Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR - 0009885-72.2017.2.00.0000
Requerente: MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO e outros
Requerido: CLAUDIO SANTOS

 


EMENTA

 

RECURSO ADMINISTRATIVO EM RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR. ARQUIVAMENTO SUMÁRIO. IRRESIGNAÇÃO COM O CONTEÚDO DE DECISÃO JUDICIAL. ALEGAÇÃO DE PRÁTICA REITERADA DE PARTICIPAÇÃO DO MAGISTRADO EM ATIVIDADE POLÍTICO-PARTIDÁRIA, COM INTERESSES ELEITORAIS, VEICULADA NOS DIVERSOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO DO ESTADO. AUSÊNCIA DE GRAVE INFRAÇÃO AOS DEVERES FUNCIONAIS DA MAGISTRATURA. MERAS CONJECTURAS, NÃO CONFIRMADAS. MANUTENÇÃO DO ARQUIVAMENTO.

1. A LOMAN, em seu art. 36, inciso III, prevê a vedação de “manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças, de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício do magistério”.

2. Na espécie, como reconhece o próprio recorrido, no último ano (2017) houve reiterada manifestação em eventos públicos, por parte dele, que é desembargador do TJRN, contra a atuação de membros do Ministério Público do Trabalho e do próprio mérito de ação civil pública por eles movida, visando a combater a intermediação de mão-de-obra e a precarização das relações de trabalho ligadas ao "Programa de Interiorização da Indústria Têxtil" (Pró-Sertão), do Governo estadual, na região do Seridó.

3. A conduta, contudo, mostrou-se isolada e não caracterizou grave infração aos deveres funcionais da magistratura a justificar, na espécie, a aplicação das penalidades previstas nos incisos III a V do art. 42 da Lei Orgânica da Magistratura. Ademais, não foram identificados indícios de que tal conduta tivesse natureza política organizada ou partidária com vistas à participação ou ascensão ao poder, tratando-se, em verdade, de manifestações e atos motivados em prol de questão social relacionada diretamente com a cidade natal do reclamado e com questões da empregabilidade na região.

4. As penas de advertência e censura, que eventualmente poderiam ser cogitadas para o caso em questão, não se aplicam aos magistrados de segundo grau, nos termos do parágrafo único do art. 42 da LOMAN, não havendo, portanto, justa causa para a instauração de processo administrativo disciplinar.

Recurso administrativo improvido.

 

S34

 ACÓRDÃO

O Conselho, por maioria, negou provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator. Vencidos os Conselheiros Aloysio Corrêa da Veiga, Valtércio de Oliveira, Luciano Frota, Maria Cristiana Ziouva, Arnaldo Hossepian, Maria Tereza Uille Gomes e Henrique Ávila, que votavam pela instauração de processo administrativo disciplinar. Plenário Virtual, 3 de maio de 2019. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Dias Toffoli, Humberto Martins, Aloysio Corrêa da Veiga, Iracema do Vale, Daldice Santana, Valtércio de Oliveira, Márcio Schiefler Fontes, Fernando Mattos, Luciano Frota, Maria Cristiana Ziouva, Arnaldo Hossepian, Valdetário Andrade Monteiro, André Godinho, Maria Tereza Uille Gomes e Henrique Ávila.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR - 0009885-72.2017.2.00.0000
Requerente: MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO e outros
Requerido: CLAUDIO SANTOS


RELATÓRIO

 

 

  O EXMO. SR. MINISTRO HUMBERTO MARTINS, CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA (Relator):   


           Cuida-se de recurso administrativo interposto pela PROCURADORIA-GERAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO (PGT/MPT) e pela ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROCURADORES DO TRABALHO (ANPT) contra decisão proferida pelo então Corregedor Nacional de Justiça, João Otávio de Noronha, que determinou o arquivamento da reclamação disciplinar formulada em desfavor de CLÁUDIO SANTOS, Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte (TJRN).

Extrai-se dos autos que os reclamantes imputam ao reclamado a prática de conduta político-partidária, revelada por declarações em entrevistas concedidas e em redes sociais, nas quais declara opinião contrária ao mérito de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho.

A decisão recorrida considerou que a irresignação não merece trânsito no âmbito administrativo disciplinar pela ausência de justa causa para a instauração de processo administrativo disciplinar, sem prejuízo da apreciação de eventual fato novo, nos termos da seguinte fundamentação:

 

 

“Da leitura dos autos e do próprio pronunciamento do reclamado (Id 2353565), verifica-se seu engajamento na questão social das “facções”, o apoio público prestado à causa e a participação nas manifestações sociais em defesa do movimento na região do Seridó, seu lugar de origem.

No entanto, não foram identificados nos autos indícios de que tais condutas tivessem natureza política organizada ou partidária com vistas à participação ou ascensão ao Poder, tratando-se, em verdade, de manifestações e atos em prol de questão social relacionada diretamente com a cidade natal do reclamado e com questões da empregabilidade na região. Portanto, não há indícios, no caso, do exercício de atividade político-partidária.

Por outro lado, houve manifestação de opinião por parte do magistrado acerca da atuação de membros do Ministério Público do Trabalho e do próprio mérito de ação civil pública por eles movida, verificando-se indícios de condutas que contrariam a vedação de “manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças, de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício do magistério” (LOMAN, art. 36, III).

Contudo, no caso concreto, em que essa conduta inadequada foi isolada, não ficou caracterizada grave infração aos deveres funcionais da magistratura, de modo que não se justifica a aplicação das penalidades previstas nos incisos III a V do art. 42 da Lei Orgânica da Magistratura, merecendo destacar que as penas de advertência e censura, que eventualmente poderiam ser cogitadas para o caso em questão, não se aplicam aos magistrados de segundo grau (parágrafo único do art. 42 da LOMAN), não havendo, portanto, justa causa para a instauração de processo administrativo disciplinar.” (ID 3157132).

  

 No presente recurso, os recorrentes se insurgem contra o teor da decisão de arquivamento, porquanto consideram nítida a natureza político-partidária da atuação do magistrado ora representado no evento "Grito do Emprego".

Defendem que “por mais que o Desembargador Cláudio Santos seja magistrado estadual, portanto, sem interferência direta na seara trabalhista, o magistrado compôs mesa, ao lado de políticos e de um futuro pré-candidato à presidência da República, num evento de contornos nitidamente políticos, para se posicionar publicamente contra a atuação regular e frequente do Ministério Público do Trabalho.”  (ID 3186878, fl. 11). 

Sustentam, outrossim, que, após o evento narrado, continuaram sendo veiculadas na imprensa do Estado do Rio Grande do Norte diversas notícias que se referiam ao magistrado como pré-candidato ao governo local, verificando-se, assim, sua participação em diversos eventos com vistas a angariar simpatizantes e eleitores para ascender ao poder em cargo eletivo.

Afirmam, nesse contexto, que “as evidências demonstram que o ora recorrido portou-se como possível candidato e manifestou-se desta forma, fatos estes que vilipendiam, de forma incontestável, o artigo 95, parágrafo único, inciso III, da CF/88, o qual afirma que 'aos juízes é vedado dedicar-se à atividade político-partidária', bem como a Lei Complementar da Magistratura, a LOMAN, por força do art. 26, inciso II, alínea c, que prevê procedimento administrativo para perda de cargo, no caso em que o magistrado exerça atividade político-partidária". (ID 3186878, fl. 12). 

Os recorrentes, alfim, requerem a reconsideração da decisão de arquivamento da representação ou a submissão ao Plenário do Conselho Nacional de Justiça.

Autos conclusos em 5/6/2018.

Não obstante a ausência de previsão regimental para contrarrazões ao recurso administrativo no âmbito do CNJ, o recorrido foi intimado a manifestar-se acerca dos fatos novos e conteúdos de mídia colacionados na peça recursal.

Em contrarrazões, aduz o magistrado que não há fatos novos e que os conteúdos de mídia digital anexados são contemporâneos aos fatos narrados na inicial, de modo que precluiu a oportunidade de os recorrentes apresentá-los.

Reitera que sua atuação no evento denominado “Grito do Emprego”, em favor das facções no Município de São José do Seridó, que reuniu populares, empresários e lideranças políticas, não se tratou de atividade político-partidária, mas, sim, do pleno exercício de cidadania e da livre liberdade de expressão.

Quanto à afirmação de circulação na mídia de suposta pré-candidatura do magistrado ao Governo do Estado, esclarece o recorrido que o fato de responder às especulações da imprensa sobre eventual candidatura ao Governo Estadual não se caracteriza como atividade político-partidária, verbis:


“Por outro lado, quanto à alegação do MPT de que a prática político-partidária do Reclamado estaria também caracterizada pela sua atuação na imprensa, cujos veículos de comunicação já o entrevistavam como “cotado” para disputar o governo do Estado, prestei os necessários esclarecimentos, os quais ora reproduzo.

[...]

Houve ampla exposição midiática das medidas austeras tomadas pelo Reclamado, em face da dramática situação orçamentária vivenciada pelo Tribunal, tendo dado inúmeras entrevistas à mídia local para explicá-las amiúde à população. E foi nesse contexto que despontou na opinião pública o seu conceito público de administrador eficiente.

As medidas de austeridade implementadas pelo Reclamado na Presidência causaram uma economia de mais R$ 500 milhões no orçamento do TJRN (Doc. ora em anexo), sendo consideradas de tal impacto que tiveram repercussão nacional, e, inclusive, no MS nº 34567, relatado pelo Ministro do STF, MARCO AURÉLIO, este reconheceu que “em tempos de grave crise financeira, causa perplexidade a grandeza do número, o volume de recursos oriundos de superávit depositados em contas bancárias de titularidade do Poder Judiciário”

Isso, aliado à péssima imagem que o atual governo tem perante a população (fato de sabença nacional em virtude dos problemas graves de segurança pública como Rebelião dos presídios deste Estado), foi suficiente para que despontasse em setores da sociedade o desejo de ter o Reclamado como um possível candidato a Governador, em razão das qualidades administrativas demonstradas durante a sua gestão na Presidência do TJRN. Este fato também foi explorado pela mídia de oposição, hoje exercida por centenas de blogs e sites em todas as cidades do Brasil!” (ID 3350752). 

 

Requer o recorrido o arquivamento definitivo da presente reclamação.

É, no essencial, o relatório.

S07/Z10/S34


 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR - 0009885-72.2017.2.00.0000
Requerente: MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO e outros
Requerido: CLAUDIO SANTOS

 

VOTO

 

 

  O EXMO. SR. MINISTRO HUMBERTO MARTINS, CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA (Relator):   

       

A irresignação do MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO (PGT/MPT) e da ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROCURADORES DO TRABALHO (ANPT), autores da reclamação disciplinar formulada em desfavor de CLÁUDIO SANTOS, Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte (TJRN), tem como objeto a fundamentação que deu respaldo à determinação, pelo então Corregedor Nacional de Justiça, de arquivamento sumário do expediente.

Preconizam os recorrentes que a decisão de arquivamento desconsiderou os documentos e informações adunadas aos autos, bem como os apontamentos formulados, ao concluir pela ausência de justa causa para a instauração de processo administrativo disciplinar.

Reiteram que o magistrado praticou atividade político-partidária veiculada nos diversos meios de comunicação do Estado do Rio Grande do Norte ao se posicionar, publicamente e de forma veemente, contra atuação legítima do Ministério Público do Trabalho, em seara distinta daquela em que atua como magistrado, fazendo coro junto a manifestações promovidas por políticos e empresários locais, que tiveram a finalidade de criticar a atuação do MPT e incitar a população contra a instituição.

Sustentam que as evidências demonstraram que o recorrido teria se portado como possível candidato ao governo do Estado, tendo assim se manifestado em eventos públicos e reuniões partidárias divulgadas pela mídia local e redes sociais, fatos estes que vilipendiariam o art. 95, parágrafo único, inciso III, da CF/88, o qual afirma que “aos juízes é vedado dedicar-se à atividade político-partidária”, bem como o art. 26, inciso II, alínea “c”, da LOMAN, que prevê procedimento administrativo para perda do cargo, no caso em que o magistrado exerça atividade político-partidária.

Ao final, postulam seja reconsiderada a decisão atacada, com o reconhecimento do exercício irregular de atividade político-partidária pelo recorrido, sendo por isso responsabilizado na forma da lei ou, caso contrário, seja o recurso administrativo submetido ao Plenário do CNJ, na forma do § 2º do art. 115 do Regimento Interno.

Não obstante as razões lançadas no recurso administrativo, do exame dos documentos que instruem os autos e dos esclarecimentos feitos pelo magistrado reclamado verifica-se o acerto da decisão que determinou o arquivamento do expediente, em razão da matéria objeto da reclamação disciplinar não se subsumir às hipóteses que demandam a intervenção do Conselho Nacional de Justiça, elencadas no art. 103-B, § 4º, da Constituição Federal, haja vista que a insurgência diz respeito à conduta inadequada e isolada do magistrado que não caracteriza grave infração aos deveres funcionais da magistratura.

Conforme consignado na decisão recorrida, da análise das informações e conteúdos de mídia trazidos aos autos é de fácil inferência o engajamento pessoal do magistrado Cláudio Santos na questão social das “facções” contratadas pelo Grupo Guararapes, por intermédio do "Programa de Interiorização da Indústria Têxtil" (Pró-Sertão), do Governo estadual, o apoio público prestado à causa e a participação nas manifestações sociais em defesa do movimento trabalhista na região do Seridó, por ser seu lugar de origem. Com efeito, como reconhece o próprio recorrido, no último ano (2017) houve reiteradas manifestações de opinião crítica por parte do magistrado acerca da atuação de membros do Ministério Público do Trabalho e do próprio mérito de ação civil pública por eles movida, visando a combater a intermediação de mão-de-obra e a precarização das relações de trabalho daqueles que se ativam nas ditas facções.

A LOMAN, em seu art. 36, inciso III, prevê a vedação de “manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças, de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício do magistério”.

A princípio as manifestações do recorrido constituem crítica à atividade do Ministério Público do Trabalho e embora este não seja "órgão judiciário", ao magistrado cabe agir com cautela ao assim agir em relação ao trabalho de outra instituição, até porque é o Ministério Público  é instituição "essencial à função jurisdicional do Estado".

Contudo, no caso concreto, por se tratar de conduta isolada e em favor da garantia de trabalho de comunidade com a qual mantém vínculos de afetividade, a crítica formulada pelo recorrido não caracteriza "juízo depreciativo", não restando caracterizada a alegada grave infração aos deveres funcionais da magistratura, de modo que não se justifica a aplicação das penalidades previstas nos incisos III a V do art. 42 da Lei Orgânica da Magistratura.

Cumpre aqui reiterar que as penas de advertência e censura, que eventualmente poderiam ser cogitadas para o caso em questão, não se aplicam aos magistrados de segundo grau, nos termos do parágrafo único do art. 42 da LOMAN, não havendo, portanto, justa causa para a instauração de processo administrativo disciplinar.

Ademais, não foram identificados nos autos indícios de que tais condutas tivessem natureza política organizada ou partidária com vistas à participação ou ascensão ao poder, tratando-se, em verdade, de manifestações e atos em prol de questão social relacionada diretamente com a cidade natal do reclamado e com questões da empregabilidade na região.

Não obstante os recorrentes tenham colacionado documentos com conteúdo da mídia local – artigos de jornais e blogs da região – acerca da suposta pré-candidatura do magistrado ao governo local, a toda evidência, seja pela natureza do que foi defendido pelo recorrido, seja pela ausência de divulgação ou registro formal de candidatura, restou demonstrado que tal alegação não passou de especulação que não se consumou.

Ante o exposto, não verificada a existência de indícios da prática de infração disciplinar pelo exercício de atividade político-partidária pelo recorrido, nego provimento ao recurso administrativo, mantendo os fundamentos da decisão de arquivamento.

É como penso. É como voto.

 

 

MINISTRO HUMBERTO MARTINS

Corregedor Nacional de Justiça

S07/Z10/S34

 

 

DECLARAÇÃO DE VOTO 

 

Adoto o relatório apresentado pelo e. Ministro-Relator, pedindo vênia, contudo, para acompanhar sua conclusão circunscrito aos fundamentos expostos no voto do e. Ministro-Presidente.

É como voto.

              

 

Conselheiro Márcio Schiefler Fontes

 

VOTO DIVERGENTE

 

Adoto, por escorreito, o relatório apresentado pelo eminente Relator, porém, no mérito, ouso divergir do voto apresentado, e assim o faço pelas razões a seguir apontadas.

O eminente Corregedor Nacional propõe o desprovimento do Recurso Administrativo interposto pelos autores, que buscam a reforma da decisão monocrática de arquivamento da presente Reclamação Disciplinar.

Entendeu o Relator, em sua proposta de voto, que a conduta imputada ao Desembargador do TJRN configurou “um fato isolado e em favor da garantia de trabalho da comunidade com a qual mantém vínculos de afetividade”, aduzindo, ainda, que as críticas por ele formuladas ao Ministério Público do Trabalho não se configuraram como depreciativas, de modo a justificar a aplicação das penalidades previstas nos incisos III a V do art. 42 da LOMAN.

O eminente Corregedor ainda afasta a possibilidade de atividade política organizada ou partidária, por não identificar evidências para sua configuração.

Faço uma leitura absolutamente diversa, tendo em vista o robusto arcabouço probatório apresentado.

Inicialmente, importante pontuar que o próprio Corregedor reconhece em seu voto que “[...] as manifestações do recorrido constituem crítica à atividade do Ministério Público do Trabalho e embora este não seja ‘órgão judiciário’, ao magistrado cabe agir com cautela ao assim agir em relação ao trabalho de outra instituição, até porque é o Ministério Público é instituição ‘essencial à função jurisdicional do Estado’”.

Ato contínuo, o eminente Corregedor admite ser possível cogitar, para o caso concreto, a aplicação das penas de advertência e censura, mas desde logo as afasta por ser o Magistrado reclamado de segundo grau, verbis:

“Cumpre aqui reiterar que as penas de advertência e censura, que eventualmente poderiam ser cogitadas para o caso em questão, não se aplicam aos magistrados de segundo grau, nos termos do parágrafo único do art. 42 da LOMAN, não havendo, portanto, justa causa para a instauração de processo administrativo disciplinar”.

 

Pedindo todas as vênias, mas o que faz o eminente Relator é basear-se em pena hipoteticamente apurada (pena em perspectiva), contrariando, no meu entender, fartas decisões do excelso STF.

A penalidade a ser eventualmente aplicada somente pode ser verificada na decisão a ser proferida no devido processo, não podendo, assim, ser prenunciada para efeito de afastar a abertura de PAD.

Nesse contexto, reforço os argumentos trazidos pelo Ministro Conselheiro Aloysio Corrêa da Veiga, em seu judicioso voto, no sentido de que não se pode deixar de aprofundar a investigação disciplinar em razão de atribuição de pena em perspectiva.

Ademais, pelas razões que passarei a expor, a gravidade da conduta do Reclamado, desde que devidamente comprovada em eventual processo disciplinar, ensejaria, a meu juízo, penalidade muito mais grave do que a mera censura.

Prossigo.

Em relação à prova dos autos, dela se extrai, de forma clara e inconteste, ter havido, por parte do Magistrado reclamado, quebra de decoro e violação de deveres éticos-disciplinares, seja pela acidez ofensiva das palavras utilizadas, seja pela manifestação de crítica, pública e depreciativa, dirigida ao Ministério Público do Trabalho, seja, ainda, por outras referências injuriosas ao Parquet, em ato público de protesto, de conotação flagrantemente política.

E isso se agrava mais quando, em discurso para uma plateia aproximada de 4 mil pessoas (conforme reportagens juntadas aos autos), o Magistrado desafia o Ministério Público do Trabalho a cumprir o seu ofício constitucional.

Para além da gravidade do comportamento do Magistrado reclamado quando participou do aludido ato político, foram também trazidos aos autos várias reportagens de jornais locais dando conta da sua intenção de se lançar candidato a um cargo público eletivo no Estado do Rio Grande do Norte (IDs 2321511 e 2321517).

Isso, por si só, já seria suficiente para um aprofundamento das investigações sobre a real natureza e intenção do ato público do qual participou ativamente o Magistrado, tendo em vista a possibilidade de configurar exercício de atividade político-partidária, vedada pelo art. 95, § único, III, da CF.

Mas passo à análise específica das provas.

A leitura da documentação apresentada não permite outra conclusão se não a de que o Reclamado participou ativamente da articulação e organização do evento político, cujo objetivo expressamente delineado nos documentos foi exatamente o de se contrapor ao Ministério Público do Trabalho, em clara tentativa de intimidação e de deslegitimação do Parquet perante a comunidade local (a transcrição da fala do Desembargador no evento, a seguir tratada, mostra isso de forma bem clara).

Por meio da informação trazida na peça recursal (ID 3186878, pag. 9), bem como do link pesquisado e a seguir indicado, é possível o acesso às imagens e áudios do ato público referido desde a inicial, sendo que a manifestação do Desembargador reclamado pode ser assistida a partir do tempo 1h40.

Eis o link: https://www.facebook.com/482191568518814/posts/d41d8cd9/1716145641790061/

 

Do exame do vídeo de participação do Desembargador reclamado no ato de protesto contra as ações do MPT, vale trazer a transcrição do trecho sequenciado de sua fala:

“[...] e disse o que vou repetir agora para vocês, não apenas como Magistrado, nem também como seridoense, ardoroso defensor dessa terra, mas sobretudo como cidadão, eu queria convidar vocês, ali Josenir, de testemunha, para fazer uma visita a São José do Seridó, a sua Câmara Municipal, a dizer da minha indignação com essas ações do Ministério Público do Trabalho para acabar com o emprego com a renda e o pão de cada dia de cada trabalhador aqui da nossa Região, não, aqui no Seridó, não vai acontecer o que aconteceu em Santa Cruz e ficou por isso mesmo, três a quatro mil empregos foram desprezados pela ação deletéria daqueles que se pretendem proteger o trabalhador e terminam por prejudicá-lo naquilo que há de mais sagrado, não vai acontecer no Seridó porque vão ter que passar por cima de muita gente nessa terra, que se orgulha do seu trabalho e da sua gente, não vai acontecer aqui o que há quinze dias aconteceu com  a Alpargatas em Natal, em Nova Cruz, aqui não, vade retro, Satanás, se há, Deputado Nelter Queiroz, alguma coisa que deva fechar, no Seridó, no Rio Grande do Norte ou no Brasil, é o Ministério Público do Trabalho, esse sim, que vive às custas do nosso esforço, para trabalhar contra o empresário, que na realidade, é mais um trabalhador, ao lado de seus parceiros, dessa luta do dia a dia, para tirar o salário mínimo no fim do mês. Aqui, Senhor Governador, aqui não pode vir a Polícia Federal, atrás do Ministério Público, para fechar uma fábrica e ficar por isso mesmo, e ficar por isso mesmo, nós somos cidadãos, quando esse povo chegar nas facções, pega pelo braço Ani, pega pelo braço e leva pra ver a panela com feijão em cima do fogão, para saber, para saber se desempregados, amanhã ele vem fazer a feira de vocês, essa que é a grande verdade. Não me venham procuradores, quaisquer que sejam, dizer que estão aplicando a lei, isso é absoluta inverdade, isso é uma grande mentira, o que a Lei Maior que existe no Brasil, na Constituição da República, é a dignidade da pessoa humana, é amanhecer o dia, trabalhar, ganhar o seu dinheiro, fazer suas compras, botar o feijão e o osso de boi em cima da mesa pro seus filhos e no fim de semana também ter um pouco de lazer, é isso que esse povo quer acabar? É isso? Pra que esse povo é pago? Dentro dos Gabinetes luxuosos? Eu espero, amigo Daniel, que essa que seria uma reunião, Josenir, de uns poucos na Câmara, que se transformou nesse encontro da necessidade de todos, não possa se perder nos discursos vazios, politiqueiros, aos quais nós já estamos acostumados no Brasil, aqui não tem partido, aqui, tem necessidade de sobrevivência, tem necessidade de ganhar o pão de cada dia, aqui estão as autoridades públicas mais representativas do nosso Estado, Poder Judiciário, Poder Legislativo, Poder Executivo, todos juntos abraçando essa causa, que não é apenas de São José, cidade emblemática do emprego, da renda e do trabalho para o Rio Grande do Norte. E alguém, e alguém me perguntou, Cláudio, por que São José? Eu digo porque é em São José onde há a maior dependência de todas as cidades com o emprego das facções. É da pequena São José, vizinha a minha querida Jardim do Seridó, que eu repito, aqui no Seridó, não, aqui, vocês não vão fazer o que fizeram em Santa Cruz, em Nova Cruz e em Natal, aqui vão ter que passar por cima de muita gente, inclusive, desse que tá falando aqui agora. Eu quero parabenizar aos trabalhadores, inclusive, empresários trabalhadores, eu quero parabenizar a Câmara de Vereadores, que acolheu uma proposta de visita e transformou no grito do emprego, no grito da dignidade da pessoa humana. Muito obrigado, um grande abraço e, todos contem comigo, um grande abraço.”

 

As imagens que podem ser vistas pelo link acima, sobretudo a partir de 1h40, realmente impressionam, e falam muito mais do que a mera transcrição.

A transcrição da fala do Desembargador reclamado, em evento público prestigiado por numerosa classe política do Rio Grande do Norte, de vereador a Governador, para uma plateia de aproximadamente 4 mil pessoas, revela o seu nítido objetivo de atacar o Ministério Público do Trabalho, descredenciá-lo perante a comunidade local, inclusive com ameaça de resistir pessoalmente às ações do Parquet, e conclamando os demais para essa resistência, não podendo, assim, ser entendida como mera liberdade de expressão, de exercício de cidadania ou de excesso de zelo social.

O que fica patente na fala do Reclamado é que ele faz um incitamento contra o Estado Democrático de Direito, na medida em que, em discurso para uma plateia bem numerosa, prega a resistência às medidas adotadas pelo Ministério Público do Trabalho, olvidando que age o Parquet sob guarida constitucional, dentro das atribuições que lhe são conferidas.

Portanto, as evidências de infrações éticas e disciplinares pelo Magistrado reclamado são cristalinas, não havendo, assim, em meu sentir, qualquer outro caminho por parte deste Conselho, que não seja o de determinar o aprofundamento das investigações por meio da abertura de um Processo Administrativo Disciplinar, seguindo a esteira de entendimento que o Colegiado vem adotando em casos similares.

Dispõem os incisos IV e VIII do art. 35 da LOMAN:

“Art. 35 - São deveres do magistrado:

[...]

IV - tratar com urbanidade as partes, os membros do Ministério Público, os advogados, as testemunhas, os funcionários e auxiliares da Justiça, e atender aos que o procurarem, a qualquer momento, quanto se trate de providência que reclame e possibilite solução de urgência.

[...]

VIII - manter conduta irrepreensível na vida pública e particular.”  

 

Já o art. 36 da LOMAN, em seu inciso III, preconiza:

“Art. 36 - É vedado ao magistrado:

[...]

III - manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças, de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício do magistério.”

 

O Código de Ética da Magistratura Nacional, por sua vez, estabelece como conduta imposta ao Magistrado a observância aos deveres de cortesia, prudência, equilíbrio, honra e decoro (art. 1º).

Também importante trazer à colação os artigos 13, 22 e 37, todos do Código de Ética da Magistratura, verbis:

“Art. 12. Cumpre ao magistrado, na sua relação com os meios de comunicação social, comportar-se de forma prudente e equitativa, e cuidar especialmente:

I - para que não sejam prejudicados direitos e interesses legítimos de partes e seus procuradores;

II - de abster-se de emitir opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos, sentenças ou acórdãos, de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos, doutrinária ou no exercício do magistério.

[...]

Art. 22. O magistrado tem o dever de cortesia para com os colegas, os membros do Ministério Público, os advogados, os servidores, as partes, as testemunhas e todos quantos se relacionem com a administração da Justiça.

Parágrafo único. Impõe-se ao magistrado a utilização de linguagem escorreita, polida, respeitosa e compreensível.

[...]

Art. 37. Ao magistrado é vedado procedimento incompatível com a dignidade, a honra e o decoro de suas funções.”

 

Por todas as evidências infracionais reveladas pela prova dos autos, e já analisadas acima, mostra-se imperioso concluir que há indícios mais do que suficientes de enquadramento das condutas do Magistrado reclamado nas infrações tipificadas nos dispositivos da LOMAN e do Código de Ética da Magistratura acima transcritos.

A ofensa à honra e ao decoro do cargo, por críticas públicas incontestavelmente depreciativas em relação às ações do Ministério Público do Trabalho, bem como o comportamento inadequado do Magistrado em sua vida pública, ao achincalhar o Órgão Ministerial publicamente, estão bem patentes no discurso proferido no aludido ato público, sendo corroborados pela documentação acostada.

E além disso tudo, por si só já muito grave, a fala do Desembargador reclamado no ato público, de resistência, inclusive pessoal, às ações institucionais do Ministério Público, reveste-se, a meu ver, de muita gravidade, pois se trata de um representante do Poder Judiciário local desafiando, sem o devido processo legal, o funcionamento do Órgão Ministerial, que é essencial à administração da justiça e que cumpre seu mister por expressa delegação constitucional.

Por fim, como já pontuado, também subscrevo, integralmente, o voto do eminente Conselheiro Aloysio Corrêa da Veiga, e o faço com os acréscimos de fundamentação que ora apresento.

Por tudo isso, divirjo da proposta de voto do eminente Corregedor Nacional, e, desse modo, dou provimento ao Recurso Administrativo para, reformando a decisão monocrática proferida, determinar a instauração de Processo Administrativo Disciplinar contra o Magistrado Cláudio Santos, com o objetivo de aprofundar as investigações em relação a todas as infrações éticas e disciplinares referidas na presente decisão e narradas na peça exordial.

É como voto.

 

LUCIANO FROTA

Conselheiro

 

 

DECLARAÇÃO DE VOTO 

  

Acompanho o i. Corregedor-Geral, Relator, sob o fundamento de ausência de indícios da prática de infração administrativa diante dos fatos narrados. Isso porque, ainda que incontroversas, as condutas atribuídas ao recorrido não possuem aptidão, no cenário em que praticadas, a configurar infração disciplinar. 

Inicialmente, tais condutas se deram em contexto apartado de processos sob sua condução. E a regra prevista no art. 36, inciso III,  da LOMAN consiste na vedação ao magistrado de “manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças, de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício do magistério”.

Em segundo lugar, a manifestação do magistrado recorrido deu-se em defesa da comunidade a que ligado, em face da alegada preocupação com empregos na região. Embora tais circunstâncias não justifiquem - de forma alguma - o tom ou as expressões utilizadas verbalmente, concluiu o i. Corregedor que os fatos de terem sido proferidas palavras inapropriadas, unicamente em uma oportunidade e sem conteúdo político, indicam a ausência de infração disciplinar, com o que estou de acordo.

Não posso deixar de pontuar, todavia, serem elas merecedoras de crítica e de repreensão, ainda que não se traduzam em infração disciplinar, considerando o tratamento respeitoso que se deve devotar a todas as instituições públicas e, em especial, às funções essenciais à administração da Justiça. Todo magistrado deve se conduzir com serenidade e com parcimônia em suas manifestações, ainda que fora do exercício da jurisdição.

Assim, embora não tenham chegado às raias da infração disciplinar, recomenda-se ao representado que melhor observe o dever de prudência.

Por fim, e retomando o enfoque unicamente sob o prisma infracional, restou evidenciada a ausência de qualquer suporte – probatório e fático – a amparar a alegação de feição política em  suas manifestações.

A partir dessas premissas, a conclusão do i. Relator, mantendo o arquivamento do feito, parece-me inafastável, sobretudo porque não “identificados nos autos indícios de que tais condutas tivessem natureza política organizada ou partidária com vistas à participação ou ascensão ao poder, tratando-se, em verdade, de manifestações e atos em prol de questão social relacionada diretamente com a cidade natal do reclamado e com questões da empregabilidade na região”.

Dessa forma, acompanho o i. Relator também quanto à conclusão acerca da ausência de feição política nas condutas narradas, pontuando a recomendação de prudência ao magistrado e a repreensão pela conduta praticada.

Pelo exposto, acompanho o i. Relator e nego provimento ao recurso administrativo, diante da ausência de indícios da prática de infração disciplinar pelo exercício de atividade político-partidária pelo recorrido.

 

  

Ministro  DIAS TOFFOLI  

Presidente 

 

 

VOTO DIVERGENTE

 

Adoto o relatório lançado pelo Conselheiro Relator, Ministro Humberto Martins, que devidamente retrata a situação descrita nestes autos.

Trata-se de recurso administrativo interposto pela Procuradoria-Geral do Ministério Público do Trabalho (PGT/MPT) e pela Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT) em face de decisão que determinou o arquivamento de reclamação disciplinar formulada contra Cláudio Santos, Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte. 

A PGT/MPT e a ANPT apresentaram a presente reclamação em face de atos praticados pelo Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte, Cláudio Santos, que supostamente contrariam deveres previstos na Lei Orgânica da Magistratura.

De acordo com os Requerentes:

 a) o Desembargador em questão liderou ato de repúdio a atuação do Ministério Público naquele Estado, em razão de ação civil pública ajuizada em face do Grupo têxtil Guararapes, segundo veiculou publicações locais (Id. 2321510, p. 9);

 b) que o ato revela finalidade política e visa atacar a atuação regular do Ministério Público Trabalho, na região de Seridó, lugar de origem do magistrado;

c) o Desembargador tem concedido entrevistas em tom eleitoral, em que não despreza futura participação em atividade política (Id. 2321517, p. 10);

d) os jornais locais veicularam lançamento de candidatura do magistrado (Id. 2321511, p. 1 e 2);

e) fala do Desembargador Cláudio Santos, extraída de vídeo disponível na rede social “facebook”, revela censura a atuação do Ministério Público do Trabalho. Destaque-se os seguintes trechos extraídos da fala do Desembargador:

"(...) Aqui no Seridó não vai acontecer o que aconteceu em Santa Cruz e ficou por isso mesmo. Aqui não vai acontecer o que aconteceu há 15 dias na Alpargatas em Nova Cruz... Aqui não! Vá de retro, Satanás!"

 "(...) Se há alguma coisa que deva fechar no Seridó, no Rio Grande do Norte ou no Brasil é o Ministério Público do Trabalho" "(..) Não me venham Procuradores, quaisquer que sejam, dizer que estão aplicando a lei. Isso é absoluta inverdade. Isso é uma grande mentira!"

"(...) Aqui vão ter que passar por cima de muita gente, inclusive desse que está falando aqui agora" (...)

 

Após manifestação do magistrado reclamado (Id.2353565), a reclamação disciplinar foi arquivada monocraticamente pelo então Ministro Corregedor João Otávio de Noronha, que, à época, repeliu a natureza política organizada ou partidária das condutas imputadas ao Desembargador.

Não obstante, o então Corregedor ponderou que a manifestação de opinião pública sobre o trabalho desempenhado pelo Ministério Público do Trabalho revela indícios de atuação contrária ao disposto no art. 36, inciso II, da LC n. 35, de 1979, no caso, passíveis apenas de aplicação das penalidades de advertência e censura.

Desse modo, na acepção do Corregedor à época dos fatos, devido à ausência de gravidade da conduta, a qual se revelou pontual, não haveria justa causa para instauração de PAD, uma vez que aos Desembargadores não são aplicáveis as penas previstas nos incisos I e II do art. 42 da LOMAN. Confira-se excerto da decisão (Id. 3157132):

Por outro lado, houve manifestação de opinião por parte do magistrado acerca da atuação de membros do Ministério Público do Trabalho e do próprio mérito de ação civil pública por eles movida, verificando-se indícios de condutas que contrariam a vedação de “manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças, de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício do magistério” (LOMAN, art. 36, III).

Contudo, no caso concreto, em que essa conduta inadequada foi isolada, não ficou caracterizada grave infração aos deveres funcionais da magistratura, de modo que não se justifica a aplicação das penalidades previstas nos incisos III a V do art. 42 da Lei Orgânica da Magistratura, merecendo destacar que as penas de advertência e censura, que eventualmente poderiam ser cogitadas para o caso em questão, não se aplicam aos magistrados de segundo grau (parágrafo único do art. 42 da LOMAN), não havendo, portanto, justa causa para a instauração de processo administrativo disciplinar.

Ao apreciar recurso interposto pelos Requerentes, o eminente Relator do feito, Ministro Corregedor Humberto Martins, repisa em seu voto os fundamentos externados na decisão combatida e nega provimento ao recurso manejado.

Aponta que, muito embora reste demonstrado o engajamento pessoal do Desembargador Cláudio Santos na questão social das “facções” contratadas pelo Grupo Guararapes, por intermédio do “Programa de Interiorização da Indústria Têxtil”, do Governo Estadual, bem como sejam públicas as críticas proferidas em face da atuação do Ministério Público do Trabalho e do mérito de ação civil pública movida por esse Órgão, tal fato não enseja a instauração de procedimento disciplinar.

Destaca que, no caso, afastado os indícios da prática de infração disciplinar pelo exercício de atividade político partidária pelo reclamado, já que não veio a formalizar candidatura ao governo local, as manifestações do Desembargador contra a atuação do Ministério Público do Trabalho são críticas que não caracterizam juízo depreciativo, aptas a justificar a aplicação de penalidades graves previstas nos incisos III a V do art. 42 da LOMAN.

Reitera, dessa forma, a ausência de justa causa para instauração de procedimento disciplinar, considerando que as penas de advertência e de censura eventualmente cogitadas para o caso, não se aplicam aos magistrados de segundo grau e mantém a decisão originária de arquivamento.

Ouso divergir, data vênia, da conclusão do eminente Relator.

É que havendo indícios de violação aos deveres da magistratura, como destaca o próprio Relator em seu voto, a solução consequente é a abertura de procedimento administrativo disciplinar para adequada averiguação dos fatos narrados na reclamação.

Descabe em sede de investigação preliminar, consubstanciada na presente reclamação, a emissão de juízo prévio sobre eventual pena e a sua dosimetria, a qual, por óbvio, deverá ser realizada em fase subsequente, nos termos do art. 69 do RICNJ c/c com o art. 13 da Resolução CNJ n. 135, de 2011.

A meu sentir, coibir prematuramente a instauração de procedimento disciplinar, com atribuição de pena em perspectiva, como defende o eminente Relator, parece obstar, de plano, a abertura de PAD em face de Desembargadores quando as condutas questionáveis são inicialmente compreendidas como infrações disciplinares de natureza leve.

Apenas após regular instrução de processo administrativo disciplinar, momento em que o acervo probatório encontra-se devidamente constituído, poder-se-á aferir, de fato, a pena a ser aplicada e a gravidade da infração cometida.

Destaco, por fim, que o caso dos autos retrata suposta infração cometida por Desembargador, cujo grau de exigência em relação às responsabilidades do cargo deve ser considerado para fins de mensuração do grau de reprovabilidade da conduta que lhe foi atribuída.

Com esses apontamentos, divirjo da orientação do Relator, pois, presentes os indícios de violação de deveres da magistratura prescritos no art. 36, II, da LC n. 35, de 1979, como revela o eminente Corregedor em seu voto, deve ser instaurado procedimento administrativo disciplinar em face do Desembargador reclamado para adequada averiguação dos fatos narrados na exordial.

É como voto.

 

 

Ministro ALOYSIO CORRÊA DA VEIGA

Conselheiro 

 

GCACVNFL

 

Brasília, 2019-08-28.