confira-se, a propósito, os seguintes julgados (g. n.):

 

“PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. DESEMBARGADOR ESTADUAL APENADO COM DISPONIBILIDADE COMPULSÓRIA, COM VENCIMENTOS PROPORCIONAIS. INSURGÊNCIA CONTRA A REDUÇÃO DO VALOR DO SUBSÍDIO E DA SUPRESSÃO DO PAGAMENTO DO AUXÍLIO-MORADIA. IMPROCEDÊNCIA. 

1. Pretensão de restabelecimento do valor integral do subsídio – decotado em decorrência da aplicação da pena, por já contar o desembargador com tempo de serviço suficiente para aposentadoria integral por tempo de serviço. Pedido de que não se conheceu em decisão anterior, contra a qual não houve recurso, em que se ressaltou a natureza meramente individual da questão, sem repercussão geral para a Magistratura nacional e a incompetência deste Conselho para a cobrança de valores. Não conhecimento que se confirma

2. Pedido de anulação da decisão que suspendeu o pagamento do auxílio-moradia a desembargador em disponibilidade. Suposta divergência entre o ato normativo do Tribunal – que veda o pagamento do auxílio-moradia ao magistrado em disponibilidade – e a Resolução CNJ nº 199/2014, que exclui do recebimento do benefício, dentre outros, os magistrados em inatividade.  

3. O auxílio-moradia configura verba de natureza indenizatória, que objetiva ressarcir o agente público de despesas realizadas no efetivo exercício de suas funções – situação incompatível com a do magistrado que se encontra afastado da atividade jurisdicional em razão da aplicação da pena de disponibilidade. Procedimento de Controle Administrativo de que se conhece, e que se julga improcedente.”

(CNJ - PCA - Procedimento de Controle Administrativo - 0000673-95.2015.2.00.0000 - Rel. ALOYSIO CORRÊA DA VEIGA - 272ª Sessão Ordinária - j. 22/05/2018)

 

“RECURSO ADMINISTRATIVO. PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. REQUERIMENTO PARA A PERCEPÇÃO DE DIFERENÇAS REMUNERATÓRIAS PARA O EXERCÍCIO DE FUNÇÃO DE JUIZ AUXILIAR DA CORREGEDORIA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS. MANIFESTAÇÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA MINEIRO PELA OCORRÊNCIA DE PRESCRIÇÃO. QUESTÃO DE INTERESSE INDIVIDUAL. AUSÊNCIA DE COMPETÊNCIA DESTE CONSELHO. PRECEDENTE. RECURSO IMPROVIDO.

1. Trata-se de procedimento em que o Requerente informa que é magistrado no Estado de Minas Gerais e, no período de 5 de dezembro de 2007 a 1º de julho de 2010, exerceu a função de Juiz Auxiliar da Corregedoria-Geral de Justiça do Estado de Minas Gerais.

2. Aduz que requereu administrativamente a percepção de gratificação pelo exercício de Juiz Auxiliar, mas teve a resposta de que, em razão de não ter feito requerimento à época devida, não receberia a diferença, em face da prescrição.

3. Interposição de recurso administrativo, sem a produção de elementos novos suficientes a ensejarem a modificação do decidido monocraticamente.

4. Este Conselho já firmou o entendimento de que as causas sem eventual interesse coletivo nacional não são passíveis de ensejar manifestação (RA em PCA 0002665-62.2013.2.00.0000 - Rel. GUILHERME CALMON NOGUEIRA DA GAMA - 174ª Sessão - j. 10/09/2013).

5. Recurso conhecido e, no mérito, improvido.”

(CNJ - RA – Recurso Administrativo em PP - Pedido de Providências - Conselheiro - 0000146-46.2015.2.00.0000 - Rel. LUIZA CRISTINA FONSECA FRISCHEISEN - 215ª Sessão - j. 01/09/2015)

 

"RECURSO ADMINISTRATIVO. SERVIDORES DO PODER JUDICIÁRIO DE TRIBUNAL DE JUSTIÇA ESTADUAL. AUXÍLIO ALIMENTAÇÃO. EQUIPARAÇÃO. ISONOMIA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 339 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AUTONOMIA DOS TRIBUNAIS. MATÉRIA DE ÂMBITO LOCAL. AUSÊNCIA DE CARÁTER NACIONAL. INCOMPETÊNCIA DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. RECURSO NÃO PROVIDO.

1. Não viola o princípio da isonomia a impossibilidade de se estender aos Servidores do Poder Judiciário, o valor do auxílio-alimentação fixado para os magistrados, pelo Tribunal de Justiça do Estado do Acre, por constituírem carreiras distintas, com regimes jurídicos distintos.

2. A matéria relativa aos valores aplicados ao auxílio alimentação e demais indenizações pagas pelos Tribunais de Justiça estão vinculadas à autonomia administrativa destes órgãos. Tratando-se de carreiras distintas, com regimes jurídicos próprios, negar ao Tribunal de Justiça a possibilidade de diferenciação, quanto aos valores pagos a título de auxílio-alimentação, é negar a autonomia financeira do Tribunal. Precedentes.

3. A jurisprudência do Conselho Nacional de Justiça tem firmado orientação no sentido de que o exercício da competência de controle administrativo deve contemplar situações que importem repercussão coletiva. A demanda de natureza local, sem repercussão nacional, afasta a competência deste Conselho.

4. A tutela de interesses individuais de magistrados ou servidores do judiciário, em especial os de natureza remuneratória, constitui pretensão que deve ser requerida na via ordinária judicial.

5. Recurso administrativo conhecido e improvido”.

(CNJ - RA – Recurso Administrativo em PCA - Procedimento de Controle Administrativo - 0002570-95.2014.2.00.0000 - Rel. DEBORAH CIOCCI - 191ª Sessão - j. 16/06/2014)

 

Ressalto que, recentemente, este Conselho aprovou o Enunciado Administrativo n. 17, de 10/09/2018, segundo o qual “não cabe ao CNJ o exame de pretensões de natureza individual, desprovidas de interesse geral, compreendido este sempre que a questão ultrapassar os interesses subjetivos da parte em face da relevância institucional, dos impactos para o sistema de justiça e da repercussão social da matéria”.

Assim, considerada a ausência de repercussão geral, necessária a legitimar a atuação do CNJ, é inegável a incompetência deste Conselho, impondo-se o não conhecimento do pedido, nos termos do art. 25, X, do Regimento Interno.

Diante do exposto, não conheço do pedido e determino o arquivamento liminar deste procedimento, nos termos do artigo 25, X, do RICNJ.

Prejudicada a análise do pedido liminar.

Intimem-se.

 Brasília-DF, 07 de dezembro de 2018.

Conselheira DALDICE SANTANA

Substituta Regimental (Art. 24, I, do RICNJ)”

 

Diante da inexistência de fato novo, impositiva a manutenção da decisão ora recorrida.

Como visto, no presente procedimento a recorrente questiona ato do TJES, que determinou a reposição de valores por ela recebidos a título de gratificação de Direção do Foro da Comarca de Fundão/ES, durante licença médica.

Da análise do pedido e da própria fundamentação apresentada, depreende-se que, apesar da tentativa de atribuir viés coletivo à pretensão, o objeto central do processo é a desconstituição da decisão proferida nos autos do Processo Administrativo nº 0021245-44.2018.8.08.0000, onde foi analisado o caso concreto da magistrada, restando inegável o caráter eminentemente individual da demanda.

Assim, não se sustentam os argumentos trazidos, e reiterados pela terceira interessada (AMB), de que haveria interesse coletivo dos magistrados, decorrente de desrespeito à garantia constitucional da irredutibilidade dos vencimentos.

Isso porque não se discute a concessão/supressão de vantagem inerente à carreira da magistratura, mas somente se questiona, em vista das características específicas do caso, seria ou não viável a restituição da verba que teria sido paga indevidamente.

A imprescindibilidade da existência de interesse geral para justificar a atuação deste Conselho está prevista no Regimento Interno, cujo art. 25, X, atribui ao relator competência para determinar o arquivamento liminar do procedimento nos seguintes termos:

“Art. 25. São atribuições do Relator:

X - determinar o arquivamento liminar do processo quando a matéria for flagrantemente estranha às finalidades do CNJ, bem como a pretensão for manifestamente improcedente, despida de elementos mínimos para sua compreensão ou quando ausente interesse geral”.

 

Com efeito, o Conselho Nacional de Justiça resguarda sua competência para atuar em procedimentos que exorbitam interesses subjetivos, dada a relevância institucional, os impactos para o sistema de justiça e a repercussão social da matéria – que não restaram demonstrados no caso em comento. 

Nesse caminho de entendimento, o Conselho Nacional de Justiça editou o Enunciado Administrativo nº 17, datado de 10 de setembro de 2018, que assim dispõe:

ENUNCIADO Nº 17/2018 – CNJ - Não cabe ao CNJ o exame de pretensões de natureza individual, desprovidas de interesse geral, compreendido este sempre que a questão ultrapassar os interesses subjetivos da parte em face da relevância institucional, dos impactos para o sistema de justiça e da repercussão social da matéria.

Precedentes: CNJ – RA – Recurso Administrativo em Pedido de Providências 0006372-04.2014.2.00.0000 – Relator Bruno Ronchetti – 2ª Sessão Virtual – julgado em 10 de novembro de 2015; PCA – Procedimento de Controle Administrativo 2008100000033473 – Relator João Oreste Dalazen – 81ª Sessão – julgado em 31 de março de 2009.

 

Como decorrência, este Conselho salvaguarda que não pode ser reduzido a mera instância recursal administrativa em questões afetas a interesses individuais de magistrados e servidores do Judiciário, que devem ser tutelados por meio da via ordinária própria. Nesse sentido:

 

“RECURSO ADMINISTRATIVO – PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO – TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MATO GROSSO - PRETENSÃO DE PAGAMENTO DE VERBAS SALARIAIS. CARÁTER INDIVIDUAL. EFEITOS FINANCEIROS. CNJ. ÓRGÃO DE COBRANÇA. IMPOSSIBILIDADE.
I. Conforme jurisprudência já consolidada, o CNJ não é instância recursal para revisão de causas subjetivas individuais.
II. A competência do CNJ para controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário está limitada às hipóteses em que verificado interesse geral, compreendido este sempre que a questão ultrapassar os interesses subjetivos da parte em face da relevância institucional, dos impactos para o sistema de justiça e da repercussão social da matéria.

III. Ainda que superada a preliminar de ausência de repercussão geral, o Conselho Nacional de Justiça não pode ser utilizado como supedâneo de órgão de cobrança de valores devidos a servidores ou ex-servidores como no caso em análise. Precedentes.

IV. Recurso Administrativo conhecido e não provido”.

(CNJ - RA – Recurso Administrativo em PCA – Procedimento de Controle Administrativo - Conselheiro – 0008866-31.2017.2.00.0000 - Rel. MARIA CRISTIANA ZIOUVA - 42ª Sessão Virtual - j. 15/02/2019)” (destacamos).

*****

“PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. DESEMBARGADOR ESTADUAL APENADO COM DISPONIBILIDADE COMPULSÓRIA, COM VENCIMENTOS PROPORCIONAIS. INSURGÊNCIA CONTRA A REDUÇÃO DO VALOR DO SUBSÍDIO E DA SUPRESSÃO DO PAGAMENTO DO AUXÍLIO-MORADIA. IMPROCEDÊNCIA. 

1. Pretensão de restabelecimento do valor integral do subsídio – decotado em decorrência da aplicação da pena, por já contar o desembargador com tempo de serviço suficiente para aposentadoria integral por tempo de serviço. Pedido de que não se conheceu em decisão anterior, contra a qual não houve recurso, em que se ressaltou a natureza meramente individual da questão, sem repercussão geral para a Magistratura nacional e a incompetência deste Conselho para a cobrança de valores. Não conhecimento que se confirma. 

2. Pedido de anulação da decisão que suspendeu o pagamento do auxílio-moradia a desembargador em disponibilidade. Suposta divergência entre o ato normativo do Tribunal – que veda o pagamento do auxílio-moradia ao magistrado em disponibilidade – e a Resolução CNJ nº 199/2014, que exclui do recebimento do benefício, dentre outros, os magistrados em inatividade.  

3. O auxílio-moradia configura verba de natureza indenizatória, que objetiva ressarcir o agente público de despesas realizadas no efetivo exercício de suas funções – situação incompatível com a do magistrado que se encontra afastado da atividade jurisdicional em razão da aplicação da pena de disponibilidade. Procedimento de Controle Administrativo de que se conhece, e que se julga improcedente.”

(CNJ - PCA - Procedimento de Controle Administrativo - 0000673-95.2015.2.00.0000 - Rel. ALOYSIO CORRÊA DA VEIGA - 272ª Sessão Ordinária - j. 22/05/2018) .

 

Ademais, o precedente do Conselho Nacional de Justiça citado pela AMB, para justificar que seria cabível o conhecimento da matéria, não se coaduna com a situação fática tratada nestes autos, senão vejamos:

 

“PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. INSPEÇÃO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA. MAGISTRADO. PERCEPÇÃO DE VERBAS SUPOSTAMENTE INDEVIDAS. PARCELAS RECEBIDAS DE BOA-FÉ. IRREPETIBILIDADE. PRECEDENTES DOS TRIBUNAIS SUPERIORES E DO TCU.  PARCIAL PROCEDÊNCIA.

1.     O presente procedimento administrativo foi autuado após Inspeção realizada pela Corregedoria Nacional de Justiça junto ao Tribunal de Justiça, para apurar a legitimidade da percepção, por alguns magistrados, de verbas supostamente indevidas, a saber: pagamento pelo desempenho de atividade em mutirões e durante recesso forense, e duplicidade de pagamentos a dois magistrados para o desempenho de uma única função, no mesmo período.

2. Inexiste dúvida de que os juízes efetivamente prestaram serviço em mutirões/justiça itinerante e, da mesma forma, cumpriram atividade jurisdicional nos meses de julho e de dezembro de 2005, período não submetido, por óbvio, ao regramento da Resolução nº. 13/CNJ, que data de 2006.

3. A ordem de devolução dos valores percebidos pelos magistrados – em evidente boa-fé – não se coaduna com o entendimento reiteradamente assentado na jurisprudência deste Conselho e dos Tribunais Superiores.

4. O STF consigna o entendimento de que o reconhecimento da ilegalidade do ato que ensejou o recebimento/pagamento de vantagem a servidor, uma vez recebida de boa-fé, não implica no ressarcimento automático. No mesmo sentido, a Súmula n.º 249 do TCU.

5. Legítimo o pagamento de vantagens para o desempenho de atividades em concurso da magistratura, considerando que o serviço foi prestado, que há previsão de âmbito federal para seu pagamento e para evitar enriquecimento sem causa para a Administração. Recomendação de regulamentação da matéria pelo Tribunal, nos termos do voto do Relator.

6.     Ordem de instauração de “procedimento específico para que sejam convocados os Magistrados que receberam verbas para o exercício da função temporária de Juiz Diretor da Escola Superior da Magistratura (tabela 4), Juiz Membro do FUNJURIS (tabela 5) e Juiz Superintendente do Fórum da Capital (tabela 6 e tabela 12 do Relatório da SCI) de modo a esclarecerem sobre a duplicidade e, após, ser procedido o ressarcimento ao Erário Público, conforme o caso”.

7.     Procedência parcial.

(CNJ - PCA - Procedimento de Controle Administrativo - 0004156-46.2009.2.00.0000 - Rel. ROGÉRIO NASCIMENTO - 245ª Sessão Ordináriaª Sessão - j. 21/02/2017)”. (grifo nosso)

 

O PCA nº 0004156-46.2019.2.00.0000 se originou de Inspeção da Corregedoria Nacional Justiça no Tribunal de Justiça de Justiça do Estado de Alagoas – TJAL, devido a constatação de possíveis irregularidades no pagamento de verbas à magistrados, ou seja, foi instaurado para aferir a legalidade do dispêndio de recursos públicos do Tribunal, o que configura a repercussão geral apta a ensejar o controle por parte deste Conselho dos atos praticados pelo TJAL. Conforme se depreende, o precedente citado não guarda similitude com o presente processo, que versa sobre matéria de interesse eminentemente individual.

Ainda que o precedente citado justificasse o conhecimento do presente processo, outro ponto que reforça a desconformidade com o caso sob análise é a conclusão que chegou o Relator no item 2 da ementa já transcrita, no sentido de que “Inexiste dúvida de que os juízes efetivamente prestaram serviço em mutirões/justiça itinerante e, da mesma forma, cumpriram atividade jurisdicional nos meses de julho e de dezembro de 2005”, considerando que, a recorrente, conforme já relatado, não exerceu atividade judicante e por consequência a Direção do Foro da Comarca de Fundão/ES durante o período em que se encontrava em gozo de licença médica (19/01/2015 a 26/12/2016).

Diante do exposto, conheço do recurso, uma vez que tempestivo, mas, no mérito, nego-lhe provimento e mantenho intacta a decisão atacada por seus próprios e jurídicos fundamentos.

É como voto.

 

Conselheira Iracema Vale

Relatora 

 

Brasília, 2019-08-05.