Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0001442-74.2013.2.00.0000
Requerente: CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DE ALAGOAS
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA

 

CONSULTA. DESTINAÇÃO DE RECURSOS PROVENIENTES DE PENAS PECUNIÁRIAS PARA CUSTEIO DE EXAMES DE DNA A HIPOSSUFICIENTES. POSSIBILIDADE CONDICIONADA À INEXISTÊNCIA DE INSTITUIÇÃO QUE ATENDA À PRIORIDADE ESTABELECIDA NA RESOLUÇÃO CNJ N. 154.

I. É possível a destinação de recursos oriundos da aplicação da pena de prestação pecuniária a instituições públicas e privadas que realizem exames de DNA a beneficiários da justiça gratuita, dada a relevância social desse serviço, desde que não haja na localidade abrangida pela unidade gestora entidade com finalidade social ligada à justiça criminal ou execução penal, ante a prioridade destas, a teor do artigo 2º, § 1º e incisos da Resolução CNJ n. 154.

II – Consulta a que se responde positivamente.

 

 

 ACÓRDÃO

Após o voto da Conselheira vistora, o Conselho, por maioria, considerou legítimo o uso de recursos oriundos da aplicação da pena de prestação pecuniária para realização dos exames de DNA, nos termos do voto do então Relator Rubens Curado. Vencida a Conselheira Luiza Cristina. Presidiu o julgamento o Conselheiro Ricardo Lewandowski. Plenário, 6 de outubro de 2015. Presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Conselheiros Ricardo Lewandowski, Nancy Andrighi, Lelio Bentes Corrêa, Carlos Levenhagen, Daldice Santana, Gustavo Tadeu Alkmim, Bruno Ronchetti, Fernando Mattos, Carlos Eduardo Dias, Luiza Cristina Frischeisen, Arnaldo Hossepian, Norberto Campelo, Luiz Cláudio Allemand, Emmanoel Campelo e Fabiano Silveira.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0001442-74.2013.2.00.0000
Requerente: CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DE ALAGOAS
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA


 

RELATÓRIO

 

Cuidam os presentes autos de Consulta apresentada pela CORREGEDORIA-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE ALAGOAS, na qual objetiva, em síntese, que o Conselho Nacional de Justiça esclareça sobre a possibilidade de utilização de recursos oriundos da aplicação de penas pecuniárias, nos termos da Resolução CNJ n. 154, para o custeio de exames de DNA.

2.                                Noticia que, em observância ao que estabelece a mencionada Resolução, editou o Provimento n. 01/2013 sobre recolhimento e utilização dos recursos oriundos da aplicação de pena pecuniária.

3.                              Todavia, após a publicação do aludido normativo foram suscitados questionamentos quanto à possibilidade de destinar tais recursos para entidades que realizam exames de DNA no caso de investigação de paternidade de pessoas carentes.

4.                                  Assim, formula a Consulta nos seguintes termos:

“(...) diante do exposto, objetivando a inequívoca e plena aplicação do contido na Resolução nº 154/12 desse Conselho Nacional de Justiça, solicitamos dessa Egrégia Corte esclarecimento quanto a possibilidade de utilização dos recursos oriundos da aplicação de penas pecuniárias na utilização de custeio de exames de DNA”. 

É o relatório.

 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0001442-74.2013.2.00.0000
Requerente: CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DE ALAGOAS
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA

 

VOTO 



 

5.                De plano, determino a conversão da classe processual do presente feito de Pedido de Providências para Consulta, uma vez que o seu objeto se coaduna com as disposições do artigo 89 do Regimento Interno do CNJ:

Art. 89. O Plenário decidirá sobre consultas, em tese, de interesse e repercussão gerais quanto à dúvida suscitada na aplicação de dispositivos legais e regulamentares concernentes à matéria de sua competência.

§ 1º A consulta deve conter indicação precisa do seu objeto, ser formulada articuladamente e estar instruída com a documentação pertinente, quando for o caso.

§ 2º A resposta à consulta, quando proferida pela maioria absoluta do Plenário, tem caráter normativo geral.

 

6.                Assim, considerando que a presente Consulta atende aos requisitos de admissibilidade de que trata o artigo destacado, dela conheço e passo a formular resposta.

7.             O cerne da questão submetida à apreciação deste Conselho diz respeito à possibilidade, à luz da Resolução CNJ nº 154, de destinação dos recursos oriundos da aplicação de penas pecuniárias para custeio de exames de DNA aos beneficiários da justiça gratuita (hipossuficientes).

8.               Importa destacar, de início, que o Código Penal elegeu a prestação pecuniária como uma das modalidades de penas restritivas de direitos e a definiu como sendo o “pagamento em dinheiro à vítima, a seus dependentes ou a entidade pública ou privada com destinação social, de importância fixada pelo juiz, não inferior a 1 (um) salário mínimo nem superior a 360 (trezentos e sessenta) salários mínimos” (arts. 43, inciso I e 45, § 1º).

9.                Observa-se, portanto, que a própria lei instituiu os beneficiários, arrolando, dentre eles, as entidades públicas e privadas com “destinação social”.

10.            Em compasso com a legislação penal e, sobretudo, considerando a necessidade de aprimorar, uniformizar as práticas e conferir maior controle das destinações das penas pecuniárias, o CNJ regulamentou a matéria por meio da Resolução n. 154, de 13 de julho de 2012. Vale rememorar o seu inteiro teor:

  

RESOLUÇÃO n. 154, DE 13 DE JULHO DE 2012. 

  

Define a política institucional do Poder Judiciário na utilização dos recursos oriundos da aplicação da pena de prestação pecuniária. 

  

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições constitucionais e regimentais,

CONSIDERANDO a Resolução nº 101, de 15 de dezembro de 2009, deste Conselho, que definiu a política institucional do Poder Judiciário na execução de penas e medidas alternativas à prisão;

CONSIDERANDO que as destinações das penas pecuniárias, espécie de pena restritiva de direitos, têm que ser aprimoradas, para evitar total descrédito e inutilidade ao sistema penal, já que a execução da pena é o arremate de todo o processo criminal;

CONSIDERANDO a necessidade de dar maior efetividade às prestações pecuniárias, aprimorando-se a qualidade da destinação das penas impostas;

CONSIDERANDO a necessidade de uniformizar as práticas para o fomento à aplicação da pena de prestação pecuniária em substituição à prisão, como condição da suspensão condicional do processo ou transação penal, visando melhor fiscalização do emprego dos valores recebidos pelas instituições beneficiadas;

CONSIDERANDO a necessidade de regulamentação da destinação, controle e aplicação de valores oriundos de prestação pecuniária aplicada pela justiça criminal, assegurando a publicidade e transparência na destinação dos aludidos recursos;

CONSIDERANDO a decisão do plenário do Conselho Nacional de Justiça, tomada no julgamento do Ato nº 0005096-40.2011.2.00.0000, na 147ª Sessão Ordinária, realizada em 21 de maio de 2012;

RESOLVE:

Art. 1º Adotar como política institucional do Poder Judiciário, na execução da pena de prestação pecuniária, o recolhimento dos valores pagos em conta judicial vinculada à unidade gestora, com movimentação apenas por meio de alvará judicial, vedado o recolhimento em cartório ou secretaria.

Parágrafo único. A unidade gestora, assim entendida, o juízo da execução da pena ou medida alternativa de prestação pecuniária, ficará responsável pela abertura da conta corrente junto à instituição financeira estadual ou federal, exclusiva para o fim a que se destina.

Art. 2º Os valores depositados, referidos no art. 1º, quando não destinados à vitima ou aos seus dependentes, serão, preferencialmente, destinados à entidade pública ou privada com finalidade social, previamente conveniada, ou para atividades de caráter essencial à segurança pública, educação e saúde, desde que estas atendam às áreas vitais de relevante cunho social, a critério da unidade gestora.

§ 1º A receita da conta vinculada irá financiar projetos apresentados pelos beneficiários citados no caput deste artigo, priorizando-se o repasse desses valores aos beneficiários que:

I - mantenham, por maior tempo, número expressivo de cumpridores de prestação de serviços à comunidade ou entidade pública;

II - atuem diretamente na execução penal, assistência à ressocialização de apenados, assistência às vítimas de crimes e prevenção da criminalidade, incluídos os conselhos da comunidade;

III - prestem serviços de maior relevância social;
IV - apresentem projetos com viabilidade de implementação, segundo a utilidade e a necessidade, obedecendo-se aos critérios estabelecidos nas políticas públicas específicas.

§ 3º É vedada a escolha arbitrária e aleatória dos beneficiários.

Art. 3º É vedada a destinação de recursos:
I - ao custeio do Poder Judiciário;

II - para a promoção pessoal de magistrados ou integrantes das entidades beneficiadas e, no caso destas, para pagamento de quaisquer espécies de remuneração aos seus membros;

III - para fins político-partidários;

IV – a entidades que não estejam regularmente constituídas, obstando a responsabilização caso haja desvio de finalidade.

Art. 4º O manejo e a destinação desses recursos, que são públicos, devem ser norteados pelos princípios constitucionais da Administração Pública, previstos, dentre outros, dispositivos no art. 37, caput, da Constituição Federal, sem se olvidar da indispensável e formal prestação de contas perante a unidade gestora, sob pena de responsabilidade, ficando assegurada a publicidade e a transparência na destinação dos recursos.

Parágrafo único. A homologação da prestação de contas será precedida de manifestação da seção de serviço social do Juízo competente para a execução da pena ou medida alternativa, onde houver, e do Ministério Público.

Art. 5º Caberá às Corregedorias, no prazo de seis meses, contados da publicação da presente Resolução, regulamentar:

I - os procedimentos atinentes à forma de apresentação e aprovação de projetos;

II - a forma de prestação de contas das entidades conveniadas perante a unidade gestora;

III - outras vedações ou condições, se necessárias, além daquelas disciplinadas nesta Resolução, observadas as peculiaridades locais.

Art. 6º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.

 

Ministro Ayres Britto

Presidente” 

 

11.              Diante da prioridade estabelecida no artigo 2º, § 1º, I e II, restou nítido o propósito de incentivar a destinação dos recursos às entidades ligadas ao sistema da justiça criminal ou de execução penal, na linha da política judiciária defendida pelo próprio CNJ em iniciativas como os “mutirões carcerários”, o projeto “Começar de Novo” e a instituição do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário – DMF.

12.             Note-se, também, a firme preocupação com o controle da destinação dos valores oriundos de prestação pecuniária, assegurando prestação de contas, transparência e publicidade. 

13.            Observe-se, contudo, que o incentivo às entidades ligadas ao sistema de justiça criminal ou de execução penal não passa (e não pode passar) de uma prioridade. Eventual exclusividade encontraria óbice na própria disposição do artigo 45, § 1º do Código Penal, acima transcrito.

14.             Assim é que, nos termos do caput do artigo 2º da citada Resolução, se o pagamento não for feito à vítima ou a seus dependentes, devem os órgãos do Poder Judiciário dar preferência às entidades públicas ou privadas com finalidade social, previamente conveniada, “ou para atividades de caráter essencial à segurança pública, educação e saúde, desde que estas atendam às áreas vitais de relevante cunho social, a critério da unidade gestora”.

15.              Mais. De acordo com o § 1º desse mesmo artigo 2º, dentre os possíveis beneficiários previstos no caput, deve ser priorizado o repasse àqueles arrolados nos incisos I a IV, nessa ordem, com destaque para os mencionados nos dois primeiros, verbis:

“(...)

I - mantenham, por maior tempo, número expressivo de cumpridores de prestação de serviços à comunidade ou entidade pública;

II - atuem diretamente na execução penalassistência à ressocialização de apenados, assistência às vítimas de crimes e prevenção da criminalidade, incluídos os conselhos da comunidade;

III - prestem serviços de maior relevância social;

IV - apresentem projetos com viabilidade de implementação, segundo a utilidade e a necessidade, obedecendo-se aos critérios estabelecidos nas políticas públicas específicas.”

 

16.              Nessa linha, não havendo na localidade abrangida pela unidade gestora entidade com finalidade social que atenda a prioridade estabelecida nos incisos I e II do § 1º, torna-se possível a destinação desses valores para financiamento de projetos de instituições que realizem exames de DNA a hipossuficientes, dada a relevância social desses serviços, a teor do artigo 2º, § 1º, inciso III, da Resolução CNJ n. 154.

17.            Tal medida, na verdade, vai ao encontro do artigo 5º, inciso LXXIV, da Carta Constitucional, segundo o qual “o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos”. 

18.              Por fim, observo nítido erro material na numeração dos parágrafos do artigo 2º desse ato normativo, tendo em vista a presença de § 3º sem o prévio § 2º, pelo que proponho tal correção.

19.              Ante o exposto, conheço e respondo positivamente à Consulta, nos seguintes termos: é possível a destinação de recursos oriundos da aplicação da pena de prestação pecuniária a instituições públicas e privadas que realizem exames de DNA a beneficiários da justiça gratuita, dada a relevância social desse serviço, desde que não haja na localidade abrangida pela unidade gestora entidade com finalidade social ligada à justiça criminal ou execução penal, ante a prioridade destas, a teor do artigo 2º, § 1º e incisos da Resolução CNJ n. 154.

20.              Também propondo a alteração formal da Resolução CNJ nº 154 para correção do erro material na numeração dos parágrafos do artigo 2º.

21.              Converta-se a classe processual para Consulta.

É como voto.

Após as comunicações de praxe, arquive-se. 

 

RUBENS CURADO SILVEIRA
Conselheiro

 

 

Autos:

PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO – 0001442-74.2013.2.00.0000

Requerente:

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DE ALAGOAS

Requerido:

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA

 

 

Vistos etc.

 

 

 

 

VOTO DIVERGENTE

 

Inicialmente, adoto o relatório do Eminente Conselheiro Relator, razão pela qual passo a votar.

O Conselheiro Relator manifesta-se favoravelmente à possibilidade de utilização de recursos oriundos da aplicação de penas pecuniárias, para o financiamento de projetos apresentados por entidades que prestem serviços de relevância social, a exemplo de instituições que realizem exames de DNA a hipossuficientes, desde que não haja beneficiário preferencial, aí incluídas as entidades públicas ou privadas de cunho social que visem ao atendimento de áreas relacionadas ao sistema de Justiça Criminal ou de Execução Penal.

Ocorre, entretanto, em que pese a finalidade altruística, não se pode permitir o direcionamento de tais recursos às instituições que realizem exames de DNA aos hipossuficientes, sob risco de desvirtuar a própria natureza da prestação de pena pecuniária

 

Da Natureza Jurídica da Prestação de Pena Pecuniária e da Vinculação dos Seus Recursos

 

Para Guilherme de Souza Nucci, a Pena de Prestação Pecuniária possuía a seguinte natureza:

 

(...) trata-se de sanção penal, restritiva de direitos, embora possa ter conotação de antecipação de indenização civil. Quando a prestação pecuniária for destinada à vítima do delito ou seus dependentes, em futura ação de indenização civil, o valor pago será devidamente descontado, evitando-se o enriquecimento sem causa por parte do ofendido. Entretanto, se o valor for destinado integralmente à entidade pública ou privada com destinação social, a pena não tem qualquer conotação civil. (NUCCI, Guilherme de Souza, Código Penal Comentado, 11. Ed. – São Paulo: Editora RT, 2012, p. 149)

 

Já o Código Penal, assim dispõe:

 

Art. 45. Na aplicação da substituição prevista no artigo anterior, proceder-se-á na forma deste e dos arts. 46, 47 e 48. (Redação dada pela Lei nº 9.714, de 1998)

        § 1o A prestação pecuniária consiste no pagamento em dinheiro à vítima, a seus dependentes ou a entidade pública ou privada com destinação social, de importância fixada pelo juiz, não inferior a 1 (um) salário mínimo nem superior a 360 (trezentos e sessenta) salários mínimos. O valor pago será deduzido do montante de eventual condenação em ação de reparação civil, se coincidentes os beneficiários. (Incluído pela Lei nº 9.714, de 1998)

        § 2o No caso do parágrafo anterior, se houver aceitação do beneficiário, a prestação pecuniária pode consistir em prestação de outra natureza. (Incluído pela Lei nº 9.714, de 1998)

        § 3o A perda de bens e valores pertencentes aos condenados dar-se-á, ressalvada a legislação especial, em favor do Fundo Penitenciário Nacional, e seu valor terá como teto – o que for maior – o montante do prejuízo causado ou do provento obtido pelo agente ou por terceiro, em conseqüência da prática do crime. (Incluído pela Lei nº 9.714, de 1998)

        § 4o (VETADO) (Incluído pela Lei nº 9.714, de 1998)

 

É possível verificar que o legislador buscou uma correlação da sanção com a pena, ou seja, primeiro a natureza indenizatória à vítima ou aos descendentes, à título de antecipação de reparação civil, ou então, na impossibilidade, a instituições públicas ou privadas com destinação social.

Veja-se o disposto na Lei de Execuções Penais, no que tange à participação da sociedade na ressocialização penal:

 

Art. 4º O Estado deverá recorrer à cooperação da comunidade nas atividades de execução da pena e da medida de segurança

 

Já o art 4º oriundo da Assembleia Geral das Nações Unidas, Resolução 45/111, de 14 de Dezembro de 1990 (Princípios Básicos Relativos ao Tratamento de Reclusos), dispõe o seguinte quanto à participação da sociedade:

 

4. A responsabilidade das prisões pela guarda dos reclusos e pela proteção da sociedade contra a criminalidade, deve ser cumprida em conformidade com os demais objetivos sociais do Estado e com a sua responsabilidade fundamental de promoção do bem-estar e do desenvolvimento de todos os membros da sociedade.

 

Desse modo, na esteia do sobredito, deve-se buscar a cooperação de instituições de modo a humanizar a justiça penal, razão pela qual transferir recursos para organizações que em nada têm correlação com a execução penal, seria incorrer em desvio de finalidade dos recursos oriundos da pena pecuniária.

A título enumerativo, há os conselhos da comunidade previstos na própria LEP (art. 80), os Núcleos de Custódia, ou seja, instituições que necessitam de atuação positiva do Estado de modo a contribuírem para a ressocialização dos apenados.

 

É válido destacar que o Provimento da Corregedoria Nacional de Justiça de nº 21, que define regras para a destinação e fiscalização de medidas e penas alternativas, assim dispõe:

 

Art. 1º. As prestações pecuniárias e as prestações sociais alternativas, objeto de transação penal e de sentença condenatória (art. 45, § 1º, do Código Penal), não revertidas às vítimas ou seus sucessores, devem ser destinadas pelo juiz às entidades públicas, privadas com destinação social e aos conselhos da comunidade, observada a resolução aprovada pelo CNJ no processo nº 0005096-40.2011.2.00.0000.

§ 1º Consideram-se entidades públicas as definidas nos termos do art. 1º, §2º, II, da Lei nº 9.784/1999, entidades privadas com destinação social as que atendam aos requisitos do art. 2º da Lei nº 9.637/1998, e conselhos da comunidade aqueles definidos nos termos da Lei de Execução Penal.

(...)

 

Cito também a Resolução de nº 96/CNJ que versa sobre o “Projeto Começar de Novo” no âmbito do Poder Judiciário, no sentido de promover ações de reinserção social de presos, egressos do sistema carcerário e de cumpridores de medidas e penas alternativas:

 

Art. 5º Os Tribunais de Justiça deverão instalar, no prazo de 30 dias, e por em funcionamento no prazo de até 90 dias, grupo de monitoramento e fiscalização do sistema carcerário, presidido por um magistrado, com as seguintes atribuições:

I - implantar, manter e cumprir as metas do Projeto Começar de Novo;

II - fomentar, coordenar e fiscalizar a implementação de projetos de capacitação profissional e de reinserção social de presos, egressos do sistema carcerário, e de cumpridores de medidas e penas alternativas.

III - acompanhar a instalação e o funcionamento, em todos os Estados, dos Patronatos e dos Conselhos da Comunidade de que tratam os arts. 78, 79 e 80 da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984, em conjunto com o juiz da execução penal, relatando à Corregedoria Geral de Justiça, a cada três meses, no mínimo, suas atividades e carências, e propondo medidas necessárias ao seu aprimoramento.

IV - planejar e coordenar os mutirões carcerários para verificação das prisões provisórias e processos de execução penal;

V - acompanhar e propor soluções em face das irregularidades verificadas nos mutirões carcerários e nas inspeções em estabelecimentos penais, inclusive Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico e Delegacias Públicas;

VI - acompanhar projetos relativos à construção e ampliação de estabelecimentos penais, inclusive em fase de execução, e propor soluções para o problema da superpopulação carcerária;

VII - acompanhar a implantação de sistema de gestão eletrônica da execução penal e mecanismo de acompanhamento eletrônico das prisões provisórias;

VIII - acompanhar o cumprimento das recomendações, resoluções e dos compromissos assumidos nos seminários promovidos pelo Conselho Nacional de Justiça, em relação ao Sistema Carcerário;

IX - implementar a integração das ações promovidas pelos órgãos públicos e entidades com atribuições relativas ao sistema carcerário;

X - estimular a instalação de unidades de assistência jurídica voluntária aos internos e egressos do Sistema Carcerário;

XI - propor a uniformização de procedimentos relativos ao sistema carcerário, bem como estudos para aperfeiçoamento da legislação sobre a matéria;

XII - coordenar seminários em matéria relativa ao Sistema Carcerário.

§ 1º Os tribunais deverão, ainda, com base no relatório do grupo, diligenciar para que os Conselhos da Comunidade sejam efetivamente instalados e para que tenham funcionamento regular, sobretudo no que pertine à implementação de projetos de reinserção social, em cumprimento à Lei 7.210, de 11 de julho de 1984 e à legislação local.

§ 2º Os tribunais que já criaram grupos de trabalho com atribuições similares às previstas no art. 5º deverão editar ato adaptando-os aos termos da presente resolução.

(grifos nossos)

 

Ainda em referência a projetos de âmbito penal, cito que recentemente o Conselho vem cumulando esforços com outras instituições públicas no sentido de dar efetiva implantação do projeto “Audiência de Custódia” que consiste na implementação e operacionalização da apresentação pessoal de autuados presos em flagrante delito à autoridade judiciária.

 

Este Conselho, inclusive, já decidiu do seguinte modo:

 

PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. CRIME AMBIENTAL. TRANSAÇÃO PENAL. DESTINAÇÃO DOS VALORES. VINCULAÇÃO LEGAL ESPECÍFICA. MEDIDAS PROTETIVAS AO MEIO AMBIENTE.

1. O presente Pedido de Providências foi formulado com o objetivo de assegurar que os valores decorrentes das transações penais ou sentenças condenatórias atinentes à tutela do meio ambiente, patrimônio cultural e urbanístico tenham como destino o efetivo custeio de medidas protetivas e de valia ao meio ambiente.

2. O ato normativo questionado estabeleceu critério subjetivo para destinação dos valores envolvidos, com deliberação pela respectiva unidade gestora. Apesar da atenção à Resolução n.º 154/2012 do CNJ, o Provimento Conjunto n.º 27/2013 não assegurou de forma clara que as prestações pecuniárias decorrentes de infrações ambientais tenham correspondente retorno para áreas relacionadas à proteção e fiscalização ao meio ambiente, conforme determinado na Lei Estadual n.º 14.086/2002 que expressamente assegura tal vinculação (art. 16).

3. Pedido julgado procedente para assegurar que os valores decorrentes das transações penais ou sentenças condenatórias atinentes à tutela do meio ambiente tenham como destino o efetivo custeio de medidas protetivas e de valia ao meio ambiente, observado o disposto na legislação estadual.

(CNJ - PP - Pedido de Providências - Conselheiro - 0002460-96.2014.2.00.0000  - Rel. DEBORAH CIOCCI - 190ª Sessão - j. 03/06/2014 ).

 

 

Da Situação Específica do Estado de Alagoas

 

Em que pese, concluir que não se mostra possível o desvirtuamento dos recursos oriundos da prestação pecuniária para outras áreas, destaco o seguinte, em relação específica do presente procedimento administrativo.

O Procedimento em questão, surgiu em razão de Ofício da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de Alagoas, em que se questiona a possibilidade de destinação dos recursos oriundos da prestação da pena pecuniária para entidades que realizem exames de DNA, quando em processos de investigação de paternidade de pessoas carentes.

O Estado de Alagoas se encontra em situação de emergência, desde janeiro do corrente ano, em razão da superlotação de presídios (http://www.alagoas24horas.com.br/situacao-carceraria-de-alagoas-chama-atencao-governador-de-pernambuco/).

Há um excedente total de 3.300 presos naquele Estado, segundo dados da própria Superintendência Geral de Administração Penitenciária do Estado de Alagoas (http://www.sgap.al.gov.br/populacao-carceraria).

Dados oriundos do mutirão carcerário também ratificam os dados acima (http://www.cnj.jus.br/images/programas/mutirao-carcerario/relatorios/alagoas_2013.pdf).

Ou seja, resta mais do que alvo e cristalino que toda e qualquer medida, seja de natureza pública ou da sociedade, será de extrema necessidade para a manutenção do próprio sistema de ressocialização penal que é dever do Estado, mas também com participação da sociedade.

 

 

CONCLUSÃO

 

Ante ao exposto, respondo a Consulta de modo negativo no sentido de impossibilidade de utilização de recursos oriundos da pena de prestação pecuniária, quando não relacionados com o âmbito penal, recomendando à Corregedoria do Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas que busque assegurar que tais recursos tenham a correta destinação.

 

É como Voto.

 

Brasília, DF, 30 de março de 2015.

 

Conselheira LUIZA CRISTINA FONSECA FRISCHEISEN

 

/DTS

 

 

VOTO CONVERGENTE

 

O EXMO. SR. CONSELHEIRO FERNANDO CESAR BAPTISTA DE MATTOS: Pedi vista para realizar uma leitura atenta da Resolução nº 154, de 13 de julho de 2012, utilizada pelo Relator para concluir em sua consulta por ser “possível a destinação de recursos oriundos da aplicação da pena de prestação pecuniária a instituições públicas e privadas que realizem exames de DNA a beneficiários da justiça gratuita, dada a relevância social desse serviço, desde que não haja na localidade abrangida pela unidade gestora entidade com finalidade social ligada à justiça criminal ou execução penal, ante a prioridade destas, a teor do artigo 2º, § 1º e incisos da Resolução CNJ nº 154.”

De fato, como disse o relator, na medida em que o caput do artigo 2º da citada Resolução prevê, se o pagamento não for feito à vítima ou a seus dependentes, deverem os órgãos do Poder Judiciário dar preferência às entidades públicas ou privadas com finalidade social, previamente conveniada, “ou para atividades de caráter essencial à segurança pública, educação e saúde, desde que estas atendam às áreas vitais de relevante cunho social, a critério da unidade gestora”, não se pode concluir de modo diverso daquele contido no resposta à consulta. Acresça-se não ser a hipótese de qualquer vedação prevista no artigo 3º da Resolução em tela.

Assim, acompanho o Relator, na resposta que ofereceu à consulta.

É como voto.

Brasília, data da sessão

 

Fernando Cesar Baptista de Mattos

Conselheiro

 

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA

218ª Sessão Ordinária

PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0001442-74.2013.2.00.0000

Relator: RUBENS CURADO SILVEIRA
Requerente: CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DE ALAGOAS
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ
Terceiros: Não definido

CERTIDÃO DE JULGAMENTO

CERTIFICO que o PLENÁRIO, ao apreciar o processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

"Após o voto da Conselheira vistora, o Conselho, por maioria, considerou legítimo o uso de recursos oriundos da aplicação da pena de prestação pecuniária para realização dos exames de DNA, nos termos do voto do então Relator Rubens Curado. Vencida a Conselheira Luiza Cristina. Presidiu o julgamento o Conselheiro Ricardo Lewandowski. Plenário, 6 de outubro de 2015."

Presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Conselheiros Ricardo Lewandowski, Nancy Andrighi, Lelio Bentes Corrêa, Carlos Levenhagen, Daldice Santana, Gustavo Tadeu Alkmim, Bruno Ronchetti, Fernando Mattos, Carlos Eduardo Dias, Luiza Cristina Frischeisen, Arnaldo Hossepian, Norberto Campelo, Luiz Cláudio Allemand, Emmanoel Campelo e Fabiano Silveira. 

Brasília, 6 de outubro de 2015.

MARIANA SILVA CAMPOS DUTRA

Secretária Processual

Brasília, 2015-10-07. 

Conselheiro Relator