Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: CONSULTA - 0001974-77.2015.2.00.0000
Requerente: COC & H COMERCIO DE PRODUTOS, PECAS E ACESSORIOS AUTOMOTIVOS EIRELI
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ

 

 

 

RECURSO ADMINISTRATIVO – CONSULTA – MATÉRIA DE CARÁTER JURISDICIONAL – INCOMPETÊNCIA 

1.      Consulta formulada com o propósito de ver esclarecidas e normatizadas, de forma vinculante, as regras de cumulação de pedidos e de competência para julgamento das ações envolvendo direito de propriedade de marcas e de patentes. 

2.      A matéria objeto da Consulta se reveste de caráter eminentemente jurisdicional e, portanto, não está contemplada no âmbito de atuação deste Conselho que, nos termos do art. 103-B, §4º da Constituição da República, restringe-se ao controle e supervisão financeira, administrativa e disciplinar dos órgãos do Poder Judiciário.

3.       Recurso Administrativo a que se nega provimento.

 

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator. Plenário Virtual, 23 de junho de 2017. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros João Otávio de Noronha, Lelio Bentes, Carlos Levenhagen, Daldice Santana, Gustavo Tadeu Alkmim, Bruno Ronchetti, Fernando Mattos, Carlos Eduardo Dias, Rogério Nascimento, Arnaldo Hossepian, Norberto Campelo, Luiz Cláudio Allemand, Henrique Ávila e Maria Tereza Uille. Não votou a Excelentíssima Conselheira Presidente Cármen Lúcia.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: CONSULTA - 0001974-77.2015.2.00.0000
Requerente: COC & H COMERCIO DE PRODUTOS, PECAS E ACESSORIOS AUTOMOTIVOS EIRELI
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ


1. Relatório 

 

Trata-se de Recurso Administrativo interposto à decisão mediante a qual se indeferiu liminarmente o pedido de Consulta, nos termos do art. 25, X, do RICNJ, diante da impossibilidade deste Conselho intervir em matérias de caráter jurisdicional.

Em seu recurso, a consulente reitera, em síntese, os argumentos lançados na inicial, requerendo, ainda, seja editada recomendação ou ato normativo que pacifique a matéria objeto da Consulta.

Sustenta que se instaurou um “caos jurídico” nos litígios referentes à propriedade intelectual, já que diversas demandas de conteúdos similares e conexos são ajuizadas perante a justiça federal e estadual, acarretando a prolação de decisões conflitantes, em prejuízo à segurança jurídica.

Afirma haver percebido, além do despreparo das partes envolvidas, que os magistrados desconsideram a segurança jurídica e decidem nova ação em desarmonia com a coisa julgada emanada de processo anterior. Em outras ocasiões, demandas sobre as mesmas marcas e patentes são analisadas concomitantemente pelas esferas estadual e federal, sem que se determine a suspensão de uma das ações.

Assevera que o problema tem por causa principal a ausência de orientação vinculante sobre o tema.

Entende que a questão referente ao “caos jurídico” é de ordem pública   inserindo-se, portanto, na competência do CNJ, a quem cabe proteger os princípios constitucionais a que alude o art. 37 da Constituição da República, e o próprio Poder Judiciário.

Alega que a pacificação da controvérsia reveste-se de relevância para todo o Poder Judiciário, já que o fenômeno atenta contra o princípio da economia processual.

Requer que a problemática seja objeto de estudo aprofundado e a participação do INPI com o fim de auxiliar na presente discussão.

Em nova petição, a Requerente junta aos autos parecer do INPI, em que manifesta concordância com o entendimento exposto na inicial, e ofício do INPI dirigido ao Presidente do Conselho Nacional de Justiça, “indagando-lhe sobre a possibilidade de produção de dados sobre as `ditas ações de abstenção de uso´ propostas na esfera estadual” (Id nº 1951753). 

É o relatório.

 

 

 

 

Conselho Nacional de Justiça

 

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O Conselheiro que me antecedeu proferiu o seguinte voto, acompanhado pela unanimidade do Plenário, na 23° sessão do Plenário Virtual, encerrada em 23 de junho de 2017:

"2. Fundamentação. 

Eis o teor da decisão impugnada:


Trata-se de Consulta formulada por COC & H Comércio de Produtos, Peças e Acessórios Ltda. quanto a diversas questões referentes à cumulação de pedidos em ações judiciais que envolvem o direito de propriedade de marca e de patentes nas esferas estaduais e federal do Poder Judiciário brasileiro.

A Consulente traça a distinção entre a Ação de Nulidade de Registro, a Ação de Adjudicação de Registro e a Ação de Abstenção do Uso de Marca ou Patente. Afirma que a competência para a apreciação e julgamento das referidas ações está prevista em normas da Lei de Propriedade Industrial – LPI (Lei nº 9.279/96) ou sedimentada pela jurisprudência e doutrina.

Salienta que, no entanto, alguns sujeitos jurídicos se utilizam maliciosamente das referidas ações para alcançar o mesmo objetivo: fazer decair o direito de outrem sobre determinada marca ou patente, com fundamento no uso ou no registro.

Noticia que, uma vez julgada improcedente a ação ajuizada perante a justiça federal, o interessado ingressa com a ação de competência da justiça estadual, ou vice-versa, de forma a ter a pretensão reapreciada.

A Consulente entende que a situação, apesar de formalmente adequada, cria um “caos jurídico”, pois gera decisões conflitantes sobre matérias conexas (direito de uso e direito de propriedade sobre a mesma marca ou patente).

Narra que, a fim de evitar tal situação, o TRF/2ª Região proferiu decisões pela possibilidade de cumulação de pedidos, a fim de que todos os pleitos sejam apreciados exclusivamente pela Justiça Federal, entendimento também defendido pela Associação Brasileira de Propriedade Intelectual (ABPI).

No entanto, afirma, a questão ainda não está sedimentada, o que vem perpetuando o “caos jurídico” referente às matérias de uso, propriedade e registro de marca, em evidente prejuízo à economia processual. Cita julgados que demonstram a existência de decisões conflitantes, instaurando a insegurança jurídica entre as partes.

Alega que a ausência de regra pré-estabelecida ou de entendimento sedimentado do Poder Judiciário sobre a análise de pedidos cumulados e alternativos para o caso de marcas e patentes gera insegurança, o que tem fomentado estratégias de “sham litigation” no Brasil.

Diante de tais fatos, a Consulente questiona: a) Qual a orientação deste Conselho sobre a possibilidade ou impossibilidade de cumulação de pedido de abstenção de uso de marca/patente e pedido indenizatório na Justiça Federal, concomitantemente às Ações de Nulidade ou Adjudicação de Registro de Marcas e Patente? b) Na hipótese de ser possível a cumulação de pedidos na Justiça Federal, essa eventual cumulação de pedidos receberá caráter preclusivo ou os referidos pedidos de abstenção de uso e indenização poderão ser novamente intentados no âmbito da Justiça Estadual? c) Qual a orientação do CNJ para os membros do Poder Judiciário, na hipótese de o autor ajuizar ações distintas nas esferas federal e estadual? d) Uma vez apreciada a Ação de Nulidade de Registro na Justiça Federal, estaria ainda passível de análise, posteriormente, a Ação de Adjudicação de Registro sobre a mesma marca envolvendo as mesmas partes e vice-versa? e) Qual a correta interpretação do art. 166 da LPI: a obrigatoriedade da formulação de pedidos alternativos na mesma ação perante a Justiça Federal (caso contrário, os pedidos seriam objeto de “preclusão”); ou a Ação de Nulidade de Registro e a Ação de Adjudicação de Registro poderão ser objeto de ações distintas, gerando brecha para a insegurança jurídica?; f) Estaria o Brasil exposto, diante do caos jurídico interno decorrente de decisões contraditórias, negativas de direitos de propriedade intelectual, e vulnerável à possibilidade de vir a responder em um novo contencioso no Sistema de Solução de Controvérsias da OMC por descumprimento do Acordo TRIPS? g) Qual garantia o Brasil oferece aos investidores (nacionais e estrangeiros) e aos empresários locais pequenos e médios quando seu marco regulatório de proteção às marcas e patentes é interpretado de forma contraditória, além de reinar no país as práticas de “sham litigation” e da manutenção do caos jurídico?

É o relatório. Decido.

As hipóteses de cabimento da Consulta perante o CNJ estão previstas no art. 89 do RICNJ, de seguinte teor:

Art. 89. O Plenário decidirá sobre consultas, em tese, de interesse e repercussão gerais quanto à dúvida suscitada na aplicação de dispositivos legais e regulamentares concernentes à matéria de sua competência. (grifei)

 Consoante a previsão regimental, somente dúvidas relativas à matéria de competência deste Conselho são passíveis de análise, em sede de Consulta.

No presente caso, a Consulente pretende obter esclarecimentos quanto à regra de cumulação de pedidos e à competência para julgamento de ações judiciais que envolvem o direito de propriedade de marcas e de patentes.

Verifica-se que a matéria a respeito da qual se pretende esclarecimentos reveste-se de caráter eminentemente jurisdicional e, portanto, é estranha ao âmbito de atuação deste Conselho, que, nos termos do art. 103-B, §4º da Constituição da República, detém competência para o controle e supervisão financeira, administrativa e disciplinar dos órgãos do Poder Judiciário.

 A jurisprudência do CNJ é firme no sentido de que não compete ao CNJ imiscuir-se em questões de natureza jurisdicional. A respeito, transcrevo os seguintes precedentes (os grifos foram acrescidos):

RECURSO ADMINISTRATIVO EM PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. VARA DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE DA COMARCA DE FOZ DO IGUAÇU. ATO DE NATUREZA JURISDICIONAL. INCOMPETÊNCIA DO CNJ. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS NOVOS CAPAZES DE ALTERAR O ENTENDIMENTO ADOTADO NA DECISÃO COMBATIDA. RECURSO DESPROVIDO.

I. O ato atacado tem natureza jurisdicional, pelo que não é alcançado pelo controle administrativo exercido por este Conselho.

II - A competência constitucional fixada do CNJ é restrita ao âmbito administrativo do Poder Judiciário, pelo que não pode intervir no andamento de processo judicial, seja para corrigir eventual vício de ilegalidade ou nulidade, seja para inibir o exercício regular dos órgãos investidos de jurisdição. Para reverter eventuais provimentos que considera incorretos, ilegais ou desfavoráveis aos seus interesses, deve a parte valer-se dos meios processuais adequados.

III. Ausência, nas razões recursais, de elementos novos capazes de alterar o entendimento adotado na decisão combatida. 

IV. Recurso conhecido e não provido.

(CNJ - RA – Recurso Administrativo em PP - Pedido de Providências Conselheiro - 0001435-48.2014.2.00.0000 - Rel. RUBENS CURADO - 186ª Sessão - j. 08/04/2014 - grifei).

 RECURSO ADMINISTRATIVO EM PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. GREVE DE SERVIDORES. REQUERIMENTO DE SUSPENSÃO DE PRAZOS. IMPOSSIBILIDADE. MATÉRIA JURISDICIONAL.

1. Trata-se de Recurso Administrativo em Pedido de Providências interposto pela Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional de Rondônia, a fim de garantir o sobrestamento de todos os prazos processuais nas unidades jurisdicionais que fazem parte do Poder Judiciário de Rondônia, em razão de greve deflagrada pelos servidores.

2. O fundamento para o sobrestamento, em casos como o dos autos, está no art. 265, V, do Código de Processo Civil. Embora o expediente que o formaliza seja, de fato, um ato administrativo editado pelo Tribunal, o poder exercido pelo Tribunal é, em verdade, jurisdicional.

3. A matéria, portanto, refoge à competência constitucionalmente fixada a este Conselho que, de acordo com precedentes do próprio STF, deve ficar adstrita ao controle de atos administrativos e financeiros dos Tribunais.

4. Ainda que se insista que a matéria ostente caráter administrativo e, portanto, seja passível de controle por este Conselho, assiste razão ao Tribunal quando aduz que a greve de servidores, por si só, não constitui motivo suficiente para determinar a suspensão dos prazos processuais. Precedentes.

5. Assim, para se comprovar que a greve constitui motivo válido para suspensão dos prazos há que se investigar se houve total paralização das atividades ou se elas foram a tal ponto comprometidas que trouxeram prejuízos imoderados às partes. A exata dimensão desse problema escapa ao conhecimento deste Conselho, porque distante dos fatos. Deve o Tribunal, no exercício de sua autonomia, sopesar se a suspensão é a melhor solução para o caso e é apenas em cada processo que isso pode ser verificado, a revelar, uma vez mais, que o exercício é de competência jurisdicional ou, no mínimo, que deve ficar adstrito à sua autonomia.

6. Escorreita a decisão que, nos termos do disposto no art. 25, X, do RICNJ, não conheceu pedido que requer providência jurisdicional.

7. Recurso conhecido e não provido.

(CNJ - RA – Recurso Administrativo em PP - Pedido de Providências Conselheiro - 0003003-36.2013.2.00.0000  - Rel. ANA MARIA DUARTE AMARANTE BRITO - 178ª Sessão - j. 05/11/2013 - grifei).

 CONSULTA. NATUREZA JÚRIDICA DO ADICIONAL CONSTITUCTONAL DE UM TERÇO SOBRE FÉRIAS USUFRUIDAS. INCIDÊNCIA OU NÃO DE IMPOST0 DE RENDA. MATÉRIA ESTRANHA A COMPETÊNCIA DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA.

Não cabe ao Conselho Nacional de Justiça, ao qual não foi atribuído o exercício de função jurisdicional, decidir sobre a natureza jurídica do adicional de 1/3 terço, previsto no inciso VII do artigo 7º da Constituição Federal e pago por ocasião do gozo de férias, bem como se sobre ele incide, ou não, imposto de renda. Consulta não conhecida.(CNJ - PP Pedido de Providências - Conselheiro - 1430 - Rel. ALTINO PEDROZO DOS SANTOS - 45ª Sessão - j. 14/08/2007 ).

 Nesse diapasão, considerando que os questionamentos formulados pela Consulente se referem a matéria de caráter jurisdicional, que não se insere nas atribuições do CNJ, e a disposição contida no art. 89 do RICNJ, resulta imperioso concluir pela incompetência do CNJ para apreciar a presente Consulta.

Ante o exposto, diante da impossibilidade deste Eg. Conselho intervir em matérias de caráter jurisdicional,  indefiro liminarmente o pedido de Consulta, nos termos do art. 25, X do RICNJ, e determino o arquivamento do feito, após as comunicações de praxe. (Id nº 1717013).

 

Verifico que as razões recursais não são capazes de infirmar o entendimento adotado na decisão.

Conforme já consignado na decisão recorrida, a pretensão da Consulente, no sentido de ver esclarecidas e normatizadas, de forma vinculante, as regras de cumulação de pedidos e de competência para julgamento das ações envolvendo direito de propriedade de marcas e de patentes, não se insere na competência do CNJ.

Com efeito, a matéria se reveste de caráter eminentemente jurisdicional e, portanto, não está inserida no âmbito de atuação deste Conselho que, nos termos do art. 103-B, §4º da Constituição da República, restringe-se ao controle e supervisão financeira, administrativa e disciplinar dos órgãos do Poder Judiciário.

Nessa linha, a competência deste Conselho, de zelar pela observância da norma do art. 37 da Constituição da República, disposta no art. 103-B, §4º, II da Lei Magna, a que se refere a Consulente, está igualmente adstrita a questões administrativas e financeiras.

Portanto, diversamente do que pretende a Consulente, não cabe ao CNJ disciplinar de forma vinculante a competência para o julgamento de ações, as hipóteses de cumulação de pedidos ou de ocorrência de coisa julgada ou litispendência, em razão de tais questões revelarem nítido caráter jurisdicional, estranho à competência do CNJ.

Assim, à luz dos precedentes já citados e diante da incompetência deste Conselho para apreciar a presente Consulta, mantenho a decisão impugnada.


3. Conclusão 

 Ante o exposto, nego provimento ao Recurso Administrativo. 

 

 

 

Lelio Bentes Corrêa 

Conselheiro Relator"

 

Ministro ALOYSIO CORRÊA DA VEIGA

Conselheiro Relator

 

Brasília, 2017-09-22.